Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo: 2638/14.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:06/28/2018
Relator:HELENA CANELAS
Descritores: APOSENTADO – CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES – ACUMULAÇÃO – PENSÃO – REMUNERAÇÕES – REVISOR OFICIAL DE CONTAS – ENTIDADE PÚBLICA EMPRESARIAL – FISCAL ÚNICO – SOCIEDADE DE REVISORES OFICIAIS DE CONTAS
Sumário:I – O fiscal único previsto nos Estatutos da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE constitui o órgão (singular) de fiscalização daquela Entidade Pública Empresarial a que alude o artigo 33º do Regime Jurídico do Sector Público Empresarial (aprovado pelo DL. nº 133/2013, de 3 de outubro), o qual deve ser um revisor oficial de contas ou uma sociedade de revisores oficiais de contas (cfr. artigo 413º do Código das Sociedades Comerciais, ex vi do artigo 33º nº 3 do Regime Jurídico do Sector Público Empresarial).

II – Nos termos do Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas aprovado pelo Decreto-Lei n.º 487/99, de 16 de novembro, com as alterações introduzidas pelos DL. nº 224/2008, de 20 de novembro, e nº 185/2009, de 12 de agosto (atualmente substituído pelo novo Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas aprovado pela Lei nº 140/2015, de 7 de setembro), as sociedades de revisores oficiais de contas revestem a natureza de sociedades civis, dotadas de personalidade jurídica, as quais têm por objeto precisamente o desempenho das funções e competências próprias dos revisores oficiais de contas, designadamente as de revisão legal das contas, de auditoria às contas e dos serviços relacionados de empresas ou de outras entidades nos termos definidos na lei, as quais são consideradas funções de interesse público (cfr. designadamente artigos 40º, 94º e 95º).

III – Em tal caso são as próprias sociedades de revisores oficiais de contas que são as nomeadas para a função (cfr. designadamente artigos 49º e 50º); porém, como se tratam de pessoas coletivas, o Estatuto impõe a designação de, pelo menos, “…um revisor oficial de contas a título individual ou como sócio de sociedade de revisores, ou um revisor oficial de contas exercendo funções nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 49.º responsável pela orientação ou execução direta do seu cumprimento”, o qual assume a posição de «revisor orientador» ou «revisor executor» (cfr. artigo 57º).

IV – Se a sociedade de revisores oficiais de contas, de que o autor é sócio não único, foi nomeada para fiscal único de uma Entidade Pública Empresarial, sendo aquela dotada de personalidade jurídica própria, distinta do autor, não se pode entender que ele vinha exercendo funções públicas remuneradas nos termos e para os efeitos previstos no artigo 78º do Estatuto da Aposentação.
Votação:
UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO
Caixa Geral de Aposentações, ré na ação administrativa especial que contra si foi instaurada em 05/11/2014 no Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa por F……………… (devidamente identificado nos autos) – na qual foi impugnado o ato que, ao abrigo do artigo 78º do Estatuto Aposentação, determinou a suspensão da pensão do autor, peticionando-se a sua anulação bem como a condenação da ré à reposição do pagamento das pensões desde Agosto de 2014 – inconformada com a sentença de 24/02/2017 do Tribunal a quo pela qual foi a ação julgada procedente, com anulação do ato impugnado e condenação da ré a pagar ao autor as pensões de aposentação não pagas em consequência da mesma, dela interpõe o presente recurso, pugnando pela revogação da decisão recorrida.
Formula nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões, nos seguintes termos:
1 - O recorrido F…………………, pretende que seja anulado o ato administrativo traduzido no ato pelo qual a recorrente, Caixa Geral de Aposentações, suspendeu o pagamento da sua pensão de aposentação a partir de 19 de agosto p.p, com fundamento no exercício, por aquele, de funções públicas.

2 - A questão da opção pela suspensão do pagamento da remuneração ou da pensão encontra-se claramente resolvida na Lei, estabelecendo o n.º 3 do art.º 8.º do Decreto-Lei n.º 137/2010, de 28 de Dezembro, que os aposentados estão obrigados a comunicar às respetivas entidades empregadoras, no prazo de 10 dias contados de 2011-01-01 “...se optam pela suspensão do pagamento da remuneração ou da pensão.” prevendo ainda o n.º 5 do mesmo artigo que “Quando se verifiquem situações de cumulação e sem que tenha sido manifestada a opção a que se refere o n.º 3, deve a CGA, I. P., suspender o pagamento do correspondente valor da pensão.”

3 – O recorrido apesar de ter sido aposentado pela CGA, em 2004-09-22, com base no Decreto-Lei n.º 116/1985, de 19 de abril, exerceu funções públicas na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE.

4 – Pelo que, configurando, o exercício de tais funções, uma situação de acumulação prevista no artigo 78.º do Estatuto da Aposentação, impunha-se-lhe, aposentado que é, o dever de optar entre a suspensão do pagamento da pensão e a suspensão da remuneração, nos termos do artigo 79.º do, referido, estatuto na redação dada pelo 137/2010, de 28 de dezembro.

5 - Contactado pela Caixa para o efeito, bem como, para proceder à reposição das verbas que face a uma correta aplicação da Lei, a Caixa lhe terá pago indevidamente a título de pensão, argumentou, tal como faz nos presentes autos, que não exerceu funções públicas na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (ULSBA) EPE, uma vez que o despacho de designação de fiscal único nomeia a S………, C… A……, SROC e não a ele enquanto pessoa singular e que aufere a remuneração por desempenho de funções de fiscal único na SROC, entidade eminentemente não pública.

6 – Prosseguiu argumentando que o que o coloca a exercer funções para aquela Unidade Hospitalar é a existência de um contrato, nada coincidente com uma relação jurídica de emprego público que transforme a remuneração auferida pela sociedade em remuneração devida pelo exercício de cargo que possa objetar a que, individualmente, um sócio de uma SROC, tenha, individualmente de ficar afetado no direito à retribuição da sua pensão.

7 – O regime das incompatibilidades vertido nos artigos 78.º e 79.º do Estatuto das Aposentações e aplicável ao recorrido sofreu várias alterações até ao presente.

8 - Assim, já na redação do artigo 78.º do Estatuto da Aposentação, conferida pelo Decreto-Lei n.º179/2005, de 2 de Novembro, houve a preocupação de restringir a atividade de aposentados em atividade públicas, e não só, uma vez que, do citado preceito, decorre que os aposentados não podem exercer funções públicas ou prestar trabalho remunerado, ainda que através de terceiras entidades, em quaisquer serviços do Estado, pessoas coletivas ou empresas públicas, sendo irrelevante a modalidade ou forma jurídica subjacente ao exercício de funções ou prestação de trabalho após aposentação (tarefa, avença, ou outra modalidade de prestação de serviços, contrato de trabalho a termo certo ou incerto ou outro).

9 - A publicação do Decreto-Lei n.º 137/2010, de 28 de Dezembro, não obstante ter por finalidade adotar um conjunto de medidas de consolidação orçamental às previstas no PEC para 2010-2013, não deixou de espreitar uma oportunidade para clarificar o regime de incompatibilidades previsto no artigo 78.º do EA, precisando exaustivamente as entidades, inclusivamente por alargamento do âmbito de aplicação (aos domínios não só da administração central, regional e local, para que não restem dúvidas), que inibem o exercício de funções por aposentados (n.º 1), por um lado, por outro, definindo o conceito de exercício de funções até ao título de precariedade mais ínfimo dos vínculos laborais conhecidos no mundo da atividade laboral (n.º 3).

10 - Na parte final do n.º1 do artigo 78.º, prevê-se um regime de exceção (e até se compreende, já que situações excecionais sempre existem, principalmente aquelas que, de momento, não se sabe possam vir a surgir no domínio de ocorrências de gestão urgente do erário público), com 2 vertentes também: quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados (…).

11 - No que a este ponto se refere, quanto à primeira vertente, parece não existir lei especial que, só por si, salvaguarde a situação dos revisores oficiais de contas.

12 - Quanto à segunda vertente, numa primeira análise, o que se tem por certo é que, de acordo com o disposto no artigo 78.º do Estatuto de Aposentação (EA), na redação do Decreto-Lei n.º 137/2010, de 28 de Dezembro, fica expressamente vedado o acesso ao exercício de funções públicas por aposentados da Caixa Geral de Aposentações, a menos que por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas das Finanças e da Administração Pública, o que não acontece no caso do recorrido.

13 - Compete à Caixa tomar a iniciativa de se ressarcir das importâncias pagas indevidamente aos seus aposentados, que tenham estado em situação de acumulação, a título de pensão de aposentação, ouvindo, como é hábito, os interessados neste propósito, antes de se proceder à dedução na pensão das quantias a apurar desde o início dos respetivos contratos: redução de 1/3 da pensão ou da remuneração que, porventura, tenham vindo a auferir até 31 de Dezembro de 2010, e, a partir de então, do valor integral de uma ou outra, consoante a opção que vier a ser tomada por aqueles, até à cessação da situação.

14 - Entretanto, com a publicação da Lei n.º 11/2014, de 6 de Março e mais recentemente com a Lei n.º 75-A/2014, de 28 de setembro (1ª e 2ª alteração à Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2014) os aposentados ou reformados, salvo as exceções ressalvadas por aqueles diplomas, caso pretendam exercer funções públicas, perdem a prerrogativa de opção entre a pensão que vinham percebendo e a remuneração correspondente ao desempenho da função pública ficando, apenas, com direito ao montante fixado para esta última e com a primeira suspensa enquanto durar o exercício das funções públicas enquanto aposentados.

15 - Encontrando-se clarificado na redação dada ao, sempre, falado artigo 78.º do Estatuto da Aposentação, pela Lei n.º 75-A/20114, de 28 de setembro, que, o conceito de atividade profissional remunerada abrange todo o tipo de funções e serviços, independentemente da sua duração ou regularidade e da forma de contrapartida, pecuniária ou em espécie, direta ou indireta, da atividade desenvolvida nomeadamente todas as prestações que, total ou parcialmente, constituem base de incidência contributiva nos termos do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social.


“Artigo 78.º”
[...]
“1 - Os aposentados, reformados, reservistas fora de efetividade e equiparados não podem exercer atividade profissional remunerada para quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas, exceto quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública.
2 - Não podem exercer atividade profissional remunerada nos termos do número anterior:
a) ...
b) ...
3 - Consideram-se abrangidos pelo conceito de atividade profissional remunerada:
a) Todos os tipos de funções e de serviços, independentemente da sua duração ou regularidade;
b) Todas as formas de contrapartida, pecuniária ou em espécie, direta ou indireta, da atividade desenvolvida, nomeadamente todas as prestações que, total ou parcialmente, constituem base de incidência contributiva nos termos do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social;
c) [Anterior alínea b)].
4 – ...
5 - ...
6 - ...
7 - ... “

16 - Ou seja, nestas novas versões do regime das incompatibilidades – aplicáveis ao recorrido - mantém-se a regra geral de que os aposentados, reformados, reservistas fora da afetividade e equiparados, não podem exercer atividades públicas para quaisquer serviços da administração central, regional ou autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas, exceto quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração pública, sejam atividades e serviços remunerados ou não e tendo como consequência a suspensão obrigatória da pensão ou remuneração de reserva ou equiparada.

17 - Aplicando-se este novo regime de suspensão obrigatória da pensão previsto no artigo 79.º do Estatuto da Aposentação na redação dada pela Lei n.º 11/2014, de 6 de março, para pensionistas da CGA (e também para pensionistas da regime geral e de outras entidades públicas) às situações de exercício de funções constituídas ou renovadas a partir de 2014-03-07 – como é o caso do recorrido.

18 - Quanto à questão do exercício das funções públicas, não de forma direta por aposentados mas por empresas para as quais aqueles foram contratados ou façam parte do seu capital social, tal contende com o artigo 78.º do EA, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 179/2005, de 2 de Novembro, e como se viu, com as restantes alterações legislativas que aquele artigo foi tendo ao longo do tempo, uma vez que, como tivemos, já, oportunidade de referir, do citado preceito, decorre que, os aposentados não podem exercer funções públicas ou prestar trabalho remunerado, ainda que através de terceiras entidades, em quaisquer serviços do Estado, pessoas coletivas ou empresas públicas, sendo, irrelevante a modalidade ou forma jurídica subjacente ao exercício de funções ou prestação de trabalho após a aposentação (tarefa, avença, ou outra modalidade de prestação de serviços, contrato de trabalho a termo certo ou incerto ou outro) (sublinhado nosso).

19 - Além disso, a contratação por entidades públicas de aposentados da CGA através de sociedades configura uma fraude à lei, que justifica a desconsideração da personalidade jurídica destas. O Estatuto da Aposentação não confere relevância a quem consta do contrato como parte mas a quem exerce efetivamente as funções (o aposentado) e a se estas são ou não remuneradas (independentemente do circuito que canalize os honorários para o património do pensionista).

20 - Assim, a pretensão do recorrido, na interpretação por si apresentada, não merece qualquer relevo, uma vez que os atos materiais de execução da norma em análise, por terem observado todos os pressupostos legais, salvo melhor opinião, não enfermam de qualquer vício de violação de lei, tanto mais que se tratam de atos decorrentes de aplicação material da lei sem necessidade de formação de qualquer juízo de valor subjetivo, desde logo, porque a impossibilidade de acumulação de pensões com remunerações em empresas do Estado resulta diretamente da Lei.

21 – De todo o exposto resulta que, a CGA, somente, cumpriu a Lei ao promover a suspensão do pagamento da pensão como previsto nos Decreto-Lei n.º 137/2010, de 28 de Dezembro e na Lei n.º 11/2014, de 6 de Março, não violando qualquer norma ou princípio legal, devendo o ato impugnado pelo recorrido manter-se.



Notificado o Recorrido contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da sentença recorrida.

Remetidos os autos em recurso a este Tribunal Central Administrativo Sul, neste notificada nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, a Digna Magistrada do Ministério Público emitiu Parecer no sentido de não dever merecer provimento o recurso, pelos seguintes fundamentos:
«(…)
Nos autos está em causa a titularidade ou não do direito do A. ao recebimento da pensão paga pela Entidade Requerida que é, ao que foi alegado, o garante da sua sobrevivência e da sua existência condigna, como consagrado no art. 63°, n° 1 da CRP.
Como alegou, o A é R.O.C. e exerce essa atividade no âmbito da Sociedade, que identificou, razão por que todos os atos e contractos compreendidos nesse exercício se reportam à respetiva sociedade e não a si, individualmente, por força do disposto nos artigos 49° n° 1 e 96° n° 4 do Estatuto da Ordem dos Revisores de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei n° 487/99, de 16.11, com a redação dada pelo Decreto-Lei n° 224/2008, de 20.11.
Nesta perspetiva que temos por correta o Autor não se encontra a exercer funções públicas nos termos e para efeitos dos artigos 78° e 79° do Estatuto da Aposentação.
Como resulta da matéria de facto dada como provada, o A. é pensionista da Caixa Geral de Aposentações, tendo o número de inscrição ……..; foi-lhe atribuída a pensão definitiva de aposentação, conforme despacho de 2004.09.22, da Direção da CGA.
A Sociedade de Revisores Oficiais de Contas “S......, C....... & Associado SROG", está inscrita na Lista das Sociedade de Revisores Oficiais de Contas com o n° ….. e os seus sócios são o Dr. F…………….. e a De N……………
Pelo Despacho n° 12046/2009, de 20 de Maio de 2009, publicado no Diário da República, 2ª Série, n° 97, da mesma data mas com efeitos reportados a 01.10.2008 foi a referida Sociedade nomeada para o triénio 2008-2010, como fiscal único efetivo da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, tendo sido renovado para o triénio 2012-2014 e recebendo a sociedade, pelos serviços prestados uma remuneração mensal (€898,65). O Autor recebe da Sociedade comercial, S…., C…. & Associados a distribuição de lucros.
A questão de direito que se coloca e que tem de decidir-se é a de saber se é aqui aplicável a disciplina contida no art° 78° do Estatuto da Aposentação, ou se, ao contrário do que fez a aqui recorrente, tal preceito não é aplicável à situação do A.
À data dos factos, estipulava o mencionado art° 78° que os aposentados não podiam exercer funções públicas remuneradas para quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integrassem o sector empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas exceto quando houvesse lei especial que o permitisse ou quando, por razões de interesse público excecional, fossem autorizados pelos membros do governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública.
Mais estipulava o mesmo preceito que não podiam exercer funções públicas nos termos anteriormente referidos, os aposentados que se tivessem aposentado com fundamento em incapacidade e os aposentados por força de aplicação da pena disciplinar de aposentação compulsiva.
Relembre-se que, como defende o A. quem foi nomeado foi a sociedade S…., C…. & Associado, de que é sócio e não ele, A., o que importa distinguir — cf alíneas I a J) do probatório).
Tem também de considerar-se, como se considerou que os rendimentos obtidos pelo ora Autor (que a CGA entende terem sido percebidos em cumulação com a pensão de aposentação), foram-lhe pagos pela Sociedade de que é sócio e por força do Regime de transparência fiscal (art. 6°, n° 1 do CIRC), conforme consta da respetiva Declaração de rendimentos (anexo D).
Concordamos com o A. ao defender que a Entidade Demandada errou ao
considerar que o Autor exerceu funções públicas nos termos e para efeitos do art. 78°, n° 1 e 3 do EA, na versão então aplicável, já que, como se referiu supra, quem celebrou contrato com a entidade pública foi a Sociedade e não o A. sendo certo que as sociedades de revisores de contas detêm personalidade jurídica própria e distinta da dos seus sócios.
Sendo assim, como entendemos que é, damos parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso interposto pela CGA, mantendo-se a sentença recorrida, por esta não merecer a censura que lhe faz a recorrente.»

Sendo que dele notificadas as partes nenhuma se apresentou a responder.

*
Com dispensa de vistos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.
*
II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/as questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pelo recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a sentença recorrido incorreu em erro de julgamento (de direito), por errada interpretação dos artigos 78º e 79º do Estatuto da Aposentação.
*
III. FUNDAMENTAÇÃO

A – De facto
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade nos seguintes termos:
A) O A. é pensionista da Caixa Geral de Aposentações, tendo o número de inscrição …….., tendo-lhe sido atribuída a pensão definitiva de aposentação, conforme despacho de 2004.09,22, da Direcção da CGA, no valor de € 2.557,83 – cf. doc. 1 junto à p.i.; ;

B) Em 2011 auferiu a pensão anual (ilíquida) de €36.652,00 – cf. doc. 3 junto à r.i.;

C) Em 2012 auferiu a pensão anual (ilíquida) de € 31.416,00 – cf. doc. 4 junto á p.i.;

D) Em 2013 auferiu a pensão anual (ilíquida) de €36.652,04 – cf. doc. 5 junto à p.i.;

E) Em 28.01.2014, pelo ofício com a referência “UAC …..SG (PC) …….. a CGA comunicou ao Autor o seguinte:

Assunto: Novo regime de exercício de funções públicas
A Caixa Geral de Aposentações tomou conhecimento de que V. Exª exerceu funções na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE, o que configura uma situação de acumulação prevista no artigo 78º do Estatuto da Aposentação, impondo-se o dever de optar entre a suspensão do pagamento da pensão e a suspensão da remuneração, nos termos do artigo 79º do mesmo Estatuto, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 137/2010, de 28 de dezembro.
Ora, dado que a Caixa não recebeu, até à presente data qualquer comunicação sobre o assunto, e não podendo deixar de dar cumprimento à lei, informo V. Exª de que, até que efetue aquela opção ou preste a devida informação, a pensão que lhe está a ser abonada ficará suspensa a partir do próximo mês de março, sem prejuízo da regularização do passado” – cf. doc. 6 junto ao r.i. / fls. 46 do processo administrativo apenso;

F) O Autor pronunciou-se nos termos constantes de doc. 7 junto à junto á p.i, opondo-se à interpretação da CGA, e ainda que a suspensão lhe causará danos irreparáveis uma vez que a sua sobrevivência depende essencialmente da pensão de aposentação;

G) Em 11 de Junho de 2014, a CGA enviou nova comunicação ao A. nos seguintes termos:

Assunto: Novo regime de exercício de funções públicas
Tendo presente a documentação que enviou, comprova-se que, posteriormente a 2011-01-
01 não auferiu verbas por parte do IGFEJ.
Porém, consta que V. Exª terá sido o representante da Sociedade de Revisores de contas (SROC) “S……, C…… e Associados, SROC”, na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (ULSBA) em data posterior a 2011.01.01.
Assim sendo, V. Exª terá que optar, relativamente ao período que representou a sociedade entre restituir as pensões pagas pela CGA ou a verba pela referida Unidade de Saúde. Na falta desta opção, esta Caixa não poderá deixar de suspender provisoriamente a pensão que vem pagando.” *que foi precedido de um parecer jurídico contante de fls. 92 a 97 do processo administrativo, que mereceu o despacho de concordância da Direcção, em 10.04.2014 ]– cf. doc. 8 junto ao r.i. /fls. 98 do processo administrativo apenso;

H) Com data de 17 de Abril de 2014, a Ordem dos Revisores Oficiais de Contas emitiu a seguinte Declaração:

Para os devidos efeitos declara-se que a Sociedade de Revisores de contas “S......, C....... & Associado SROG”, (…) está inscrita na Lista das Sociedade de Revisores de contas com o nº …. e os seus sócios o Dr. F……… e a Drª N………. (…) encontram-se no exercício efectivo de todos os seus direitos como tal. “ – cf. doc. 9 junto ao r.i.;

I) Pelo Despacho nº 12046/2009, de 20 de Maio de 2009, publicado no Diário da República, 2ª Série, nº 97, da mesma data mas com efeitos reportados a 01.10.2008 foi a Sociedade nomeada para o triénio 2008-2010, como fiscal único efectivo da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, a sociedade de Revisores de Contas “S......, C....... & Associado SROG”, representada pelo ora Autor e como fiscal suplente J……….., revisor oficial de contas. Tendo sido fixada que a remuneração anual ilíquida do fiscal efectivo da Unidade de Saúde do Baixo Alentejo, será a constante do contrato de prestação de serviços a celebrar, tendo como limite máximo equivalente a 25% da quantia correspondente a 12 meses de vencimento mensal ilíquido atribuído ao Presidente do Conselho de Administração – cf. doc. 10 junto à p.i.;

J) Por Despacho (nº …./12-SETF) da Secretaria de Estado do Tesouro e Finanças, foi renovado o mandato do órgão de fiscalização da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE, para o triénio 2012-2014: fiscal único efectivo S....., C..... & Associados, SROC, tendo sido celebrado o contrato de prestação de serviços - cf. doc. 11, junto à p.i.;

K) Por esse contrato de prestação de serviços a Sociedade de Revisores Oficiais de Contas “S........, C.......... & Associados ” contribuinte nº ………….., recebia uma remuneração mensal de €898,65 , que emitia as respectivas facturas – cf. doc. 12 a 41 juntos à p.i..;

L) Do aludido contrato consta (Cláusula terceira – Vigência do contrato):

1- O presente contrato vigora para o triénio 2012-2014, nos termos definidos no Despacho nº ……/12-STEF, de 24 de Março de 2012, do S.E.T.F., que consta em anexo (…)

2. Sem prejuízo do disposto no número anterior, nos termos do disposto no nº 4 do art. 15º dos Estatutos da Primeira Outorgante, cessando o mandato, o fiscal único, Segunda Outorgante mantém-se em funções até à posse do respectivo substituto” - cf. doc. 11 junto á p.i.;

M) O Autor recebe da sociedade Comercial, S....., C..... & Associados distribuição de lucros – confissão (art. 40 do r.i.);

N) Os rendimentos declarados pelo Autor nos anos de 2011 a 2013 (valor anual) repartem-se da seguinte forma:

(Texto no Original)


**
B – De direito

1. Da decisão recorrida
A sentença recorrida julgou a ação procedente, anulando o ato impugnado e condenando a ré CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES a pagar ao autor as pensões de aposentação não pagas em consequência do mesmo.
Decisão que tendo por base a matéria de facto que foi dada como provada, assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever:
«Na presente ação importa aferir da (i)legalidade da decisão de suspensão do pagamento da pensão de aposentação paga pela Entidade Demandada ao Autor, a partir do mês de Agosto de 2014.
Da errada interpretação do art. 78º e 79º do Estatuto da Aposentação (na redação dada pela Lei nº 11/2014, de 06.03)
Segundo o Autor não celebrou qualquer contrato com a actual Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE, nem tem qualquer vínculo contratual com quaisquer serviços da administração, central, regional, autárquica ou outra para efeitos do art. 78º do EA.
É Revisor Oficial de Contas e exerce essa atividade no âmbito da Sociedade “S....., C...... & Assiciados, SROC”, pelo que todos os atos e contratos compreendidos nesse exercício se reportam à respetiva sociedade e não individualmente ao próprio, por força do disposto nos artigos 49º, nº 1, 96º, nº 4, do Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 487/99, de 16.11, com a redação dada pelo Decreto-Lei nº 224/2008, de 20.11
Logo, o contrato celebrado entre a dita Sociedade e a Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE, de que é sócio não se subsume no art. 78º, nº 1 do Estatuto da Aposentação.
Assim, não o entende a Entidade Requerida, Caixa Geral de Aposentações, segundo a qual do art. 78º, nº 1, do Estatuto da Aposentação decorre os aposentados não podem exercer funções públicas ou prestar trabalho remunerados, anda que através de terceiras entidades, em quaisquer serviços do Estado, pessoas coletivas ou empresas públicas, sendo irrelevante a modalidade ou forma jurídica subjacente ao exercício de funções ou prestação de trabalho após a aposentação (tarefa, avença, ou outra modalidade de prestação de serviços, contratos de trabalho a termo certo ou incerto ou outro).
O artigo 78º do Estatuto da Aposentação, na versão do Decreto-Lei nº 137/2010, de 28 de Dezembro (aplicável á data dos factos), previa que:
“1. Os aposentados não podem exercer funções públicas remuneradas para quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o sector empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas , exceto quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública.
2. Não podem exercer funções públicas nos termos do número anterior:
a) Os aposentados que se tenham aposentado com fundamento em incapacidade;
b) Os aposentados por força de aplicação da pena disciplinar de aposentação compulsiva.
3. Consideram-se abrangidos pelo conceito de exercício de funções:
a) Todos os tipos de atividade e de serviços, independentemente da sua duração, regularidade e forma de remuneração;
b) Todas as modalidades de contratos, independentemente da respetiva natureza, pública ou privada, laboral ou de aquisição de serviços.”

Que entretanto já sofreu três alterações, Lei n.º 11/2014, de 6 de Março; Lei n.º 75- A/2014, de 30 de Setembro e Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro, todas elas no sentido da regra da inacumulabilidade de pensões de aposentação ou de reforma com o exercício de funções públicas. Tendo sido clarificado pela Lei nº 75-A/2014, de 28.09, o conceito de atividade profissional remunerada que abrange todo o tipo de funções e independentemente da sua duração ou regularidade e da forma de contrapartida, pecuniária ou espécie, direta ou indireta, da atividade desenvolvida, nomeadamente as prestações que total ou parcialmente constituem base de incidência contributiva nos termos do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social.
Todavia, no caso em apreço estamos a falar na versão dada pelo Decreto-Lei nº
137/2010 (ofício da CGA de 2014.01.28), em que a ED assume que o ora Autor exerceu funções na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo.
Em resposta o ora Autor esclareceu que quem foi nomeado foi a sociedade S……, C…… & Associado, que é sócio mas que se distinguem.
Vejamos;
Os revisores oficiais de contas ao contrário do alegado pelo ora Autor exercem nos termos do artigo 40º do Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (aprovado pelo Decreto-Lei nº 487/99, de 16.11, com a redação dada pelo Decreto-Lei nº 224/2008, de 20.11) funções de interesse público:
“1 - Constituem competências exclusivas dos revisores oficiais de contas as seguintes funções de interesse público:
a) A revisão legal das contas, a auditoria às contas e os serviços relacionados, de empresas ou de outras entidades, nos termos definidos no artigo seguinte;
b) O exercício de quaisquer outras funções que por lei exijam a intervenção própria e autónoma de revisores oficiais de contas sobre determinados atos ou factos patrimoniais de empresas ou de outras entidades.
2 - Constituem também competências exclusivas dos revisores oficiais de contas quaisquer outras funções de interesse público que a lei lhes atribua.”
Diferente das constantes do art. 48º do mesmo Estatuto, como sejam de docência, entre outras.
Acontece que esse exercício pode assumir várias formas:
1 - O Revisor oficial de contas desempenha as funções contempladas neste diploma em regime de completa independência funcional e hierárquica relativamente às empresas ou outras entidades a quem presta serviços, podendo exercer a sua atividade numa das seguintes situações:
a) A título individual;
b) Como sócio de sociedades de revisores;
c) Sob contrato de prestação de serviços celebrado com um revisor oficial de contas a título individual ou com uma sociedade de revisores.
2 - Os revisores oficiais de contas cuja atividade seja exercida nos termos da alínea c) do número anterior podem exercer as funções contempladas neste diploma em regime de não dedicação exclusiva, durante um período máximo de três anos a contar da data de celebração do primeiro contrato de prestação de serviços.
3 - O contrato de prestação de serviços referido na alínea c) do n.º 1 deverá ser previamente registado na Ordem, observando-se, na parte aplicável, o disposto no n.º 2 do artigo 53.º
4 - Os revisores oficiais de contas que não exerçam as funções contempladas neste diploma em regime de dedicação exclusiva, bem como as sociedades de revisores em que algum dos sócios esteja nessas condições, não podem contratar revisores oficiais de contas nos termos da alínea c) do n.º 1.
5 - Para efeitos deste diploma, considera-se que os revisores oficiais de contas ou sócios de sociedades de revisores exercem as funções nele contempladas em regime de dedicação exclusiva quando não estiverem simultaneamente vinculados, seja qual for a natureza do vínculo, fora do âmbito das referidas funções, a outra empresa ou entidade.
6 - Os vínculos estabelecidos pelos revisores oficiais de contas ou pelos sócios de sociedades de revisores com vista ao exercício das funções previstas no artigo 48.º não prejudicam o exercício das funções em regime de dedicação exclusiva.”
Sendo que conforme prescreve o artigo 94º do mesmo Estatuto sob a epígrafe “Natureza, tipos jurídicos e regime supletivo”,
1 - As sociedades de revisores revestem a natureza de sociedades civis, dotadas de personalidade jurídica.
2 - As sociedades de revisores podem adotar os tipos jurídicos previstos no Código das Sociedades Comerciais.
3 - Na falta de disposições especiais. observar-se-á o regime jurídico estabelecido na legislação civil ou comercial, conforme o caso.”

Como resulta do probatório (alíneas I a J)) quem foi contratada para a prestação de serviço com a ULSBA foi a sociedade de Revisores Oficiais de Contas , que como resulta da norma transcrita detém autonomia e personalidade jurídica própria, distinta dos sócios. Identificada na própria Ordem na Lista das Sociedades de Revisores Oficiais de Contas com o nº … – cfr. alínea H) do probatório. Sendo que como consta da mesma declaração o ora Autor não é único sócio.
Acresce que conforme resulta do probatório (alíneas K) e N)) os rendimentos obtidos pelo ora Autor, que a CGA. entende terem sido percebidos em cumulação com a pensão de aposentação, foram-lhe pagos por via da Sociedade de que é sócio e por força do Regime de transparência fiscal (art. 6º, nº 1 do CIRC), conforme consta da respetiva Declaração de rendimentos (anexo D).
Não se podendo entender, como pretende, a Entidade Demandada que o ora Autor tenha exercido funções públicas nos termos e para efeitos do art. 78º, nº 1 e 3 do EA, na versão então aplicável, uma vez que quem celebrou contrato com a entidade pública foi a Sociedade de revisores de contas, que detém personalidade jurídica própria e distinta do ora Autor, conforme supra explanado, e a quem é paga a devida retribuição pela prestação de serviços contratada.
Relativamente ao direito à segurança social a que alude o Autor, invocando o art. 63º, nº 1 da CRP, desde já, se refere que não está em causa qualquer restrição de acesso ao regime previdencial, tanto mais que o Autor aufere uma pensão de aposentação paga pela ED. O que acontece é que o princípio da não cumulação de pensões de aposentação com remunerações pelo exercício de funções públicas, já vem sendo considerado pelo legislador há muito tempo, desde a versão originária do Estatuto da Aposentação, somente admissível a titulo excecional inicialmente, tendo vindo posteriormente a sofrer uma maior restrição face à evolução quer das “novas realidades”, designadamente da diversidade de entidades públicas ou detidas por capitais públicos, em simultâneo com os princípios da justiça intergeracional e o princípio da sustentabilidade (cfr. v.g. Acórdão 396/2011 do Plenário do Tribunal Constitucional, no processo 72/11, que analisa a constitucionalidade de determinadas normas do OE para 2011).
Pelo que nesta parte não assiste razão ao Autor.
Em suma procedendo o vício de erro sobre os pressupostos de direito dos artigos 78º e 79º do EA (na versão do DL 137/2010), o que conduz à anulação do acto impugnado (cfr. art. 135º do CPA) e correlativamente ao pagamento ao Autor das pensões de aposentação que tenham deixado de ser pagas em execução da decisão da ED que determinou a suspensão do pagamento da pensão em causa nos presentes autos, que corresponde à reconstituição da situação atual hipotética que impende sobre a ED em execução da decisão anulatória (cfr. art. 173º, nº 1 do CPTA).»
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2. Da tese da recorrente
Pugna a recorrente CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES pela revogação da sentença recorrida. Sustenta, em suma, que o recorrido, apesar de ter sido aposentado pela CGA em 22-09-2004, com base no DL. n.º 116/1985, de 19 de abril, exerceu funções públicas na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE, configurando o exercício de tais funções uma situação de acumulação prevista no artigo 78º do Estatuto da Aposentação (na redação dada pelo 137/2010, de 28 de dezembro) e do artigo 8º nº 3 do DL. n.º 137/2010, de 28 de Dezembro; que a publicação do DL. n.º 137/2010, de 28 de Dezembro, não obstante ter por finalidade adotar um conjunto de medidas de consolidação orçamental às previstas no PEC para 2010-2013, não deixou de espreitar uma oportunidade para clarificar o regime de incompatibilidades previsto no artigo 78.º do Estatuto da Aposentação, precisando exaustivamente as entidades, inclusivamente por alargamento do âmbito de aplicação (aos domínios não só da administração central, regional e local, para que não restem dúvidas), que inibem o exercício de funções por aposentados (n.º 1), por um lado, por outro, definindo o conceito de exercício de funções até ao título de precariedade mais ínfimo dos vínculos laborais conhecidos no mundo da atividade laboral (n.º 3); que entretanto, com a publicação da Lei n.º 11/2014, de 6 de Março, e mais recentemente com a Lei n.º 75-A/2014, de 28 de setembro (1ª e 2ª alteração à Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2014) os aposentados ou reformados, salvo as exceções ressalvadas naqueles diplomas, caso pretendam exercer funções públicas, perdem a prerrogativa de opção entre a pensão que vinham percebendo e a remuneração correspondente ao desempenho da função pública ficando, apenas, com direito ao montante fixado para esta última e com a primeira suspensa enquanto durar o exercício das funções públicas enquanto aposentados, encontrando-se clarificado na redação dada ao artigo 78.º do Estatuto da Aposentação, pela Lei n.º 75-A/2014, de 28 de setembro, que, o conceito de atividade profissional remunerada abrange todo o tipo de funções e serviços, independentemente da sua duração ou regularidade e da forma de contrapartida, pecuniária ou em espécie, direta ou indireta, da atividade desenvolvida nomeadamente todas as prestações que, total ou parcialmente, constituem base de incidência contributiva nos termos do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social, em termos que, nestas novas versões do regime das incompatibilidades mantém-se a regra geral de que os aposentados, reformados, reservistas fora da afetividade e equiparados, não podem exercer atividades públicas para quaisquer serviços da administração central, regional ou autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas, exceto quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração pública, sejam atividades e serviços remunerados ou não e tendo como consequência a suspensão obrigatória da pensão ou remuneração de reserva ou equiparada; que este novo regime de suspensão obrigatória da pensão previsto no artigo 79.º do Estatuto da Aposentação na redação dada pela Lei n.º 11/2014, de 6 de março, para pensionistas da CGA (e também para pensionistas da regime geral e de outras entidades públicas) aplica-se às situações de exercício de funções constituídas ou renovadas a partir de 2014-03-07, como é o caso do recorrido; que quanto à questão do exercício das funções públicas, não de forma direta por aposentados mas por empresas para as quais aqueles foram contratados ou façam parte do seu capital social, tal contende com o artigo 78.º do EA, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 179/2005, de 2 de Novembro, e com as restantes alterações legislativas que aquele artigo foi tendo ao longo do tempo, uma vez que do citado preceito decorre que os aposentados não podem exercer funções públicas ou prestar trabalho remunerado, ainda que através de terceiras entidades, em quaisquer serviços do Estado, pessoas coletivas ou empresas públicas, sendo, irrelevante a modalidade ou forma jurídica subjacente ao exercício de funções ou prestação de trabalho após a aposentação (tarefa, avença, ou outra modalidade de prestação de serviços, contrato de trabalho a termo certo ou incerto ou outro); que além disso a contratação por entidades públicas de aposentados da CGA através de sociedades configura uma fraude à lei, que justifica a desconsideração da personalidade jurídica destas; que o Estatuto da Aposentação não confere relevância a quem consta do contrato como parte mas a quem exerce efetivamente as funções (o aposentado) e a se estas são ou não remuneradas (independentemente do circuito que canalize os honorários para o património do pensionista) e que assim, a pretensão do recorrido, na interpretação por si apresentada, não merece qualquer relevo, uma vez que os atos materiais de execução da norma em análise, por terem observado todos os pressupostos legais não enfermam de qualquer vício de violação de lei, resultando ter a CGA somente cumprido a Lei ao promover a suspensão do pagamento da pensão como previsto nos Decreto-Lei n.º 137/2010, de 28 de Dezembro e na Lei n.º 11/2014, de 6 de Março, não violando qualquer norma ou princípio legal, devendo o ato impugnado pelo recorrido manter-se.
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3. Da análise e apreciação do recurso
3.1 Importa começar por precisar que a sentença recorrida enfrentou o pedido impugnatório formulado pelo autor, por referência ao disposto no artigo 78º do Estatuto da Aposentação, na versão dada pelo DL. nº 137/2010, de 28 de Dezembro, que considerou ser o aplicável à data dos factos, por ser o regime em vigor, e no qual, aliás, a entidade demandada se suportou para determinar a suspensão do pagamento da pensão ao autor. Entendimento que, não obstante a referência feita pela recorrente a diplomas posteriores, não é posto em causa no recurso.
Sendo certo que, o que importa aferir, na situação dos autos, é se a decisão de suspender o pagamento da pensão fez correta ou incorreta interpretação e aplicação da lei à data em vigor. Foi, aliás, assim que foi balizado pela Tribunal a quo o objeto da ação. E bem.
3.2 A posição da recorrente CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES é a de que a atividade de revisor oficial da UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DO BAIXO ALENTEJO, EPE, que o autor vem exercendo como representante da Sociedade de Revisores Oficiais de contas (SROC) denominada S………, C…… e Associados, SROC, de que é sócio, configura o exercício de funções públicas para aquela entidade, em termos que, estando o autor aposentado desde 22-09-2004 (com base no DL. n.º 116/1985, de 19 de abril), configura uma situação de acumulação prevista no artigo 78.º do Estatuto da Aposentação, se lhe impunha o dever de optar entre a suspensão do pagamento da pensão ou a suspensão da remuneração, nos termos do artigo 79.º do Estatuto da Aposentação na redação dada pelo DL. nº 137/2010, de 28 de dezembro.
3.2 Os artigos 78º e 79º do Estatuto da Aposentação, na versão do DL. nº 137/2010, de 28 de Dezembro dispunham o seguinte:
“Artigo 78º
Incompatibilidades
1. Os aposentados não podem exercer funções públicas remuneradas para quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o sector empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas, exceto quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública.
2. Não podem exercer funções públicas nos termos do número anterior:
a) Os aposentados que se tenham aposentado com fundamento em incapacidade;
b) Os aposentados por força de aplicação da pena disciplinar de aposentação compulsiva.
3. Consideram-se abrangidos pelo conceito de exercício de funções:
a) Todos os tipos de atividade e de serviços, independentemente da sua duração, regularidade e forma de remuneração;
b) Todas as modalidades de contratos, independentemente da respetiva natureza, pública ou privada, laboral ou de aquisição de serviços.”

Artigo 79º
Cumulação de pensão e remuneração
1 - Os aposentados, bem como os referidos no n.º 6 do artigo anterior, autorizados a exercer funções públicas não podem cumular o recebimento da pensão com qualquer remuneração correspondente àquelas funções.
2 - Durante o exercício daquelas funções é suspenso o pagamento da pensão ou da remuneração, consoante a opção do aposentado.
3 - Caso seja escolhida a suspensão da pensão, o pagamento da mesma é retomado, sendo esta atualizada nos termos gerais, findo o período da suspensão.
4 - O início e o termo do exercício de funções públicas são obrigatoriamente comunicados à Caixa Geral de Aposentações, I. P. (CGA, I. P.), pelos serviços, entidades ou empresas a que se refere o n.º 1 do artigo 78.º no prazo máximo de 10 dias a contar dos mesmos, para que a CGA., I. P., possa suspender a pensão ou reiniciar o seu pagamento.
5 - O incumprimento pontual do dever de comunicação estabelecido no número anterior constitui o dirigente máximo do serviço, entidade ou empresa, pessoal e solidariamente responsável, juntamente com o aposentado, pelo reembolso à CGA, I. P., das importâncias que esta venha a abonar indevidamente em consequência daquela omissão.”

3.3 Sobre a interpretação destes normativos do Estatuto da Aposentação, na redação dada pelo DL n.º 137/2010, de 28 de dezembro, já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo em sede de recurso excecional de revista, em dois recentes acórdãos de 13/12/2017, Proc. nº 01456/16 e de 18701/2018, Proc. nº 0353/17, disponíveis in, www.dgsi.pt/jsta.
Tendo, designadamente, o quadro normativo em causa, sido contextualizado do seguinte modo no Acórdão de 13/12/2017, Proc. nº 01456/16, que se passa a citar:
«(…)
XII. Assim, e no que para aqui releva, extrai-se dos arts. 73.º e 74.º, n.º 1, do «EA» que com a passagem do interessado à aposentação o mesmo, enquanto aposentado, passa a ser titular do direito a uma pensão, continuando, todavia, “vinculado à função pública, conservando os títulos e a categoria do cargo que exercia e os direitos e deveres que não dependam da situação de atividade”.

XIII. Temos, por sua vez, que o «EA» previu sempre, desde a sua versão primitiva, no seu art. 78.º um regime denominado de “incompatibilidades”, regime esse cujos termos e redação foi sendo, contudo, sucessivamente objeto de várias modificações até 2010 [vide, no caso, as alterações produzidas ao normativo pelo DL n.º 215/87, de 19.05, pelo DL n.º 179/2005, de 02.11, e pelo DL n.º 137/2010, de 28.12 - redação que se mostra em crise nos autos], e, inclusive, depois [cfr. a Lei n.º 11/2014, de 06.03, e a Lei n.º 75-A/2014, de 30.09], para além do próprio regime do art. 78.º do «EA», bem como do artigo seguinte, ter sido estendido aos beneficiários de pensões de reforma pagas pela Segurança Social ou por outras entidades gestoras de fundos de pensões ou planos de pensões [cfr. a Lei n.º 55-A/2010, de 31.12, a Lei n.º 11/2014, de 06.03, a Lei n.º 83-C/2013, de 31.12], e de também o referido DL n.º 137/2010 ter sido objeto de alteração [cfr. a Lei n.º 60-A/2011, de 30.11] e de interpretação [cfr. o DL n.º 68/2011, de 14.06].


XIV. Inicialmente, previa-se um impedimento aos aposentados de exercerem funções remuneradas ao serviço, mormente, do Estado, dos institutos públicos [incluindo os “organismos de coordenação económica”], das autarquias locais e das empresas públicas, excecionando-se apenas as funções prestadas em regime de prestação de serviços nas condições previstas na al. a) do n.º 2 do art. 01.º do «EA» e as demais permitidas por lei “quer diretamente quer mediante autorização do Conselho de Ministros” [cfr. n.º 1], constituindo uma proibição legal que fazia incorrer o interessado e demais responsáveis na obrigação de reposição dos valores pagos, bem como em responsabilidade disciplinar [cfr. n.º 2].


XV. Através da alteração operada em 1987 pelo DL n.º 215/87 desapareceu o estabelecimento da sanção que se mostrava prevista no n.º 2 do art. 78.º, disciplinando-se igualmente que, nomeadamente, os aposentados não poderiam exercer funções públicas ou prestarem trabalho remunerado nas empresas públicas, ou seja, não poderiam voltar a trabalhar para o Estado e demais entes públicos e deles receberem remuneração segundo o regime igual ou semelhante àquele por que se haviam aposentado, visando-se, assim, evitar que um mesmo beneficiário pudesse auferir do Estado, em duplicado, rendimentos provenientes do exercício de funções públicas exercidas no quadro de vinculação hierárquica e de disciplina.


XVI. Comportava tal regime regra de incompatibilidade, todavia, as exceções que se mostravam elencadas nas als. a) a c) do art. 78.º e que permitiam o exercício por aposentados de funções públicas em acumulação, figurando entre tais exceções as que o legislador haja previsto ou permitido noutros normativos [al. b)] e, bem assim, as que hajam sido autorizadas pelo Primeiro-Ministro, sob proposta do membro do Governo que detenha poder hierárquico ou tutelar sobre a entidade onde o aposentado vai exercer funções [al. c)].


XVII. Mas ainda as que consistam na prestação de serviço por parte do aposentado a qualquer entidade pública, atividade essa [intelectual ou manual] feita num quadro de total autonomia e visando proporcionar aquela entidade o efeito ou resultado pela mesma pretendido com a aquisição ou o fornecimento do serviço mediante a contrapartida da retribuição, e sem que haja um exercício de funções pelo aposentado num quadro de dependência, de controle, de orientação, de direção e de disciplina relativamente à entidade pública [al. a)].


XVIII. Em todas as situações de acumulação do exercício de funções públicas ou prestação de trabalho remunerado por aposentados estes continuavam, nos termos do art. 79.º do «EA», a receber mensalmente e na sua integralidade a pensão de aposentação, sendo-lhes ainda abonado, por tal acumulação, uma terça parte daquilo que era a remuneração que cabia às funções concretamente exercidas pelos mesmos, salvo se o Primeiro-Ministro, sob proposta do membro do Governo que tivesse o poder hierárquico ou de tutela sobre a entidade onde o aposentado prestasse o seu trabalho, autorizasse um montante superior, que, todavia, nunca poderia ultrapassar aquilo que era o limite remuneratório legal previsto para tal função.

XIX. Com o DL n.º 179/2005 veio a proceder-se a uma nova alteração ao regime em matéria de incompatibilidades inserto nos arts. 78.º e 79.º do «EA», extraindo-se do respetivo preâmbulo, nomeadamente, por um lado, que “[o] exercício de funções públicas por aposentados ao abrigo do Estatuto da Aposentação justifica-se exclusivamente por razões de interesse público” e que o regime até aí vigente envolvia “uma significativa discricionariedade quer no que se refere à decisão em si mesma quer na definição do valor do abono devido por tal exercício” e, por outro lado, que a situação das contas públicas implicava “a adoção de critérios mais rigorosos em todas as áreas potencialmente geradoras de despesa pública” e de que a existência condigna dos aposentados era “garantida pela atribuição das respetivas pensões”, pelo que quando lhes era “excecionalmente autorizado o exercício de funções públicas” de tal situação não deveria “decorrer a possibilidade de cumulações remuneratórias suscetíveis de pôr em causa elementares princípios de equidade”.

XX. Na concretização das linhas orientadoras explanadas no preâmbulo passou, por um lado, a disciplinar-se no art. 78.º do Estatuto que os aposentados não podiam “exercer funções públicas ou prestar trabalho remunerado, ainda que em regime de contrato de tarefa ou de avença, em quaisquer serviços do Estado, pessoas coletivas públicas ou empresas públicas”, salvo quando houvesse lei que o permitisse ou, então, quando o Primeiro-Ministro expressamente o decidisse “por razões de interesse público excecional” [n.º 1] mediante despacho no qual o “interesse público excecional” carecia de ser “devidamente fundamentado, com suficiente grau de concretização, na justificada conveniência em assegurar por essa via as funções que se encontram em causa” [n.º 2], sendo que tal decisão tinha de ser precedida de proposta do membro do Governo com poder de direção, de superintendência, de tutela ou de outra forma de orientação estratégica sobre o serviço, entidade ou empresa onde as funções deveriam ser exercidas ou o trabalho deveria ser prestado [n.º 3], a mesma produzia “efeitos por um ano” salvo se fosse fixado “um prazo superior, em razão da natureza das funções ou do trabalho autorizados” [n.º 5 - ver ainda quanto às autorizações anteriores e existentes à data da vigência do diploma a disciplina inserta no art. 02.º do mesmo DL em termos de reapreciação/renovação] e não poderia ser tomada em relação a quem se encontrasse “na situação prevista no n.º 1 em razão da utilização de mecanismos legais de antecipação de aposentação” ou tivesse sido “aposentado compulsivamente” [n.º 4].


XXI. E, por outro lado, em sede de cumulação de remunerações passou a disciplinar-se no art. 79.º que “[q]uando aos aposentados e reservistas, ou equiparados, seja permitido, nos termos do artigo anterior, exercer funções públicas ou prestar trabalho remunerado, é-lhes mantida a respetiva pensão ou remuneração na reserva, sendo-lhes, nesse caso, abonada uma terça parte da remuneração base que competir àquelas funções ou trabalho, ou, quando lhes seja mais favorável, mantida esta remuneração, acrescida de uma terça parte da pensão ou remuneração na reserva que lhes seja devida” [n.º 1], sendo que as "condições de cumulação referidas no número anterior são fixadas pela decisão prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo anterior” [n.º 2].


XXII. Temos, assim, que com o DL n.º 179/2005, e até à data do início de vigência do DL n.º 137/2010, procedeu-se à eliminação do elenco das exceções ao regime regra de incompatibilidade a prestação de serviço por parte do aposentado, já que apenas figuram como situações ressalvadas a existência de lei que o permita ou, então, a existência de despacho autorizativo do Primeiro-Ministro, sendo que tal incompatibilidade quanto ao exercício de funções públicas ou de prestação de trabalho remunerado em quaisquer serviços do Estado, pessoas coletivas públicas ou empresas públicas foi estendido, também, ao exercício em regime de contrato de tarefa ou de avença nos mesmos entes, para além de que nas situações em que aos aposentados era possível o exercício de funções públicas ou a prestação de trabalho/serviço remunerado era-lhes permitido, em matéria de cumulação de remunerações, ou manter a respetiva pensão a que se adicionava o abono de uma terça parte da remuneração base que competisse àquelas funções ou trabalho, ou, quando lhes fosse mais favorável, manter esta remuneração, acrescida de uma terça parte da pensão.


XXIII. Com o DL n.º 137/2010 [publicado em 28 de dezembro], veio a introduzir-se uma nova alteração ao regime de incompatibilidades constante dos arts. 78.º e 79.º do «EA», o qual passou a vigorar no dia seguinte ao da publicação do diploma [cfr. n.º 1 do art. 10.º daquele DL], podendo ler-se no respetivo preâmbulo, nomeadamente e no que aqui ora releva, que “[n]o quadro de uma política comum adotada na zona euro com vista a devolver a confiança aos mercados financeiros e aos seus agentes e fazer face ao ataque especulativo à moeda única, o Governo Português reafirma o total empenhamento em atingir os compromissos assumidos em matéria de redução do défice orçamental em 2010 e 2011”, pelo que “[p]ara o efeito, o Governo decidiu adotar um conjunto de medidas de consolidação orçamental adicionais às previstas no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) para 2010-2013 e às que venham a constar da lei do Orçamento do Estado para 2011 cujos efeitos se pretende que se iniciem ainda no decurso de 2010”, representando tais medidas “um esforço adicional no sentido de assegurar o equilíbrio das contas públicas de modo a garantir o regular financiamento da economia e a sustentabilidade das políticas sociais”, termos em que “as medidas adotadas concentram-se principalmente na redução da despesa de modo a reforçar e a acelerar a estratégia de consolidação orçamental prevista no PEC 2010-2013” e, assim, através deste diploma “elimina-se a possibilidade de acumulação de vencimentos públicos com pensões do sistema público de aposentação”.


XXIV. Daí que, de harmonia com o previsto no n.º 1 do art. 06.º do DL em referência, passou a estipular-se no art. 78.º do «EA» que os aposentados “não podem exercer funções públicas remuneradas para quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas, exceto quando haja lei especial que o permita ou quando, por razões de interesse público excecional, sejam autorizados pelos membros do governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública” [n.º 1], que “[n]ão podem exercer funções públicas nos termos do número anterior: a) Os aposentados que se tenham aposentado com fundamento em incapacidade; b) Os aposentados por força de aplicação da pena disciplinar de aposentação compulsiva” [n.º 2], sendo que “[c]onsideram-se abrangidos pelo conceito de exercício de funções: a) Todos os tipos de atividade e de serviços, independentemente da sua duração, regularidade e forma de remuneração; b) Todas as modalidades de contratos, independentemente da respetiva natureza, pública ou privada, laboral ou de aquisição de serviços” [n.º 3] e que a “decisão de autorização do exercício de funções é precedida de proposta do membro do Governo que tenha o poder de direção, de superintendência, de tutela ou influência dominante sobre o serviço, entidade ou empresa onde as funções devam ser exercidas, e produz efeitos por um ano, exceto se fixar um prazo superior, em razão da natureza das funções” [n.º 4].


XXV. E no art. 79.º, com a epígrafe de “cumulação de pensão e remuneração”, passou a preceituar-se que “[o]s aposentados (…), autorizados a exercer funções públicas não podem cumular o recebimento da pensão com qualquer remuneração correspondente àquelas funções” [n.º 1], que “[d]urante o exercício daquelas funções é suspenso o pagamento da pensão ou da remuneração, consoante a opção do aposentado” [n.º 2], sendo que “[c]aso seja escolhida a suspensão da pensão, o pagamento da mesma é retomado, sendo esta atualizada nos termos gerais, findo o período da suspensão” [n.º 3] e que “[o] início e o termo do exercício de funções públicas são obrigatoriamente comunicados à Caixa Geral de Aposentações, I.P. (CGA, I.P.), pelos serviços, entidades ou empresas a que se refere o n.º 1 do artigo 78.º no prazo máximo de 10 dias a contar dos mesmos, para que a CGA, I.P., possa suspender a pensão ou reiniciar o seu pagamento” [n.º 4], para além de que “[o] incumprimento pontual do dever de comunicação estabelecido no número anterior constitui o dirigente máximo do serviço, entidade ou empresa, pessoal e solidariamente responsável, juntamente com o aposentado, pelo reembolso à CGA, I.P., das importâncias que esta venha a abonar indevidamente em consequência daquela omissão” [n.º 5].


XXVI. De notar que, nos termos do n.º 2 do art. 06.º do mesmo DL, “[o] disposto nos artigos 78.º e 79.º do Decreto-Lei n.º 498/72 (…) tem natureza imperativa, prevalecendo sobre quaisquer outras normas, gerais ou excecionais, em contrário, sem prejuízo do disposto no número seguinte” e que “[é] ressalvado do disposto no número anterior o regime constante do Decreto-Lei n.º 89/2010, de 21 de julho - [diploma no qual estava contido o regime excecional a que obedecia o exercício de funções públicas ou a prestação de trabalho remunerado por médicos aposentados em serviços e estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde, independentemente da sua natureza jurídica] -, durante o período da sua vigência, que permite aos sujeitos por ele abrangidos cumular a pensão com uma terça parte da remuneração base que competir às funções exercidas ou, quando lhes seja mais favorável, cumular a remuneração base que competir a tais funções acrescida de uma terça parte da pensão que lhes seja devida” [n.º 3 do mesmo preceito].


XXVII. Importando, ainda, ter em atenção o disciplinado no diploma em matéria de “aplicação da lei no tempo” no seu art. 08.º onde se estipulou que o regime introduzido pelo art. 06.º aplicava-se, por um lado, “aos pedidos de autorização de exercícios de funções públicas por aposentados que sejam apresentados a partir da entrada em vigor do presente decreto-lei” [n.º 1] e, por outro lado, “a partir de 1 de janeiro de 2011 aos aposentados ou beneficiários de pensões em exercício de funções que tenham sido autorizados para o efeito ou que já exerçam funções antes da entrada em vigor do presente decreto-lei” [n.º 2], pelo que “[n]o prazo de 10 dias contados da data referida no número anterior, os aposentados aí referidos comunicam às entidades empregadoras públicas ou à Caixa Geral de Aposentações, I.P. (CGA, I.P.), consoante o caso, se optam pela suspensão do pagamento da remuneração ou da pensão” [n.º 3], sendo que “[c]aso a opção de suspensão de pagamento recaía sobre a remuneração, deve a entidade empregadora pública a quem tenha sido comunicada a opção informar a C.A., I.P., dessa suspensão” [n.º 4] e que “[q]uando se verifiquem situações de cumulação e sem que tenha sido manifestada a opção a que se refere o n.º 3, deve a CGA, I.P., suspender o pagamento do correspondente valor da pensão” [n.º 5].


XXVIII. E, também, no que veio a preceituar-se no art. 173.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31.12 [diploma que veio aprovar o Orçamento do Estado para o ano de 2011], em que sob a epígrafe de “extensão do regime de cumulação de funções”, se determinou que “[o] regime de cumulação de funções públicas remuneradas previsto nos artigos 78.º e 79.º do Estatuto da Aposentação (…) é aplicável aos beneficiários de pensões de reforma da segurança social e de pensões pagas por entidades gestoras de fundos de pensões ou planos de pensões de entidades públicas, designadamente de institutos públicos e de entidades pertencentes aos setores empresariais do Estado, regional e local, a quem venha a ser autorizada ou renovada situação de cumulação”, e, bem assim, ao estabelecido pelo n.º 2 do art. 10.º da Lei n.º 60-A/2011, de 30.11, onde se estipulou que “[a] alteração ao Decreto-Lei n.º 137/2010, de 28 de dezembro, prevista no artigo 8.º, reporta os seus efeitos a 1 de setembro de 2011”.

XXIX. Para além disso através do DL n.º 68/2011, de 14.06, em cujo preâmbulo consta, nomeadamente, que tendo este último diploma fixado uma “nova redação para os seus artigos 78.º e 79.º, relativos, respetivamente, a «incompatibilidades» e a «cumulação de remunerações», com vista a eliminar a possibilidade de acumulação de vencimentos públicos com pensões do sistema público de aposentação” e em que a amplitude da “medida ficou, desde logo, consagrada no n.º 2 do seu artigo 6.º, conferindo ao regime natureza imperativa, que prevalece sobre quaisquer outras normas, gerais ou excecionais, em contrário”, veio a afirmar-se no seu artigo único, sob a epígrafe de “norma interpretativa do Decreto-Lei n.º 137/2010 …”, que “[a]s limitações ao exercício de funções públicas e à cumulação de pensão e remuneração impostas pelo artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 137/2010 (…) não se aplicam aos deficientes militares abrangidos pelos regimes especiais constantes dos Decretos-Leis n.ºs 43/76, de 20 de janeiro, 314/90, de 13 de outubro, e 240/98, de 7 de agosto”.


XXX. Temos, assim, que com as alterações produzidas pelo DL n.º 137/2010 no «EA», em concreto, nos normativos em referência, as quais gozam de natureza imperativa e prevalecem sobre quaisquer outras normas em contrário [sejam elas gerais ou excecionais], e da extensão de tal regime operada pela referida Lei n.º 55-A/2010, os aposentados e os reformados, salvo lei especial que o permita [v.g., quanto aos médicos (através do regime inserto no DL n.º 89/2010), e quanto aos deficientes das Forças Armadas abrangidos pelos DL’s n.ºs 43/76, 314/90 e 240/98 (cfr. DL n.º 68/2011), tendo ainda sido introduzidas ou aditadas posteriormente outras exceções (cfr. arts. 04.º e 05.º da Lei n.º 11/2014, de 06.03)] ou decisão autorizativa da autoria de membro do Governo responsável pelas áreas das finanças e da Administração Pública fundada em razões de “interesse público excecional”, não podem exercer “funções públicas remuneradas” para quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas, considerando-se abrangidos pelo conceito de “exercício funções” remuneradas, aludido no n.º 1 do art. 78.º do «EA», todos os tipos de atividade e de serviços, independentemente da sua duração, regularidade e forma de remuneração, bem como todas as modalidades de contratos, independentemente da respetiva natureza, pública ou privada, laboral ou de aquisição de serviços [cfr. n.º 3 do mesmo artigo].


XXXI. E nas situações em que os aposentados/reformados estejam autorizados a exercer tais funções os mesmos, ao invés do que era o regime até aí vigente, passaram, por força do previsto no art. 79.º do «EA», a não poder cumular o recebimento da pensão com qualquer remuneração correspondente àquelas funções, já que durante o exercício destas ficava suspenso, consoante a opção do aposentado/reformado, o pagamento da pensão ou da remuneração, reintroduzindo-se, ainda, a responsabilidade do dirigente máximo do serviço, entidade ou empresa, em termos pessoais e solidários com o aposentado, relativamente ao dever de reembolso à «CGA, IP» das importâncias que esta venha a abonar indevidamente em consequência da omissão do dever de comunicação estabelecido no n.º 4 do referido preceito.

(…)”

E ali se fez, ainda, alusão ao seguinte:
“ (…)
XXXIV. Refira-se, desde logo, que a alusão naquele preceito a exercício de “funções públicas” não constitui ou se mostra como um sinónimo de função pública, não se reconduzindo o seu âmbito tão-só àquilo que concetualmente se define, comummente, ou como função pública em sentido estrito, enquanto designando o conjunto de trabalhadores da Administração Pública cujas relações de emprego, de natureza estatutária, se mostram regidas por um regime específico de Direito administrativo, ou ainda a um sentido mais amplo de função pública, abarcando todas as relações/vínculos de emprego estabelecidas entre uma pessoa física com uma pessoa coletiva pública e cuja disciplina jurídica, podendo ser “jus-laboralísticas” ou “jus-administrativistas”, tenha, todavia, na base e enquanto denominador comum, um regime “jus-publicista”.

XXXV. O uso no plural da locução “função pública” aponta, desde logo, no sentido de que ali se visou abarcar não apenas o sentido mais amplo de função pública atrás acabado de referir, ou seja, todo o tipo de exercício de funções no quadro de relações/vínculos de emprego estabelecidos com um empregador público, mas um sentido ainda mais amplo, abrangendo também o exercício de cargos públicos, mormente, daqueles que, fora de subordinação jurídica, exercem cargos diretivos ou são titulares de órgãos administrativos.


XXXVI. Mas, por outro lado, por força do previsto no n.º 3 do art. 78.º do «EA» e da enorme amplitude pelo mesmo aportada, mostram-se, ainda, incluídos no conceito de exercício de funções relevantes nesta sede, fazendo operar as incompatibilidades que impendem sobre aposentados e reformados, todos os tipos de atividade e de serviços [independentemente da sua duração, regularidade e forma de remuneração], bem como todas as modalidades de contratos [independentemente da respetiva natureza - pública ou privada, laboral ou de aquisição de serviços] com quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas.


XXXVII. Não só os contratos de prestação de serviços, nas modalidades, mormente, de contratos de tarefa e de avença, não figuram entre o tipo de vínculos contratuais considerados excluídos do regime das incompatibilidades, como o legislador alargou, enormemente, o leque dos tipos de vínculos geradores de incompatibilidades para aposentados e reformados em termos de exercício de funções remuneradas para entidades ou pessoas coletivas públicas já que, independentemente da duração, regularidade e forma de remuneração, nelas passam a estar incluídos todos os tipos de atividade e de serviços, assim como todas as modalidades de contratos, independentemente da respetiva natureza, seja ela pública ou privada, seja ela laboral ou de aquisição de serviços.


XXXVIII. De notar que, no ativo, os trabalhadores em funções públicas estavam, à data, e estão, ainda hoje, sujeitos uma regra de incompatibilidade com o exercício de outras funções [cfr. art. 26.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27.02 - atualmente art. 20.º da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas («LTFP»), aprovada e publicada como anexo à Lei n.º 35/2014, de 20.06], já que “[a]s funções públicas são, em regra, exercidas em regime de exclusividade”, sendo que, à data, o exercício de funções em acumulação com outras funções públicas [cfr. art. 27.º da Lei n.º 12-A/2008] só poderia ocorrer se estas não fossem “remuneradas e haja na acumulação manifesto interesse público” ou quando, sendo remuneradas e existisse manifesto interesse público na acumulação, o exercício de funções em acumulação respeitasse a inerências, a atividades de representação de órgãos ou serviços ou de ministérios, ou se reportasse à participação em comissões ou grupos de trabalho, em conselhos consultivos e em comissões de fiscalização ou outros órgãos colegiais [neste caso para fiscalização ou controlo de dinheiros públicos], ou, então, em atividades de carácter ocasional e temporário que possam ser consideradas complemento da função, ou em atividades docentes ou de investigação [de duração não superior à fixada em despacho dos membros do Governo responsáveis pelas finanças, Administração Pública e educação ou ensino superior e que, sem prejuízo do cumprimento da duração semanal do trabalho, não se sobrepusesse em mais de um terço ao horário inerente à função principal], ou, ainda, na realização de conferências, palestras, ações de formação de curta duração e outras atividades de idêntica natureza.


XXXIX. E quanto à acumulação com funções privadas [cfr. art. 28.º da Lei n.º *12-A/2008] a regra era, também, a de que o exercício de funções públicas não poderia ser acumulado com o de funções ou atividades privadas, admitindo-se que a título remunerado ou não, em regime de trabalho autónomo ou subordinado, poderiam ser acumuladas, pelo trabalhador ou por interposta pessoa, funções ou atividades privadas desde que as mesmas não fossem concorrentes ou similares com as funções públicas desempenhadas e que com estas fossem conflituantes [cfr. n.º 2 do preceito e concretização do n.º 3], e que as mesmas não fossem legalmente consideradas como incompatíveis com as funções públicas, ou desenvolvidas em horário sobreposto, ainda que parcialmente, ao das funções públicas, ou que não comprometessem a isenção e a imparcialidade exigidas pelo desempenho das funções públicas, nem provocassem algum prejuízo para o interesse público ou para os direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos [cfr. n.º 4 do mesmo preceito].

XL. De notar, ainda, que, nos termos do art. 29.º daquele diploma, a acumulação de funções [públicas ou privadas] estava também ela dependente de autorização conferida pela entidade dotada de competência para o efeito.

(…)”

3.4 Na situação presente é seguro que o autor está aposentado pela CGA desde 22/09/2004, e que vinha recebendo a respetiva pensão de aposentação. Assim, como se encontra assente que a sociedade de Revisores Oficiais de Contas denominada «S……, C…… e Associados, SROC», de que o autor é sócio, foi nomeada como fiscal único efetivo da UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DO BAIXO ALENTEJO, EPE, sendo esta representada pelo autor, como revisor oficial de contas, tendo sido celebrados os respetivos contratos de prestação de serviços entre a identificada EPE e a referida sociedade de revisores oficiais de contas, com fixação da remuneração devida, sociedade que recebia os pagamentos correspondentes pelos quais emitia as respetivas faturas. Tendo os rendimentos obtidos pelo autor, pagos por via da referida Sociedade de Revisores Oficiais de Contas, de que é sócio, sido submetidos ao Regime de transparência fiscal (cfr. art. 6º, nº 1 do CIRC), nos termos demonstrados pela respetiva declaração de rendimentos (anexo D).
3.5 Perante estas circunstâncias, a contenda reside na questão de saber se uma vez que a identificada EPE contratou o serviço de Revisor Oficial de Contas com a referida sociedade de revisores oficiais de contas S……, C… e Associados, SROC, que recebe a pagamento correspetivo devido pelos serviços, relativamente aos quais emite as correspondentes faturas, deve entender-se que sendo esta dotada de personalidade jurídica própria, distinta do autor, não se pode entender que seja ele mesmo quem vinha exercendo funções públicas remuneradas para a identificada EPE, nos termos previsto no artigo 78º do Estatuto da Aposentação com a consequente suspensão da pensão de aposentação prevista no artigo 79º do mesmo diploma, como foi entendido pela sentença recorrida.
3.6 Para a resolver importa, por isso, atentar na natureza das funções exercidas, de revisor oficial de contas, por referência ao quadro organizativo-funcional da UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DO BAIXO ALENTEJO, EPE.
3.7 A UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DO BAIXO ALENTEJO, EPE foi criada pelo DL. nº 183/2008, de 4 de setembro, que igualmente aprovou os respetivos Estatutos, sendo uma pessoa coletiva de direito público de natureza empresarial, dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimoniais, regendo-se pelo regime jurídico aplicável às entidades públicas empresariais, com as especificidades previstas no diploma instituir e nos seus Estatutos (cfr. artigos 1º e 4º do DL. nº 183/2008 e artigo 1º dos Estatutos).
3.8 São seus órgãos sociais estatutários (a) o «Conselho de Administração»; (b) o «Fiscal Único» e (c) o «Conselho Consultivo» (cfr. artigo 5º dos Estatutos). Orgânica que também havia sido seguida para os Hospitais e Centros Hospitalares EPE´S criados pelo DL. nº 233/2005, de 29 de dezembro.
3.9 Dispõem os artigos 15º e 16º dos Estatutos do UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DO BAIXO ALENTEJO, EPE (anexos ao DL. nº 183/2008) o seguinte a respeito do «Fiscal Único»:
“Artigo 15.º
Fiscal único
1 — O fiscal único é o órgão responsável pelo controlo da legalidade, da regularidade e da boa gestão financeira e patrimonial da ULS.
2 — O fiscal único é nomeado por despacho do Ministro das Finanças obrigatoriamente de entre revisores oficiais de contas ou sociedades de revisores oficiais de contas, por um período de três anos, apenas renovável uma vez.
3 — O fiscal único tem sempre um suplente, que é igualmente revisor oficial de contas ou sociedade de revisores oficiais de contas.
4 — Cessando o mandato, o fiscal único mantém-se em exercício de funções até à posse do respetivo substituto.
5 — A remuneração do fiscal único é fixada por despacho do Ministro das Finanças.”
“Artigo 16.º
Competências
1 — O fiscal único tem as competências, os poderes e os deveres estabelecidos na lei e nestes estatutos.
2 — Ao fiscal único compete, especialmente:
a) Verificar a regularidade dos livros, registos contabilísticos e documentos que lhe servem de suporte;
b) Dar parecer sobre o relatório de gestão do exercício e certificar as contas;
c) Acompanhar com regularidade a gestão através de balancetes e mapas demonstrativos da execução orçamental;
d) Manter o conselho de administração informado sobre os resultados das verificações e dos exames a que proceda;
e) Propor a realização de auditorias externas, quando tal se mostre necessário ou conveniente;
f) Pronunciar-se sobre qualquer outro assunto em matéria de gestão económica e financeira que seja submetido à sua consideração pelo conselho de administração;
g) Dar parecer sobre a aquisição, arrendamento, alienação e oneração de bens imóveis;
h) Dar parecer sobre a realização de investimentos e a contração de empréstimos;
i) Elaborar relatórios da sua ação fiscalizadora, incluindo um relatório anual global;
j) Pronunciar -se sobre assuntos que lhe sejam submetidos pelo conselho de administração, pelo Tribunal de Contas e pelas entidades que integram o controlo estratégico do sistema de controlo interno da administração financeira do Estado;
l) Verificar se os critérios valorimétricos adotados pela ULS conduzem a uma correta avaliação do património e dos resultados.”

3.10 O fiscal único, constitui, assim, o órgão (singular) de fiscalização da EPE, a que alude o artigo 33º do Regime Jurídico do Sector Público Empresarial (aprovado pelo DL. nº 133/2013, de 3 de outubro), o qual que deve ser um revisor oficial de contas ou uma sociedade de revisores oficiais de contas (cfr. artigo 413º do Código das Sociedades Comerciais, ex vi do artigo 33º nº 3 do Regime Jurídico do Sector Público Empresarial).
3.11 Nos termos do Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas em vigor à data dos factos (o aprovado pelo Decreto-Lei n.º 487/99, de 16 de novembro, com as alterações introduzidas pelos DL. nº 224/2008, de 20 de novembro, e nº 185/2009, de 12 de agosto), atualmente já substituído pelo novo Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas aprovado pela Lei nº 140/2015, de 7 de setembro, as sociedades de revisores oficiais de contas revestem a natureza de sociedades civis, dotadas de personalidade jurídica.
E elas têm por objeto precisamente o desempenho das funções e competências próprias dos revisores oficiais de contas, designadamente as de revisão legal das contas, de auditoria às contas e dos serviços relacionados de empresas ou de outras entidades nos termos definidos na lei, as quais são consideradas funções de interesse público (cfr. designadamente artigos 40º, 94º e 95º). Em tal caso são as próprias sociedades de revisores oficiais de contas que são as nomeadas (contratadas) para a função (cfr. designadamente artigos 49º e 50º). Porém, como se tratam de pessoas coletivas, o Estatuto impõe, a designação de, pelo menos, “…um revisor oficiais de contas a título individual ou como sócio de sociedade de revisores, ou um revisor oficial de contas exercendo funções nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 49.º responsável pela orientação ou execução direta do seu cumprimento”, o qual assume a posição de «revisor orientador» ou «revisor executor» (cfr. artigo 57º).
3.12 Na situação presente temos que por Despacho nº 12046/2009, de 20 de Maio de 2009, publicado no Diário da República, 2ª Série, nº 97, a sociedade de Revisores Oficiais de Contas S………, C……. & Associado, SROG, foi nomeada como fiscal único da UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DO BAIXO ALENTEJO, EPE, nomeação que foi sucessivamente renovada.
Tendo aquela sociedade de revisores oficiais de contas emitido as correspondentes faturas e recebido o pagamento respetivo.
3.13 Neste contexto, e à luz do quadro normativo convocado, supra percorrido, tem de considerar-se correto a posição assumida pela sentença recorrida no sentido de “..não se podendo entender, como pretende, a Entidade Demandada que o ora Autor tenha exercido funções públicas nos termos e para efeitos do art. 78º, nº 1 e 3 do EA, na versão então aplicável, uma vez que quem celebrou contrato com a entidade pública foi a Sociedade de revisores de contas,, que detém personalidade jurídica própria e distinta do ora Autor, conforme supra explanado, e a quem é paga a devida retribuição pela prestação de serviços contratada.”
3.14 Nem a circunstância de o recorrido, enquanto sócio (não único, atenha-se) daquela sociedade de revisores oficiais de contas ter beneficiado, em última instância, do valor recebido pela identificada sociedade pelo exercício da correspondente função de fiscal único da EPE, é bastante para o efeito.
Note-se que, na verdade, as concretas funções do recorrente se consubstanciavam nas de revisor orientador ou executor em representação da sociedade de revisores nomeada para o cargo (cfr. artigo 57º do Estatuto da ordem dos Revisores Oficiais de Contas), que é quem é, na verdade, a titular do órgão social «fiscal único» da identificada EPE, nos termos legais e por razões de interesse público.
3.15 O ato administrativo impugnado nos autos, errou, pois, nos pressupostos de direito, tendo feita incorreta aplicação dos artigos 78º e 79º do Estatuto da Aposentação, nos termos decididos na sentença recorrida.
Razão pela qual deve ser mantida a sentença recorrida, não merecendo provimento o recurso.
O que se decide.
*
III. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao recurso jurisdicional, confirmando-se a sentença recorrida.
~
Custas pelo Recorrente - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro) e 189º nº 2 do CPTA.
*
Notifique.
D.N.
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Lisboa, 28 de junho de 2018
Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora)
Maria Cristina Gallego dos Santos
Ana Celeste Catarrilhas da Silva Evans de Carvalho