Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03903/10
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/04/2010
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IRS
PRESSUPOSTOS PARA MÉTODOS INDIRECTOS
ERRADA QUANTIFICAÇÃO
Sumário:I) -O recurso a métodos indiciários para a determinação do imposto é uma faculdade que assiste ao Fisco, com a margem de livre apreciação conferida pelos art.ºs 51.º e 52.º do CIRC, ex vi dos artºs 31.º e segs do CIRS e 87º e ss da LGT quando haja razões fundadas para concluir que não é possível a comprovação e a quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável nas situações que estão que estão expressamente tipificadas no CIRC e que assumem um carácter excepcional.

II) -Tem por isso a AF de demonstrar, sem margens para dúvidas, a existência de erros, omissões ou inexactidões na contabilidade da impugnante, já que a previsão do artº 51º do CIRC aponta para a necessidade de recorrer a presunções ou estimativas por carência de elementos que permitam apurar claramente o imposto, procedendo à rectificação de declarações ou à correcção oficiosa, de acordo com os artº. 52º do mesmo Código.

III) - Tendo a AT adoptado o recurso a métodos indiciários para determinar o lucro tributável do contribuinte, compete-lhe demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação com recurso a tais métodos e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação.

IV) -Em tal situação, porque em relação à quantificação com recurso a métodos indiciários, pela sua própria natureza, não se pode exigir a mesma precisão que na quantificação feita com base na declaração do contribuinte, é exigível a este a prova de que os elementos utilizados pela AT ou o método que utilizou são errados.

V) -O contribuinte não demonstra o erro na quantificação do lucro tributável se não consegue provar, como alegou, que um dos pressupostos factuais utilizados excede o realmente verificado e, pelo contrário, a prova apresentada confirma o acerto desse facto que até lhe é favorável.

VI) -Para determinação da matéria colectável por estimativas ou presunções podem ser utilizados quaisquer meios, designadamente as margens de lucro brutas de custo do sector, Índices de rentabilidade, etc., na falta de outros elementos colocados à disposição da AF e directamente recolhidos da actividade do contribuinte.

VII) -Não se verifica a errada quantificação do apuramento do imposto por métodos indirectos, quando o critério utilizado pela AT se revela adequado e apto para esse fim e o contribuinte não logra provar, no caso, qualquer erro ou excesso nessa quantificação;
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:

1. A FAZENDA PÚBLICA, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A..., veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:
“I. A douta sentença ora recorrida entendeu que:
"(...) Ora, no relatório da Inspecção, nada vem dito, (...), que se possa aproximar das indicações de fundamentação Legalmente exigidas.
Nada vem, aí, apontado quanto à impossibilidade de comprovar e quantificar directamente a matéria tributável, nem quanto ao afastamento da matéria tributável dos indicadores objectivos da actividade de base científica, nem se indica a sequência de prejuízos fiscais relevantes durante três anos consecutivos. Aliás, nem se refere a contabilidade e a sua credibilidade, nem se apontam indicadores objectivos da actividade, nem vêm indicados três exercícios com prejuízos.
Do que fica dito, não pode deixar de se concluir que não se mostra legitimado o recurso a métodos indirectos para a determinação da matéria colectável do Impugnante, em sede de IRS, na medida em que se não - que impossibilitasse a determinação directa do mesmo. Tal comprovação era, de resto, o primeiro aspecto a ser observado e explicado e tal não aconteceu."
II. Ora, do Relatório de Inspecção consta, devidamente fundamentada, a justificação do recurso a métodos indiciários;
III. O Despacho proferido na sequência da acção inspectiva efectuada ao impugnante, refere: " (...) verificam-se os pressupostos formais e legais, conforme alínea b) do art. 87° da LGT, para a avaliação indirecta da matéria tributável do IRS, bem como do IVA apurado em f alta nos termos do art. 84° do CIVA, sendo os rendimentos líquidos, de € 9.981,76, e de € 11.709,93, com referência aos exercícios de 2000 e 2001, respectivamente, e o IVA nos montantes de € 520,12 e 537,74, respectivamente, com referência aos mesmos exercícios, determinados com recurso à aplicação de métodos indirectos, nos termos da alínea a) do art. 88° da citada Lei, que fixo, nos termos da alínea a) do n° 2 do art. 66°do CIRS, e art. 84°do CIVA."
IV. Assim, o recurso a métodos indirectos surge em consequência da impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, pressuposto para aplicar os referidos métodos, nos termos da alínea b) do art. 87° da LGT;
V. No caso concreto, detectou-se que a contabilidade não estava organizada nos termos do art. 44° CIVA, tal como vem descrito no Relatório de Inspecção (cfr. quadro OS do Pedido de Reembolso e ponto 3.4 do Relatório): "o sistema de contabilidade não satisfaz os requisitos adequados ao correcto apuramento e fiscalização do imposto, indiciando omissões, quer ao nível do registo dos proveitos, quer ao nível dos custos relevados, não reflectindo de forma verdadeira e exacta a situação do contribuinte e portanto o resultado efectivamente obtido, infringindo o estatuído no art. 37° do CIRS (na redacção em vigor no ano de 2000) e no art. 28° do CIRS (na redacção em vigor no ano de 2001.)" (negrito nosso);
VI. De acordo com todos os elementos referidos no capítulo IV do Relatório de Inspecção 'Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos', onde constam os motivos que conduziram ao recurso à aplicação de métodos indirectos, concluiu pela impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável e procedeu-se ao cálculo do lucro tributável por métodos indirectos, de acordo com o preceituado nos arts. 38° do CIRS (art. 39°, após a remuneração resultante do decreto-lei nc. 198/2001, de 3 de Julho), 51° do CIRC (art. 52°, após a renumeração resultante do decreto-lei nc. 198/2001, de 3 de Julho, e actualmente, após a produção de efeitos do decreto-lei n°. 159/2009, de 13 de Julho, art. 57°) 6 84° do CIVA (art. 90°, após a renumeraçao resultante do decreto-lei n°. 102/2008, de 20 de Junho), conforme capítulo V do Relatório de Inspecção - 'Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos';
VII. O n°. 3 do art. 74° da LGT estabelece uma repartição do ónus da prova, em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, competindo à Administração Tributária (A.T.) o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação e ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação;
Ora, de acordo com os elementos constantes dos autos, verifica-se que a A.T. cumpriu com o ónus que sobre si recaía e provou que se verificavam os pressupostos que legitimam o recurso a métodos indiciários;
VIII. Numa situação de sucessivas omissões de documentos relativos a proveitos e a custos durante dois anos consecutivos (2000 e 2001), de facturação com graves omissões e inexactidões (cfr. fis. 104 do processo administrativo), é absolutamente pacífico que terá de se considerar estarem reunidos os pressupostos da aplicação de métodos de avaliação indirecta;
IX. Neste sentido atente-se no douto Acórdão do TCAS, de 2008/10/21, proferido no âmbito do proc. n°. 02018/07 (disponível em www.dgsi.pt):
"7. Verificam-se os pressupostos para o imposto ser apurado pela AT com o recurso a métodos indirectos, quando através da contabilidade não é possível alcançar tal desiderato, designadamente quanto aos proveitos;
2. Não se verifica a errada quantificação do apuramento do imposto por métodos indirectos, quando o critério utilizado pela AT se revela adequado e apto para esse fim e o contribuinte não logra provar, no caso, qualquer erro ou excesso nessa quantificação;
3. Não padece da falta de fundamentação formal a liquidação adicional de IRS com recurso a métodos indirectos, quando a fundamentação constante do relatório da inspecção tributária, permite ao contribuinte apreender, de forma clara, suficiente e congruente, a motivação por que tal liquidação teve lugar; (...)"
X.E também nos doutos Acórdãos proferidos pelo TCAS, em 2009/03/10, em 2008/04/01 e em 2007/11/14, no âmbito dos procs. n°. 02409/08, 02076/07 e 02016/07, respectivamente, (todos disponíveis em www.dgsi.pt)
XI. Assim, só podemos concluir pela correcta utilização e fundamentação dos critérios e métodos utilizados pela AT, não tendo o impugnante demonstrado que a realidade fosse distinta do resultado a que se chegou com a utilização de tais critérios, nem que tenha havido manifesto excesso na matéria tributável quantificada;
XII. Pelo que, tendo a matéria tributável sido efectuada através de avaliação indirecta e não tendo sido demonstrados factos concretos que pusessem em dúvida a razoabilidade do critério e métodos utilizados, foi violado o disposto nos arts. 74°, n°. 3, a alínea b) do art. 87 e a alínea b) do art. 88°, todos da LGT.
Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser julgado procedente anulando-se a douta decisão em apreço, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.”
Não foram apresentadas contra-alegações.
O EPGA pronunciou-se pelo provimento do recurso pelas razões a que infra se fará alusão.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
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2. -Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A. Durante o ano de 2003, o Impugnante foi sujeito a uma acção de fiscalização, a qual incidiu, além do mais, sobre o IRS dos exercícios de 2000 e de 2001, no termo da qual foram propostas correcções àquele imposto, no montante de €3 562,29, relativamente a 2000 e de €4 768,48, relativamente a 2001- fls 44 e ss, do processo administrativo;
B. As correcções efectuadas tiveram na sua base o recurso a métodos indirectos de avaliação, tendo a Administração Fiscal explicado do seguinte modo o recurso a tal método de avaliação (cfr. relatório de inspecção junto ao PAT a fls. 44 e ss):
C. «O sujeito passivo encontra-se permanentemente em crédito de IVA, resultando o reembolso de IVA solicitado essencialmente da dedução efectuada pela aquisição do veículo "QJ-78-23", a qual ascendeu a €1087,12, tendo ocorrido em 31/01/1996.
Numa apreciação aos valores indicados, constata-se que o sujeito passivo apresenta regularmente na rubrica "serviços prestados" valores abaixo dos que se poderão considerar normais para a actividade de taxista na área de Lisboa, indicando os montantes de €16 513,91, €23 350,53 e €15 305,02, para os anos de 1999, 2000 e 2001, respectivamente, sendo que, conforme declarou, a partir de Abril de 2000 passou a dispor de 2 turnos (...) O montante de quilómetros percorridos de 17 de Novembro de 1999 a 20 de Novembro de 2001 ascendeu a 169 610 Km, justificando um andamento médio anual acima dos 70 000Km, conforme também é referido no relatório do grupo de trabalho criado por Despacho do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de 1997/01/09 (...)
Da análise dos consumos médios aos 100 Km, verificam-se indícios de omissão de custos de gasóleo. Inferindo-se que o consumo médio apurado não corresponderá à realidade. Tendo o Sr. José Fragueiro declarado que o consumo médio da viatura ronda os 9 litros.
Verificando-se assim, de acordo com o acima exposto, a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, justifica-se a determinação do lucro tributável por métodos indirectos, de acordo com o consagrado no n° 1 do art. 38° do CIRS art. 39° após a renumeração resultante do decreto-lei 198/2001, de 3/07), determinando-se o valor tributável nos termos do art. 51° do código do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (CIRC) (art. 52° após a renumeração resultante do decreto-lei 198/2001 de 3/07)»
D. De acordo com o relatório da inspecção, a Administração Tributária calculou o rendimento tributável do Impugnante com base num estudo elaborado por um Grupo de Trabalho constituído por elementos da Administração Tributária e da Associação Nacional de Transportes Rodoviários em Automóveis Ligeiros (ANTRAL) - cfr- relatório de inspecção, junto ao PAT;
E. Em resultado da inspecção efectuada foi emitida, em 19-11-04, a liquidação adicional de IRS n° 5334263187, respeitante ao IRS de 2000, no montante de €1610,50- f Is. 27 do PAT);
F. Em resultado da inspecção efectuada foi emitida, em 03-06-2005, a liquidação adicional de IRS n° 5113301367, respeitante ao IRS de 2001, no montante de € 740,85 - fls. 28 do PAT);
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Inexistem factos não provados com interesse para a decisão da causa.
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A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados, que constam dos autos.
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3. -A questão decidenda consiste em saber se no caso sub judice se verificam os pressupostos para a matéria tributável ser apurada por métodos indirectos e se ocorre erro ou excesso de quantificação dessa matéria apurada por tais métodos.
O Mº juiz «a quo» fundamentou a procedência em que, no essencial, resulta do probatório, em particular dos factos retirados do relatório de inspecção, que a Administração Tributária fundamentou o recurso à aplicação de métodos indirectos, invocando o artigo 38° do CIRS, posteriormente, art. 39°, e, bem assim, os arts. 85°/1 e 87° e segs. da LGT), mas não especificou se se está perante a impossibilidade de comprovação e quantificação exacta e directa da matéria tributável, se se trata de um caso em que a matéria tributável se afasta, sem razão justificada, mais de 30 por cento para menos ou, durante três anos seguidos, mais de 15 por cento para menos, da que resultaria da aplicação dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica referidos na LGT ou se, sem razão justificada, foram apresentados resultados tributáveis nulos ou prejuízos fiscais durante três anos consecutivos (cfr. artigo 87° da LGT, para o qual remete o art. 39° do CIRS).
Mais aduziu o julgador que o relatório de inspecção refere, apenas, que, nos anos de 2000 e de 2001, o Impugnante apresentou receitas abaixo das normais para a actividade de táxi em Lisboa, não se especificando no relatório da Inspecção, nem se descortinando imediatamente, pois não está esclarecido, se se está perante o regime simplificado, se perante a impossibilidade de comprovação e quantificação exacta e directa da matéria tributável, se se trata de um caso em que a matéria tributável se afasta, sem razão justificada, mais de 30 para menos ou, durante três anos seguidos, mais de 15 por cento para menos, da que resultaria da aplicação dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica referidos na LGT ou se, sem razão justificada, foram apresentados resultados tributáveis nulos ou prejuízos fiscais durante três anos consecutivos, como se prevê no art. 87° da LGT.
Refere, ainda o Mº juiz recorrido que os parágrafos transcritos em C dos factos provados são meramente conclusivos já que, por um lado, trata-se do mero enquadramento legal, incompleto, onde assenta a actuação da Administração Tributária, e, por outro, não se especificam aí, em sede de fundamentação, os factos que, do ponto de vista do relatório, levam a concluir, precisamente, que os valores de receitas nos anos em referência foram abaixo dos normais para a actividade de táxi em Lisboa. Não resulta do relatório quais são os valores normais de receitas para a actividade de táxi em Lisboa e, muito menos, em que medida as receitas do Impugnante são mais baixas.
E como era à Administração Tributária que competia demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indirectos e, feita essa prova, recaía sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação, conclui o Mº juiz que, faltando os pressupostos de que a lei - artigos 87° e ss da LGT - faz depender o recurso (excepcional) a métodos indirectos, a liquidação impugnada não se pode manter, devendo ser anulada, o que se determinará.
Contra o assim fundamentado e decidido se insurge a recorrente FªPª pelos fundamentos condensados nas transcritas conclusões e que, no fundamental, apontam para que in casu se verificam os pressupostos para a aplicação dos métodos indirectos (avaliação indirecta), não demonstrando o recorrente, como lhe competia, que esteja errado o critério que presidiu à quantificação operada.
Quid juris?
Conforme se vê do relatório de exame à escrita da impugnante e do procedimento de revisão e foi levado ao probatório, relativamente aos exercícios dos anos de 2001 e 2001 e à tributação em IRS, aqui em causa, a AF motivou-se, exclusivamente, de direito e de facto, para aplicar os métodos indirectos na impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria colectável, por via de inexistência ou insuficiência de elementos contabilísticos (fls. 44 e 52 do apenso PAT), invocando os artigos 87.°/b) e 88.°/a) da LGT.
Substanciando, no RIT e no procedimento de revisão em que se suportam as liquidações impugnadas, a AT refere os factos concretos que evidenciam a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria tributável, mormente os que se mencionam a fls. 52,53, 99 e 100 do apenso PAT segundo os quais há indícios de omissão de custos (gasóleo) e de proveitos, tendo nomeadamente em conta o número de Kms percorridos pelo recorrido (média anual acima dos 70.000 Kms), Kms obtidos a partir de dados fornecidos pelos centros de inspecção periódica, tendo por base os gastos de combustível declarados pelo sujeito passivo.
O certo é que o impugnante, não obstante compute em 35-40%, em termos de Kms percorridos, a utilização do veículo a título particular, no entanto não fez qualquer prova desse facto alegado, antes se apurando (cfr. RIT, a fls. 64) que a viatura foi adquirida para o exercício da sua actividade, tendo o recorrente deduzido o IVA pela totalidade, procedido à amortização pela totalidade, e, ainda, à relevação global dos custos com este incorrido, donde se pode depreender uma utilização exclusiva no exercício da actividade.
Assim sendo e como também conclui o EPGA no seu douto parecer, a AT demonstra a verificação dos pressupostos legais para a determinação da matéria tributável, vício que o recorrido imputa aos actos sindicados.
Em termos gerais, para que a AF se encontre legitimada a lançar mão do método presuntivo no apuramento do valor tributável, em sede de IRC/IRS, não basta que depare com anomalias e incorrecções na contabilidade dos contribuintes, era ainda indispensável que, cumulativamente, tais anomalias e incorrecções inviabilizassem a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável condicionalismo que se impõe, face ao preceituado nos arts. 85°/1 e 87° e segs. da LGT.
Na verdade e como decorre do disposto no artº 75º da LGT, vigora o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, segundo o qual o mesmo era efectuado com base nos elementos indispensáveis fornecidos pelos contribuintes.
Caso estes tenham contabilidade organizada segundo a lei comercial ou fiscal, como reza o artº 75º da LGT, presume-se a veracidade dos dados e apuramentos operados, excepto se se verificarem erros, inexactidões ou outros fundados indícios de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte.
Contudo, a AF tem o poder de controle e fiscalização das aludidas declarações, para a concretização do qual poderá recorrer as elementos da contabilidade do sujeito passivo ou de outros elementos disponíveis, fazendo a correcção das declarações e/ou efectuando liquidações oficiosas ou adicionais observando os prazo de caducidade, poderes que lhe estão legalmente conferidos pelo artº 75º nº2 e 87º e ss da LGT.
O recurso à avaliação indirecta para a determinação do imposto é uma faculdade que assiste ao Fisco, com a margem de livre apreciação conferida pelos art.ºs 51.º e 52.º do CIRC, ex vi dos artºs 31.º e segs do CIRS e 87º e ss da LGT, quando haja razões fundadas para concluir que os valores registados e declarados referentes ao tributo, não correspondem à realidade das transmissões de bens efectuadas.
Instituem aqueles normativos o poder de a AF proceder à liquidação adicional, estabelecendo as condições do seu exercício, quais sejam:- figuração nas declarações dos sujeitos passivos de um imposto inferior ou de uma dedução superior aos devidos e demonstração, i. é, declaração externadora justificativa de tal facto.
Em suma: conjugando o disposto nos citados artigos, deve concluir-se que a AF poderá recorrer ao critério de apuramento do volume de negócios por estimativas ou presunções, dependendo unicamente dos seguintes condicionalismos:
a)- Externação de elementos por parte da AT que justifiquem que nas declarações apresentadas figura um imposto inferior ao devido e
b)- carência de elementos na escrita comercial ou discrepância da mesma com a realidade económica que permitam apurar claramente o imposto.
Ora, como veio de provar-se, as alterações aos valores declarados pelao impugnante foram operadas a coberto de tais normativos, em virtude de se ter considerado que a escrita daquele não se encontrava devidamente organizada por forma a permitir um conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao cálculo do imposto. Assim, estaria justificado o recurso ao método presuntivo.
Na verdade, a impugnante estava obrigada a manter a sua contabilidade organizada de acordo com os princípios consagrados no POC e impostos pelo artº 44º do CIVA.
Ora, foi porque consideraram que tal não sucedia que os serviços competentes da AF efectuaram as liquidações oficiosas ora em crise.
Com efeito, como consta dos documentos que formalizaram o acto tributário, os actos impugnados foram motivados pelas irregularidades apontadas e de carácter contabilístico.
No probatório alicerçado nas informações oficiais prestadas pelos Serviços de Fiscalização Tributária e que serviu de fundamentação da fixação definitiva do imposto em causa, deu-se como assente que a determinação do imposto em falta foi efectuada no pressuposto de que a escrita do ora impugnante não reflectia a veracidade da sua actividade, ou seja, as liquidações em causa foram operadas com recurso ao método indirecto, actuado em sede de fiscalização à mesma.
De acordo com a norma ínsita no artº 87º b) da LGT « A avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de … impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável de qualquer imposto», resultante das anomalias tipificadas no artº 88º da mesma Lei.
De todo o exposto decorre que é à AF que cabe a demonstração da verificação dos pressupostos que a legitimem a lançar mão do aludido método indirecto, ou seja, de que, ao que aqui nos importa, a contabilidade do contribuinte padece de anomalias que afectam a sua credibilidade, por forma a que se torne inviável a quantificação directa, imediata e exacta da matéria colectável. Só verificados estes pressupostos se transfere para o contribuinte o ónus de demonstrar que, ao invés do sustentado pela AF, aqueles pressupostos se não verificam, ou que, verificando-se, não permitem o apuramento dos valores encontrados.
Do relatório dos SFT constante do autos e cujo conteúdo foi levado ao probatório, emerge que no decurso da acção inspectiva a AF constatou existir as situações anormais que ficaram descritas, dentro de um critério de comprovação criterioso donde se constatam factos mais que justificativos de que a contabilidade da firma não merece fiabilidade e de que através dos seus elementos não é possível quantificar de forma certa e exacta a matéria tributável dos vários exercícios em causa.
Ora todas estas circunstâncias estão comprovadas nos autos.
Destarte e em discordância com o Mº Juiz « a quo», tem de concluir-se pela verificação, no caso presente, dos necessários pressupostos legais à tributação da recorrente por recurso a métodos indiciários.
Tendo a AF concluído que perante as situações descritas estava impossibilitada de efectuar um controlo claro e inequívoco dos valores em causa e do lucro tributável para efeitos de IRS justificava-se que lançasse mão do método indirecto de determinação da matéria tributável, porque impossibilitada de usar os meios de prova directa para cumprir com o seu poder dever de liquidar, impossibilidade criada pela recorrente pelo não cumprimento de obrigações a que estava adstrita.
Não é, pois, verdade que os factos levados ao probatório e que o recorrente indica, tornassem desnecessária a aplicação dos métodos indiciários, antes resultando desses pontos para a Administração Fiscal a impossibilidade de utilizar os meios da empresa para fazer a quantificação directa e exacta no âmbito de uma contabilidade insegura, aqui e ali confusa e contraditória ou omissa. E, aqui chegados, o ónus da prova passou para o contribuinte (v. art. 342° do Código Civil).
Portanto, não infirmando estes fundamentos, ainda que tivesse total razão quanto aos restantes, sempre seria de manter a decisão de recurso à tributação indirecta feita, corrigida, claro está, quanto ao que, naqueles restantes, for conduta ilegal por parte da AF.
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O Mº juiz as especiais invocou as exigências de fundamentação que rodeiam as decisões de tributação por métodos indirectos, previstas no artigo 77°, n° 4 da LGT, nos termos do qual "/A decisão da tributação por métodos indirectos e com os fundamentos previstos na presente lei especificará os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria tributável, ou descreverá o afastamento da matéria tributável do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade de base cientifica, ou fará a descrição dos bens cuja propriedade ou fruição a lei considerar manifestações de fortuna relevantes, ou indicará a sequência de prejuízos fiscais relevantes, e indicará os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável".
E concluiu que no relatório da Inspecção, nada vem dito, como resulta de C dos factos provados, que se possa aproximar das indicações de fundamentação legalmente exigidas ou seja, quanto à impossibilidade de comprovar e quantificar directamente a matéria tributável, nem quanto ao afastamento da matéria tributável dos indicadores objectivos da actividade de base cientifica, nem se indica a sequência de prejuízos fiscais relevantes durante três anos consecutivos.
Porque assim, entendeu – erradamente, como já se demonstrou - que não se mostrava legitimado o recurso a métodos indirectos para a determinação da matéria colectável do Impugnante, em sede de IRS, e, consequentemente, que a Administração Tributária não demonstrou, como lhe competia, a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indirectos.
Ora, isso acarretou, na tese da sentença, que o contribuinte ficou eximido do ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação.
Mas, como concluímos que o recurso ao método indirecto estava justificado, impõe-se agora aferir se procede a questão do alegado erro ou excesso na quantificação da matéria tributável.
Tal como se afigura ao EPGA, também aqui nos parece existir razão à recorrente.
Com efeito, por força do disposto no artigo 344.°/2 do Código Civil e artigo 74.°/3 da LGT incumbe ao impugnante o ónus de demonstrar que houve excesso de quantificação da matéria colectável, sendo que, emergindo dúvida ela resolve-se a favor da Administração Tributária.
E o certo é que decorre do RIT que a AT, na determinação da matéria tributável utilizou um critério objectivo e fundamentado que o recorrido, a nosso ver, não logrou, fundadamente, infirmar.
Saliente-se, no ponto que o que é importante é fazer o apuramento por métodos claros e objectivos, bem como seguros.
E, se assim é, como não pode deixar de ser, porque a contabilidade do contribuinte não merecia credibilidade e não existiam outros dados relevantes e seguros, nada mais seguro do que recorrer aos estudos efectuados pela AF sobre o sector da actividade em que se insere a desenvolvida pela impugnante.
Na verdade e como resulta da MF provada, o montante de quilómetros percorridos de 17 de Novembro de 1999 a 20 de Novembro de 2001 ascendeu a 169 610 Km, justificando um andamento médio anual acima dos 70 000Km, conforme também é referido no relatório do grupo de trabalho criado por Despacho do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de 1997/01/09 e, da análise dos consumos médios aos 100 Km, verificam-se indícios de omissão de custos de gasóleo. Inferindo-se que o consumo médio apurado não corresponderá à realidade. Tendo o Sr. José Fragueiro declarado que o consumo médio da viatura ronda os 9 litros.
É que não basta, como o impugnante decerto saberá, pôr em dúvida a existência e quantificação do facto tributário, antes se tornando necessário provar factos que comprovem a alegada errónea quantificação da matéria tributária.
Ora, face aos factos alegados pelas AT sobre a sua contabilidade, caberia à impugnante trazer, e não trouxe salvo melhor opinião, novos elementos, credíveis, nomeadamente prova documental, que pudesse abalar a decisão da Comissão, que já reduziu, substancialmente, a matéria colectável.
Enfim, a impugnante não logrou provar o excesso na quantificação da matéria colectável apurada por métodos indiciários.
De acordo com o Acórdão deste TCA de 03/02/04, tirado no Recurso nº 785/03, a utilização de tal método presuntivo ou indiciário, traduz-se no recurso por banda da AT, a elementos de facto conhecidos que, utilizados segundo as regras da experiência, pautados por critérios de razoabilidade e normalidade, conduzem à extrapolação de outros desconhecidos que servem de suporte ao juízo valorativo extraído pela mesma.
Consequente e necessariamente tal conclusão não tem, na generalidade dos casos, de corresponder ao resultado de um raciocínio dedutivo, sustentado em elementos de facto concretos, mas tão só prováveis, justificando a utilização de parâmetros gerais comuns adequados àquele juízo valorativo que se impõe apurar.
Por outro lado, muito embora as situações que constituem os pressupostos que legitimam o recurso ao método indirecto de avaliação constituam as mais das vezes contra - ordenações fiscais/a aplicação de tais métodos não visa nunca a punição desses factos mas tão somente, nas palavras de Génova Galván, in La estimación indirecta, Tecnos, Madrid, 1985, «alcançar senão aquela certeza que o método directo atinge pelo menos atingir a máxima verosimilhança que seja possível alcançar no caso concreto através da utilização de inferências probabilísticas».
O recurso ao método indirecto está legitimado por força do princípio da capacidade contributiva que só se respeita fielmente quando se mede directamente a matéria tributável sendo por isso uma faculdade da AT no exercício do seu poder/dever de liquidar quando comprovadamente demonstre não poder por via directa alcançar o rendimento tributável.
Na senda do douto acórdão citado, para que assim não suceda, imperioso se torna que aquele a quem possa ser oposto o método em causa, faculte os elementos necessários e indispensáveis à decisão a tomar, de forma a que os resultados a que permitam chegar se mostrem reais, efectivos, concretos e credíveis, assim excluindo, necessariamente, a possibilidade da utilização de tais métodos.
Por outro lado, no caso de utilização de métodos indiciários, para que as extrapolações a que o mesmo venha a conduzir, se mostrem casuisticamente adequadas, bastará que se suportem na utilização de elementos obtidos segundo as regras da experiência, norteados pelos aludidos critérios de normalidade e de razoabilidade.
Caberá, então, àquele a quem o método em questão venha a ser oposto, e sendo caso disso, a demonstração que, no caso, a realidade é diversa do resultado a que conduziu a utilização das mencionadas regras da experiência, nomeadamente porque os critérios que as nortearam, não se mostram razoáveis e/ou normais.
No caso em apreço, o recorrente vem imputar à liquidação impugnada o erro nos seus pressupostos de facto apurados por métodos indiciários, pelo que agora aqui em sede de recurso, também se encontra em causa a errada quantificação.
Nesta medida, o ónus da prova da factualidade alegada pelas partes tem a natureza de ónus objectivo, por decorrência do principio da oficialidade, e não de ónus subjectivo tal como em sede de alegação, embora hoje este ónus subjectivo de alegação se apresente mitigado por disposição expressa do art.º 264.° n.º s 2 e 3 do CPC, que introduziu o conhecimento oficioso de factos instrumentais e complementares.
A consequência do ónus de prova objectivo é que vem a... suportar as desvantagens da incerteza do facto de que não tenha logrado prova, por via das partes ou do tribunal, a parte a quem interesse a aplicação da norma de que ele for pressuposto... cfr. Anselmo de Castro in Direito Processual Civil Declaratório, Almedina/1982, V-III, pág. 163.
Ora, em plena concordância o EPGA, entendemos que andou bem a AF, uma vez que a mesma parte de uma premissa correcta: de que a contabilidade da impugnante é incredível.
Destarte, como já se disse, o impugnante não devia limitar-se a alegar factos que pusessem em dúvida a existência e a quantificação do acto tributário, impondo-se-lhe cumprir o ónus probatório de tais factos, sem embargo de o juiz, no âmbito do seu poder - dever inquisitório, diligenciar também comprová-los - cfr. Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, in CPT, Comentado e Anotado, 3.ª Edição, anotação 8. ao art.° 121.°, págs. 267 e 268.
Volta a salientar-se que o apuramento da matéria tributável não está a ser efectuado directamente pela contabilidade do sujeito passivo, por falta de crédito desta, descredibilização que tanto vale para a contribuinte como para a AT, o que significa que a possível incerteza da quantificação da matéria colectável mais não é do que a normal consequência do próprio método presuntivo ou indiciário dessa quantificação, que lhe é inerente, surgindo como uma última ratio fisci para apuramento de uma matéria colectável que por culpa da contribuinte não foi apurada através da forma normal que é a sua escrita comerciai, mercê das deficiências que apresenta ou perante a sua falta pura e simples.
No caso, face aos elementos antes referidos, carreou a Administração Fiscal para os autos, dados certos e objectivos, baseados no relatório do exame à escrita.
Por sua vez, cabia à impugnante ter alegado e provado factos certos e concludentes que pusessem em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou aquele juízo de probabilidade elevado feito pela Administração Fiscal para prova do erro nessa quantificação por métodos indiciários. Na utilização de valores indiciários entende-se que a administração fiscal goza de uma margem de discricionariedade na sua quantificação, por ser ela que, pela sua continuada experiência e contacto com os operadores económicos, se encontra em melhor posição e com melhores dados para o efeito, e tendo em conta que se trata de valores necessariamente indicativos de médias generalizadas.
E por se tratar de uma margem de discricionariedade ela só pode ser jurisdicionalmente sindicável se inequivocamente, por si ou por elementos apresentados pelos interessados, se mostrar fora dos limites da razoabilidade.
Na verdade, o recorrido não trouxe qualquer dado concreto donde, para a situação em concreto, se pudesse concluir extravasados aqueles limites.
E, se é certo que nada obsta a que o Impugnante questione em sede de impugnação da liquidação dos tributos a fixação da matéria tributável com base em erro na quantificação, designadamente por erro quanto aos pressupostos de facto em que esta assentou, o que ficou dito permite concluir que também no que se refere à concreta quantificação da matéria colectável, não se vislumbra que a actuação da Administrarão Fiscal padeça de ilegalidade que invalide a liquidação impugnada.
É que, porque essa quantificação foi feita com recurso a métodos indiciários e ficando incólume a decisão de recorrer a esses métodos, é sobre o Contribuinte que recai o ónus de demonstrar o erro ou manifesto exagero desta quantificação (art. 100.º, n.º 3, do CPPT), não bastando que o mesmo crie dúvida sobre a quantificação do facto tributário. Dúvida sobre a quantificação existe sempre quando se recorre aos métodos indirectos.
Como salienta SALDANHA SANCHES, «o regime de dúvida razoável aplicado à prova indirecta levaria longe de mais, na medida em que a avaliação indirecta é sempre menos exacta da que é feita, nos termos legais, pelo contribuinte». Bem se compreende que assim seja, pois, como se expendeu no acórdão deste Tribunal de 22 de Maio de 2001, proferido no recurso com o n.º 4016/00, esta posição menos favorável do contribuinte compreende-se «porque a quantificação por presunção só a si lhe é imputável, pelo que o contribuinte, se queria ser tributado pelo lucro real, deveria ter uma contabilidade sã, que permitisse o controlo dos dados nela constante».
Se é pacífico que o recorrido podia em qualquer altura do procedimento demonstrar que houve erro na quantificação ou foi cometida qualquer ilegalidade ou preterição de formalidade que afectem a liquidação através de provas sérias e convincentes, não resta qualquer dúvida de que ele não ofereceu contraprova convincente.
Mas, como ficou fundamentado, os pressupostos legitimadores do recurso ao método presuntivo foram efectivamente comprovados o que, à míngua de contestação válida e credível, acarreta necessariamente a conclusão de que a AF ficou impossibilitada de calcular directamente a base tributável tanto mais que, como resulta da matéria de facto que foi dada como assente, o Recorrido não logrou provar sequer a existência de qualquer erro na quantificação efectuada por avaliação indirecta pois, sustentando embora que o critério deveria ter sido outro, toda a prova produzida indo no sentido de demonstrar que o valor adoptado pela AT é claro, justificado e razoável(1).
Sendo assim, e pelo mais que dos elementos de suporte dos actos impugnados resulta não se apura, com base em matéria de prova produzida pelo recorrido, que a quantificação da matéria tributável esteja errada, até porque não provaram aqueles outros elementos de facto melhores que conduzam a outra quantificação, tal como era seu ónus, em face do disposto no artigo 74°, n° 3 da LGT.
O impugnante não provou, como lhe competia, que os factos carreados pela Administração Fiscal no sentido de demonstrar aquela falta de fiabilidade dos elementos contabilísticos não eram verdadeiros.
Mais. Perante uma contabilidade que, manifestamente, não é fiável, não pode a impugnante pretender demonstrar que a quantificação lograda pela Administração Tributária está errada com base nessa mesma contabilidade.
A tributação através de métodos indiciários pressupõe, é inevitável e decorre da sua própria natureza, uma certa margem de falibilidade. Não é a mesma coisa que a determinação directa da matéria colectável.
Assim, porque não se trata de apuramento directo, é razoável e aceitável que a determinação das variáveis essenciais da tributação se façam através de amostragens representativas. Não se demonstrando, de modo claro e inequívoco, que os resultados obtidos são erróneos ou não se provando factos susceptíveis de fundar uma dúvida sobre tais resultados, deverá manter-se a tributação baseada em tais métodos indiciários.
Assim, não podemos de deixar de concordar com o EPGA, já que, a nosso ver, o recorrente acaba por se ater unicamente a aspectos que considera muito específicos dela própria desfocalizando a real situação, acima descrita, em que em que é claro que a quantificação directa da matéria colectável resulta inviável por razões que lhe são, em exclusivo, imputáveis quando é também certo que ela não demonstrou, com dados concretos, que os resultados a que chegou a Administração Fiscal se afaste, em medida desproporcionada, desrazoável e arbitrária da real medida das coisas.
Na verdade, o recorrido não trouxe qualquer dado concreto donde, para a situação em concreto, se pudesse concluir terem sido extravasados aqueles limites pois, extraindo-se do Relatório e das demais informações oficiais prestadas pela Administração fiscal que os valores considerados estão de acordo com o tipo de actividade desenvolvida pelo sujeito passivo, falece razão ao recorrido quando afirma que os critérios considerados se mostram aquém dos valores reais.
Procedem assim, todas as conclusões do recurso, sendo de lhe conceder provimento e de revogar a sentença recorrida que em sentido oposto decidiu.
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4. -Nestes termos, acorda-se, em conceder provimento ao recurso e em revogar a sentença recorrida e manter o acto impugnado.
Custas pelo recorrido na 1ª instância.
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Lisboa, 04/05/2010
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Aníbal Ferraz) –com declaração
Declarando que se deviam ter aditado ao probatório os factos evidenciadores da “impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria colectável (…)”.

1 - Cfr. a este propósito o douto Acórdão deste TCA de 20/01/04 , tirado no Recurso nº 1137/03, em que se expende: “O que, pelos vistos, se pretende é que, pela eventual consideração de outros factores, se substitua por outro critério os critérios ou o critério utilizado pela Administração Fiscal, sem que nos convençamos que este se revela injustificado ou inadequado ao caso.
É que a simples circunstância de a Administração Fiscal, no procedimento de apuramento do valor tributável, ter optado pela utilização de tal ou de tal critério, em vez de por um outro qualquer, achado (mormente pelo impugnante, ora recorrido) mais adequado ao caso, não faz com que seja errado o critério efectivamente utilizado pela Administração Fiscal - pois a lei não mostra preferência por qualquer dos critérios que elenca, nem esses critérios são exclusivos ou taxativos.
Não demonstrado (como não está) que sejam errados os critérios seguidos pela Administração Fiscal, não importa provar que outro critério poderia ser adoptado que não fosse errado também.
Verificados os pressupostos de aplicação de métodos indiciários como meio de apuramento do valor tributável, realmente não está em causa saber se outro critério era o melhor para o caso. O importante, e decisivo, é que o critério utilizado pela Administração Fiscal seja claro, justificado e razoável - ainda que ele não produza certezas sobre o valor tributável.
As certezas e as dúvidas sobre o valor tributável em casos deste tipo são apenas as co-naturais ao próprio acto de apuramento de um valor por meio de métodos indiciários, onde o valor encontrado é sempre um valor probabilístico e não um valor absolutamente certo.
De resto, a impugnante, ora recorrida, só de si própria pode queixar-se quanto à existência da falta de certeza sobre os factos tributários - pois que, por insuficiência de elementos de que devia dispor, é que não foi possível que a liquidação impugnada tivesse sido operada com base nos valores tributáveis reais (rectius: declarados).”