Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:11846/15
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:02/26/2015
Relator:HELENA CANELAS
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR ANTECIPATÓRIA – PROVISORIEDADE
Sumário:I – À luz do disposto no artigos 112º nºs 1 e 2 do CPTA é possível solicitar a adoção de providência cautelar destinada à obtenção de autorização provisória para iniciar uma atividade sem que isso (por si) exceda os limites da pretensão a formular no processo principal ou retire utilidade à ação principal.

II - É perante o caso concreto, e após aferir da verificação dos requisitos para o decretamento de uma providência cautelar antecipatória que o Tribunal há-de aferir se, por a concreta providência requerida esvaziar a ação principal, não pode ser deferida tout court, impondo-se então, em tal caso, averiguar da possibilidade de ser decretada providência cautelar diversa da requerida, mormente regulando provisoriamente a situação jurídica, ou temperando a providência requerida com outras medidas, já que as providências cautelares a adotar devem limitar-se ao necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos pelo requerente, podendo o tribunal, ouvidas as partes, “adotar outra ou outras providências, em cumulação ou em substituição daquela ou daquelas que tenham sido concretamente requeridas, quando tal se revele adequado” (cfr. nº 3 do artigo 120º do CPTA).

III – Salvo nas situações em que seja manifesta (caso em que deverá ser liminarmente rejeitada a providência cautelar – cfr. artigo 116º nº 2 alínea d) do CPTA) a impossibilidade de ser decretada uma concreta providência cautelar tal como foi requerida por a mesma retirar o efeito útil ao processo principal integra a apreciação do mérito do processo cautelar, não devendo obstar à aferição dos respetivos requisitos.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. RELATÓRIO
Madeira ……………. - ……………., Lda., Luís ………………….. e Yenimar …………….. (todos devidamente identificados nos autos), requerentes no Processo Cautelar que instauraram no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal (Procº nº 268/14.5BEFUN) previamente ao respetivo processo principal, sendo requerido o Município do Funchal (devidamente identificados nos autos), e no qual haviam requerido a decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo, que identificaram ser a decisão datada de 11/09/2014, do Vice-Presidente do Município do Funchal que indeferiu o pedido de exploração e circulação de um comboio turístico bem como a decretação de providência cautelar de autorização provisória para a exploração e circulação do mesmo no circuito considerado viável nos termos da decisão do requerido de 09/12/2013 e dos pareceres favoráveis do Município de Câmara de Lobos e da Direção Regional de Estradas, vêm interpor o presente recurso do despacho de 28/11/2014 (fls. 277 ss.) do Tribunal a quo, pelo qual apreciando enquanto incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida a que alude o artigo 128º nº 4 do CPTA o requerimento de fls. 311 dos requerentes, o indeferiu, e da subsequente sentença, da mesma data (28/11/2014 - fls. 280 ss.), pela qual foi julgado improcedente o processo cautelar.

Nas suas alegações os Recorrentes formulam as seguintes conclusões nos seguintes termos:
«
Antes de mais, verifica-se que não foi deduzido incidente de execução indevida, mas apenas exercido o direito de resposta dos Requerentes quanto à resolução apresentada , ao abrigo do princípio do contraditório, pelo que, conhecendo de tal resposta como se de incidente de execução indevida se tratasse, padece a decisão recorrida de excesso de pronúncia.
Em segundo lugar, conhecendo tal resposta como se de incidente de execução indevida se tratasse, não podia o Tribunal a quo deixar de apreciar da legalidade e cabimento da resolução apresentada, o que não fez.

Ora, quanto à legalidade, e conforme assinalado pelos Requerentes e ora Recorrentes na respectiva resposta à mesma, a resolução em causa padece do vício de incompetência.
E, quanto ao cabimento, resulta que a resolução fundamentada prevista no nº 1, do artigo 128º do CPTA se destina a permitir à autoridade administrativa iniciar ou prosseguir a execução de determinado acto impugnado em defesa do interesse público, sendo que, no caso, inexiste qualquer acto de execução susceptível de ser iniciado ou prosseguido.

Aliás, a essa conclusão chegou o Tribunal a quo na sentença recorrida , mas sem que daí haja extraído todas as consequências legais, posto que, face a tal conclusão, forçoso se toma concluir também pela impossibilidade processual do Requerido lançar mão de um mecanismo destinado precisamente a obter tais efeitos, sob pena de violação dos princípios da limitação dos actos e da legalidade a qual os Recorrentes invocam.

Já quanto à decisão de indeferimento das próprias providências, divergindo em absoluto do entendimento aí sufragado pelo Tribunal a quo, defende-se que as providências requeridas são expressamente e por natureza provisórias, respeitando:
- Por um lado, à suspensão de eficácia de um acto - medida cautelar por natureza, com previsão legal expressa, estruturalmente provisória e dependente da decisão definitiva de declaração de nulidade ou anulabilidade do acto em causa;
- Por outro lado, à concessão de autorização provisória - medida cautelar também com previsão legal expressa, estruturalmente provisória e dependente da decisão definitiva de concessão de autorização definitiva ou de reconhecimento de concessão de autorização definitiva já dada.

Em particular a este último respeito, e sob pena da primeira parte, da alínea d), do nº 2, do artigo 112º do CPTA não fazer sentido, verifica-se a possibilidade de solicitar a adopção de providência cautelar destinada à obtenção de autorização provisória para iniciar uma actividade, como é o caso, sem que isso exceda os limites da pretensão a formular no processo principal, ou sem que isso retire utilidade à acção principal , sendo que, de outro modo, a função instrumental da tutela cautelar estaria posta em causa, dado que com aquela se procura assegurar o efeito útil da sentença a proferir na acção principal (cfr. art. 112º, nº 1, do CPTA).
O princípio da tutela jurisdicional efectiva exige que seja reconhecida ao interessado a possibilidade de impugnar todos os actos que se mostrem lesivos, sendo que o acto consubstanciado no despacho da Vice-Presidente da Câmara Municipal do Funchal de 11/09/2014, enquanto acto decisório que nega a pretensão formulada pelos Requerentes, como aliás o Tribunal a quo assim decidiu, é lesivo dos seus direitos e interesses, sendo que, por força da decisão recorrida , se mantém vedada aos Requerentes a possibilidade de exploração, ainda que provisória, do circuito em causa, o que põe irremediavelmente em risco todos os investimentos efectuados, com as consequências daí decorrentes para aqueles em termos de prejuízos e de responsabilização (cfr. supra Jorge Lopes de Sousa, citado no Ac. do TCAN de 15/02/2013).
Assim, a presente providência de autorização provisória à Requerente sociedade para iniciar a exploração em causa não só tem cabimento como não se destina a definir em termos finais a pretensão dos Requerentes, antes se destina a acautelar essa pretensão no sentido da perda que possa ser originada pela demora da decisão do processo principal , sem que isso invada ou esgote aquilo que é o objecto do processo principal.
10º
Com efeito, a antecipação a título provisório da exploração em causa nada tem que ver com a procedência ou a improcedência da acção de que o processo depende ou irá depender, e consequentemente não se subsume nem esgota o objecto deste processo (cfr. supra Mário Aroso de Almeida), sendo que, no caso concreto, a tutela cautelar se justifica porquanto a mesma se constitui como condição sine qua non da utilidade e da eficácia da decisão a proferir no processo principal.
11º
Em reforço do supra alegado importa ainda considerar que o mencionado princípio da tutela jurisdicional efectiva garante também ao interessado a adopção de medidas cautelares adequadas, de onde, sendo o acto em causa impugnável, mostrando-se sumariamente alegado o periculum in mora e o fumus boni iuris, enunciada que se mostra no requerimento inicial a relação de instrumentalidade entre a providência cautelar e a acção de que o processo irá depender , e considerando que do processo constam todos os elementos necessários para a apreciação global da causa,
12º
Nada obstava até a que o Tribunal a quo lançasse mão do mecanismo do nº 3, do artigo 120º do CPTA em ordem à tutela jurisdicional efectiva dos direitos e interesses legalmente protegidos dos Requerentes , de modo a assim assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo principal, entendimento este que se abona no facto da lei processual permitir até a convolação da tutela cautelar em tutela final urgente quando a manifesta urgência na resolução definitiva do caso, atendendo à natureza das questões e à gravidade dos interesses envolvidos, permita concluir que a situação não se compadece com a adopção de uma simples providência cautelar e tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito.
13º
Em suma, ao decidir pela não adopção da providência de autorização provisória à Requerente sociedade para a exploração do circuito turístico em causa com fundamento em que a resolução da questão nesta sede retira a utilidade da acção principal a interpor , e que a provisoriedade da tutela cautelar impede que o Tribunal adopte, como providência cautelar, uma regulação que dê resposta à questão de fundo sobre a qual versa o litígio, desse modo inutilizando o processo em que aquele é objecto de discussão, o Tribunal a quo não fez uma correcta aplicação da lei e violou o princípio da tutela jurisdicional efectiva ínsito nos artigos 20º e 268°, nº 4, da CRP, com afloramentos designadamente nos artigos 2°, nº 1, e 112º, nº 1, do CPTA, violação essa a qual os Recorrentes expressamente invocam para todos os efeitos.»


Notificado o Recorrido apresentou contra-alegações (fls. 332 ss.) pugnando pela improcedência do recurso.

Notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA o Ministério Público não emitiu Parecer (cfr. fls. 370 ss.)

Sem vistos, em face do disposto no artigo 36º nº 1 alínea e) e nº 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO (das questões a decidir)
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso são duas as decisões que vêm jurisdicionais que vêm impugnadas:
- a primeira, a proferida através do despacho de 28/11/2014 (fls. 277 ss.), prévio à prolação da sentença, pela qual a Mmª Juiz do Tribunal a quo, apreciando enquanto incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida a que alude o artigo 128º nº 4 do CPTA a pronuncia emitida pelos requerentes no seu articulado de fls. 311, o indeferiu.
- a segunda, a proferida na sentença de 28/11/2014 (fls. 280 ss.), pela qual a Mmª Juiz do Tribunal a quo julgou improcedente o processo cautelar.
Relativamente à primeira os recorrentes sustentam ter o Tribunal a quo incorrido em excesso de pronúncia, por não terem deduzido através do indicado requerimento, qualquer incidente de ineficácia de atos de execução indevida (vide conclusões 1ª a 5ª das suas alegações de recurso).
Relativamente à segunda os recorrentes sustentam ter incorrido em erro de julgamento, por incorreta aplicação da lei, ao decidir pela não adoção da providência de autorização provisória à sociedade Requerente para a exploração do circuito turístico em causa com fundamento em que a resolução da questão nesta sede retira a utilidade da ação principal a interpor , e que a provisoriedade da tutela cautelar impedia o Tribunal de adotar, como providência cautelar, uma regulação que desse resposta à questão de fundo sobre a qual versa o litígio, desse modo inutilizando o processo em que aquele é objeto de discussão, violando assim o princípio da tutela jurisdicional efetiva ínsito nos artigos 20º e 268°, nº 4, da CRP, com afloramentos designadamente nos artigos 2°, nº 1, e 112º, nº 1, do CPTA (vide conclusões 6ª a 13ª das suas alegações de recurso).
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A – De facto
No despacho de 28/11/2014 (fls. 277 ss.), no qual a Mmª Juiz do Tribunal a quo, apreciando enquanto incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida a que alude o artigo 128º nº 4 do CPTA a pronuncia emitida pelos requerentes no seu articulado de fls. 311, o indeferiu, considerou a seguinte factualidade, ali assim vertida:
1) O requerente intentou a presente providência em 20/10/2014, (doc. de fls. 222 e ss dos autos).

2) Por ofício datado de 22/10/2014 e recebido em 23/10/2014, a entidade requerida foi citada para deduzir oposição (doc. de fls. 187 dos autos).

3) Em 31/10/2014, a entidade requerida deduziu oposição (doc. de fls. 189 e ss dos autos).

4) Em 05/11/2014 foi junta aos autos resolução fundamentada, proferida pela Vice-Presidente da Câmara Municipal do Funchal, nos termos que constam de fls. 236 a 245 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.


Na sentença de 28/11/2014 (fls. 280 ss.), pela qual a Mmª Juiz do Tribunal a quo julgou improcedente o processo cautelar, foi dada como provada a seguinte factualidade, nos seguintes termos:
1) Em 15/04/2013, o Requerente Luís …………………. apresentou junto do Município do Funchal requerimento, ao qual foi atribuído o n.º 16768, no qual formulou “pedido de licença para exercer a atividade de exploração de circuitos com comboio turístico”, um dos quais na cidade do Funchal e outro do Funchal até Câmara de Lobos, do qual consta, designadamente, o seguinte:

“(…)”

[cfr. doc. de fls 36 a 44 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido ; acordo].

2) Em 15/11/2013, o Requerente Luís …………….. apresentou junto do Município do Funchal, em nome da Requerente sociedade novo requerimento, ao qual foi atribuído o número 52106, nos termos seguintes:

“(…)”

[cfr. doc. de fls 46 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido ; acordo].
3) Em anexo ao requerimento referido no número anterior, o Requerente Luís Manuel Abreu Alves juntou documento contendo cinco circuitos, identificados de circuito n.º 1 a circuito n.º 5, assinalados em mapas e com os respetivos percursos assinalados em termos de início, locais de passagem, de paragem e de fim de circuito, tendo o circuito n.º 5 um total de 6,9 km e o seguinte descritivo:

• Início do circuito na Estrada da Vitória (paragem), Funchal;

• Segue para sudoeste em frente à Estrada da Vitória;

• Na rotunda, segue pela segunda saída para a Estrada Monumental;

• Continua até à Estrada João Gonçalves Zarco;

• Curva à esquerda em direção à Estrada João Gonçalves Zarco (paragem), Câmara de Lobos;

• Vira à direita na Praça da Autonomia (Largo de S. Sebastião);

• Vira à direita em direção à Estrada João Gonçalves Zarco;

• Continua até à Estrada Monumental;

• Na rotunda, segue pela primeira saída e continua na Estrada Monumental (paragem Hotel Orca Praia, Funchal);
• Vira à direita em direção à Rua do Cabrestante;

• Na Rua do Cabrestante vira à direita e entra na Rua da Ponta da Cruz (paragem) final de circuito Funchal.
[cfr. doc. de fls 47 a 46 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido ; acordo]

4) Por documento com saída n.º 2013/22406 de 20/11/2013, a Entidade Requerida notificou o Requerente Luís ………………… do despacho da Vereadora - por delegação do Presidente da Câmara – datado de 15/11/2013, com o seguinte teor:

Assunto: Autorização para exploração e circular com comboio turístico no Concelho do Funchal.
Relativamente ao vosso requerimento registado nesta autarquia sob o número
16768 e sobre o assunto acima mencionado, comunica-se a V. Ex.ª que, por razões de congestionamento em que se encontra o trânsito no centro da cidade do Funchal, não é possível satisfazer o pedido, pelo que o mesmo é indeferido (…)”
[cfr. doc. de fls 56 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido ; acordo].

5) Por documento com saída n.º 2013/23993 de 20/11/2013, a Entidade Requerida notificou o Requerente Luís ………………… do despacho do Diretor do Departamento de Trânsito do Município do Funchal –, datado de 09/12/2013, com o seguinte teor:

Assunto: Pedido de licenciamento de atividade exploração de circuito turístico em comboio turístico.
Relativamente ao vosso requerimento registado nesta autarquia sob o n.º 52106, em 15/11/2013 e sobre o assunto acima mencionado, manda-me a vereadora do Pelouro de Trânsito com delegação de competências do Presidente da Câmara, informar V. Ex. que o único percurso possível neste momento/período seria o circuito n.º 5, pelo que foi solicitado parecer à Câmara Municipal de Câmara de Lobos e à Direção Regional de Estradas.
Quanto aos restantes circuitos, são indeferidos por constrangimentos de trânsito”.
[cfr. doc. de fls 58 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; acordo].

6) Em 05/09/2014 foi emitida a certidão pelo Departamento de Trânsito do Município do Funchal, designadamente com o seguinte teor:

“(…)”

[cfr. doc. de fls 75 e 76 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; acordo].
7) Por documento com saída n.º 2014/17293 de 11/09/2014, a Entidade Requerida notificou o Requerente Luís Manuel Abreu Alves do despacho da Vice- Presidente da Câmara do Funchal, datado de 11/09/2014, no uso de poderes delegados pelo Presidente da Câmara, com o seguinte teor:

Assunto: Exploração e circulação de um comboio turístico no Concelho do Funchal”
Relativamente à audiência do dia 23 de Abril de 2014, referente ao assunto acima mencionado, comunica-se a V. Ex.ª que, apesar dos pareceres positivos da Direção Regional de Estradas e do Município de Câmara de Lobos, para a realização do circuito turístico em comboio, o Município do Funchal indefere o pedido de Exploração e circulação de um comboio turístico no Concelho do Funchal, atendendo aos constrangimentos de trânsito que este tipo de veículo provocaria, aliado ao facto de não existir espaço físico para a implementação de paragens, há existência de outros pedidos idênticos que a serem autorizados a cidade não comportaria” [cfr. doc. de fls . 80 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; acordo].

7) A petição inicial da presente ação deu entrada neste Tribunal em 20/10/2014 [cfr. doc. de fls. 1 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].


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B – De direito

1. Da decisão atinente à declaração de ineficácia de atos de execução indevida (conclusões 1ª a 5ª das suas alegações de recurso)
~
Da decisão recorrida
Através do despacho de 28/11/2014 (fls. 277 ss.), prévio à prolação da sentença, pela qual a Mmª Juiz do Tribunal a quo, apreciando enquanto incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida a que alude o artigo 128º nº 4 do CPTA a pronuncia emitida pelos requerentes no seu articulado de fls. 311, o indeferiu.

~
Da tese dos recorrentes
Pugnam os recorrentes ter o Tribunal a quo incorrido em excesso de pronuncia, por não terem deduzido através do indicado requerimento, qualquer incidente de ineficácia de atos de execução indevida, sustentando desde logo que não foi deduzido incidente de execução indevida, mas apenas exercido o direito de resposta dos Requerentes quanto à resolução apresentada, ao abrigo do princípio do contraditório, pelo que, conhecendo de tal resposta como se de incidente de execução indevida se tratasse, padece a decisão recorrida de excesso de pronúncia e que, em segundo lugar, conhecendo tal resposta como se de incidente de execução indevida se tratasse, não podia o Tribunal a quo deixar de apreciar da legalidade e cabimento da resolução apresentada, o que não fez; que quanto à legalidade, e conforme assinalado pelos Requerentes e ora Recorrentes na respetiva resposta à mesma, a resolução em causa padece do vício de incompetência e que quanto ao cabimento, resulta que a resolução fundamentada prevista no nº 1, do artigo 128º do CPTA se destina a permitir à autoridade administrativa iniciar ou prosseguir a execução de determinado ato impugnado em defesa do interesse público, sendo que, no caso, inexiste qualquer ato de execução suscetível de ser iniciado ou prosseguido, conclusão a que chegou o Tribunal a quo na sentença recorrida, mas sem que daí haja extraído todas as consequências legais, posto que, face a tal conclusão, forçoso se toma concluir também pela impossibilidade processual do Requerido lançar mão de um mecanismo destinado precisamente a obter tais efeitos, sob pena de violação dos princípios da limitação dos atos e da legalidade.
~
Análise e apreciação
À luz do disposto no artigo 128º nºs 1, 2 e 3 do CPTA a emissão de uma resolução fundamentada tem por escopo permitir que a entidade administrativa requerida num processo cautelar possa praticar atos após a notificação do requerimento cautelar em que a requerente pede a suspensão de eficácia de um ato. Sendo certo que, como é sabido, com a proibição (provisória) de execução do ato suspendendo decorrente da propositura do processo cautelar, prevista nos nºs 1 e 2 do artigo 128º do CPTA, visa-se assegurar a manutenção do efeito útil ao próprio processo cautelar no qual seja requerida a providência de suspensão de eficácia de ato administrativo, de molde a evitar que quando o julgador tome posição sobre aquele litígio essa sua decisão ainda faça sentido ou tenha utilidade à luz mormente dos direitos e interesses que o requerente queria ver acautelados.
Faltando a resolução fundamentada (emitida no prazo de 15 dias após a citação – cfr. nº 1 do artigo 128º do CPTA) considera-se indevida a execução do ato suspendendo (cfr. nº 3 do artigo 128º do CPTA). Tal como se considerada indevida quando o tribunal julgue improcedentes as razões em que se fundamenta a Resolução Fundamentada.
E com vista a salvaguardar os interesses do requerente de uma providência cautelar de suspensão de eficácia de ato, tutelados pela proibição (provisória) de execução prevista no artigo 128º nºs 1 e 2 do CPTA, o nº 4 do mesmo artigo dispõe que “o interessado pode requerer ao tribunal onde penda o processo de suspensão da eficácia, até ao trânsito em julgado da sua decisão, a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida”. Incidente que é processado nos próprios autos do processo cautelar e que é decidido após ouvidos os interessados no prazo de 5 dias (cfr. nºs 5 e 6 do artigo 128º do CPTA).
À luz dos dispositivos insertos no artigo 128º do CPTA, para decidir se os atos de execução de um ato administrativo objeto de um processo cautelar no qual seja requerida a sua suspensão de eficácia devem, ou não, ser considerados ineficazes o Tribunal deve verificar: (i) se a resolução fundamentada existe; (ii) se foi emitida dentro do prazo legal de 15 dias e (iii) se está fundamentada, no sentido de demonstrar que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.
A Administração tem que indicar na Resolução Fundamentada as razões que militam no sentido da existência de situação de urgência grave no prosseguimento da execução do ato administrativo suspendendo.
Tal decisão é passível de ser sindicada contenciosamente pelos tribunais no âmbito do incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida (designadamente com fundamento no facto dos motivos aduzidos naquela Resolução não constituírem fundamentos legais ou legítimos abarcados pelo conceito legal enunciado no n.º 1 do art. 128.º do CPTA do diferimento da execução ser “gravemente prejudicial para o interesse público).
Na situação dos autos temos que através do despacho de 28/11/2014 (fls. 277 ss.), prévio à prolação da sentença, a Mmª Juiz do Tribunal a quo, apreciando enquanto incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida a que alude o artigo 128º nº 4 do CPTA a pronuncia pelos requerentes no seu articulado de fls. 311 dos, o indeferiu.
E fê-lo nos seguintes termos, que se passam a transcrever:
«Os Requerentes instauraram a presente providência cautelar contra com vista a obter “a suspensão de eficácia do ato administrativo consubstanciado na decisão do Requerido, datada de 11/09/2014, por via da qual indeferiu o pedido de autorização de exploração de comboio turístico no concelho do Funchal à Requerente sociedade, e de autorização provisória para a respetiva exploração e circulação no circuito considerado viável nos termos da decisão do Requerido de 09/12/2013 e dos pareceres favoráveis do Município de Câmara de Lobos e da Direção Regional de Estradas (…)”.
A presente providência foi liminarmente admitida, tendo sido citada a Entidade Requerida para contestar.
A Entidade Requerida juntou aos autos resolução fundamentada proferida nos termos do artigo 128.º (cfr. fls. 236 a 245 dos autos).
Por requerimento de fls. 311 e seguintes dos autos vieram os Requerentes pedir que seja julgada “como indevida qualquer execução que o Requerido entenda vir dar ao ato cuja suspensão foi requerida”, alegando para tanto e em síntese, que a resolução padece de vício de incompetência, os fundamentos invocados são falsos e a mesma foi proferida fora de prazo.
Verifica-se, com base nos documentos juntos, que:
1) O requerente intentou a presente providência em 20/10/2014, (doc. de fls. 222 e ss dos autos).
2) Por ofício datado de 22/10/2014 e recebido em 23/10/2014, a entidade requerida foi citada para deduzir oposição (doc. de fls. 187 dos autos).
3) Em 31/10/2014, a entidade requerida deduziu oposição (doc. de fls. 189 e ss dos autos).
4) Em 05/11/2014 foi junta aos autos resolução fundamentada, proferida pela Vice- Presidente da Câmara Municipal do Funchal, nos termos que constam de fls. 236 a 245 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
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Dispõe o artigo 128º do CPTA:
“1 - Quando seja requerida a suspensão da eficácia de um ato administrativo, a autoridade administrativa, recebido o duplicado do requerimento, não pode iniciar ou prosseguir a execução, salvo se, mediante resolução fundamentada, reconhecer, no prazo de 15 dias, que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.
2 - Considera-se indevida a execução quando falte a resolução prevista no n.º 1 ou o tribunal julgue improcedentes as razões em que aquela se fundamenta.
3 - O interessado pode requerer ao tribunal onde penda o processo de suspensão da eficácia, até ao trânsito em julgado da sua decisão, a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida.”

Este preceito estabelece o modo de atuação da Administração a partir do momento em que recebe o duplicado do pedido de suspensão de eficácia e até à data da decisão a proferir pelo Tribunal. Durante tal período, está aquela impedida de iniciar ou prosseguir a execução do ato.
Porém, caso a Administração pretenda iniciar ou prosseguir com a execução do ato suspendendo deve, no prazo de 15 dias, proferir resolução fundamentada que reconheça que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.
O que leva a concluir que a resolução fundamentada junta a estes autos não é extemporânea.
O objeto do incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida é o ato ou atos que a Administração pratica em execução do ato cuja suspensão de eficácia o requerente pretende obter, cumprindo ao Tribunal aferir se os mesmos violaram o disposto no n.º 1 do artigo 128.º do CPTA.
Como se refere no Acórdão do TCA Sul de 29/03/2012, proc. n.º 08626/12, “O controlo contencioso da resolução fundamentada tem de se processar no contexto do específico incidente para a declaração de ineficácia dos atos de execução praticados previsto nos n.ºs 3 a 6 do artigo 128.º do CPTA. Não se podendo questionar, só por si, a resolução eventualmente emitida, ainda na ausência de atos de execução, havendo que aguardar pela prática dos atos de execução para poder reagir contra eles, não podia a decisão recorrida conhecer da legalidade da resolução fundamentada sem que os requerentes da providência tivessem requerido a declaração de ineficácia dos atos de execução eventualmente praticados ao seu abrigo”.
Ora, resulta inequivocamente do exposto que compete aos Requerentes indicar especificadamente quais os atos de execução indevida cuja declaração de ineficácia pediram a este Tribunal, o que, nos presentes autos não sucede.
Note-se que o pedido é o de que “Deve ser julgada como indevida qualquer execução que o Requerido entenda vir a dar ao ato cuja suspensão foi requerida”.
Porque não foram indicados quaisquer atos de execução, sempre improcederia o incidente deduzido.
De todo o modo, sempre se dirá que não se vislumbram quais os atos de execução que poderiam ser praticados pela Entidade Requerida.
Pelo pedido efetuado, é manifesto que o que os Requerentes pretendem é que lhes seja deferida a pretensão de exploração de comboio turístico em percurso que indicam. Ora, da suspensão de eficácia da decisão que indeferiu tal pedido não advém a possibilidade de os Requerentes iniciarem a atividade que pretendem ou a autorização para exploração do comboio pretendida (o oposto sucederia se os Requerentes tivessem iniciado a atividade e o despacho ordenasse a sua cessação), pelo que não haverá atos de execução a “iniciar ou prosseguir”.
Pelo que, também por estas razões, se impõe concluir pelo indeferimento do presente incidente.»

Constata-se que o pedido concretamente formulado pelos recorrentes no requerimento inicial do processo cautelar foi o seguinte, nos seguintes termos:
«Deve ser admitido o presente requerimento e, a final, serem adotadas as providências cautelares de suspensão de eficácia do ato administrativo, consubstanciado na decisão do Requerido, datada de 11/09/2014, por via da qual indeferiu o pedido de autorização de exploração de comboio turístico no concelho do Funchal à Requerente sociedade e de autorização provisória para a respetiva exploração e circulação no circuito considerado viável nos termos da decisão do Requerido de 09/12/2013 e dos Pareceres favoráveis do Município de Câmara de Lobos e da Direção Regional de Estradas, supra identificado no artigo 8º.».

É certo que se constata que o articulado apresentado pelos recorrentes (requerentes no processo cautelar) a fls. 311 dos autos, foi apresentado em resposta à matéria de exceção que havia sido deduzida pelo requerido na sua contestação (vide artigos 1º a 30º daquele articulado), e que nele simultaneamente os recorrentes “responderam”, nas suas palavras, ao teor da Resolução Fundamentada (que havia sido junta aos autos pela entidade requerida), o que fizeram na parte “B” daquele articulado, sob a epígrafe: “Da resposta à Resolução Fundamentada”.
Mas igualmente se constata que os recorrentes concluíram aquele seu articulado (de fls. 311 dos autos), requerendo o seguinte, nos seguintes termos: “Deve ser julgada como indevida qualquer execução que o Requerido entenda vir a dar ao ato cuja suspensão foi requerida”. Para o que alegaram, e passa-se a transcrever, que: «a assinalada resolução mostra-se proferida pela Vice-presidente de Câmara ao abrigo da competência na mesma delegada relativa à alínea m), do n°. 2, do art. 35°, da Lei 75/2013, sendo que nesta não se inclui a nem a representação em juízo, nem a prolação de resoluções fundamentadas ao abrigo do art. 128° do CPTA com vista a obstar ao diferimento da execução de acto cuja suspensão haja sido requerida em juízo»; que assim «a resolução em causa padece do vício de incompetência, o que expressamente se invoca para todos os efeitos legais»; que a resolução em causa «contraria, nos seus próprios e expressos termos, a defesa apresentada pelo Requerido, e, em concreto, da mesma decorre inequivocamente, como supra referido sob o art. 20°, que a decisão final do Requerido se mostra consubstanciada no despacho impugnado datado de 11/09/2014» por «sob o ponto 1 da mencionada resolução é expressamente referido que: “.. .a 11 de Setembro de 2014, indeferiu no uso das suas competências a possibilidade de exploração de cinco circuitos com comboio turístico na cidade do Funchal...”»; que «quanto ao conjunto de fundamentos invocados na mencionada resolução, que - os mesmos são falsos; - os mesmos não decorrem de qualquer estudo / avaliação / parecer
técnicos; - os mesmos colidem com os pareceres técnicos anteriormente carreados
para os autos do processo administrativo em causa; - os mesmos colidem com o próprio acto do Requerido de 09/12/2013 supra referido, e que, como supra invocado, é constitutivo de direitos
» e que «neste momento já decorreu o prazo para o Requerido proferir resolução nos termos do art. 128° do CPTA».
Compreende-se, pois, que a Mmª Juiz do Tribunal a quo tenha enquadrado, o assim requerido e alegado como dedução do incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida a que aludem os nºs 4, 5 e 6 do artigo 128º do CPTA. E fê-lo corretamente, já que lhe foi expressamente dirigido pedido nesse sentido. Ainda que não tivesse sido indicado qualquer concreto «ato de execução» que tivesse sido praticado cuja declaração de ineficácia fosse pretendida, o que, aliás, foi considerado pela Mmª Juiz do Tribunal a quo ao decidir como decidiu.
Não colhe, por conseguinte, a invocação, feita pelos recorrentes, de que o Tribunal a quo incorreu em excesso de pronúncia. Na verdade o Tribunal a quo debruçou-se e apreciou o pedido que lhe foi dirigido, de que fosse “julgada como indevida qualquer execução que o Requerido entenda vir a dar ao ato cuja suspensão foi requerida”.
Como também não colhe quanto à invocação feita pelos recorrentes de que não podia o Tribunal a quo deixar de apreciar da legalidade e cabimento da resolução apresentada, o que não fez. É que em face dos termos em que o pedido (de que fosse “julgada como indevida qualquer execução que o Requerido entenda vir a dar ao ato cuja suspensão foi requerida”) deduzido pelos recorridos foi decidido, entendendo a Mmª Juiz do Tribunal a quo que não podia ser deferido o requerido não só que por não terem sido indicados quaisquer atos de execução, mas também por não se vislumbrarem quais atos de execução que poderiam ser praticados pela Entidade Requerida por da suspensão de eficácia da decisão que indeferiu o pedido de exploração de comboio turístico em percurso indicado não advir a possibilidade de os Requerentes iniciarem a atividade que pretendem ou a autorização para exploração do comboio pretendida, não havendo atos de execução a “iniciar ou prosseguir”, não se impunha entrar na apreciação da legalidade e cabimento da Resolução Fundamentada. E fê-lo, corretamente. Mostrando-se, assim, prejudicadas as questões atinentes, mormente o invocado vício de incompetência do autor da Resolução para o emitir.
Assim, e pelo exposto, improcedendo as conclusões 1ª a 5ª das alegações de recurso, não merece provimento o recurso dirigido ao identificado despacho de 28/11/2014 (fls. 277 ss.), prévio à prolação da sentença, pela qual a Mmª Juiz do Tribunal a quo, apreciando enquanto incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida a que alude o artigo 128º nº 4 do CPTA, a pronuncia emitida pelos requerentes no seu articulado de fls. 311, o indeferiu.

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2. Da decisão proferida através da sentença de 28/11/2014 (fls. 280 ss.), pela qual a Mmª Juiz do Tribunal a quo julgou improcedente o processo cautelar (conclusões 6ª a 13ª das suas alegações de recurso)
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Da decisão recorrida
Pela sentença de 28/11/2014 (fls. 280 ss.) a Mmª Juiz do Tribunal a quo julgou improcedente o processo cautelar que os recorrentes instauraram no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal previamente ao respetivo processo principal, no qual haviam requerido a decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo, que identificaram ser a decisão datada de 11/09/2014, do Vice-Presidente do Município do Funchal que indeferiu o pedido de exploração e circulação de um comboio turístico bem como a decretação de providência cautelar de autorização provisória para a exploração e circulação do mesmo no circuito considerado viável nos termos da decisão do requerido de 09/12/2013 e dos pareceres favoráveis do Município de Câmara de Lobos e da Direção Regional de Estradas.
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Da tese dos recorrentes
Sustentam os recorrentes ter a sentença recorrida incorrido em erro de julgamento, por incorreta aplicação da lei, ao decidir pela não adoção da providência de autorização provisória à sociedade Requerente para a exploração do circuito turístico em causa com fundamento em que a resolução da questão nesta sede retira a utilidade da ação principal a interpor, e que a provisoriedade da tutela cautelar impedia o Tribunal de adotar, como providência cautelar, uma regulação que desse resposta à questão de fundo sobre a qual versa o litígio, desse modo inutilizando o processo em que aquele é objeto de discussão, violando assim o princípio da tutela jurisdicional efetiva ínsito nos artigos 20º e 268°, nº 4, da CRP, com afloramentos designadamente nos artigos 2°, nº 1, e 112º, nº 1, do CPTA.
Sustentam, a este respeito, que é possível solicitar a adoção de providência cautelar destinada à obtenção de autorização provisória para iniciar uma atividade, como é o caso, sem que isso exceda os limites da pretensão a formular no processo principal, ou sem que isso retire utilidade à ação principal, e que de outro modo a função instrumental da tutela cautelar estaria posta em causa, dado que com aquela se procura assegurar o efeito útil da sentença a proferir na ação principal em conformidade com o disposto no artigo 112º nº 1 do CPTA; que o princípio da tutela jurisdicional efetiva exige que seja reconhecida ao interessado a possibilidade de impugnar todos os atos que se mostrem lesivos, e que o ato consubstanciado no despacho da Vice-Presidente da Câmara Municipal do Funchal de 11/09/2014, enquanto ato decisório que nega a pretensão formulada pelos Requerentes é lesivo dos seus direitos e interesses; que por força da decisão recorrida se mantém vedada aos Requerentes a possibilidade de exploração, ainda que provisória, do circuito em causa, o que põe irremediavelmente em risco todos os investimentos efetuados, com as consequências daí decorrentes para aqueles em termos de prejuízos e de responsabilização; que assim a providência de autorização provisória à Requerente sociedade para iniciar a exploração em causa não só tem cabimento como não se destina a definir em termos finais a pretensão dos Requerentes, antes se destina a acautelar essa pretensão no sentido da perda que possa ser originada pela demora da decisão do processo principal, sem que isso invada ou esgote aquilo que é o objeto do processo principal; que a antecipação a título provisório da exploração em causa nada tem que ver com a procedência ou a improcedência da ação de que o processo depende ou irá depender, e consequentemente não se subsume nem esgota o objeto deste processo; que no caso concreto a tutela cautelar se justifica por a mesma se constituir como condição sine qua non da utilidade e da eficácia da decisão a proferir no processo principal; que o princípio da tutela jurisdicional efetiva garante também ao interessado a adoção de medidas cautelares adequadas, de onde, sendo o ato em causa impugnável, mostrando-se sumariamente alegado o periculum in mora e o fumus boni iuris, enunciada que se mostra no requerimento inicial a relação de instrumentalidade entre a providência cautelar e a ação de que o processo irá depender; que considerando que do processo constam todos os elementos necessários para a apreciação global da causa nada obstava a que o Tribunal a quo lançasse mão do mecanismo do nº 3, do artigo 120º do CPTA em ordem à tutela jurisdicional efetiva dos direitos e interesses legalmente protegidos dos Requerentes , de modo a assim assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo principal, entendimento este que se abona no facto da lei processual permitir até a convolação da tutela cautelar em tutela final urgente quando a manifesta urgência na resolução definitiva do caso, atendendo à natureza das questões e à gravidade dos interesses envolvidos, permita concluir que a situação não se compadece com a adoção de uma simples providência cautelar e tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito.
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Análise e apreciação
Na sentença recorrida, após ter julgado improcedentes as questões da inimpugnabilidade e da caducidade do direito de ação, que haviam sido suscitadas pela entidade requerida na sua contestação, a Mmª Juiz do Tribunal a quo considerou que a questão da inadmissibilidade material do pedido, que igualmente havia sido suscitada pela entidade requerida, não configura uma exceção dilatória respeitando antes a um requisito intrínseco da providência cautelar – a sua provisoriedade – tendo então julgado improcedente o processo cautelar, precisamente por falta de tal caraterística (por entender não poderem os Requerentes obter nesta sede o que só poderá ser obter, a título definitivo, na ação principal). Julgamento que assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever:
«A título de exceção, alegou ainda a Entidade Demandada a inadmissibilidade material do pedido dado que o procedimento cautelar de suspensão de eficácia do ato não se destina à declaração e realização do direito invocado, pois que os Requerentes pretendem antecipar a resolução definitiva do litígio.
A Entidade Demandada defende, portanto a ilegalidade do recurso ao processo cautelar, na parte em que os Requerentes pedem a autorização provisória à interessada para a exploração e circulação do comboio, pois que a sua apreciação irá esgotar o objeto da ação principal.
E diga-se, desde já, que não carece de razão a Entidade Demandada.
Note-se, porém, que a matéria em causa não traduzirá uma exceção; trata-se, ao invés, da falta de um requisito intrínseco à providência cautelar, a sua provisoriedade (e contendente, até, com a sua admissibilidade). Contudo, atentos os factos assentes, é pertinente a sua apreciação.
Com efeito, nos termos do artigo 112.º, n.º 1 do CPTA “quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adoção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”.
O CPTA consagra, assim, uma cláusula aberta que permite a adoção de todo o tipo de providências cautelares, o que inclui as providências que se encontram especificadas no CPC e aquelas que, a título meramente exemplificativo são enunciadas no n.º 2 do citado artigo, podendo compreender outras que, no caso concreto, se mostrem adequadas [cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª edição, 2010, anotação ao artigo 112º].
O processo cautelar tem como características a instrumentalidade, isto é, a sua dependência em face de um processo principal: a provisoriedade, por não visar a resolução do litígio, estando vedado ao tribunal conceder, através de uma providência cautelar, aquilo que só a sentença final pode proporcionar; e a sumariedade, ou seja, cognição necessariamente sumária e perfunctória da situação de facto e de direito.
A finalidade própria do processo cautelar é, pois, assegurar que a demora na tomada da decisão final não implique a criação de uma situação de facto consumado com ela incompatível, ou a produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses de quem dela deveria beneficiar.
As providências cautelares destinam-se, assim, a obter uma regulação provisória dos interesses envolvidos num determinado litígio, podendo traduzir-se, consoante o seu conteúdo, em antecipar, a título provisório, a constituição de uma situação jurídica nova cuja obtenção se visa alcançar, a título definitivo, no processo principal (providências antecipatórias), ou a manutenção, a título provisório, de uma situação jurídica já existente, até que a situação seja definida, a título definitivo, no processo principal (providências conservatórias).
Essa regulação provisória deve traduzir-se, nos termos do artigo 112.º, n.º 1 do CPTA, na adoção das providências cautelares que se mostrem “adequadas a assegurar a utilidade da sentença” a proferir no processo principal, evitando o chamado “periculum in mora”, isto é, o risco de que essa sentença, quando for proferida, já não dê resposta adequada às situações envolvidas no litígio, “seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão totalmente inútil, seja, pelo menos, porque essa evolução conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis”. [Cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, op. cit].
Por outro lado, o artigo 113.º, n.º 1 estabelece a dependência das providências cautelares relativamente à causa principal.
Analisado o caso dos autos, já se concluiu que, no que se refere à suspensão de eficácia do despacho da Vice-Presidente da Câmara requerida, a providência requerida é manifestamente inadequada aos fins pretendidos pelos Requerentes, pois que é manifesto que o que pretendem é a obtenção da autorização para circulação do comboio, a qual depende do cumprimento de alguns requisitos que têm de ser apreciados, designadamente decorrentes do Decreto-Lei n.º 249/2000 de 13/10.
Da suspensão de eficácia da decisão que indeferiu tal pedido não advém a concessão dessa autorização. Em sede de ação principal, a anulação do ato que lhe indeferiu a pretensão, por si só, não logra atingir tal efeito, sendo necessário averiguar se cumpre as determinações legais para que a mesma lhe seja atribuída. [Como é sabido, a impugnação prevista nos arts. 50.º e ss. do CPTA, dirigida à anulação ou dec laração de nulidade ou inexistência, é o modo de reação adequado contra atos administrativos de conteúdo positivo, mas tratando-se de atos de conteúdo negativo o modo de reação será já a ação de condenação à prática de ato devido (vd. arts. 51.º, n.º 4, 66.º, n.º 1 e 67.º, n.º 1, al. b) do CPTA). O objeto do processo é, neste caso, a pretensão do interessado. Ou seja, o processo dirige-se à condenação da Administração na prática de um ato que, desde logo, dê satisfação à pretensão do A., não se limitando o Tribunal a devolver a questão ao órgão administrativo competente, mas pronunciando -se sobre a pretensão material do interessado].
Portanto, apenas a parte em que os Requerentes pedem a autorização provisória à interessada para a exploração e circulação do comboio é que seria apta a conceder a sua pretensão, porque implica que o Tribunal verifique os requisitos de que depende essa autorização.
A questão que se coloca é a de saber se pela resolução da questão em apreço, nesta sede, não se estará a retirar a utilidade da ação principal a interpor.
Recorde-se que uma característica fundamental da tutela cautelar é a sua provisoriedade, pois que não visa a resolução do litígio, estando vedado ao Tribunal conceder, através de uma providência cautelar, aquilo que só a sentença final pode proporcionar, sendo instrumental desta.
Na verdade, por força da sua natureza, a tutela provisória não só não pode dar mais do que se obterá com a ação principal, como nem sequer pode produzir o mesmo efeito a título definitivo, com o que resultaria inutilizada a decisão a proferir no processo relativamente ao qual está em relação de instrumentalidade. O requisito da “instrumentalidade” dos procedimentos cautelares exige, pois, uma vinculação objetiva à ação principal, ou seja, uma identidade objetiva de tutela jurisdicional em ambas as lides – provisória na lide cautelar, definitiva na ação principal – de molde a que a decisão cautelar seja instrumental e garante da utilidade da decisão a proferir na ação.
Por seu lado, a provisoriedade da tutela cautelar impede que o tribunal adote, como providência cautelar, uma regulação que dê resposta à questão de fundo sobre a qual versa o litígio, desse modo inutilizando o processo em que ele é objeto de discussão.
Veja-se, a este propósito o disposto Acórdão do TCA Sul de 07/04/2005, proc. n.º 514/2005: "II - Nas providências antecipatórias, o pedido formulado não pode exceder os limites da pretensão formulada no processo principal, nem obter um efeito que corresponda ao provimento antecipado do pedido de mérito ou o torne irreversível".
Pretendendo os Requerentes que lhe seja concedida autorização provisória de circulação de comboio, pois que entendem que se verificam os requisitos para tanto exigidos, é em sede de ação principal que tais exigências têm de ser verificadas, a fim de se conceder aos Requerente uma tutela definitiva, que os coloque, para o futuro, na situação que pretendem, pondo termo à questão.
Pelo que se verifica que não poderão os Requerente obter, nesta sede, o que poderá apenas obter, a título definitivo, na ação principal.
Nestes termos, não poderá a ação proceder, sem necessidade de mais considerações, ficando prejudicado o conhecimento dos requisitos e demais vícios invocados.»

Os recorrentes insurgem-se contra o assim decidido, sustentando ter a sentença recorrida incorrido em erro de julgamento, por incorreta aplicação da lei, com violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva ínsito nos artigos 20º e 268°, nº 4, da CRP, com afloramentos nos artigos 2°, nº 1, e 112º, nº 1, do CPTA, sustentando em suma, entre o demais, que é possível solicitar a adoção de providência cautelar destinada à obtenção de autorização provisória para iniciar uma atividade, como é o caso, sem que isso exceda os limites da pretensão a formular no processo principal, ou sem que isso retire utilidade à ação principal.
E com efeito, não pode ser mantido o decidido na sentença recorrida.
É certo que a razão de ser do processo cautelar é a de permitir, em concretização do direito a uma tutela judicial efetiva, constitucionalmente consagrado no artigo 268º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, a decretação judicial de medidas cautelares adequadas a precaver os direitos ou interesses legalmente protegidos dos interessados, enquanto não é definitivamente decidida a causa principal. A tutela cautelar visa apenas assegurar o efeito útil de uma sentença a proferir em sede de ação principal, regulando provisoriamente a situação sob litígio até que seja definitivamente decidida, naquela ação, a contenda que opõe as partes. Razão pela qual se exige que as medidas cautelares cumpram as características de instrumentalidade e provisoriedade.
Mas é precisamente por os processos cautelares terem função instrumental, destinando-se a assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo principal – o que tem por objeto a decisão sobre o mérito do litígio – que a lei faz depender a concessão de providência cautelar da verificação de uma situação de periculum in mora, em qualquer das suas duas vertentes aludidas: “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado” ou a “produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal”. Como refere Mário Aroso de Almeida, inO Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, Coimbra, Fevereiro 2003, pág. 260, a propósito do periculum in mora para efeitos de concessão de uma providência cautelar no âmbito do novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos, “ela (a providência cautelar) deve ser concedida desde que os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade. (...) A providência deve também ser concedida (...) quando, embora não seja de prever que a reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade se tornará impossível, os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, essa reintegração no plano dos factos será difícil, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente.”.
Nos termos das disposições conjugadas das alíneas a), b) e c) do nº 1 e do nº 2 do artigo 120º do CPTA as providências cautelares são adotadas quando seja evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal” (alínea a)) ou quando estando em causa a adoção de uma providência conservatória, haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito” (alínea b)), ou “quando, estando em causa a adoção de uma providência antecipatória, haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente pretende ver reconhecidos no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente” (alínea c)) e desde que, nestes dois últimos casos, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão não se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências (nº 2).
Esses são os requisitos de que depende a concessão de uma providência cautelar.
Na situação dos autos, os recorrentes pediram no requerimento inicial do processo cautelar a decretação das seguintes providências cautelares que assim enunciaram:
- providência cautelar de «suspensão da eficácia do ato administrativo consubstanciado na decisão, datada de 11/09/2014, proferida pela Vice-Presidente do Município do Funchal, nos termos da qual indeferiu o pedido de exploração e circulação de um comboio turístico no concelho do Funchal» (vertido no Doc. nº 16 que juntaram com o seu requerimento inicial);
- providência cautelar de «autorização provisória à interessada para a respetiva exploração e circulação do mesmo no circuito considerado viável nos termos da decisão do Requerido de 09/12/2013 (cfr. infra doc. 5) e dos pareceres favoráveis do Município da Câmara de Lobos e da Direção Regional das Estradas».
Sendo que o processo cautelar foi instaurado previamente à instauração da respetiva ação principal, que os Requerentes indicaram no seu requerimento inicial tratar-se de ação administrativa especial destinada «à declaração da nulidade do identificado ato cuja suspensão de eficácia é requerida, e pedidos conexos.
Como corretamente se decidiu na sentença recorrida (não sendo, ademais, nessa parte colocada em crise pelos recorrentes) a providência cautelar de suspensão de eficácia do identificado despacho de 11/09/2014, é manifestamente inadequada aos fins pretendidos pelos Requerentes, atenta a circunstância de se tratar de ato de indeferimento de pedido de autorização, não produzindo no caso, a mera suspensão de eficácia daquele ato de indeferimento (consubstanciando uma recusa da pretensão dirigida à Administração) qualquer efeito útil.
Mas ele será alcançável através de providência cautelar que permita (provisoriamente) a exploração e circulação do dito comboio turístico no circuito indicado. Providência que foi também concretamente requerida pelos recorrentes no seu requerimento inicial.
Como se trata de uma providência antecipatória, para que a mesma seja concedida é necessário, à luz do disposto no artigo 120º nº 1 alínea c) do CPTA, para além do requisito do periculum in mora, que pode assumir uma das duas vertentes “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado” ou a “produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal”, assim ali aludidas, que seja “provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente” (sem prejuízo, claro está, da ponderação a que caiba proceder nos termos do nº 2 do artigo 120º do CPTA).
Sem que tenha averiguado da verificação de tais requisitos, cuja apreciação considerou, aliás, prejudicada, a Mmª Juiz do Tribunal a quo julgou improcedente a pretensão cautelar por faltar a esta concreta segunda providência cautelar – a autorização provisória para a exploração e circulação do comboio turístico no circuito identificado – a caraterística da provisoriedade, entendendo que «pretendendo os Requerentes que lhe seja concedida autorização provisória de circulação de comboio, pois que entendem que se verificam os requisitos para tanto exigidos, é em sede de ação principal que tais exigências têm de ser verificadas, a fim de se conceder aos Requerente uma tutela definitiva, que os coloque, para o futuro, na situação que pretendem, pondo termo à questão», para concluir não poderem os Requerente «obter, nesta sede, o que poderá apenas obter, a título definitivo, na ação principal».
Ora, à luz do disposto no artigos 112º nºs 1 e 2 do CPTA é possível solicitar a adoção de providência cautelar destinada à obtenção de autorização provisória para iniciar uma atividade, como é o caso, sem que isso (por si) exceda os limites da pretensão a formular no processo principal, ou sem que isso retire utilidade à ação principal, como bem sustentam os recorrentes.
E, como é bom de ver, é desde logo mencionada na enunciação exemplificativa contida no nº 2 do artigo 112º do CPTA, a possibilidade de serem adotadas providências cautelares de autorização provisória para iniciar ou prosseguir uma atividade ou adotar uma conduta (alínea d) do nº 2 do artigo 120º do CPTA).
E não é a mera circunstância (genérica) de ser requerida uma providência desse tipo (destinada a assegurar o efeito útil da ação principal), que retira o caráter provisório à medida cautelar esvaziando ou esgotando o mérito da ação principal (essa sim destinada a decidir, em definitivo, a pretensão material dos interessados).
É perante o caso concreto, e após aferir da verificação dos requisitos para o decretamento de uma providência cautelar (adequada a assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo principal – cfr. nº 1 do artigo 112º do CPTA), que o Tribunal há-de aferir se por a concreta providência requerida esvaziar a ação principal, não pode ser deferida tout court, impondo-se então, em tal caso, averiguar da possibilidade de ser decretada providência cautelar diversa da requerida, mormente regulando provisoriamente a situação jurídica, ou temperando a providência requerida com outras medidas, já que as providências cautelares a adotar devem limitar-se ao necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos pelo requerente, podendo o tribunal, ouvidas as partes, “adotar outra ou outras providências, em cumulação ou em substituição daquela ou daquelas que tenham sido concretamente requeridas, quando tal se revele adequado” (cfr. nº 3 do artigo 120º do CPTA).
Pelo que não só não estavam os recorrentes impedidos de requerem, como fizeram, a decretação de providência cautelar de autorização provisória para a exploração e circulação do comboio turístico no circuito identificado, como não podia o Tribunal a quo, à partida, abstendo-se de aferir da verificação, em concreto, dos requisitos enunciados no artigo 120º do CPTA para a decretação da providência, indeferi-la com base na falta do seu carater provisório.
Como bem sustentam os recorrentes, a providência requerida, de autorização provisória, não só tem cabimento como não se destina a definir em termos finais a pretensão dos Requerentes objeto do processo principal.
Claro que se porá a questão de a execução se tornar definitiva pelo período de tempo em que durar a medida cautelar. E foi nessa dimensão que foi colocada a questão pela entidade requerida (vide artigos 97º a 99º da contestação da entidade requerida).
Mas salvo nas situações em que seja manifesta (caso em que deverá ser liminarmente rejeitada a providência cautelar – cfr. artigo 116º nº 2 alínea d) do CPTA) a impossibilidade de ser decretada uma concreta providência cautelar tal como foi requerida por a mesma retirar o efeito útil ao processo principal integra a apreciação do mérito do processo cautelar, não deve obstar à aferição dos respetivos requisitos, nem lhe deve ser antecipada, antes estando deles dependente.
Só perante as circunstâncias do caso concreto, apuradas pelo Tribunal, poderá ser tirada tal conclusão. E feita ela, então, há-de o Tribunal encontrar uma solução adequada a acautelar os interesses em jogo, adotando outra ou outras providências, em cumulação ou em substituição daquela ou daquelas que tenham sido concretamente requeridas.
Nada disso foi feito.
Razão pela qual não pode manter-se a sentença recorrida, merecendo provimento, nesta parte, o recurso, revogando-se, com tal fundamento, a sentença recorrida.
Devendo, por conseguinte, os autos baixar ao Tribunal a quo para que se decida do mérito da pretensão cautelar, com aferição dos respetivos requisitos, após instrução da causa, se a tanto entretanto nada obstar.
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IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em:
a) negar provimento ao recurso jurisdicional dirigido ao despacho (de fls. 277 ss.) respeitante à declaração de ineficácia de atos de execução indevida, confirmando-o;
b) conceder provimento ao recurso jurisdicional dirigido à sentença de 28/11/2014 (de fls. 280 ss.), revogando-se a sentença recorrida, e baixando os autos ao Tribunal a quo para que se decida do mérito da pretensão cautelar, com aferição dos respetivos requisitos, após instrução da causa, se a tanto entretanto nada obstar.
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Custas nesta instância pelo Recorrido.
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Notifique.
D.N.
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Lisboa, 26 de Fevereiro de 2015

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Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora)


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António Paulo Esteves Aguiar de Vasconcelos



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Pedro José Marchão Marques