Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:55/06.4BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:02/25/2021
Relator:ISABEL FERNANDES
Descritores:IRC;
CUSTOS;
JUROS COMPENSATÓRIOS
Sumário:I – Em sede de IRC, o que releva para efeitos da comprovação e relevação fiscal de determinadas despesas, enquanto custos de exercício é, essencialmente a comprovação da sua efectiva realização por parte do sujeito passivo e a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul
I – RELATÓRIO

L... – E..., SA, veio deduzir Impugnação Judicial pedindo a anulação do impugnado na parte proporcional ao acréscimo ao lucro tributável das quantias de € 132.680,36 e 33.26484, ou seja, IRC e derrama de 56.819,63 bem como dos juros compensatórios de 406.036,28

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, por decisão de 16 de Dezembro de 2011, julgou parcialmente procedente a impugnação.

Não concordando com a sentença, a impugnante L... – E..., SA e a Fazenda Pública vieram interpor recurso da mesma.

A recorrente L... – E..., SA, nas suas alegações, formulou as seguintes conclusões:

«A) Na douta sentença recorrida foi dado como provado, no ponto 16., que a ora recorrente recebeu a liquidação de juros compensatórios em 28/10/2005, com o conteúdo de fls. 17 e 55 (ponto 15 do probatório), com base nos documentos juntos aos autos, que se resumem a prints internos de aplicações informáticas da Administração Tributárias, e informações retiradas do site dos CTT.

B) Os dados e elementos contidos nos prints extraídos de aplicações da AT são privativos desta, sem acesso aos contribuintes em geral, ou à recorrente em particular.

C) O teor de tais documentos apenas chegou ao conhecimento da recorrente em sede de processo judicial.

D) Do teor da demonstração da liquidação (docum. 18 junto à p.i.) recebida pela recorrente, nada consta quanto aos fundamentos de facto e de direito da liquidação dos juros compensatórios.

E) Ora, uma vez que o teor da liquidação dos juros apenas foi dado a conhecer à recorrente com a contestação, tal configura uma fundamentação “a posteriori” do acto de liquidação, a qual não é relevante, nem susceptível de sanar o acto tributável, como se refere no douto acórdão, proferido no processo n.º 00145/03, de 9/02/2006, do Tribunal Central Administrativo Norte (in www.dgsi.pt).

F) O nº 3 do artigo 38º do CPPT, para o qual remete o nº 1 do artigo 39º do CPPT, refere-se a “carta registada”.

G) Ora, como em parte alguma do CPPT se encontra regulado o regi- me das cartas registadas, o mesmo terá de ser procurado no D.L. n.º 176/88 de 18 de Maio, que aprova o Regulamento do Serviço Público de Correios.

H) Deste Regulamento dos Correios resulta que constitui um requisito essencial e imprescindível que a cada carta registada corresponda um recibo, o qual é entregue ao remetente e por sua vez, o levantamento subsequente, por parte do destinatário, da referida carta é também objecto de recibo, o qual fica na posse dos Serviços dos CTT.

I) Prova de depósito e assinatura de entrega que não foi feita em sede de impugnação, não sendo prova bastante a mera informação do registo no site dos CTT ou as informações internas e privativas da AT.

J) A recorrente entende que a informação interna dos prints informáticos, quer dos Serviços da Administração Fiscal, quer dos CTT, não constitui meio idóneo para provar a eficácia da notificação da liquidação e, assim, dar como provada o conhecimento da fundamentação da liquidação dos juros compensatórios.

L) Neste sentido foi já proferida a seguinte jurisprudência: acórdão da Secção Tributária do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 20 de Outubro de 2010, proferido no processo 0526/10, acórdão da Secção Tributária do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 21 de Janeiro de 2010, proferido no processo 00623/08.6BEBRG, acórdão da Secção Tributária do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 23 de Março de 2010, proferido no pro- cesso 03499/09, todos publicados no site www.dgsi.pt.

M) Por outro lado, conferir aos prints informáticos internos dos Serviços da Administração Fiscal e dos CTT a força probatória da notificação com carta registada representaria uma contradição e uma negação da própria essência das notificações. Com efeito, destinando-se as notificações a dar conhecimento dos fundamentos de facto e de direito e a tornar eficaz perante o próprio destinatário / contribuinte uma liquidação, a exclusão da existência de um elemento externo como é o caso do registo postal, transformaria e tornaria o processo de liquidação e cobrança do imposto num processo fechado e inacessível ao próprio contribuinte / destinatário, com a inerente perda do direito constitucional à notificação dos actos tributários.

N) Pelo que, não pode dar-se como provado que a recorrente foi notificada da liquidação dos juros compensatórios, e consequentemente, não pode dar-se como provado que a recorrente tomou conhecimento dos fundamentos, de facto e de direito, que presidiram àquela liquidação de juros.

O) Mas, mesmo que assim não se entenda, sempre se alega que o teor do print interno, com o título “Consultar Liquidação de Juros – Detalhe” (fls. 3 do print da AT), não contém uma fundamentação de facto e de direito sufi- ciente, clara ou congruente, perceptível para o destinatário.

P) Na verdade, embora refira o período de tributação, o imposto, o período do cálculo, o valor base, a taxa e o valor, nada esclarece quanto à razão de ser do valor base no período de cálculo de 2003-05-01 a 2005-06-14 ser diferente do valor base no período de cálculo de 2005-06-15 a 2005-07-22. Também, não refere qualquer norma ou disposição legal.

Q) Pelo que, a fundamentação cede por insuficiência e falta de clareza na forma de determinação do valor de 406.036,28 € a título de juros compensatórios, tornando a liquidação ilegal.

R) Para além do mais, a douta sentença recorrida é omissa em matéria de facto relevante para o apuramento da legalidade da liquidação.

S) Com efeito, a recorrente, na sua petição inicial, juntou aos autos os documentos n.ºs 19, 20, 21 e 22, com os quais fez prova bastante do pagamento em excesso de IRC, relativo aos exercícios de 2002 e 2003.

T) Prova que faz parte integrante do processo de impugnação judicial, e como tal, deveria ter sido alvo de apreciação crítica e valoração em sede judicial, e aduzida a competente motivação e fundamentação.

U) Pagamentos em excesso estes que são relevantes para se concluir pela falta de fundamentação legal da liquidação dos juros compensatórios.

V) Com efeito, embora a liquidação de imposto e juros compensatórios impugnada diga respeito ao exercício de 2001, a acção inspectiva e a liquidação adicional só ocorreu em 2005. Ou seja, entre o período que medeia a entrega voluntária (ou autoliquidação) da declaração de 2001 e a liquidação adicional verificaram-se eventos, como sejam a liquidação e pagamento dos exercícios de 2002 e 2003.

X) Pagamento de impostos destes exercícios, que se relevaram pagamentos em excesso, no montante de € 1.184.089,86, no período entre 30/05/2004 a 19/10/2005.

Z) Pelo que, relativamente à quantia liquidada e pelo referido período a recorrente não foi responsável pelos juros compensatórios. Responsabilidade da recorrente que se extinguiu a partir do momento em que cabia à AT através da actuação atempada liquidar adicionalmente o imposto do ano 2001 e, eventualmente, compensar com o estorno que a recorrente teve direito por pagamento de imposto em excesso dos exercícios de 2002 e 2003.

AA) Além do mais, o direito a juros compensatórios corresponde à reparação efectiva de um dano sofrido pela Administração Tributária.

BB) Dano que não se verifica por a AT, no período calculado dos juros, estar na posse de valores em montante superior àqueles que calculou a título de juros compensatórios.

CC) Acresce que, no caso, o retardamento da liquidação não pode ser imputado à recorrente, mas sim a AT a quem cabia detectar e corrigir o erro da declaração apresentada por aquela.

DD) Tanto mais que a recorrente actuou de boa fé, a qual se presume nos termos do n.º 2 do artigo 59º da LGT, e cuja falta de culpa decorre da razoabilidade da interpretação da lei que a recorrente fez para ter autoliquidado o imposto de 2001 do modo que o fez.

EE) De todo o exposto resulta, assim, que a douta sentença fez errónea apreciação crítica da prova, no que toca à notificação da fundamentação da liquidação dos juros compensatórios, e incorre na nulidade por omissão de pronúncia por falta de apreciação e valoração da prova produzida pela recorrente, no que toca aos valores de imposto excedentários pagos, no período em que foram calculados os juros compensatórios.

FF) A douta sentença é nula nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 668º do CPC, tendo incorrido em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, tendo violado o disposto no nº 3 do artigo 38º e o nº 1 do artigo 39º ambos do CPPT e o n.º 9 do artigo 35º da LGT.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a dou- ta sentença recorrida, anulando-se a liquidação de juros compensatórios do ano 2001, na quantia de € 406.036,28.»


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A também recorrente Fazenda Pública, nas suas alegações, formulou as seguintes conclusões:
«A) Sufragou a douta sentença sob recurso que o montante de € 33.264,83 contabilizado pela impugnante no ano de 2001 e relativo às despesas de participação em actividades de lazer proporcionadas por um aludido "P...", revestia o carácter de custo na formulação do art. 23° do CIRC, revelando-se, por conseguinte, indispensável para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para manutenção da fonte produtora daquela.
B) Contudo, a sociedade impugnante não fez prova da indispensabilidade dos custos, nem aquando da acção de inspecção realizada, nem posteriormente em sede impugnatória.
C) Pois que no que respeita à aceitação dos encargos fiscalmente dedutíveis, o critério legal, acolhido no art. 23º, nº1 do CIRC, assenta na exigência de que tais custos, para além de devidamente comprovados, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos sujeitos a imposto e, relativamente ao ónus da prova da referida indispensabilidade cabe ao contribuinte, uma vez que é ele quem, verdadeiramente, tem a possibilidade de produzir a atinente demonstração.
D) Tal o entendimento jurisprudencial dominante na matéria.
E) Ora, o depoimento das testemunhas inquiridas revela a sua convicção pessoal, bastante subjectiva se nos lembrarmos que as mesmas têm relações profissionais com a sociedade impugnante (empregadas por sua conta ou responsável pela sua contabilidade), situações que lhes ministra, ou é susceptivel de ministrar, interesse e que compromete a total isenção dos depoimentos prestados.
F) Quanto à referida participação ficou por demonstrar a necessidade da participação naquelas provas em concreto enquanto estratégia empresarial de crescimento da impugnante, pelo que, dificilmente se pode equacionar a indispensabilidade dos correspondentes custos suportados na formação dos proveitos obtidos ou na manutenção da fonte produtora, uma vez que se verifica um total desfasamento entre o escopo social e a participação em actividades/provas de "projecto de aventura".
G) Ou seja, a prática da actividade cujos custos foram desconsiderados não se prende com quaisquer necessidades ou capacidades objectivas da empresa e visaram a prossecução de qualquer outro objectivo que não o objectivo social.
H) Pois que a lei fiscal determina que os custos elencados no art. 23° do CIRC apenas sejam dedutíveis para efeitos fiscais, desde que, comprovadamente, se relacionem com a actividade da empresa, o que não é o caso.
I) Os custos incorridos não revestem assim um carácter de indispensabilidade, no sentido da sua "necessidade" ao "desenvolvimento ou crescimento da empresa" ditado por razões de "motivação empresarial".
J) Nesse sentido, com a devida vénia, o Acórdão do TCA Sul de 2009/11117, proc. Nº 03253/09: "O critério da indispensabilidade foi criado pelo legislador (...) para impedir a consideração fiscal de gastos que, ainda que contabilizados como custos, não se inscrevem no âmbito da actividade da empresa, foram incorridos não para a sua prossecução mas para outros interesses alheios. (...) Em rigor, não se trata de verdadeiros custos da empresa, mas de gastos que, tendo em vista o seu objecto, foram abusivamente contabilizadas como tal." (sublinhado nosso)
K) Ainda, o Acórdão do TCAS de 2011/06/01, proc. 04589/11: "É no conceito de indispensabilidade insite no artº 23º do CIRC que radica a questão essencial da consideração fiscal dos custos empresariais e que assenta o a distinção fundamental entre o custo efectivamente incorrido no interesse colectivo da empresa e o que pode resultar apenas do interesse individual do sócio, de um grupo de sócios ou do seu conjunto e que não pode, por isso, ser considerado custo." (sublinhado nosso)
L) E até o Acórdão do TCAS de 2012/03/27, proc. 05312/12: "Só não são indispensáveis "os custos que não tenham relação causal e justificada com a actividade produtiva da empresa", isto é, a indispensabilidade, dos gastos fiscais, tem de entender-se "como referida à ligação dos custos à actividade desenvolvida pelo contribuinte". (...) se a administração tributária/ai, atuando submetida ao principio da legalidade, fundamentadamente, despoleta a dúvida sobre a relação justificada de uma determinada despesa com a atividade do sujeito passivo, necessária e logicamente, por se encontrar mais habilitado para o efeito, compete a este uma explicação sobre a "congruência económica" da operação, a qual não se cumpre com a alegação abstrata e conclusiva de que a despesa se insere no interesse societário e/ou da existência de relação justificada com a atividade desenvolvida, exigindo-se, sim, que o contribuinte alegue e comprove factos concretos, sindicáveis, capazes de demonstrar a realidade, veracidade, das atuações empresariais provocantes dos gastos registados, em ordem a que, entre o mais, não resulte inviabilizada a função fiscalizadora da at." (sublinhado nosso)
M) Face ao que vem exposto, a actuação da AT, no sentido de não considerar como custos fiscais as despesas incorridas com a participação nas actividades de lazer "P..." não merece qualquer censura, pelo que deve manter-se a correcção efectuada nos termos do art. 23º/1 e do ar!. 17º/1 do CIRC manter-se.
N) Existindo erro de julgamento consubstanciado na deficiente avaliação da prova documental e testemunhal produzida, a douta sentença sob recurso fez desacertada interpretação dos normativos aplicáveis, designadamente dos artigos 23°/1 e 17°/1 do CIRC, pelo que não deve manter-se.
Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de Vossas Ex.as, deverá ser concedido provimento ao presente, com o que se fará como sempre JUSTIÇA.»

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificado para o efeito, ofereceu aos autos o seu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso interposto pela Impugnante e concedido provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública.
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Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta 1ª Sub-Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«1. A impugnante foi sujeita a fiscalização externa referente ao exercício de 2001, no âmbito da qual foi elaborado o relatório junto a fls. 177 cujo conteúdo se dá por reproduzido.

2. Em consequência da fiscalização foram efectuadas algumas correcções à matéria tributável entre as quais as referente ao valor de aquisição de quatro Dumpers, nos seguintes termos:

a. O fornecedor deste equipamento foi a “W... limited” com sede em Gibraltar, e a sua origem o Brasil, tendo sido a firma L... Com. e Loc. de Equip. LTDA a empresa que apresentou os bens para embarque no Brasil.

b. Solicitadas informações às autoridades fiscais do Brasil, verificou-se que:

i. O sócio maioritário da L... é a firma L... Engª e Const. SA;

ii. Os Dumpers em referência foram adquiridos pela L... LTDA à firma brasileira “Construtora N... SA” e vendidas posteriormente a “W... Limited”, sendo esta a firma que vende posteriormente o equipamento a L... Engª e Const. SA.

iii. O preço de aquisição unitário, inicial, das referidas máquinas foi de 14 000 reais, que ao câmbio da data corresponde a Esc. 2.399.880$ e o valor final pelo qual são adquiridos é de Esc. 22.345.190$. (fls. 181 cujo conteúdo se dá por reproduzido, pp. 5 do relatório)

3. Assim, concluiu a AF, «Em virtude das relações especiais existentes entre o vendedor e o comprador final, o preço de aquisição declarado seria diverso daquele que se apuraria na ausência dessas relações».

4. Pelo que foram efectuadas correcções às amortizações praticadas de que resultou um valor a acrescer de € 26.600$024 ou € 132.680,36 (fls. 181 dos autos cujo conteúdo se dá por reproduzido – pag 5 do relatório).

5. O valor declarado de aquisição dos 4 Dunpers foi aceite pelos serviços de fiscalização da Alfândega do Porto, os quais procederam a liquidação adicional de direitos alfandegários (fls. 115 a 133 cujo conteúdo se dá por reproduzido).

6. A impugnante, através de um mecânico seu, acompanhou a reparação dos Dumpers no Brasil antes da sua transferência para Portugal.

7. Os 4 Dumpers Terex foram pagos pela impugnante através de duas transferências bancárias no valor de USD 230.000 cada uma da sua conta D/O n.º 350... para a conta n ° 993... pertencente a empresa W... Limited (fls. 111 a 114 cujo conteúdo se dá por reproduzido).

8. Os Dumpers em questão já não se fabricam, porém os modelos novos não apresentam grandes diferenças em relação aos anteriores.

9. Os modelos novos custam à volta de 75.000.000$ (fls. 135 cujo conteúdo se dá por reproduzido).

10. Os Dumpers foram utilizados nas obras públicas da impugnante para execução dos contratos celebrados quer com o Estado quer com as autarquias.

11. Pela firma P..., Lda, foi organizado, em 2001, o III C..., em Castelo de Vide (fls. 145 cujo conteúdo se dá por reproduzido).

12. C... no qual participaram mais de quarenta equipas, nomeadamente C..., SA, Supermercados U..., SA, S..., Lda, E..., SA, bem como impugnante (fls. 151 verso cujo conteúdo se dá por reproduzido).

13. Prova que contou com a participação de diversas equipas e que contou com a afluência de muito público e de diversos meios de comunicação social. (fls. 154 verso, onde consta que o suplemento teve uma tiragem de 70.000 exemplares e foi distribuído em 9 de Novembro de 2001 no Região de Leiria, 9 de Novembro no Semanário Económico e 10 de Novembro de Fonte Nova).

14. As verbas respeitantes a esta prova não foram consideradas custo do exercício, com o fundamento de que os valores constantes das facturas n.ºs 201025 no valor de € 7.003,12 e 201071 no montante de € 26.261,71, tudo no total de € 33.264,83 relacionados com encargos suportados com actividades de lazer, cujos beneficiários não estão identificados e que pela sua natureza não contribuíram para a obtenção dos proveitos (fls. 183 dos autos cujo conteúdo se dá por reproduzido, pp. 7 do relatório).

a. As facturas encontram-se a fls. 93 e 94.

15. A liquidação dos juros compensatórios consta de fls. 17 e 55 cujos conteúdos se dão por reproduzidos.

16. Mas para além disso foi remetido à impugnante um documento de demonstração da liquidação de juros, a coberto do registo RY31…PT, por ela recebido em 28/10/2005 (fls. 301 a 305 cujo conteúdo se dá por reproduzido).

MOTIVAÇÃO.

A convicção do tribunal baseou-se nos seguintes meios de prova:

PROVA DOCUMENTAL. Os meios de prova documental que serviram para a convicção do tribunal estão referidos no «probatório» com remissão para as fls. do pro- cesso onde se encontram.

PROVA TESTEMUNHAL. Quanto a este meio de prova, relevaram os depoimentos das testemunhas inquiridas que confirmaram, no essencial, os factos alegados pela impugnante, com destaque para o TOC da impugnante J..., C..., director de manutenção para todo o território nacional e A..., mecânico, que acompanhou a reparação das máquinas no Brasil. O depoimento destas testemunhas mereceu credibilidade, pois não obstante terem vínculo laboral à impugnante o seu depoimento mostrou-se razoável e consistente.»



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Ao abrigo do preceituado no nº1 do artigo 662º do CPC aditam-se ao probatório os seguintes factos, documentalmente provados:


17) A Impugnante participou no evento “C...” com equipas suas – Cfr. documento a fls. 151v;


18) No folheto denominado “Grupo L... - III C...” encontra-se impresso, não só o logotipo da Impugnante, como é mencionado no rodapé ao lado do número de página – Cfr. documento 17 junto a fls. 145 a 154, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;


19) No âmbito do direito de audição relativamente ao projecto de RIT, a Impugnante referiu que os custos no valor de € 33.264,83, mencionados no ponto 3.6 do projecto, são custos com a promoção e serviços da Impugnante, seja por um conjunto de menções publicitárias, seja com a comparticipação da prova rainha do evento, bem como com a inscrição de trabalhadores da empresa na formação de quatro equipas participantes nas provas – Cfr. documento a fls. 226;


20) No âmbito do direito de audição a que se refere a alínea antecedente e relativamente à identificada correcção, a Impugnante juntou documentação onde consta a identificação dos colaboradores que participaram no evento – Cfr. documentos a fls. 226 e 270 a 284, os quais se dão, aqui, por integralmente reproduzidos.



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- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Foram interpostos recursos por ambas as partes, sendo que iniciaremos a nossa análise pelo recurso deduzido pela Fazenda Pública.

Assim, quanto ao recurso da Fazenda Pública, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença padece de erro de julgamento de facto, por deficiente avaliação da prova produzida, bem como de direito, por desacertada interpretação dos artigos 17º e 23º do CIRC.

Vejamos, então.

Está em causa o entendimento acolhido na sentença recorrida no sentido de que deveriam ser considerados como custos fiscais, nos termos previstos no artigo 23º do CIRC, as despesas suportadas pela Recorrida com actividades outdoor em Castelo de Vide, bem como o decidido relativamente ao período em que seriam devidos juros indemnizatórios.

No que se refere à correcção anulada pela sentença recorrida, recuperemos o que nela se considerou como fundamento da anulação, depois de se transcrever o entendimento relativo aos custos considerados indispensáveis do autor Rui Morais, que foi acolhido:

“(…) parece claro que as despesas «Chalenge» devem ser qualificados como custos, já que na sua origem estão motivações empresariais, bem perceptíveis na divulgação do nome da impugnante.

Aliás, esta divulgação do nome da impugnante associado a uma actividade lúdica, também não está fora do que se pode considerar publicidade, e essa sempre foi um custo fiscalmente aceite e até vertido na lei como uma despesa exemplificativa (Art.º 23/1,b) CIRC).(…)”

Dissente a Recorrente Fazenda Pública do assim decidido por, e uma vez que não estavam identificados os beneficiários das actividades lúdicas, considerar que a Recorrida não fez prova da indispensabilidade daqueles custos incorridos. Refere que não o fez em sede de inspecção, nem em sede de impugnação judicial.

Desconsidera os depoimentos prestados pelas testemunhas, na medida em que a sua condição de trabalhadores da Recorrida lhes retira isenção.

Entende que se verifica um total desfasamento entre o escopo social e a participação em provas de “projectos de aventura”.

Comecemos por dizer que só por desatenção pode vir referido o depoimento das testemunhas relativamente a esta correcção, uma vez que, como ressalta dos autos, a prova testemunhal foi aproveitada do processo nº 167/04, especificamente quanto aos artigos 9º a 47º da p.i., matéria que não tem que ver com a correcção em análise, sendo certo que, consultado o SITAF se constatou que nem sequer naqueles autos estava em causa correcção semelhante.

Razão para que se conclua que o depoimento das testemunhas inquiridas em nada releva para a questão da prova da correcção relativamente ao evento outdoor, denominado “C...”.

Assim, improcede, por despicienda, a argumentação da Recorrente relativamente à prova testemunhal.

Afirma, por outro lado, a Recorrente que não foi feita a prova da indispensabilidade do custo, nomeadamente por se desconhecer a identidade dos participantes.

Não é verdade, como ressalta do facto por nós aditado sob o nº 20, foram juntos pela Recorrida documentos relativos à inscrição e participação dos seus funcionários no evento, onde consta a identidade, cargo e autorização das chefias, pelo que falece este argumento da Recorrente.

No que diz respeito à indispensabilidade, cumpre salientar a circunstância de a Recorrida ter vindo sempre a justificar os referidos como sendo despesas de promoção e marketing, sendo certo que, como é sabido, estas despesas podem não ter um efeito imediato e directo na prossecução da actividade da empresa, sem que por isso se possa dizer que não se verifica o requisito da indispensabilidade previsto no artigo 23º do CIRC.

E não há dúvida que a Recorrente participou no evento, com equipas suas, e na organização do mesmo, sendo disso prova a documentação que juntou e a que a sentença disso deu conta no probatório.

Assim sendo, não logra ter sucesso a argumentação da Recorrente, pelo que será de manter a sentença recorrida, neste segmento.

Atentemos, agora, no modo de contagem dos juros indemnizatórios, com a qual não concorda a Recorrente.

A sentença recorrida entendeu o seguinte, no segmento decisório:

“(…) devendo a AF restituir as importâncias pagas acrescidas dos juros indemnizatórios devidos desde o pagamento efectuado em 18/11/2005 até reembolso.(…)”

A Recorrente discorda do assim decidido, por entender que os juros indemnizatórios apenas são devidos desde a data do pagamento até ao termo do prazo para o cumprimento voluntário da sentença, dado que, daí em diante seriam devidos juros de mora.

Vejamos.

Sobre a extensão temporal do direito a juros indemnizatórios dispõe o nº5 do artigo 61.º do CPPT:

“Os juros são contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos.”


É, pois, claro que o termo do cômputo dos juros indemnizatórios é a data do processamento da respectiva nota de crédito – nesse mesmo sentido, veja-se o acórdão do STA de 19/09/2018, proferido no âmbito do processo n.º 0462/14.

Não tem, pois, razão a Recorrente, improcedendo, também, este segmento do recurso.


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Debrucemo-nos, agora, sobre o recurso interposto pela Impugnante.

Relativamente ao Recurso interposto pela Impugnante, versa o mesmo sobre a liquidação de juros compensatórios, que a sentença entendeu não padecer dos vícios que lhe vinham assacados.

Entende a Recorrente que a sentença é nula por omissão de pronúncia, por falta de apreciação e valoração da prova produzida pela Recorrente, no que que toca aos valores de imposto excedentários pagos, no período em que foram calculados os juros compensatórios.

Mais refere que se verifica erro de julgamento relativamente à questão da notificação da liquidação de juros compensatórios e quanto ao vício de falta de fundamentação, que a sentença concluiu não se verificar.

A fls. 429 foi proferido despacho, pelo juiz a quo, no sentido de se não verificar a nulidade da sentença, uma vez que todas as questões relevantes para a decisão foram apreciadas.

Vejamos.

Comecemos por aquilatar da invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Dispõe o artigo 615º n.º 1, do CPC de 2013, que:

“É nula a sentença quando:

(…)

d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (…)”.

A nulidade prevista na 1ª parte da al. d) do n.º 1 deste artigo 615º, denominada omissão de pronúncia, relaciona-se directamente com o estatuído no artigo 608º n.º 2, do CPC de 2013, nos termos do qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; (…)”.

A propósito desta nulidade, ensina Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 2003, 4ª Edição, pág. 50, que, «À omissão de pronúncia alude a 1ª parte da alínea d) do n.° 1 do art. 668.° (1) e traduz-se na circunstância de o juiz se não pronunciar sobre questões que devesse apreciar, ante o estatuído na 1.ª parte do n.° 2 do art. 660.° (2).

Trata-se da nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda.

Como nos diz Alberto dos Reis, não enferma da nulidade de omissão de pronúncia o acórdão que não se ocupou de todas as considerações feitas pelas partes, por as reputar desnecessárias para a resolução do litígio. “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão”».

A omissão de pronúncia só existe, portanto, quando o tribunal deixe, em absoluto, de apreciar e decidir a(s) questão(ões) que lhe é(são) colocada(s) pelas partes, isto é, o(s) problema(s) concreto(s) que haja sido chamado a resolver, e não quando deixe de apreciar razões, argumentos, considerações, teses, doutrinas ou raciocínios invocados pelas partes em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão da(s) questão(ões) colocada(s).

No caso vertente verifica-se que falece a razão à ora Recorrente, pois só existe omissão de pronúncia quando o tribunal não tome posição sobre qualquer questão que devesse conhecer, o que não se verifica.

Com efeito, na sentença recorrida emitiu-se pronúncia quanto à questão dos alegados pagamentos em excesso, relativamente a outros exercícios, e explicou-se expressamente a razão pela qual apenas cumpria apreciar a liquidação referente ao exercício em análise (o de 2001) ou seja, na sentença recorrida apresentou-se o motivo para a abstenção de conhecimento das eventuais implicações dos alegados pagamentos em excesso.

Pelo exposto, improcede a arguição de nulidade da sentença recorrida.

No que se refere às ocorrências relacionadas com a notificação da fundamentação da liquidação de juros compensatórios, a Recorrente impugna o facto dado como provado na alínea 16), já que considera que não podia ter sido dado como provado que tinha sido notificada da fundamentação da liquidação de juros compensatórios, uma vez que apenas tomou conhecimento da mesma em sede judicial, com os documentos (prints informáticos) juntos com a contestação.

Compulsados os autos, verifica-se que, efectivamente, com a p.i. a Recorrente juntou a nota de liquidação de juros compensatórios por si recebida e a que se refere a alínea 15 do probatório (certamente por lapso, aí se refere fls. 55, quando se queria dizer 155).

Porém, constata-se que a fundamentação da liquidação de juros foi, apenas, junta pela FP com a contestação e consta a fls. 303, como referido no ponto 16 do probatório.

A sentença recorrida deu como provado ter sido remetido à Recorrente um documento de demonstração da liquidação de juros compensatórios a coberto do registo RY316814173PT, e por ela recebido em 28/10/2005 (cfr. alínea 16) do probatório).

Não oferece dúvida que a fls. 303 consta um print informático com o detalhe da fundamentação da liquidação de juros compensatórios. E que do mesmo consta o período de tributação, de cálculo, o valor base e a taxa aplicada.

A questão é a de saber se se podia ter dado como provado que a Recorrente foi notificada do mesmo.

A sentença para assim entender fundamentou-se no print informático de fls. 304, onde se refere ter sido enviada a demonstração da liquidação de juros com data de 11/10/2005, remetida a coberto do registo dos CTT RY3…3PT, registada em 26/10/2005, sem aviso, e no comprovativo de entrega extraído do site dos CTT, com a identificação do objecto registado.

A Recorrente afirma nada ter recebido e que a informação interna dos prints informáticos não constitui meio idóneo para provar a eficácia da notificação da liquidação e assim, dar como provado o conhecimento da fundamentação da liquidação de juros compensatórios.

Assim, a questão é a de saber se a Recorrente foi notificada da fundamentação da liquidação de juros compensatórios, como decidiu a sentença recorrida.

Dito isto, vejamos, então.

Como se afirmou no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11.03.2015, proferido no âmbito do processo n.º 4/14, abordando a questão da notificação e respectivas formalidades: «Trata-se de questão que (conforme ressalta, aliás, quer da fundamentação constante da sentença recorrida, quer do teor da alegação do recurso), tem sido apreciada em vários arestos desta Secção do STA, (cfr., os acórdãos de 16/5/2012, proc. n.º 1181/11, de 27/6/2012, proc. n.º 966/11, de 29/5/2013, proc. n.º 472/13, de 1/10/ 2014, procs. n.ºs 603/13 e 1450/13, de 29/10/2014, proc. n.º 1619/13, de 5/11/2014, proc. n.º 0609/13, de 26/11/2014, proc. n.º 1056/13 e de 3/12/2014, proc. nº 1139/13), com a mais recente jurisprudência a firmar-se no sentido de que, tendo a AT o ónus de demonstrar que efectuou a notificação de forma correcta (cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais) e sendo certo que o recibo de aceitação e o recibo de entrega da carta registada pelos serviços postais, previstos nos n.ºs 2 e 4 do art. 28.º do Regulamento do Serviço Público de Correios, são documentos idóneos para provar que a carta foi registada, remetida e colocada ao alcance do destinatário. E que, de todo o modo, sempre se estará perante uma formalidade simplesmente probatória ou “ad probationem”, cuja falta pode ser substituída por outros meios de prova.

E na verdade assim é.

Por um lado, o registo informático dos mesmos dados de facto existente em entidades diferentes – o emissor (Administração Tributária) e o distribuidor da carta (CTT) – é uma circunstância concreta que, num sistema de livre apreciação das provas, ainda que limitado pelo principio da persuasão racional, justifica suficientemente que se dê como provado que o registo foi efectivamente realizado e, por outro lado, o registo da carta faz presumir que o seu destinatário provavelmente a receberá, ou terá condições de a receber, três dias após a data registo, uma presunção legal que se destina a facilitar a prova de que a notificação foi introduzida na esfera de cognoscibilidade do notificando, presunção que, tendo por base o registo postal, só existe quando se prove que o registo foi efectuado.

No que aqui releva, exara-se no citado acórdão de 1/10/2014, proc. n.º 1450/13, o seguinte:

«Antes de mais, convém esclarecer que não se encontra em discussão no presente recurso que a notificação dos actos de liquidação que estão na origem da dívida exequenda tinha que ser efectuada por carta registada, em conformidade com o disposto no n.º 3 do art. 38.º do CPPT; nem se discute que, tal como ficou provado, a carta para notificação desses actos de liquidação foram recepcionados na sede da oponente. O que se discute é unicamente a questão de saber se o registo dessas cartas apenas pode ser provado pelo recibo da expedição da carta sob registo, emitido e entregue ao remetente pelos CTT, ou se pode, antes, ser comprovado por outros meios de prova, mais propriamente pelos registos informáticos da emissão, distribuição e entrega da correspondência existentes nos respectivos serviços. (…)

Tal questão foi já analisada e decidida no acórdão proferido pelo STA em 16 de Maio de 2012, no processo n.º 01181/11, […]

Trata-se de jurisprudência que também aqui se acolhe, por com ela concordarmos plenamente, pelo que nos limitaremos a reproduzir o que sobre a questão ficou dito no referido acórdão proferido no processo nº 01181/11:
“O procedimento de notificação por carta registada, regulado nos artigos 35.º a 39.º do CPPT e no artigo 28.º do Regulamento do Serviço Público de Correios (RSPC), aprovado pelo DL n.º 176/88 de 18/5, compreende os seguintes actos: (i) a emissão de uma carta, que incorpora a notificação do acto tributário, com a respectiva fundamentação (ii) o registo nos serviços postais, através da apresentação da carta em mão, mediante recibo; (iii) e a entrega no domicílio fiscal do respectivo destinatário, comprovada por recibo.

Em princípio, do ponto de vista formal, estes actos colocam a informação ao alcance do sujeito passivo, fazendo depender o respectivo conhecimento exclusivamente da sua vontade.

O «recibo de aceitação» e o «recibo de entrega» da carta registada pelos serviços postais, previstos nos n.ºs 2 e 4 do artigo 28.º do Regulamento do Serviço Público de Correios são documentos idóneos para provar que a carta foi remetida e colocada ao alcance do destinatário. Para a administração tributária é suficiente exibir o recibo da apresentação em mão da carta expedida sob registo, pois, não tendo sido devolvida a carta, o n.º 1 do artigo 39.º do CPPT presume que a notificação se efectuou no 3.º dia posterior ao registo. Porque a comunicação é efectuada através dos serviços postais, que podem levar algum tempo a colocar a carta em condições do destinatário ter possibilidade de conhecer a sua existência, através de uma regra de experiência (id quod plerumque accidit), a lei presume que a comunicação postal demora três dias posteriores ao registo, que se transfere para o 1.º dia útil, se o último dia não for dia útil.

Deste modo, o registo da carta faz presumir que o seu destinatário provavelmente a receberá, ou terá condições de a receber, três dias após a data registo. Trata-se pois de uma presunção legal destinada a facilitar à administração tributária a prova de que a notificação foi introduzida na esfera de cognoscibilidade do notificando. Mas a «presunção» que tem por base o registo postal, não existe se o registo não for feito.

Não se duvida que o recibo da apresentação da carta nos serviços de correio é de grande importância probatória do registo postal e por isso mesmo pode questionar-se se o recibo tem preponderância absoluta como meio de prova ou se é possível prová-lo por outros meios.

O registo postal, com ou sem aviso de recepção, apenas se justifica por uma questão de segurança probatória. É uma formalidade que a lei prevê para melhor garantir a certeza jurídica da cognoscibilidade do acto notificado, evitando o risco de se invocar a falta de notificação. E resulta claramente do artigo 28.º do RSPC que a finalidade tida em vista ao se exigir o recibo foi apenas a de obter prova segura acerca do registo e não qualquer outra finalidade. Assim sendo, e aplicando o critério do n.º 2 do artigo 364.º do Código Civil, deve considerar-se o recibo do registo da carta como uma formalidade simplesmente probatória ou «ad probationem», cuja falta pode ser substituída por outros meios de prova.

Os outros meios de prova invocados pela administração tributária são os dados constantes do sistema electrónico de citações e notificações da DGCI e dos registos constantes do site dos CTT. Aqueles elementos, que constam dos autos, indicam a data em que foram emitidas as notificações relativas às liquidações a que nos vimos referindo e o número do registo postal dessas notificações a indicação de que foram recebidas e a data da recepção. Por sua vez, no registo dos CTT, cuja cópia consta do processo administrativo, também consta o número do registo, a data de envio e a data da aceitação do registo.

Do confronto entre os dois registos resultou claro para o julgador que as notificações das liquidações foram remetidas à recorrente através de registo postal. Daí que a matéria de facto fixada na 1.ª Instância (a qual expressamente não é atacada) tenha referido não só o envio das liquidações como a sua recepção na sede da oponente.

A partir da prova do envio funciona a presunção do n.º 1 do artigo 39.º do CPPT, pertencendo ao destinatário o ónus de demonstrar que, apesar do registo, não chegou a receber as cartas pois que é verdade que a atribuição legal de certa relevância ao registo não dá certeza de que o seu destinatário as recebeu no prazo de três dias, havendo sempre o risco de as não ter recebido. E, como referimos, é por isso mesmo que o n.º 2 do artigo 39.º permite ao notificado ilidir aquela presunção «quando não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida», solicitando à administração tributária e ao tribunal que requeiram aos correios a informação sobre «a data efectiva da recepção» ou, como também se estabelece no art. 6.º do RSPC, qualquer outro «documento comprovativo» do destino que lhe foi dado.

Como se vê, os n.ºs 1.º e 2.º do artigo 39.º CPPT indicam claramente o efeito que a lei quer atribuir ao registo: trata-se de uma presunção juris tantum da demora que levará a fazer a comunicação postal (cfr. Ac do STA, de 2/3/2011, rec. n.º 0967/10). Se o registo da carta liberta a administração tributária do ónus de provar que a mesma ficou em condições de ser recebida pelo destinatário em três dias, este tem o ónus de provar que, na situação concreta, a recebeu posteriormente ou que nunca a recebeu, o que não se verificou nos autos.

E assim sendo, não tem cabimento a argumentação da recorrente no sentido de que a dívida exequenda é inexigível por falta de notificação». (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).(...)”

Regressando ao caso dos autos, constam dos mesmos não só o print dos registos informáticos da AT, como também o comprovativo de entrega retirado do site dos CTT, onde facilmente se constata a entrega do objecto registado e que consta a fls. 305, como deu nota a sentença recorrida.

Daí que, contrariamente ao afirmado pela recorrente, resulte demonstrado que a notificação da fundamentação da liquidação de juros compensatórios foi remetida à Recorrente através de registo postal para o seu domicílio fiscal e por esta recebida, pelo que improcede a sua argumentação.

Finalmente, não concorda a Recorrente com a sentença recorrida na parte em que considerou que a fundamentação era suficiente.

Consta da sentença o seguinte:

“(…) Quanto à falta de fundamentação dos juros compensatórios.

A impugnante alega a falta de fundamentação dos juros compensatórios porque nem o documento 1 nem o documento 18 (a que correspondem fls. 17 e 55) esclarecem a forma de determinar os juros compensatórios.

Porém, como resulta do «print» de fls. 303, está especificada a data, a taxa e o valor referente ao cálculo dos juros compensatórios, cumprindo assim, o disposto no art.º 35/9 da LGT.

E no que respeita ao pagamento em excesso ele reporta-se aos exercícios de 2002 e 2003, como alega nos artigos 71 a 78 da douta petição inicial. Simplesmente a liquidação impugnada respeita a 2001, razão por que não podem ser levados em linha de conta os pagamentos de liquidações posteriores.

Esse será uma questão referente a essas liquidações que não cabe aqui apreciar.(…)”

Entendemos que a sentença decidiu com acerto, de acordo com a jurisprudência constante dos tribunais superiores, sendo por isso de confirmar, improcedendo o recurso da Impugnante.


*




III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento a ambos os recursos, assim se mantendo a sentença recorrida.

Custas por ambas as partes.

Registe e Notifique.

Lisboa, 25 de Fevereiro de 2021

A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores Jorge Cortês e Lurdes Toscano


(Isabel Fernandes)

(Jorge Cortês)

(Lurdes Toscano)


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(1) Que corresponde à 1ª parte da al. d) do n.º 1 do art. 615º, do CPC de 2013.
(2) Que corresponde à 1ª parte do n.º 2 do art. 608º, do CPC de 2013.