Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07016/13
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:01/30/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:EXAME E DECISÃO DE DOIS RECURSOS.
PRINCÍPIO DA PREJUDICIALIDADE COMO FUNDAMENTO PARA O EXAME DE UM DELES.
FALTA DE NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO ENQUANTO FUNDAMENTO DE OPOSIÇÃO A EXECUÇÃO FISCAL.
A NOTIFICAÇÃO RELEVANTE PARA EFEITOS DE OBSTAR À CADUCIDADE DO DIREITO DE LIQUIDAÇÃO É A RELATIVA AO SUJEITO PASSIVO ORIGINÁRIO DO TRIBUTO.
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA.
DETERMINAÇÃO DO REGIME DE PRESCRIÇÃO A APLICAR AO CASO CONCRETO.
REGIMES DE SUSPENSÃO E INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO.
ARTº.48, Nº.3, DA L.G.T. ACTOS INTERRUPTIVOS DA PRESCRIÇÃO. RESPONSÁVEIS SUBSIDIÁRIOS.
Sumário:1. Levando em consideração, segundo um prudente critério, a tutela mais eficaz dos interesses em presença no âmbito do presente processo, deve concluir-se pela necessidade de apreciação, em primeiro lugar, do recurso apresentado pelo opoente, o qual, a merecer provimento, implica o desaparecimento do fundamento da apelação deduzida pela Fazenda Pública, assim ficando prejudicado o seu conhecimento (cfr.artº.124, do C.P.P.Tributário).
2. De acordo com a interpretação jurisprudencial do quadro normativo existente, à qual se adere, fica aberta, na fase executiva, pelos meios legais de oposição, a discussão da falta ou de eventuais vícios da notificação, designadamente por inexigibilidade da dívida, ao abrigo do disposto no mencionado artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário). Em resumo, o regime processual de defesa do contribuinte, nestas situações será o seguinte:
A-Se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o sujeito passivo pode sempre opor-se à execução ao abrigo da alínea i), do nº.1, do artº.204, do C.P.P.T., invocando a ineficácia do acto, que impede que a dívida seja exigível, sendo indiferente, para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o de extemporaneidade da liquidação;
B-Já se foi instaurada uma execução e efectuada notificação válida do acto de liquidação, mas a notificação foi realizada fora do prazo de caducidade previsto no artº.45, nº.1, da L.G.T. (ou outro prazo especial que for aplicável), o contribuinte pode opor-se à execução ao abrigo da alínea e), do nº.1, deste artº.204, do C.P.P.T. (trata-se de situação que, no seu teor literal, poderia caber na mencionada alínea i), pois não se engloba nela a apreciação da legalidade da própria liquidação nem é matéria da exclusiva competência da entidade que emite o título, mas que era dela afastada à face do entendimento jurisprudencial referido formado na vigência do C.P.T., reconduzindo-se a utilidade da alínea e) ao afastamento da aplicabilidade deste entendimento; a possibilidade de oposição ao abrigo da alínea e) existirá independentemente de a própria liquidação ser extemporânea, isto é, de ela própria ser ilegal, pois não está em causa no processo de oposição à execução fiscal a apreciação da legalidade da liquidação, mas a sua oponibilidade ao seu destinatário);
C-Por último, se foi efectuada uma liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo, mas não foi ainda instaurada execução, o contribuinte pode impugnar judicialmente a liquidação, invocando a ilegalidade da sua extemporaneidade, porém, se o não fizer e não pagar a quantia liquidada, não ficará impedido de se opor à execução, ao abrigo da alínea e) referida, visto que, além da ilegalidade da liquidação, ocorrer também a sua inexigibilidade por falta de tempestiva notificação.
3. A notificação relevante para efeitos de obstar à caducidade do direito de liquidação (natureza receptícia do acto tributário) é a relativa ao contribuinte, o sujeito passivo originário do tributo, e não a dos outros responsáveis solidários ou subsidiários. No que concerne às notificações ou citações dos responsáveis solidários ou subsidiários, não lhes reconhecendo a lei qualquer relevo para efeitos de caducidade, é indiferente que ocorram após o termo desse prazo.
4. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
5. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
6. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
7. A prescrição da dívida exequenda constitui fundamento de oposição à execução (cfr. artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), consubstanciando excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário).
8. A determinação do regime de prescrição a aplicar ao caso concreto faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei (cfr.artº.297, nº.1, do C.Civil).
9. Como se retira do preceituado nos artºs.318 a 320, do C.Civil, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo. Os factos suspensivos são de natureza duradoura, obstando ao começo e ao decurso do prazo de prescrição enquanto perdurarem, como se infere dos citados artºs. 318, 319 e 320, do C.Civil. Nas leis tributárias prevêem-se factos especiais a que é atribuído efeito suspensivo, pelo que serão essas as regras a aplicar em matéria de prescrição da obrigação tributária (cfr.v.g.artº.49, nº.4, da L.G.Tributária). Concluindo, para além da especificidade dos factos a que é atribuído efeito suspensivo, o regime da suspensão da prescrição da obrigação tributária não tem especialidades no domínio do direito tributário, pelo que, face a qualquer facto com natureza suspensiva, enquanto este surtir efeitos, a prescrição não começa nem corre.
10. Por sua vez, a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de toda o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr.artº.326, nº.1, do C.Civil). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr.artº.327, nº.1, do C.Civil).
11. Nos termos do artº.48, nº.2, da L.G.T., as causas de suspensão ou interrupção da prescrição produzem efeitos, igualmente, tanto em relação ao devedor principal, como aos responsáveis solidários e subsidiários. Esta produção de efeitos pelas causas de suspensão e interrupção da prescrição em relação a todos os devedores será um corolário do princípio da unicidade da relação jurídica tributária, em relação aos diferentes obrigados pelo seu cumprimento, tal como está consagrada no artº.18, nº.3, da L.G.T. Já o artº.48, nº.3, da L.G.T., consagra uma excepção a esta regra, fazendo depender a produção de efeitos em relação aos devedores subsidiários pelas causas de suspensão e interrupção que afectem o devedor principal da citação daqueles até ao termo do quinto ano posterior ao da liquidação. Saliente-se que a subordinação a condição da extensão ao responsável subsidiário dos efeitos dos actos praticados em relação ao devedor originário, que se estabelece na norma em exegese, apenas está prevista quanto aos actos interruptivos da prescrição e não também quanto às causas de suspensão da prescrição, como tal denominadas, designadamente as previstas no artº.49, nº.4, da L.G.T.


O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
1-... , com os demais sinais dos autos, deduziu salvatério dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Loulé, exarada a fls.573 a 594 do presente processo, através da qual julgou parcialmente procedente a oposição pelo mesmo intentada visando a execução fiscal nº.1058-2004/104787.6 e aps., a qual corre seus termos no Serviço de Finanças de Faro, contra o opoente revertida e propondo-se a cobrança coerciva de dívidas de I.V.A., I.R.S. e Coimas fiscais, referentes aos anos de 2001 a 2007 e no montante total de € 170.290,59.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.608 a 614 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-A notificação determinante para efeitos de interrupção da caducidade do direito à liquidação, não pode ser a que foi dirigida pela A.T. à devedora originária, mas a que esta dirigiu ao revertido;
2-Revertido e devedora originária são pessoas jurídicas distintas e cujas notificações a uma e a outra são distintas e, apenas, a cada uma delas, respectivamente, poderão vincular, pois, de outro modo, a reversão seria automática, sem necessidade de audição prévia;
3-Esta, como se sabe, existe, exactamente, para que o futuro revertido possa ser ouvido e, se o entender, aduzir em sua defesa fundamentos que possam, eventualmente, determinar o afastamento de tamanho mecanismo;
4-A eventual reversão só opera em momento subsequente à citação/notificação da devedora originária, nomeadamente, após se concluir pela inexistência de património na sua titularidade suficiente para satisfazer o tributo em falta e demais acréscimos legais, pelo que, quando o revertido é, finalmente, citado/notificado, evidentemente, que os valores já são diferentes daqueles que, inicialmente, foram comunicados à devedora originária;
5-Daí que, a originária citação/notificação não possa ter a virtualidade de interromper o prazo de caducidade do direito à liquidação relativamente a pessoas jurídicas que não está a citar/notificar;
6-Ainda que o tivesse, no caso dos autos o Tribunal não poderia decidir desse modo, porquanto a matéria de facto dada como assente o não permite, já que, dela partindo, ficamos sem saber em que momento foi a devedora originária citada/notificada do tributo e, consequentemente, se, já, nessa data, havia ou não decorrido o prazo invocado pelo recorrente na peça processual inicial;
7-Nem sequer se sabe e, poderá mesmo ser essa a situação dos autos, se a citação/notificação dirigida à executada principal foi ou não recebida, i.é, se, porventura, não se mostra devolvida;
8-Cabe à Fazenda Pública o ónus da prova da realização dessa citação/notificação à executada principal;
9-Uma segurança temos, é que dos factos alinhados como provados, não resulta nenhum donde se possa concluir a data em que a devedora originária foi citada/notificada, sequer se, de facto, as recebeu e delas tomou conhecimento;
10-Terão, pois, os autos de se nortearem pela citação/notificação dirigida ao recorrente e, por este recebida, sendo esta que releva para efeitos da contagem do prazo de 4 anos respeitante ao tempo de que dispõe a A.T. para comunicar ao alegado devedor o tributo, sob pena de caducidade do direito de o poder liquidar;
11-No caso “sub judice”, na data em que a A.T. notificou o sindicante, já esse prazo havia decorrido, pelo que, se mostra caducado o direito pretendido exercer por aquela, o que foi invocado expressamente por este e, consequentemente, triunfa a sua pretensão;
12-Termos em que, deverá o presente recurso merecer integral provimento, com as legais consequências, como é inteiramente de JUSTIÇA !!!
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Não foram apresentadas contra-alegações no âmbito da instância deste primeiro recurso deduzido e tendo por objecto a sentença exarada em 1ª. Instância nos presentes autos.
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2-O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA também deduziu recurso dirigido a este Tribunal visando a sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Loulé, exarada a fls.573 a 594 do presente processo, cingindo o recurso à parte em que a decisão recorrida declarou a prescrição das dívidas exequendas de I.V.A., relativas aos anos de 2001 e 2002, sendo que, quanto a este último os períodos de tributação anteriores a 24/5/2002.
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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.618 a 621 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-A douta sentença recorrida decidiu pela procedência parcial do pedido na parte respeitante à prescrição das dívidas de I.V.A. de 2001 e das certidões devidamente identificadas naquela decisão;
2-A decisão não considerou como provado o facto respeitante à citação da sociedade devedora originária em 12/01/2005 conforme alegado na contestação da Fazenda Pública;
3-Fundamentou ainda a douta sentença recorrida que apesar de alegado na contestação, a F.P. não juntou qualquer prova do facto;
4-Porém, essa prova encontra-se nos autos, conforme documento que ora se anexa mas que já existe no processo não constituindo por esse facto o anexo qualquer documento;
5-Apesar da F.P. não ter referido especificamente o documento, o mesmo existe nos autos e prova o facto invocado pelo que devia ter sido considerado pela Mma Juiz “a quo”;
6-Não o tendo feito, incorreu o julgador da 1ª. Instância em erro de julgamento e violou o disposto no nº.1, do artº.49, da Lei Geral Tributária, por não considerar o facto interruptivo do prazo prescricional e, em consequência, julgou indevidamente prescritas as dívidas indicadas supra;
7-Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida na parte que reconhece a prescrição de dívidas exequendas como é de inteira JUSTIÇA.
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O opoente apresentou contra-alegações no âmbito da instância deste segundo recurso deduzido e tendo por objecto a sentença exarada em 1ª. Instância, nas quais pugna pela confirmação do julgado nesta parte (cfr.fls.627 a 632 dos autos), sustentando, nas Conclusões:
1-A prescrição é uma excepção peremptória que é de conhecimento oficioso (artº.175, do C.P.P.T.), sendo que, a interrupção da prescrição a ter existido em relação à ... , devedora originária, não produz efeitos em relação ao responsável subsidiário, por este ter sido citado, depois do 5º. ano ao da liquidação;
2-Deste modo, deve negar-se provimento ao recurso interposto. Decidindo-se assim, far-se-á a costumada JUSTIÇA !
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do provimento do recurso deduzido pela Fazenda Pública (cfr.fls.646 dos autos).
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Corridos os vistos legais (cfr.fls.648 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.576 a 582 dos autos - numeração nossa):
1-O oponente, conjuntamente com ... , constituiu em 14/11/1995 uma sociedade comercial por quotas com a denominação "... - Equipamentos e Serviços, L.da.", à qual foi atribuído o número de pessoa colectiva ... (cfr.documentos juntos a fls.22 a 34 dos presentes autos);
2-O capital da sociedade "... - Equipamentos e Serviços, Lda." foi inicialmente de 3.000.000$00 e ficou a pertencer aos dois sócios, sendo que ao sócio ... pertencia uma quota de 2.100.000$00 e ao sócio ... uma quota de 900.000$00 (cfr.documentos juntos a fls.22 a 34 dos presentes autos);
3-A sociedade "... - Equipamentos e Serviços, Lda." obrigava-se com a assinatura de um gerente, a qual foi atribuída ao oponente (cfr.documentos juntos a fls.22 a 34 dos presentes autos);
4-Em 14/12/2006, o oponente comunicou à sociedade "... - Equipamentos e Serviços, Lda.", por carta, a vontade de renunciar à gerência da sociedade (cfr.documento junto a fls.37 dos presentes autos);
5-Em 23/12/2006, realizou-se a assembleia-geral da sociedade "... - Equipamentos e Serviços, Lda." tendo como pontos para deliberação: “consentimento da sociedade relativamente à proposta de cessão de quota pertencente ao sócio ... para o Sr. ... : renúncia à gerência e nomeação e aceitação do cargo de gerente." (cfr.documento junto a fls.35 e 36 dos presentes autos);
6-Em 26/04/2010, foi efectuado o registo da renúncia ao cargo de gerente por parte do Oponente (cfr.documento junto a fls.27 a 34 dos presentes autos);
7-Em 15/02/2010, foi feita informação pelo Serviço de Finanças de Faro onde se conclui que "não são conhecidos quaisquer bens imóveis susceptíveis de penhora, possuindo a mesma um móvel, nomeadamente, um veículo automóvel de matrícula - 30-79-GD" (cfr.documento junto a fls.387 dos presentes autos);
8-Em 19/04/2010, foi feita informação pelo Serviço de Finanças de Faro onde se concluiu que "não são conhecidos bens penhoráveis suficientes para garantia da dívida" (cfr.documento junto a fls.397 dos presentes autos);
9-Em 14/12/2004, foi instaurado o processo de execução fiscal com o nº.1058-2004/104787.6 e apensos - relativo ao período de tributação de 2001 a 2007 pela quantia de € 170.290.59, a título de I.V.A. I.R.S. e Coimas, contra a executada "... - Equipamentos e Serviços, Lda." (cfr.documento junto a fls.76 a 79 dos presentes autos);
10-As certidões de dívida dizem respeito aos períodos de tempo constantes dos documentos juntos a fls.76 a 385, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido;
11-Em 19/04/2010, foi proferido projecto de despacho de reversão da execução contra o oponente (cfr.documento junto a fls.398 dos presentes autos);
12-Em 21/04/2010, o oponente, foi notificado do projecto de despacho de reversão (cfr. documento junto a fls.420 dos presentes autos);
13-O oponente exerceu o direito de audiência prévia (cfr.documento junto a fls.421 a 428 dos presentes autos);
14-Em 17/05/2010, o Chefe de Finanças de Faro, proferiu despacho onde designadamente refere: "(...) prossiga a reversão contra o oponente (…)” (cfr.documento junto a fls.434 dos presentes autos);
15-Em 19/05/2010, foi proferido despacho de reversão da execução contra o oponente (cfr.documento junto a fls.436 dos presentes autos);
16-O oponente foi citado em 25/05/2010 (cfr.documentos juntos a fls.447 a 459 dos autos).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não ficou provado que a devedora originária tenha sido citada em 21/01/2005.
Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na documentação junta aos autos e no depoimento das testemunhas ouvidas em audiência contraditória.
A testemunha ... , disse que era sócio da ... com 30% de quotas e era trabalhador. O outro sócio era o Oponente. A Sociedade era gerida pelo Oponente e foi constituída em 1995 tendo sido gerente até Dezembro de 2006. Nessa altura tentou-se uma venda de quota ao Sr. ... . Este inicialmente, mostrou-se interessado, mas não tinha dinheiro e por isso não se fez a venda das quotas logo. Passou-se só a gerência. Fez-se uma acta para acabar a gerência e passá-la para o Sr. ... . Também foi feita carta onde o Oponente renunciou à gerência. Confrontado com os documentos 3 e 4, reconheceu a sua assinatura e a do Oponente, o mesmo tendo acontecido com a carta e ainda a assinatura do Sr. ... na própria acta. A partir dessa data, tem ideia que o Oponente não teve mais intervenção. O Oponente tinha outras empresas e a testemunha foi trabalhar para uma delas. Só em 2010 foi possível vender as quotas. Já não trabalhava lá desde Dezembro de 2006. Em Dezembro de 2006, sabia que havia dívidas ao fisco, mas não tem ideia dos valores. Afirmou que tem a certeza que o Oponente deixou de ser gerente em Dezembro de 2006. Depois dessa data tentaram falar várias vezes com o Sr. ... para fazer a venda das quotas.
A testemunha ... , disse que "era fornecedor de equipamento audiovisual e também cliente da ... desde 2002. O Oponente é que era o gerente desta empresa. Era ele que fazia os pagamentos. A partir de 2006 deixou de ter negócios com a ... , porque o Oponente disse-lhe que a empresa estava a fechar. As quotas iam ser vendidas. Nunca mais o contactaram a partir dessa altura. Tinha conta-corrente com a ... . Nem sempre havia troca de dinheiro. Regularizou todas as contas com esta empresa. Não há dívidas. Depois de 2006 passou a fazer negócios com o Oponente, mas através de outra empresa do mesmo…”.
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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e que a mesma foi impugnada parcialmente pelos recorrentes este Tribunal julga provada a seguinte matéria de facto que se reputa igualmente relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
17-Em 12/1/2005, a sociedade executada originária, "... - Equipamentos e Serviços, Lda.", foi citada, através de carta registada com a.r., no âmbito do processo de execução fiscal nº.1058-2004/104787.6 e aps. identificado no nº.9 supra, o qual corre seus termos no Serviço de Finanças de Faro (cfr.documento junto a fls.95 dos presentes autos);
18-O despacho de reversão identificado no nº.15 supra, foi lavrado contra o opoente, enquanto responsável subsidiário e devido a insuficiência de bens da sociedade executada originária, pelo montante total da dívida exequenda de € 170.290.59, relativa a I.V.A. I.R.S. e Coimas dos anos de 2001 a 2007, tudo ao abrigo do artº.24, nº.1, al.b), da L.G.T. (cfr.documentos juntos a fls.397 e 436 dos presentes autos).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada uma dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar parcialmente procedente a presente oposição, mais decretando a extinção da execução fiscal revertida contra o opoente, quanto às seguintes dívidas:
1-Devido a ilegalidade da reversão quanto a todas as dívidas exequendas de coimas;
2-Devido a ilegalidade da reversão quanto a dívidas de I.V.A. e I.R.S. posteriores a 23/12/2006;
3-Devido a prescrição das dívidas exequendas de I.V.A. de 2001 e 2002, sendo que, quanto a este último ano, somente os períodos de tributação anteriores a 24/5/2002.
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Em primeiro lugar, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Levando em consideração, segundo um prudente critério, a tutela mais eficaz dos interesses em presença no âmbito do presente processo, deve concluir-se pela necessidade de apreciação, em primeiro lugar, do recurso apresentado pelo opoente ... , o qual, a merecer provimento, implica o desaparecimento do fundamento da apelação deduzida pela Fazenda Pública, assim ficando prejudicado o seu conhecimento (cfr.artº.124, do C.P.P.Tributário).
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O recorrente ... discorda do decidido sustentando, em síntese e como supra se alude, que a notificação determinante para efeitos de interrupção da caducidade do direito à liquidação, não pode ser a que foi dirigida pela A.T. à devedora originária, mas a que esta dirigiu ao revertido. Que revertido e devedora originária são pessoas jurídicas distintas e cujas notificações a um e a outra são distintas e, apenas, a cada uma deles, respectivamente, poderão vincular, pois, de, outro modo, a reversão seria automática, sem necessidade de audição prévia. Daí que a originária citação /notificação não possa ter a virtualidade de interromper o prazo de caducidade do direito à liquidação relativamente a pessoas jurídicas que não está a citar/notificar. Que no caso dos autos o Tribunal não poderia decidir como o fez, porquanto a matéria de facto dada como assente o não permite, já que, dela partindo, ficamos sem saber em que momento foi a devedora originária citada/notificada do tributo e, consequentemente, se já nessa data, havia ou não decorrido o prazo invocado pelo recorrente na peça processual inicial. Que nem sequer se sabe, e poderá mesmo ser essa a situação dos autos, se a citação/notificação dirigida à executada principal foi ou não recebida, i.é, se, porventura, não se mostra devolvida (cfr.conclusões 1 a 11 do recurso), com suporte em tal alegação, segundo entendemos, procurando consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal vício.
Desde logo, se remete o recorrente para a matéria de facto aditada ao probatório por este Tribunal e supra exarada no nº.17 da factualidade provada.
De acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, há muito se fixou o entendimento de que a falta de notificação da liquidação, enquanto elemento integrante da eficácia externa da mesma, é fundamento de oposição a enquadrar no artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário), dado não colidir com a apreciação da legalidade da própria liquidação, não representar interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título, poder ser provado por documento e constituir facto modificativo posterior à liquidação e anterior à emissão da certidão executiva. Face a esta interpretação jurisprudencial do quadro normativo existente, à qual se adere, fica aberta, na fase executiva, pelos meios legais de oposição, a discussão da falta ou de eventuais vícios da notificação, designadamente por inexigibilidade da dívida, ao abrigo do disposto no mencionado artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário).
Em resumo, o regime processual da defesa do contribuinte, nestas situações será o seguinte:
1-Se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o sujeito passivo pode sempre opor-se à execução ao abrigo da alínea i), do nº.1, do artº.204, do C.P.P.T., invocando a ineficácia do acto, que impede que a dívida seja exigível, sendo indiferente, para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o de extemporaneidade da liquidação;
2-Já se foi instaurada uma execução e efectuada notificação válida do acto de liquidação, mas a notificação foi realizada fora do prazo de caducidade previsto no artº. 45, nº.1, da L.G.T. (ou outro prazo especial que for aplicável), o contribuinte pode opor-se à execução ao abrigo da alínea e), do nº.1, deste artº.204, do C.P.P.T. (trata-se de situação que, no seu teor literal, poderia caber na mencionada alínea i), pois não se engloba nela a apreciação da legalidade da própria liquidação nem é matéria da exclusiva competência da entidade que emite o título, mas que era dela afastada à face do entendimento jurisprudencial referido formado na vigência do C.P.T., reconduzindo-se a utilidade da alínea e) ao afastamento da aplicabilidade deste entendimento; a possibilidade de oposição ao abrigo da alínea e) existirá independentemente de a própria liquidação ser extemporânea, isto é, de ela própria ser ilegal, pois não está em causa no processo de oposição à execução fiscal a apreciação da legalidade da liquidação, mas a sua oponibilidade ao seu destinatário);
3-Por último, se foi efectuada uma liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo, mas não foi ainda instaurada execução, o contribuinte pode impugnar judicialmente a liquidação, invocando a ilegalidade da sua extemporaneidade, porém, se o não fizer e não pagar a quantia liquidada, não ficará impedido de se opor à execução, ao abrigo da alínea e) referida, visto que, além da ilegalidade da liquidação, ocorre também a sua inexigibilidade por falta de tempestiva notificação (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/9/2011, rec.473/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.360).
Tanto à face do anterior C.P.T., como da actual L.G.T., o facto que obsta à caducidade do direito à liquidação e consequente inexigibilidade da dívida exequenda é a notificação do contribuinte no prazo determinado na lei (cfr.artº.33, nº.1, do C.P.T.; artº.45, nº.1, da L.G.T.).
O prazo de caducidade do direito à liquidação é de quatro anos, atento o disposto no artº.45, nº.1, da L.G.Tributária. Nos termos do artº.45, nº.4, da L.G.Tributária, o prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, sendo que, em relação ao I.V.A. tal prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do tributo (cfr.artº.45, nº.4, da L.G.T., na redacção da Lei 32-B/2002, de 30/12, a aplicável ao caso “sub judice”, visto que aplicável a todos os prazos em curso - cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 15/9/2010, rec.545/10).
No entanto, a notificação relevante para efeitos de obstar à caducidade do direito de liquidação é a relativa ao contribuinte, o sujeito passivo originário do tributo, e não a dos outros responsáveis solidários ou subsidiários. Com efeito, a caducidade é impedida pela prática, dentro do prazo legal, do acto a que se refere o direito (cfr.artº.331, nº.1, do C.Civil), pelo que, uma vez praticado validamente o acto, o afastamento da caducidade é definitivo, se não vier a ser anulado o feito que a impediu. Tanto à face do anterior C.P.T., como da actual L.G.T., o facto que obsta à caducidade é a notificação do contribuinte no prazo determinado na lei (cfr.artº.33, nº.1, do C.P.T.; artº.45, nº.1, da L.G.T.) e, por isso, ocorrendo essa notificação, não é necessária a notificação de qualquer outra pessoa para obstar à ocorrência da caducidade. No que concerne às notificações ou citações dos responsáveis solidários ou subsidiários, não lhes reconhecendo a lei qualquer relevo para efeitos de caducidade, é indiferente que ocorram após o termo desse prazo (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 24/1/2001, rec.25265; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 31/1/2001, rec.25263; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/5/2005, rec.381/05; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/9/2011, proc. 2907/09; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.491 e seg.).
No caso “sub judice”, o que o opoente/recorrente pretende é que se declare a caducidade do direito à liquidação de todas as dívidas exequendas, com excepção das que lhe foram notificadas enquanto revertido e no prazo de quatro anos previsto no artº.45, nº.1, da L.G.T. Ora, não figurando o opoente como contribuinte ou sujeito passivo originário das mencionadas liquidações e não pondo este em causa que tais dívidas foram devidamente notificadas à sociedade executada originária, "... - Equipamentos e Serviços, Lda.", no respectivo prazo de caducidade (cfr.nº.17 do probatório), julga-se manifestamente improcedente o recurso deduzido pelo opoente ... e confirma-se a decisão recorrida neste segmento, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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A Fazenda Pública aduz, em primeiro lugar e como supra se alude, que a decisão recorrida não considerou como provado o facto respeitante à citação da sociedade devedora originária em 12/01/2005, conforme alegado na contestação. Que essa prova encontra-se nos autos, conforme documento que ora se anexa mas que já existe no processo. Não o tendo feito, incorreu o julgador da 1ª. Instância em erro de julgamento (cfr.conclusão 2 a 4 e 6 do recurso), com suporte em tal alegação, segundo entendemos, procurando consubstanciar erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Revertendo ao caso dos autos, remete-se o recorrente para a factualidade aditada ao probatório por este Tribunal e supra exarada (cfr.nº.17 da matéria de facto), factualidade essa que concretiza, se bem percebemos, o que defende o apelante quanto ao que se deve extrair da produção de prova documental no âmbito dos presentes autos.
Nestes termos, deve este Tribunal concluir pela existência de erro de julgamento de facto de que padece a sentença recorrida no que se refere à dita citação da sociedade executada originária em 12/1/2005.
O recorrente dissente do julgado alegando, igualmente e como supra se alude, que a sentença recorrida decidiu pela procedência parcial do pedido na parte respeitante à prescrição das dívidas de I.V.A. de 2001 e das certidões devidamente identificadas na mesma. Que a decisão não considerou como provado o facto respeitante à citação da sociedade devedora originária em 12/01/2005 conforme alegado na contestação pelo apelante. Que o julgador da 1ª. Instância violou o disposto no nº.1, do artº.49, da Lei Geral Tributária, por não considerar o facto interruptivo do prazo prescricional e, em consequência, julgou indevidamente prescritas as dívidas indicadas supra (cfr.conclusões 1, 2 e 6 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de direito da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Deve, antes de mais, concretizar-se que a decisão do Tribunal “a quo” julgou prescritas as dívidas exequendas de I.V.A., relativas a 2001 e 2002, sendo que, quanto a este último ano, somente os períodos de tributação anteriores a 24/5/2002, tudo conforme mencionado supra.
São, portanto, estas dívidas o objecto do presente fundamento do recurso, havendo que apurar da sua prescrição, ou não, no caso concreto.
A prescrição da dívida exequenda constitui fundamento de oposição à execução (cfr. artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), consubstanciando excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário).
O decurso do prazo de prescrição extingue o direito do Estado à cobrança do imposto. O instituto da prescrição, tal como o da caducidade, tem na sua base o interesse da certeza e segurança jurídicas, encontrando aquele igualmente fundamento na negligência do credor (cfr.Pedro Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.274 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98 e seg.).
O prazo de prescrição das obrigações tributárias em geral é actualmente de oito anos (cfr.artº.48, da L.G.Tributária), sendo anteriormente de dez anos (cfr.artº.34, do C.P.Tributário), e antes de vinte anos nos termos do artº.27, do C.P.C.Impostos. Embora mais favorável ao contribuinte, o prazo actual não é de aplicação retroactiva, devendo, em tal situação, lançar-se mão dos princípios consagrados no artº.297, do C. Civil, no que diz respeito ao cômputo do mesmo. Nestes termos, o prazo de dez anos consagrado no artº.34, do C. P. Tributário, ou o prazo de oito anos consagrado no artº.48, da Lei Geral Tributária, somente se contam a partir da entrada em vigor dos respectivos diplomas (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/4/93, Acórdãos Doutrinais, nº.385, pág.461; ac.T.T.2ª.Instância, 29/10/91, C.T.F.365, pág.243 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.94 e seg.).
O termo inicial do prazo de prescrição conta-se em função da ocorrência do facto tributário (sendo computado a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, nos impostos periódicos, ou a partir da data em que o facto tributário ocorreu, nos impostos de obrigação única, salvo em relação ao I.V.A. em que tal prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que ocorreu a exigibilidade do tributo, se o regime aplicável for o previsto na L.G.T.- cfr.artº.48, nº.1, da L.G.Tributária).
Passemos à determinação do regime de prescrição a apor ao caso dos autos. A determinação do regime de prescrição a aplicar faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei (cfr.artº.297, nº.1, do C.Civil; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.94).
“In casu”, sendo o marco inicial do prazo de prescrição o dia 1/1/2002, face à dívida exequenda de I.V.A. de 2001 (cfr.artº.48, nº.1, da L.G.T.), mais levando em consideração que a L.G.T. entrou em vigor em 1/1/99 (cfr.artº.6, do dec.lei 398/98, de 17/12), conclui-se ser aplicável ao caso em apreciação o regime previsto neste diploma.
Analisemos agora os factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição, para tanto havendo que convocar o disposto no artº.49, da L.G.Tributária. A suspensão da prescrição tem o seu regime civil previsto nos artºs.318 e seg., do C.Civil. Por sua vez, a interrupção da prescrição está regulada nos artºs.323 e seg., do C.Civil.
Como se retira do preceituado nos artºs.318 a 320, do C.Civil, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo. Os factos suspensivos são de natureza duradoura, obstando ao começo e ao decurso do prazo de prescrição enquanto perdurarem, como se infere dos citados artºs. 318, 319 e 320, do C.Civil. Nas leis tributárias prevêem-se factos especiais a que é atribuído efeito suspensivo, pelo que serão essas as regras a aplicar em matéria de prescrição da obrigação tributária (cfr.v.g.artº.49, nº.4, da L.G.Tributária, na redacção resultante da Lei 53-A/2006, de 29/12 - O.E. de 2007). Concluindo, para além da especificidade dos factos a que é atribuído efeito suspensivo, o regime da suspensão da prescrição da obrigação tributária não tem especialidades no domínio do direito tributário, pelo que, face a qualquer facto com natureza suspensiva, enquanto este surtir efeitos, a prescrição não começa nem corre.
Por sua vez, a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de toda o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr.artº.326, nº.1, do C.Civil). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr.artº.327, nº.1, do C.Civil). Resultam, assim, destes artºs.326 e 327, do C. Civil, dois conceitos de interrupção da prescrição: um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição do tempo decorrido); outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição). Nas leis tributárias prevêem-se factos a que é atribuído efeito interruptivo da obrigação tributária, pelo que não há que fazer apelo às normas do C.Civil, no que concerne a determinar os factos interruptivos. Porém, os efeitos da interrupção da prescrição não estão completamente regulados, assim devendo aplicar-se, quanto a estes, subsidiariamente o regime do Código Civil (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/1/2013, proc.5512/12; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.52 e seg.).
Mais se dirá, que a aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais, em resultado da previsão normativa do artº.297, nº.1, do C.Civil, não impõe a aplicação de um ou outro regime em bloco, pois só se refere tal normativo à lei que altere o prazo e não aos termos em que se conta, nem a tudo o que releva para o seu curso. O texto do artigo e a respectiva epígrafe revelam que se tem em vista apenas as leis que alteram prazos e não as que alteram os efeitos das causas interruptivas ou suspensivas da prescrição. Por isso, as leis que alteram causas de suspensão ou interrupção não sendo leis sobre “alteração de prazos”, não estão abrangidas na previsão do referido artº.297, do C.Civil. Estas leis seguem a regra de aplicação no tempo do artº.12, nº.2, do mesmo diploma (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/2/2011, rec.807/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5689/12; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.92).
Nos termos do disposto no artº.12, nº.2, do C.Civil, a lei aplicável aos factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição será a vigente no momento em que os mesmos ocorreram. Assim sendo, nos termos do artº.49, nº.1, da L.G.T., a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição, a que acresce a citação como facto interruptivo por força da redacção dada à referida norma pela Lei 100/99, de 26/7, cuja vigência se iniciou em 1/8/1999.
No caso concreto, atenta a matéria de facto provada, assume relevância, desde logo, como vector interruptivo da prescrição, a citação da sociedade executada originária, "... - Equipamentos e Serviços, Lda.", no âmbito do processo de execução fiscal nº. 1058-2004/104787.6 e aps., a qual ocorreu em 12/1/2005 (cfr.nº.17 da matéria de facto provada).
Tal facto interruptivo inutilizou todo o tempo decorrido anteriormente. Relembre-se que ocorrendo uma causa de interrupção e findos os efeitos da mesma, inicia-se uma nova contagem do prazo, ou seja, mais 8 anos. Concretizando, a contagem do novo prazo de prescrição de oito anos passa a ter o seu termo inicial em 13/1/2005, dado que nos encontramos perante facto interruptivo (a citação da sociedade executada originária) de natureza instantânea.
Haverá, agora, que saber se este facto interruptivo da prescrição é, ou não, oponível ao opoente, enquanto responsável subsidiário, para tanto devendo chamar-se à colação o artº.48, nº.3, da L.G.T.
Nos termos do artº.48, nº.2, da L.G.T., as causas de suspensão ou interrupção da prescrição produzem efeitos, igualmente, tanto em relação ao devedor principal, como aos responsáveis solidários e subsidiários. Esta produção de efeitos pelas causas de suspensão e interrupção da prescrição em relação a todos os devedores será um corolário do princípio da unicidade da relação jurídica tributária, em relação aos diferentes obrigados pelo seu cumprimento, tal como está consagrada no artº.18, nº.3, da L.G.T.
O aludido artº.48, nº.3, da L.G.T., consagra uma excepção a esta regra, fazendo depender a produção de efeitos em relação aos devedores subsidiários pelas causas de suspensão e interrupção que afectem o devedor principal da citação daqueles até ao termo do quinto ano posterior ao da liquidação. Saliente-se que a subordinação a condição da extensão ao responsável subsidiário dos efeitos dos actos praticados em relação ao devedor originário, que se estabelece na norma em exegese, apenas está prevista quanto aos actos interruptivos da prescrição e não também quanto às causas de suspensão da prescrição, como tal denominadas, designadamente as previstas no artº.49, nº.4, da L.G.T.
Os efeitos que não se produzem em relação ao responsável subsidiário que não for citado até ao fim do quinto ano posterior ao da liquidação são todos os efeitos dos actos interruptivos, isto é, tanto a inutilização do período de tempo decorrido anteriormente, que é própria dos actos interruptivos da prescrição, como o efeito suspensivo que decorre desses actos. Releve-se que, apesar do regime consagrado nesta norma, no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao quinto ano, se ele for citado até ao fim do oitavo ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se, tanto em relação a ele, como também em relação ao devedor originário, por força do estatuído no artº.48, nº.2, da L.G.T. (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 1/9/2010, rec.635/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/6/2013, rec.215/13; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Editora Encontro da Escrita, 4ª. edição, 2012, pág.392 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.264 e seg.).
Voltando ao caso dos autos, do exame da factualidade provada deve assentar-se que não sobreveio qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição face ao opoente, pelo que o termo final do mesmo quanto à dívida de I.V.A. de 2001 ocorreu em 31/12/2009, devendo declarar-se a prescrição, no caso concreto (recorde-se que este somente foi citado no âmbito do processo de execução fiscal nº.1058-2004/104787.6 e apensos em 25/05/2010 - cfr.nº.16 do probatório).
O mesmo se diga face às dívidas exequendas de I.V.A. relativas ao ano de 2002 e com períodos de tributação anteriores a 24/5/2002. Também neste caso, não se verificando qualquer facto interruptivo ou suspensivo da prescrição, o termo final do prazo de oito anos ocorreu em 23/5/2010, portanto, também em momento anterior à citação do opoente no âmbito do processo de execução fiscal. Concluindo, identicamente neste segmento se deve confirmar a decisão recorrida.
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se procederá na parte dispositiva do acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO A AMBOS OS RECURSOS E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condenam-se os recorrentes em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 30 de Janeiro de 2014



(Joaquim Condesso - Relator)

(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)