Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04125/10
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:09/15/2010
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IRS.
GANHO PROVENIENTE DE OBRIGAÇÕES DE NÃO CONCORRÊNCIA.
LEI INTERPRETATIVA.
Sumário:I -Sendo os montantes que estão na génese da liquidação adicional sindicada contrapartida da assunção de obrigações de não concorrência, os mesmos constituem rendimentos de categoria G (artigo 9°/1/c) do CIRS).

II) -Em IRS funciona a óptica de caixa, ou seja, os vários tipos de rendimentos (A, B, E, F, G) só ficam sujeitos a imposto e a têm de ser declarados no ano em são recebidos ou postos à disposição do respectivo titular.

III) -Provando-se que os rendimentos em causa foram recebidos e postos à disposição do recorrente em 2001 e decorrendo expressamente do artigo 43°/2 da referida Lei, que a redacção por ela introduzida ao n°4 do artigo 9° do CIRS, aprovado pelo DL 442-A/88, de 20 de Novembro, tem natureza interpretativa, isso quer dizer que a nova redacção não veio trazer nada de novo, pois já resultava do ordenamento jurídico que os incrementos em causa constituíam rendimentos do ano em que eram pagos ou postos à disposição dos titulares.

IV) -Tendo sido atribuída ao preceito, pela própria Lei que o introduziu, “natureza interpretativa”, estamos perante uma interpretação autêntica, do próprio legislador, que vem, por esta forma, fixar vinculativamente o alcance que, ab initio, deve ser atribuído ao preceito interpretado pois a norma interpretativa integra-se na norma interpretada, retroagindo os seus efeitos ao início da vigência desta (art. 13º, nº 1 do C.Civil), ou seja, retroage os seus efeitos até à data da entrada em vigor da antiga lei, tudo ocorrendo como se tivesse sido publicada na data em que o foi a lei interpretada.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:
1. A......................... veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do TAF de Loulé, pela qual foi julgada improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra o acto de liquidação do IRS do ano de 2001.
São estas as conclusões das alegações do recurso e que definem respectivo objecto:
“1. Há na sentença erro na interpretação dos factos e uma incorrecta aplicação das normas aplicáveis;
2. No âmbito de um contrato promessa de venda de activos de 21 de Junho de 2000 celebrado entre a impugnante e outros (junto aos Autos como documento 2) foi estabelecido com a empresa World .............., Lda. um pacto de não concorrência subscrito, entre outros, pela impugnante Margarida Sousa, pelo qual deveria a mesmo ter recebido, como de facto recebeu, a quantia de PTE 35.000.000$00/Euros 174.579,261 em 21 de Junho de 2000 e a quantia de PTE 131.665.000$00/Euros 656.742,25 em 21 de Dezembro de 2000 , cfr. cláusula oitava, número 4, alíneas ci) e cii) do referido contrato ;
3.Por dificuldades de tesouraria, ou por ausência dos administradores para emitirem os cheques, a devedora World ........., Lda. não pagou a quantia de PTE 131.665.000$00/Euros 656.742,25 em 21 de Dezembro de 2000, tendo entrado em mora, efectuando tal pagamento apenas em princípios de Janeiro de 2001;
4. Não obstante, a prestação devida à impugnante a título de obrigação de não concorrência contratualmente estabelecida, venceu-se e tornou-se exigível em 21 de Dezembro de 2000. (uma quinta-feira);
5. Atendendo à quadra natalícia, não houve tempo útil para exercer atempadamente por via judicial ou extrajudicial, qualquer direito que permitisse antes de Janeiro de 2001 receber efectivamente o valor contratualmente acordado;
6. Sendo neste enquadramento factual que se situa o diferimento do pagamento, vencido em 21.12.2000;
7.O atraso/adiamento no pagamento não é imputável à impugnante que para ele não contribuiu, nem o desejou;
8. Não existem meios legais ou processuais adequados a obter o pagamento em tempo útil, nestas condições pelo que não restava outra alternativa que não fosse a aceitação da realidade e aceitar o facto de a mora no pagamento ser inevitável;
9. Ora, ao tempo do facto constitutivo da obrigação de pagamento - e é este o facto que determina a obrigação de imposto - e simultaneamente gerador da eventual incidência do imposto liquidado - ano 2000 - , tais rendimentos não eram tributados porque inexistia incidência real;
10. Os proveitos resultantes da assumpção de obrigações de não concorrência apenas passaram a ser tributadas com a publicação da Lei 30- G/2000 de 29 de Dezembro que no seu artigo 2- (página 7492 - (668) do DR nº299 de 29 de Dezembro de 2000) aditou ao código do IRS o artigo 9º-A que passou a tributar as obrigações de não concorrência como incrementos patrimoniais susceptíveis de tributação em mais-valias e que entrou em vigor no dia 01 de Janeiro de 2001, aplicando-se apenas aos períodos de tributação que se iniciem após essa data;
11. No ano 2000 não existia incidência real ou pessoal que tributasse proveitos originados em assumpção de obrigações de não concorrência;
12. Sendo que, nos termos do artigo 103º nº3 da Constituição da República Portuguesa: "Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei”;
13. E nos termos do artigo 12º da LGT: "As normas tributárias aplicam-se aos factos posteriores à sua entrada em vigor, não podendo ser criados quaisquer impostos retroactivos.";
14. O rendimento obtido pela impugnante, a ser tributado, teria necessariamente que o ser pelo sistema fiscal em vigor no ano 2000;
15. Na verdade, o momento determinante para a incidência real das mais-valias é o da assumpção da obrigação e não o momento do pagamento, Veja-se que, para efeito de mais valias imobiliárias o momento determinante para a incidência é o da escritura ou do acto transmissivo equivalente, independentemente do eventual diferimento do pagamento do preço, ou mesmo que este não venha a ser pago;
16. Nas mais valias em IRS não vigora a "óptica de caixa" que se verifica na categoria A, em que o imposto é determinado no momento do pagamento ou colocação à disposição - o que nesta categoria se compreende face à necessidade de protecção dos trabalhadores por contra de outrem;
17. Em todas as demais categorias do IRS e mesmo no IVA o imposto é devido e torna-se exigível com a mera verificação do facto gerador de tributação. Veja-se a título exemplificativo as normas de exigibilidade do IVA e as normas de exigibilidade dos rendimentos enquadráveis na categoria G do IRS;
18. É apenas com a Lei 60-A/2005 de 30 de Dezembro que no número dois do seu artigo 43º (páginas 7506 - (10-11) do DR ne 250 de 30 de Dezembro de 2005) - que entrou em vigor no dia 01 de Janeiro de 2006 - se aditou ao artigo 9º do CIRS o seu nº 4 que passou a considerar que os incrementos patrimoniais previstos na alínea c) do nº1 como rendimentos do ano em que são pagos ou colocados à disposição;
19. Da análise destas disposições legais referidas supra deverá concluir-se o seguinte:
• Apenas a partir de Janeiro de 2001 passou a existir incidência real para ao proveitos originados em obrigações de não concorrência, que passaram a ser considerados incrementos patrimoniais susceptíveis de tributação na categoria G do IRS;
• Até Janeiro de 2001 não existia qualquer tributação sobre os referidos proveitos;
• A tributação de tais proveitos a partir de 2001, sendo os mesmos considerados mais-valias atendia, para efeitos de determinação do momento temporal da verificação da incidência, não ao momento do pagamento, mas sim ao do facto gerador da respectiva incidência;
• Apenas a partir de 2006, com o aditamento do nº4 do artigo 9º do CIRS se passou a considerar os incrementos patrimoniais previstos na alínea c) do nº1 como rendimentos do ano em que são pagos ou colocados à disposição;
Termos em que, deverá ser declarada a inexistência do imposto à data dos factos a que respeita a obrigação e, em consequência, ser considerada procedente a impugnação.”
Não foram apresentadas contra -alegações.
O EPGA pronunciou-se no sentido de que o recurso não merece provimento pelas razões às quais infra se fará alusão.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
*
2. -A sentença recorrida deu como assentes os seguintes factos com base no teor dos documentos juntos aos autos:
“1) Por contrato promessa de compra e venda de activos celebrado em 21 de Junho de 2000, em que intervieram, de um lado J.........., E............., Lda, representada por todos os seus sócios, a sociedade P.......... & B....... - Sociedade ............., Lda, Paulo ............... (que outorga também em nome próprio) Ana ..........................., Margarida ................... e Maria ...................... e por todos os seus gerentes, (para além de Margarida ..................) Anibel ..................... e Augusto .................. que outorgam o contrato também em nome próprio, J............ – E............ .............. Lda, Fenton ............, Ltd, e de outro lado a World ........... - Edição ................., Lda, como promitente comprador, junto a fls 30 a 49, dos autos que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, ficou estipulado, designadamente, nas seguintes Cláusulas: "Sétima
1. Os outorgantes Paulo ..............., Margarida ......................, Anibal ................... e Augusto ......................, em nome próprio e a partir da data da conclusão, obrigam-se perante a WE a não concorrer com lea e consequentemente a não realizar, por si ou por interposta pessoa, qualquer actividade idêntica, similar ou sucedânea ao negócio de publicações, listas, anuários, guiões, publicidade, seja por meios tradicionais, seja por meios informáticos ou electrónicos, designadamente através de participação (directa ou indirecta) em sociedades, consultadoria, prestação de trabalho dependente ou independente, no território de Portugal ou de Espanha, ou noutro território desde que as línguas utilizadas sejam o português ou castelhano.
2. As primeiras contratantes, por seu lado, e também após a data da conclusão, obrigam-se perante a WE a não concorrer com ela, nos mesmos termos que os outorgantes identificados no número anterior.
3. A obrigação de não concorrência estabelecida nos dois números anteriores perdurará por três anos a contar da data da conclusão.
4. O incumprimento, por qualquer dos outorgantes referido no número um, ou por qualquer das primeiras contratantes da obrigação de não concorrência estabelecida nesta cláusula, determinará a aplicação pela WE, a qualquer dos incumpridores, de uma sanção pecuniária que se fixa desde já em cento e cinquenta mil contos.
5.Ficam excluídas da obrigação de não concorrência estabelecida nesta cláusula a prestação de trabalho dependente ou de consultadoria que a WE, ou empresas com ela agrupadas, venham a contratar com alguns dos outorgantes referidos no número 1, bem como a participação na ITN - ..............., Lda, caso a WE não venha a adquirir as quotas desta nos termos do contrato celebrado.
Oitava
1. O montante global a pagar pela WE a titulo de preço da venda e transmissão de activos objecto deste contrato e a titulo de compensação pela obrigação de não concorrência, é de 1.550.000 contos.
2.O montante global acima referido será pago pela WE em duas tranches:
a) uma no montante de setecentos e setenta e cinco mil contos na data da conclusão;
b) Outra no montante de setecentos e setenta e cinco mil contos dentro de seis meses decorridos sobre a data da conclusão.
3. O preço da venda e transacção dos activos será pagoa a cada uma das primeiras contratantes consoante a seguinte divisão, constando a imputação por activos ou grupos de activos no anexo 8.
a) para a J...............;
ai) 120.000, na data da conclusão;
aii) 200.000 contos, até seis meses após a data da conclusão;
b) para a J......... 40.000 contos, na data da conclusão;
c) para a F............
ci) 420.000 contos na data da conclusão;
cii) 180.000 contos, até seis meses após a data da conclusão.
4. A compensação pela obrigação de não concorrência estabelecida na cláusula sétima será paga aos outorgantes referidos no número l dessa cláusula consoante a seguinte divisão:
a) ao outorgante Paulo ................., 90.000 contos na data da conclusão;
b) à outorgante Margarida .................:
bi) 35.000 contos na data da conclusão;
bii) 131.670 contos até seis meses da data da conclusão;
c) ao outorgante Aníbal .....................:
ci) 35.000 contos, na data da conclusão;
cii) 131.655 contos até seis meses da data da conclusão;
d) ao outorgante Augusto .................:
di) 35.000 contos na data da conclusão;
dii) 131.665 contos até seis meses da data da conclusão.
5. Os pagamentos previstos nas alíneas aii) e cii) do n° 3 e nas alíneas bii), cii) e dii) do n° 4 serão asseguradas por garantias bancárias individusia em beneficio dos destinatários dos pagamentos (considerando-se todavia que o montante da alínea cii) do n° 3 se incorpora paritariamente nas garantias em favor dos outorgantes em nome pessoal) garantias essas que seguirão as minutas constantes no anexo 4.
2) Ao impugnante Augusto .................. foi paga a quantia de €174.579,26 (PTE 35.000.000$00) em 21 de Junho de 2000 (facto confessado pelo impugnante e aceite pela administração fiscal);
3) Em 21 de Junho de 2000 foi celebrado um aditamento ao contrato promessa de compra e venda referido em 1), junto a fls 19 a 22, do processo administrativo, que compõe o Anexo l, do RIT, que se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais e, que se reproduz na parte que interessa para a decisão da causa:
" por, de uma parte,
A) J............ - Edições ............, Lda (J.............) no acto representado por todos os seus sócios gerentes, alguns deles outorgando em nome próprio;
B) F.............................. (F..........) e de outra parte,
2) World .......... - Edições ........, Lda (WE) Considerando que:
A) Alguns dos outorgantes do contrato promessa referido no proémio e doravante designado simplesmente por "Contrato" resolveram alterar algumas das condições de execução do Contrato;
B) Essa alteração em nada briga com os direitos e obrigações das partes outorgantes do Contrato não celebrantes do presente aditamento;
E agora expressamente convencionado e reduzido a escrito, por, De uma parte:
• J..........;
• F...............;
• Margarida .................., doravante designada simplesmente por Margarida ................;
• Aníbal ................, doravante designado simplesmente por Aníbel ........., e
• Augusto ................., doravante designado simplesmente por Augusto .......... E de outra parte,
• WE
Em aditamento ao Contrato que fica sujeito às cláusulas seguintes:
1a
1. As partes ora outorgantes aceitam modificar o esquema de prazos dos pagamentos constantes dos números 2, 3 e 4 do Contrato da seguinte forma:
a) O pagamento previsto realizar-se pela WE à J............. em valor de 200.000 contos nos termos da subalínea aii) do n° 3 da cláusula oitavo é reduzido para 125.407.054$00, em virtude da aplicação da alínea i) do n° l da cláusula décima primeira do Contrato: este valor de PTE 125.407.054$00 contem uma verba relativa a IVA incorrido pela WE, conforme descriminado no anexo 8 do Contrato, no montante de PTE 29.461.510$00;
b) O prazo para pagamento previsto realizar-se pela WE à F......... no valor de 180.000 contos nos termos da subalínea cii) do n° 3 da cláusula oitava é prorrogado para o dia 31 de Janeiro de 2001.
c) Os prazos e valores dos pagamentos referidos nas subalíneas bii), cii) e dii) do n° 4 da cláusula oitava a realizar pela WE, respectivamente a Margarida ........., Aníbal ............ e Augusto ............. são realizados da forma seguinte:
ci) Margarida ......... recebe na data de 2 de Janeiro de 2001 a quantia de 20.000 contos e o remanescente da quantia de 111.670 contos na data de 31 de Janeiro de 2001;
cii) Aníbal ............, recebe na data de 2 de Janeiro de 2001 a quantia de 20.000 contos e o remanescente da quantia de 11.665 contos na data de 31 de Janeiro de 2001;
ciii) Augusto ..............., recebe na data de 2 de Janeiro de 2001 a quantia de 60.000 contos e o remanescente na quantia de 71.665 contos na data de 31 de Janeiro de 2001.
2. A WE entrega nesta data para pagamento à Jovipress, a Margarida Sousa, Aníbal .......... e a Augusto............ as importâncias respectivas de 105.407.054$00, 20.000.000$00, 20.000.000$00 e 60.000.000$00, todos com a data de 31 de Dezembro de 2000, ficando expressamente aceite por todas as partes que estes cheques só podem ser apresentados a desconto ou a depósito na data de 2 de Janeiro de 2001.
(-)
Em cumprimento da ordem de serviço n° 85625, de 2003-06-06, da Direcção de Finanças de Lisboa foi realizada acção de inspecção e elaborada a seguinte
Informação:
"l Correcções propostas
1.1 - No ano de 2001 e em 02 e 31 de Janeiro, foram pagas pela W........E........- Edição .............., Lda a Augusto ..............., as verbas de Esc. 60.000.000$00 e Esc. 71.665.000$00 a titulo de compensação pela obrigação de n~so concorrência (Anexo II de 11 folhas).
1.2 - Através da Lei 30-G/2000, de 27-12, ficou estipulado que os incrementos patrimoniais, relativas a importâncias auferidas a titulo de compensação pela não concorrência, são considerados rendimentos da categoria G (alínea c) do n° l do artigo 9° do CIRS) e objecto de declaração em IRS pelas pessoas que as auferem.
1.3 - Da consulta do sistema informático da DGCI, verifica-se que o sujeito passivo, acima identificado, não declarou no ano de 2001, como rendimento da categoraia G, o valor de Esc. 131.665.000$00 (€656.742,25) pelo que, se vai proceder ao referido acréscimo dos valores declarados em IRS, para efeitos de apuramento do rendimento liquido total, e consequentemente liquidação adicional a proceder pela Administração Fiscal, tendo em atenção o disposto nos artigos 89° e 76° n° l, alínea c) todos do CIRS.
2 - Da consulta ao sistema informático da DGCI, verifica-se que o sujeito passivo auferiu no ano de 2001, rendimento da categoria F no valor de €12.021,03, tendo-lhe sido retido IRS no montante de €1.803,15. A entidade pagadora de tais rendimentos foi a W........ E.........(NIPC 503 949 847).
2.1 - Como se verifica que os referidos rendimentos estão omissos na DR modelo 3 do ano de 2001 e à semelhança do que foi referido no ponto 1.3, as mesmas vão ser acrescidos aos rendimentos declarados, para efeitos de liquidação adicional.
(-)"
4 - Direito de Audição – Fundamentação
4.1 Pelo oficio n° 9638, de 03-07-2003 foi o contribuinte notificado com carta registada para o domicilio fiscal sito na Ava .............. 23 - ... B, em L......... (morada constante no cadastro do sistema informático da DGCI) para, no prazo de dez dias, exercer o seu direito de audição referente às correcções propostas pela Administração Fiscal, tendo os CTT devolvido a carta com a indicação de "ser desconhecido na morada indicada", Anexo II de l folha.
4.2 - Como tivemos acesso à DR mod 3 do ano de 2001, verificamos que os titulares A e B não assinaram a declaração de rendimentos, tendo a mesma sido assinada por um representante legal ou gestor de negócios, Sr. Cândido José .............. (NIF ..........). Assim, procedemos a idêntica notificação para a morada do representante do Sr. Augusto ..............., dando cumprimento ao estipulado no n° l do art" 130° do CIRS (ex art° 129°) que diz: "Os não residentes que obtenham rendimentos sujeitos a IRS, bem como os que, embora residentes em território nacional, se ausentem deste por um período superior a seis meses devem, para efeitos tributários, designar uma pessoa singular ou colectiva com residência ou sede em Portugal para os representar perante a Direcção Geral dos impostos e garantir o cumprimento dos seus deveres fiscais".
4.3 - Ficámos muito admirados pelo conteúdo da carta que o representante legal, Sr Cândido .............., nos disse solicitando a anulação da notificação:
1. Não sou representante do Senhor Augusto .................
2. Não tenho com o mesmo qualquer contacto.
4.4 - Então como é que o Sr. Cândido ................ assinou as DR mod 3 de 2001 e 2002, dos contribuintes Augusto .............. (titular A) Hannah ............ (titular B)? Junta-se em anexo III de 5 folhas, fotocópias da carta do representante legal e das DR mod 3 dos anos de 2001 e 2002, para que se veja que o mesmo assinou como representante legal.
4.5 - E ainda, se a carta que foi enviada para a morada da Ava ............., 23 - ........, em L........, veio devolvida, como é que o Sr° Augusto ..............., que não tomou conhecimento da primeira notificação, veio exercer o direito de audição através de carta escrita, que deu entrada nos Serviços de Inspecção em 28-10-03? Estamos em crer que foi o seu representante legal que lhe deu conhecimento do conteúdo do "Projecto de Conclusões do relatório", apesar de o mesmo ter escrito, na carta que nos enviou que "não tenho com o mesmo quaisquer contactos".
4.6 - Os fundamentos invocados pelo contribuinte são os constantes do anexo IV de 6 folhas e que passo a transcrever:

Por contrato promessa de venda de activos de 21 de Junho de 2000, celebrado entre a J............ Ld", j......... Ld", F......Ldt e W..... E...- Edição ........, Ld" (referida no contrato como WE) com sede na Rua ............... 87 em L........., com o capital social de mil contos, NIPC .............. representada pelos seus gerentes, Miguel ...................... e Eduardo ..................., que veio anexo por cópia ao oficio em referência e que aqui se considera integralmente reproduzido, foi efectivamente estabelecido um pacto de não concorrência subscrito, entre outros, pelo signatário Augusto ................. Com efeito,
Nos termos da cláusula sétima do referido contrato foi estabelecido:
l. Os outorgantes Paulo ................, Margarida ....................., Aníbal ...................... e Augusto ..............., em nome próprio e a partir da data da conclusão, obrigam-se perante a WE a não concorrer com lea e consequentemente a não realizar, por si ou por interposta pessoa, qualquer actividade idêntica, similar ou sucedânea ao negócio de publicações, listas, anuários, guiões, publicidade, seja por meios tradicionais, seja por meios informáticos ou electrónicos, designadamente através de participação (directa ou indirecta) em sociedades, consultadoria, prestação de trabalho dependente ou independente, no território de Portugal ou de Espanha, ou noutro território desde que as línguas utilizadas sejam o português ou castelhano.
2.As primeiras contratantes, por seu lado, e também após a data da conclusão, obrigam-se perante a WE a não concorrer com ela, nos mesmos termos que os outorgantes identificados no número anterior.
3.A obrigação de não concorrência estabelecida nos dois números anteriores perdurará por três anos a contar da data da conclusão.
4.O incumprimento, por qualquer dos outorgantes referido no número um, ou por qualquer das primeiras contratantes da obrigação de não concorrência estabelecida nesta cláusula, determinará a aplicação pela WE, a qualquer dos incumpridores, de uma sanção pecuniária que se fixa desde já em cento e cinquenta mil contos.
5.Ficam excluídas da obrigação de não concorrência estabelecida nesta cláusula a prestação de trabalho dependente ou de consultadoria que a WE, ou empresas com ela agrupadas, venham a contratar com alguns dos outorgantes referidos no número l, bem corno a participação na I.. - ................., Ldª, caso a WE não venha a adquirir as quotas desta nos termos do contrato celebrado.

Por tal obrigação de não concorrência o signatário Augusto ............... recebeu as seguintes quantias nas datas indicadas:
1. Em 21 de Junho de 2000 PTE 35.000.000$00 Euros 174.579,26
2. Em 21 de Dezembro de 2000 PTE 131.665.000$00 Euros 656.742,25
Tudo conforme disposto na cláusula oitava, número 4, alínea ai) e dii) que a seguir se transcreve:
4) A compensação pela obrigação de nos concorrência estabelecida na cláusida sétima será paga aos outorgantes referidos no número l dessa cláusula consoante a seguinte divisão:
d) ao outorgante Augusto ..................;
di) 35.000 contos na data da conclusão;
dii) 131.665 contos até seis meses da data da conclusão.

Acontece é que por dificuldades de tesouraria da referida W......... E......... (WE) foi por esta solicitado que os pagamentos viessem a ser concretizados em 2001, mas reportados a uma obrigação que se venceu em 21 de Dezembro de 2000 e que apenas entrou em mora por factos não imputáveis ã signatária, antes por dificuldades da entidade pagadora.

Acontece assim que, a obrigação se venceu e se tornou exigível em 21 de Dezembro de 2000 (uma quinta-feira). Nesse dia foi o contribuinte confrontado com o facto de a WE não ter dinheiro para efectuar o pagamento e de propor um adiamento para Janeiro.

Atendendo à quadra natalícia, não havia tempo útil para exercer atempadamente qualquer direito que permitisse antes de Janeiro receber efectivamente o contratualmente acordado.
Sendo neste enquadramento que se situa o diferimento do pagamento, vencido em 21.12.2000. Tal adiamento não é imputável ao contribuinte, para ele não contribuiu, nem o desejou. Não existiam meios legais ou processuais adequados a obter o pagamento em tempo útil, pelo que não restava outra alternativa que não fosse a aceitação da realidade.

Ou seja o facto constitutivo da obrigação e gerador da incidência ocorre em 2000, altura em que tais rendimentos não eram tributados. E é este o fado que determina a obrigação de imposto.
10°
O momento determinante é o da assumpção da obrigação e não o momento do pagamento. Com efeito, a título exemplificativo para efeito de mais valias imobiliárias o momento determinante é o da escritura, independentemente do eventual diferimento do pagamento do preço, ou mesmo que este não venha a ser pago.
11°
Não pode assim a administração fiscal ter dois pesos e duas medidas conforme as suas conveniências.
12°
Por outro lado, neste caso, a questão nem se coloca, já que contratualmente a obrigação foi constituída e deveria ser paga em 2000, altura em que não existia incidência real para o ganho proveniente de obrigações de não concorrência.
13°
Pelo que, sempre o pagamento terá que ser imputado, nos termos contratuais, a 21 de Dezembro de 2000 e não a Janeiro de 2001.
O DIREITO
14°
O actual artigo 9° no 1 alínea c) do Código do IRS, que tributa as "importâncias auferidas em virtude da assunção de obrigações de não concorrência, independentemente da respectiva fonte ou título" apenas entrou em vigor em 01 de Janeiro de 2001, não sendo de aplicação retroactiva, pelo que à data em que a obrigação de não concorrência foi assumida e se venceu, não existia qualquer incidência real para este ganho.
15°
Ora, não existindo incidência real, nos termos do artigo 103° no 3 da Constituição da República Portuguesa: "Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não tenham sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da Lei."
16°
Pelo que não existe no ano de 2001 qualquer obrigação tributária ou meramente declarativa em relação aos valores recebidos.
17°
Termos em que se requer a V. Exa a considerar procedentes os argumentos expostos e, em consequência, rectificar o projecto de conclusões e relatório, não se efectuando qualquer correcção à matéria colectável do IRS para o ano de 2001.
5 - Análise do Contraditório por Escrito
5.1 - Passamos, de imediato, à análise do contraditório escrito, subscrito pelo Sr Augusto .................., que deu entrada nestes serviços em 28-10-03, e que constitui o Anexo IV de 6 folhas.
5.2 - No ponto 3° do contraditório escrito o contribuinte diz ter recebido Esc. 35.000.000$00 em 21-06-2000 e Esc. 131.665.000$00 em 21-12-2000.
Cabem aqui dois reparos:
- Os Esc. 35.000.000$00 não foram incluídos nas correcções propostas, porque os mesmos foram pagos ao contribuinte em 29-06-2000;
- Os Esc. 131.665.000$00 que o contribuinte diz ter recebido em 21-12-2000, e que dizem respeito à correcção proposta, não foram recebido no ano de 2000, mas sim em 02-01-2001 (Esc. 60.000.000$00) e em 31-01-2001 (Esc. 71.665.000$00) perfazendo as duas verbas o total de Esc. 131.665.000$00.
5.3 - No ponto 5° o contribuinte diz que a W......... E........., por dificuldades de tesouraria, solicitou que os pagamentos viessem a ser feitos em Janeiro de 2001. No ponto 6° o contribuinte diz que em 21-12-2000 (5a feira) se viu confrontado com o facto da WE não ter dinheiro para efectuar o pagamento e de a mesma ter proposto em adiamento para Janeiro do ano seguinte. Diz ainda, que, atendendo à quadra natalícia, não tinha tido tempo para exercer atempadamente qualquer direito que permitisse antes de Janeiro de 2001 receber, efectivamente, o contratualmente acordado (ponto 7°).
5.4 - É estranho que o contribuinte refere nos pontos 5°, 6° e 7° do seu contraditório, pois o que na realidade se passou é que o pagamento daquelas duas verbas (Esc 60.000.000$00 e Esc. 71.665.000$00) efectuadas nas datas já indicadas (2 e 31 de Janeiro de 2001) resultou de um aditamento ao contrato de promessa de compra e venda de activos, assinado pelas partes (WE Augusto ..............., entre outros) em 21-12-2000, em que expressamente se convencionou, por acordo, que o esquema e prazos de pagamento constantes das subalíneas dii) do n° 4 da cláusula oitava, do contrato de venda de activos, fossem alterados e que Augusto ............... só receberia em 2 de Janeiro de 2001 a verba de Esc. 60.000.000$00 e em 31 de Janeiro de 2001 a verba de Esc. 71.670.000$00. E, ainda que o cheque de Esc. 60.000.000$00 só poderia ser apresentado a desconto ou a depósito na data de 2 de Janeiro de 2001 (vide folhas 8, 9,10 e 11 do Anexo I).
Como se vê houve acordo entre as partes, verificando-se assim, incoerência naquilo que é referido nos pontos 5°, 6° e 7° da audição escrita.
5.5 - Mas, aparte os comentários que nos propusemos fazer, a verdade é que em Janeiro de 2001, o contribuinte recebeu, efectivamente a titulo de compensação pela não concorrência, a verba de Esc. 131.665.000$00 (€656.742,25).
É irrelevante dizer que houve deferimento no pagamento, que o facto constitutivo da obrigação e gerador ocorreu em 2000.
Em IRS funciona a óptica de "CAIXA", isto é, os vários tipos de rendimentos (A, B, E, F e G) só ficam sujeitos a imposto (a ser declarados) no ano em que são recebidos ou postos à disposição. A al c) do n° l, do artigo 9° do CIRS diz expressamente que as importâncias auferidas em virtude da assunção de obrigações de não concorrência, são tributadas na categoria G, conforme estabelecido na Lei 30-G/2000, de 27/12.
Em conformidade só restava ao contribuinte Augusto ................. declará-las, o que não aconteceu. Por essa omissão declarativa vai a Administração Fiscal proceder ao respectivo englobamento nos rendimentos em 2001.
6 - Relativamente às correcções propostas aos rendimentos da categoria F, no montante de €12.021,03, o contribuinte não se pronunciou. Lisboa 6 de Novembro de 2003."
Sobre o Relatório de Conclusões da Acção de Inspecção incidiu parecer do Chefe de Equipa, de 13 de Outubro de 2003 (fls 2 de 44, do relatório de inspecção): "Na sequência de elementos disponíveis à Administração Fiscal verificou-se que no ano de 2001 foram pagas a Augusto ............, a titulo de "compensação pela obrigação de não concorrência", verbas num total de €656.742,25 (Esc. 131.665.000$00). Por força da Lei n° 30-G/2000, de 27/12, ficou estatuído que os rendimentos patrimoniais auferidos a titulo de compensação pela não concorrência, são considerados rendimentos da categoria G (alínea c) do n° l do art° 9° do CIRS) e objecto de declaração em IRS pelos titulares dos mesmos. Como o sujeito passivo não declarou na sua mod 3 os rendimentos auferidos, vão os mesmos ser objecto de liquidação adicional a processar pela AF, tendo em conta o disposto no art° 89° e 76° n° l, alínea c) todos do CIRS. Tendo-se verificado, ainda que no mesmo ano, o contribuinte auferiu rendimentos da categoria F, no montante de €12.021,03 (Esc. 2.410.000$00) pagos pela W......... E..........(NIPC ..........) que também omitiu na sua DR mod 3, vai o referido montante ser objecto de englobamento nos rendimentos declarados para efeitos de liquidação adicional, por força da legislação acima citada.
Através do exercício do direito de audição e para os incrementos patrimoniais, o contribuinte diz, entre outros, que o facto constitutivo e gerador de tais incrementos (contrato assinado entre a WE e Augusto ..........) ocorreu no ano de 2000, não devendo, por isso, ser tributados os referidos rendimentos no ano do seu recebimento, que foi em 2001. Conforme comentários ao contraditório escrito do contribuinte, é referido que é irrelevante tal facto, uma vez que, em IRS, a determinação dos rendimentos líquidos, subordina-se à óptica de caixa, ou seja, ao ano em que são recebidos ou postos à disposição. Sobre a correcção proposta aos rendimentos da Categ. F o sujeito passivo não se pronunciou."
4) Sobre o parecer referido no ponto anterior incidiu parecer do Chefe de Divisão, em 12 de "Novembro de 2003 confirmando a matéria do relatório e parecer (fls 2, de 44, do Relatório de Inspecção);
5) Sobre o parecer e relatório da acção de inspecção incidiu despacho de concordância da Directora de Finanças Adjunta, datado de 12 de Novembro de 2003 (fls l de 44 do Relatório de Inspecção);
6) Em 16-12-2005 a administração fiscal liquidou imposto de 1RS de 2001 (fls 59, do processo apenso);
7) A liquidação n° 2005 ................, de 1RS de 2001, foi notificada ao impugnante em 27-12-2005 (fls 58 do processo apenso);
8) O impugnante e Hannah ................... foram casados, tendo o casamento sido dissolvido em 15 de Março de 2002 (fls 24, dos autos);
9) A declaração de rendimentos de IRS relativa ao ano de 2001 foi entregue em nome de ambos os cônjuges Augusto ................ (sujeito passivo A) e Hannah .............. (sujeito passivo B) (fls 39 de 44 do relatório de inspecção);
10) A presente impugnação deu entrada em 16 de Fevereiro de 2006 (carimbo aposto no rosto de fls 5 dos autos).
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A convicção do Tribunal formou-se no teor dos documentos juntos em cada ponto dos factos provados.
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Factos não provados
Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.
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3. -A questão a decidir consiste em saber se, tendo a obrigação sido constituída e devendo ser paga em 2000, altura em que não existia incidência real para o ganho proveniente de obrigações de não concorrência e, por isso, sempre o pagamento teria que ser imputado, nos termos contratuais, a 21 de Dezembro de 2000 e não a Janeiro de 2001, era ou não aplicável o actual artigo 9° no 1 alínea c) do Código do IRS, que tributa as "importâncias auferidas em virtude da assunção de obrigações de não concorrência, independentemente da respectiva fonte ou título" que entrou em vigor em 01 de Janeiro de 2001.
Conforme o relatório da Acção de Inspecção de que foi alvo o impugnante, constatou-se que este auferido no ano de 2001, o montante de €656.742,25 (Esc.131.665.000$00) a título de "compensação pela obrigação de não concorrência" e que esses rendimentos não foram declarados pelo impugnante na declaração de rendimentos Modelo 3 de IRS, do ano de 2001, pelo que procederam os serviços à liquidação n°2005 ..................., nos termos dos art°s 89° e 76°, n° l al c), do CIRS.
Sucede que o impugnante afirma que recebeu as quantias de €174.579,26 em 21 de Junho de 2000 e €656.742,25, em 21 de Dezembro de 2000, sendo certo que no relatório de inspecção tributária consta que na correcção não foi incluída a verba de €174.579,26 percebida em 21 de Junho de 2000.
Feito este enfoque, a sentença recorrida enfrenta depois a questão decidenda nos seguintes termos:
“No que respeita à verba €656.742,25, não podemos concordar com a posição assumida pelo impugnante quando invoca ter sido recebida em 21 de Dezembro de 2000, pois que, como refere a Fazenda Pública na sua contestação a verba total foi recebida em duas tranches: de €299.278,74, recebida em 2 de Janeiro de 2001 €357.463,51 recebida em 31 de Janeiro de 2001.
Ora, o pagamento destas duas tranches resultou de um aditamento ao contrato de promessa de compra e venda de activos assinado em 21 de Dezembro de 2000 e em que, as partes expressamente convencionaram alterarem os prazos de pagamento constante da cláusula oitava, n° 4, subalínea dii), como se comprava da clausula P, subalínea ciii) do aditamento ao contrato promessa (ponto 1) e 2) do probatório).
Aliás do próprio aditamento e na cláusula 1a n° 2 é expressamente estipulado que o cheque no montante de €299.278,74 só pode ser apresentado a desconto ou a depósito no dia 2 de Janeiro de 2001.
Tendo havido pois acordo entre as partes intervenientes nos dois contratos pelo que não faz sentido o alegado pelo impugnante.
Assim, em virtude da entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2001, o estatuído na alínea c) do n° l do art° 9° do CIRS o impugnante devia ter declarado tais rendimentos, o que não aconteceu e daí a administração fiscal ter procedido ao englobamento.
Por outro lado, e atenta a questão prévia invocada que deste já se diga não procede uma vez que respeitando a nota de liquidação de IRS de 2001 e a declaração de rendimentos desse ano foi apresentada em nome dos dois cônjuges, casados à data, a divida tributária é da responsabilidade de ambos os cônjuges.”
Não podemos deixar de concordar com o Mº Juiz «a quo» no sentido de que a dívida é da responsabilidade de ambos os cônjuges e uma vez os montantes em causa recebidos em função da assunção de obrigações de não concorrência foram pagos no ano de 2001 são rendimentos desse mesmo ano.
Na verdade, na senda do douto parecer do EPGA, patenteia o probatório que os montantes que estão na génese da liquidação adicional sindicada são contrapartida da assunção de obrigações de não concorrência e constituem rendimentos de categoria G (artigo 9.°/l/c) do CIRS).
Ora, em IRS funciona a óptica de caixa, ou seja, os vários tipos de rendimentos (A, B, E, F, G) só ficam sujeitos a imposto e a serem declarados no ano em são recebidos ou postos à disposição do respectivo titular e resulta claramente do probatório que os ajuizados rendimentos foram recebidos e postos à disposição do recorrente em 2001.
Tendo isso presente e sendo certo que os ditos rendimentos estão expressamente, previstos no artigo 9.°/l/c) do CIRS, vejamos se eram passíveis de tributação.
Na tese do recorrente, só com a redacção do artigo 9.°/4) do CIRS introduzida pela Lei 60-A/2005, de 30 de Dezembro (LOE 2006) é que passou a constar, expressamente, da lei que os incrementos patrimoniais referidos nas alíneas b) e c) do presente artigo constituem rendimento do ano em que são pagos ou colocados à disposição e, por isso, os rendimentos em causa não podiam ser tributados por falta de norma de incidência objectiva vigorante no momento fiscalmente relevante.
É verdade que o tributo em causa está sujeito ao regime constitucional do imposto pelo que, de harmonia com o nº 3 do artº 103º da CRP “ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não tenham sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei”.
Como se expendeu nos Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 81/2005, 137/2005 e 138/2005, o princípio da não rectroactividade dos impostos consagrados nesta disposição com a quarta revisão constitucional operada pela Lei Constitucional nº1/97, de 20 de Setembro “é em geral, reconduzido ao princípio da protecção da confiança ínsito na ideia de estado de direito democrático, ou mesmo ao princípio da capacidade contributiva” – cfr. José Casalta Nabais, Jurisprudência do Tribunal Constitucional em matéria fiscal, in Boletim da faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, nº 57, 1993, p. 404. Significa que antes da 4ª Revisão da CRP, era já possível defender que era “...no princípio da confiança jurídica, enquanto dimensão inarredável da ideia de Estado de direito democrático, e não simplesmente no princípio da legalidade, que se encontrará (...) um limite constitucional à admissibilidade de normas fiscais rectroactivas –cf. J.M. Cardoso da Costa, O enquadramento constitucional do direito dos impostos em Portugal: A jurisprudência do Tribunal Constitucional, in Perspectivas Constitucionais: Nos 20 Anos da Constituição de 1976, vol. II, Coimbra, Coimbra Editora, 1997, pp 397-428).
Porém, como bem adverte o EPGA, decorre expressamente do artigo 43°/2 da referida Lei, que a redacção por ela introduzida ao n°4 do artigo 9° do CIRS, aprovado pelo DL 442-A/88, de 20 de Novembro, tem natureza interpretativa, o que vale por dizer que essa nova redacção não veio trazer nada de novo, pois já resultava do ordenamento jurídico que os incrementos em causa constituíam rendimentos do ano em que eram pagos ou postos à disposição dos titulares.
A este nº 4 foi atribuída, pela própria Lei que o introduziu, “natureza interpretativa”, tratando-se pois de uma interpretação autêntica, do próprio legislador, que vem, por esta forma, fixar vinculativamente o alcance que, ab initio, deve ser atribuído ao preceito interpretado.
Como é sabido, a norma interpretativa integra-se na norma interpretada, retroagindo os seus efeitos ao início da vigência desta (art. 13º, nº 1 do C.Civil), ou seja, “retroage os seus efeitos até à data da entrada em vigor da antiga lei, tudo ocorrendo como se tivesse sido publicada na data em que o foi a lei interpretada” (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, 2ª Edição, anotação ao art. 13º).
No caso em análise resultando, inequivocamente, demonstrado que os incrementos foram pagos ao recorrente em 2001, é manifesto que os mesmos devem ser tributados em IRS.
Termos em que improcedem as conclusões de recurso.
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4. - Termos em que, se acorda, em conferência, nesta 2ª Secção do TCA, em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
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Lisboa, 15/09/2010
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Eugénio Sequeira)