Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:211/08.0BEALM-A
Secção:CT
Data do Acordão:12/03/2020
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:EXECUÇÃO JULGADO
CADUCIDADE DIREITO ACÇÃO
Sumário:I. Na esteira da jurisprudência vertida no acórdão do Pleno do STA de 28/11/2008 transcrito, entendemos que para efeitos estritos de aferir da tempestividade do presente meio processual de execução de julgado é atendível a data da remessa do processo ao órgão de administração tributária, por os interessados não deverem ser prejudicados em matéria de prazos para a utilização dos meios de defesa, por confiarem no que dispõe a lei tributária, que no caso presente é o que dispõe o n.º 2, do artigo 146.º do CPPT.
II. A alegada inconstitucionalidade do artigo 146º, n.º 2 do CPPT é de afastar, tendo presente a interpretação supra referida dos preceitos em causa, no sentido de que a remessa do processo ao órgão competente não tem por função criar o dever de executar, pois, ela já existe desde o trânsito em julgado da sentença, por força do artigo 100.º LGT, mas apenas determinar o início o momento a partir do qual o interessado pode reagir judicialmente contra a inércia da administração tributária em dar execução ao julgado.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

1. A FAZENDA PUBLICA, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou parcialmente procedente a execução de julgado deduzida por M..., no âmbito do processo de impugnação judicial n° 211/08.0 BEALM, visando a condenação da Autoridade Requerida no pagamento à Exequente dos seguintes montantes, acrescidos de juros indemnizatórios: €960,00-Taxa de justiça da ação de impugnação judicial; €612,00-Taxa de justiça da ação de execução de sentença; €1.965,85 -Encargos com a Garantia Bancária; €766,05-Escritura de Mútuo com Hipoteca; €250,00-Conservatória do Registo Predial; €6.000,00- Honorários a Mandatário; €7.500,00- Indemnização por danos morais.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«1. A contribuinte acima indicada, melhor identificada nos autos, foi parte na impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRS de 2002, na qualidade de cônjuge do então impugnante marido, José Maria Soldado, dando assim origem ao processo n.° 211/08.0BEALM, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada.

2. Por sentença exarada em 31 de Maio de 2013, veio o douto Tribunal pugnar pela procedência daquela impugnação, julgando a impugnação procedente e, em consequência, anulando a liquidação adicional de IRS n.° 500…, do ano de 2002, juros compensatórios incluídos e condenando a Fazenda Pública nas custas devidas.

3. Não obstante esta decisão, vem a Impugnante, agora na qualidade de Exequente, requer a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA), a pagar a quantia de € 10.553,90, relativa a alegadas despesas suportadas com a prestação indevida da garantia e o patrocínio judiciário, acrescida dos correspondentes juros indemnizatórios, no prazo de 30 dias.

4. E ainda a quantia de € 7.500,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, totalizando o pedido a quantia de € 18.053,90 - dezoito mil e cinquenta e três euros e noventa cêntimos. O imposto nem sequer foi pago.

5. Por sua vez, a douta Sentença, decorrente do processo n.° 211/08.0BEALM, foi notificada, em 7/06/2013, dilação (de 3 dias) incluída, à Representação da Fazenda Pública de Setúbal, sita na Av. Luísa Tody, n.° 375, 2900-464 Setúbal, bem como ao Ilustre Mandatário da ora exequente, tendo a mesma transitado em julgado, em 17/06/2013.

6. Em 2-09-2013, foi exarado o respectivo despacho de liberação da garantia bancária prestada, bem como despacho de cancelamento do registo de penhora do imóvel, tudo notificado, aos então Impugnantes, em 3 de Setembro de 2013.

7. Em 06-09-2013, foi-lhes entregue, em mão, o original da aludida garantia bancária e anulada a liquidação adicional de IRS em questão, razão pela qual, ao invés do alegado (PI - 28 e ss), a douta sentença não só foi executada, como ainda o foi antes de decorrido o prazo procedimental (90 dias) decorrente do n.° 1, do artigo 175.° do CPTA, iniciado, atento o disposto no n.° 1, do artigo 160.° do CPTA, a partir, 17/06/2013, data do respectivo trânsito em julgado da sentença.

8. Tendo o mesmo cessado (90 dias úteis) em 5/11/2013.

9. Assim sendo, o prazo de 6 meses, para requerer a alegada execução, na redacção vigente até 1-12-2015, dada pelo Decreto-Lei n.° 214-G/2015, de 2 de Outubro, iniciou-se a 6 de Novembro 2013 e terminou, atento o disposto na alínea c), do artigo 279.° do Código Civil, às 24 horas do dia 6 de Maio de 2014.

- Da excepção

10. Como antedito, o prazo de 6 meses, para requerer a alegada execução, iniciou-se a 6 de Novembro 2013 e terminou, atento o disposto na alínea c), do artigo 279.° do Código Civil, às 24 horas do dia 6 de Maio de 2014. 

11. E conforme o Ilustre Juiz Conselheiro, Jubilado, Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado (Áreas Editora) V.II, pág. 530 e ss, "... a obrigação da administração executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial...".

12. Entendimento tal-qualmente sufragado pelo douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 9-05-2012, in Processo 01015/11, cujo sumário aqui reproduzimos: - "A obrigação da Administração Tributária de executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial e não com a remessa, a requerimento do contribuinte, do processo para o serviço competente para a execução, sem prejuízo de ao mesmo ser concedida, no prazo de oito dias, a faculdade de requerer a remessa dos autos ao serviço de finanças competente no prazo de oito dias após o trânsito da decisão (art° 146°, n° 2 do Código de Procedimento e Processo Tributário).

13. No douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 3-12-2008, in Processo 0570A/08, cujo Sumário aqui reproduzimos - " I - O art° 146°, n° 2 do CPPT na medida em que não se compatibiliza com o disposto no art° 100° da LGT é organicamente inconstitucional. II - De qualquer forma, a obrigação da Administração Tributária de executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial e não com a remessa, a requerimento do contribuinte, do processo para o serviço de finanças competente. III - (...).

14. E no douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 2-12-2009, in Processo 0570A/08, disponível em www.dgsi.pt, cujo Sumário aqui reproduzimos - PRAZO DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA/ BAIXA DO PROCESSO/ADMINISTRAÇÃO FISCAL: "A obrigação da Administração Tributária de executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial e não com a remessa, a requerimento do contribuinte, do processo para o serviço competente para a execução".

15. Daí que, pelas nossas contas, tendo a sentença sido notificada em 7/06/2013, dilação de 3 dias, incluída, a mesma transitou em julgado, em 17/06/2013; principiando, de imediato, nesta data, a correr o denominado prazo de execução espontânea [prazo procedimental (3 meses)] constante do n.° 1, do artigo 175.° do CPTA, tendo cessado [atento o disposto no n.° 1, do artigo 160.° do CPTA (90 dias úteis)] em 5 de Novembro 2013.

16. Assim sendo, o aludido prazo de 6 meses (à data em vigor) decorrente do n.° 2, do artigo 170.° do CPTA, para requerer a alegada execução, iniciou-se a 6 de Novembro 2013 e terminou, atento o disposto na alínea c), do artigo 279.° do Código Civil, às 24 horas do dia 6 de Maio de 2014.

17. Razão pela qual, em 26/06/2014, data da entrega do pedido de execução, no TAF de Almada, já o sobredito prazo havia decorrido, razão pela qual, salvo o devido respeito, que é muito, não podia, pois, o pedido ser admitido, nem outra deveria ter sido a decisão proferida, que a de julgar intempestivo o sobredito pedido de execução de julgados. Porém, esse não foi o entendimento do Tribunal a quo, de cuja decisão ora se recorre.

- Da sentença do Tribunal "a quo"

18. Na verdade, na douta sentença ora recorrida, o Tribunal "a quo" não só julgaria o pedido de execução de sentença tempestivo, como condenaria ainda a Fazenda Pública ao (i) pagamento da taxa de justiça liquidada, pela impugnante (ora exequente) no âmbito da acção de Impugnação Judicial n.° 211/08.0BEALM, no valor de € 624,00; (ii) ao pagamento de compensação de honorários de advogado, no âmbito da acção de Impugnação Judicial n.° 211/08.0BEALM, no valor de € 792,00 e (iii) ao pagamento de encargos suportados com a prestação de garantia, no âmbito da acção de Impugnação Judicial n.° 211/08.0BEALM, no valor de € 2.981,90;

19. Com referido, em 2-09-2013, (i) foi exarado o despacho de liberação da garantia bancária prestada; (ii) foi cancelado o registo de penhora do imóvel, tudo notificado, aos então Impugnantes, em 3 de Setembro de 2013; e (iii) em 06-09-2013 foi-lhes entregue, em mão, o original da aludida garantia bancária e anulada a liquidação adicional de IRS em questão.

20. Por conseguinte, ao invés do alegado na douta PI, a sentença não só foi executada, como ainda o foi antes de decorrido o prazo procedimental (90 dias) decorrente do n.° 1. do artigo 175.° do CPTA.

21. Assim, à luz do decidido, a sua execução residia (i) na liberação da garantia; (ii) na anulação da liquidação adicional de IRS em questão, n.° 5004589122, e dos respectivos juros compensatórios e na (iii) na condenação da Fazenda Pública nas custas devidas.

22. Agora se, em boa verdade, facilmente se alcança que, atenta a hierarquia das leis, o estatuído no artigo 100.° da lei Geral Tributária (LGT), a ATA (Executada) haja procedido, em tempo útil, ao cumprimento de uma obrigação decorrente da lei. 

23. Ou seja, executando, de imediato, a sentença em questão, tal com é seu dever, executar os julgados imediatamente ao trânsito da decisão judicial.

24. Já não se compreende que, nesta matéria, e relativamente ao Exequente, idêntica exigência de cumprimento de prazos não se coloque, desde logo, face à constatação de, no caso da norma do artigo 146, n.° 2, do CPPT, se estar perante uma norma inconstitucional, como reconhecido nos sobreditos Acórdãos, desse Supremo Tribunal Administrativo, na medida em que não se compatibiliza com o disposto no art° 100° da LGT.

25. Daí o entendimento, e convicção da ATA, naturalmente ancorada na lei, que o dever de executar os julgados surge imediatamente com o trânsito da decisão e não, como defendido pela ora Exequente, com a remessa do processo ao Serviço de Finanças competente, razão pela qual, atenta a data do pedido, é, o mesmo, extemporâneo.

26. Donde, salvo o devido respeito, não se entender este dualismo de critérios, desde logo e ainda ao arrepio da generalidade da Jurisprudência.

27. Dualismo, esse, decorrente do pressuposto da inconstitucionalidade orgânica do n.° 2, do artigo 146.°, sendo, nestes casos, a partir do trânsito em julgado, e não a partir da remessa do processo, que os prazos de execução espontânea começam a decorrer.

28. Logo, "a contrario sensu", nos casos em que tal pressuposto se não coloque, assim não sucederá.

29. Prerrogativa que, no caso concreto, e salvo o devido respeito, que é muito, se pretende ver conferida à ora Executante, não em razão do legalmente estatuído e aceito, do espírito da Lei, do seu valor e hierarquia, mas em função de outros desígnios, ainda que compreensíveis, não fosse o primado da Lei.

30. Podendo ler-se, na douta Sentença, de que ora se recorre: - "Porquanto, do teor dos normativos convocados resulta que contrariamente ao defendido pelo Executado, em face da regra especial contemplada no artigo 146.°, n.° 2 do CPPT, o prazo de execução espontânea da sentença não se inicia com o trânsito em julgado da mesma que se tem em vista executar, mas sim com a data da remessa desses autos aos Serviços competentes para dar cumprimento á execução espontânea do julgado... " Sublinhado, nosso.

31. E ainda, "Conforme resulta da factualidade assente o processo de impugnação judicial foi remetido ao serviço de Finanças do Montijo, em 24 de Setembro de 2013, logo o prazo de 90 dias terminou em 30 de Janeiro de 2014, e o prazo de seis meses expirou em 30 de Julho de 2014, ora tendo a acção dado entrada em 26 de Junho de 2014, resulta peremptório que a presente execução é julgada tempestiva."

32. Porém, pelas anteditas razões, a verdade é que, como decorre dos autos, a fls. (...), a douta Sentença, decorrente do processo n.° 211/08.0BEALM, na sequência da sua notificação às partes, em 7/06/2013, dilação (de 3 dias) incluída, transitou em julgado, em 17/06/2013.

33. Por conseguinte, atento o estatuído no do artigo 100.°, da LGT, na redacção dada pela Lei n.° 64-B/2011, de 30 de Dezembro, o prazo procedimental (90 dias) decorrente do n.° 1, do artigo 175.° do CPTA, iniciou-se, atento ainda o disposto no n.° 1, do artigo 160.° do CPTA, a partir, 17/06/2013, data do respectivo trânsito em julgado da sentença, tendo o mesmo cessado em 5/11/2013.

34. Donde, ao invés do estatuído na douta Sentença ora recorrida, o prazo de 6 meses, para requerer a alegada execução, na redacção vigente até 1-12-2015, dada pelo Decreto-Lei n.° 214-G/2015, de 2 de Outubro, se haja iniciado a 6 de Novembro 2013 e terminado, atento o disposto na alínea c), do artigo 279.° do Código Civil, às 24 horas do dia 6 de Maio de 2014.

35. Assim, atento o exposto, e com o devido respeito, que é muito, o prazo de 6 meses, para requerer a alegada execução, terminou, atento o disposto na alínea c), do artigo 279.° do Código Civil, às 24 horas do dia 6 de Maio de 2014 e não em 30 de Julho de 2014.

36. E tendo a acção de execução dado entrada em Juízo, somente em 26 de Junho de 2014, resulta peremptório que o pedido de execução é intempestivo, porquanto o prazo de 6 meses, iniciou-se em 6 de Novembro 2013, tendo o mesmo terminado, atento o disposto na alínea c), do artigo 279.° do Código Civil, às 24 horas do dia 6 de Maio de 2014.

- Do erro de julgamento

37. Com o devido respeito, que é muito, ao invés do alegado e sufragado na douta Sentença do Tribunal a quo, a presente acção é intempestiva.

38. Dado, como expendido, o prazo de execução espontânea da sentença se iniciar com o trânsito em julgado da mesma que se tem em vista executar e não com a remessa do processo ao Serviço de Finanças competente, face, designadamente, à constatação de, no caso da norma do artigo 146, n.° 2, do CPPT, se estar perante uma norma inconstitucional, como reconhecido nos sobreditos Acórdãos desse Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 9-05-2012, de 3-12-2008 e de 2-12-209, na medida em que não se compatibiliza com o disposto no artigo 100° da LGT.

39. Assim, e se assim não for entendido, estar-se-á, então, perante um inexplicável dualismo de critérios, dificilmente compaginável com aquilo que se julga ser o espírito e a letra da lei ou, se quisermos, ainda, com aquilo que esta corporiza, a sua finalidade em termos objectivos.

40. Consubstanciada na imediata e plena reconstituição da situação.

41. Finalidade, essa, que tanto quanto julgamos, aproveita também à Administração, atentos os reflexos positivos para o Erário Público, na medida em que poderá traduzir-se numa reconstituição da situação menos dispendiosa.

42. Aproveitando, ainda, e muito, ao Contribuinte, dado a imediata e plena reconstituição da situação, que existiria se não tivesse sido cometida a ilicitude, ser, também, por razões óbvias, do interesse tanto do Cidadão em geral, como da Empresa, independentemente do escalão em que esta se insira (pequena ou média empresa) Unipessoais incluídas.

43. Agora um dualismo de critérios à la carte, assente no pressuposto, ou no não pressuposto, da inconstitucionalidade orgânica do n.° 2, do artigo 146.°, para além da insegurança gerada, não se coaduna, de todo, com o subentendido por execução espontânea e que se traduz na imediata e plena reconstituição da situação do contribuinte.

44. Daí que a Jurisprudência entenda, tal como decorre, ainda, do Acórdão do STA, de 12-022014, Processo 01528/13, que - "I - O dever de cumprir espontaneamente o julgado tributário surge com o trânsito em julgado deste e não com a remessa do processo ao órgão competente para a execução. II - (...); III- (...); IV(…)”

45. E do Acórdão do STA, de 19-03-2009, Processo 0983/08, que - "I - O n.° 2 do artigo 146.° do CPPT, afrontando o disposto nos artigos 100.° da LGT e 205.° n.° 2 da CRP, é material e organicamente inconstitucional. II - A obrigação da Administração Tributária de executar os julgados surge logo com o trânsito em julgado da decisão judicial e não com a remessa do processo para o serviço de finanças competente, a requerimento do contribuinte. III - (...).

46. Na verdade, a arguida caducidade do pedido de execução em questão, radica neste entendimento e, naturalmente, também no facto do prazo legal ter expirado em 6 de Maio de 2014, já que o requerimento deu entrada em 27 de Junho de 2014. 

47. Logo, a questão, que ora se coloca, prende-se com o início do termo de contagem do prazo previsto nos artigos 175.° n.° 1, do CPTA (três meses) prazo de execução espontânea, e, consequentemente do prazo, à data, previsto no n.° 2 , do artigo 176.° do mesmo diploma.

48. Ora, ao invés do alegado e sufragado na douta Sentença do Tribunal a quo, de que ora se recorre, defende, a Fazenda Pública, que tendo a sentença transitado em julgado em 17 de Junho de 2013, o prazo de 3 meses previsto no artigo 175.°, n.° 1, contado nos termos do n.° 1 do artigo 160.°, ambos do CPTA, terminou em 5 de Novembro de 2013.

49. Donde o prazo de seis meses se consumou em 6 de Maio de 2014, tendo o requerimento da ora Exequente, entrado entrada em 27 de Junho de 2014, manifestamente extemporâneo.

50. Acrescendo ainda, que, como referido, se por força do disposto no artigo 100.° da LGT, a Administração está obrigada - em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo - à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade.

51. A verdade é que, com a liberação, em 2 de Setembro de 2013, da garantia bancária, com o cancelamento do registo da penhora do imóvel e com a anulação da liquidação adicional de IRS em questão, foi dado cabal cumprimento à sentença.

52. Por conseguinte, ao invés do alegado (PI - 28 e ss), a sentença não só foi executada, como ainda o foi antes de decorrido o prazo procedimental (90 dias) decorrente do n.° 1, do artigo 175.° do CPTA.

53. Sendo pois, com o devido respeito, que é muito, entendimento da Fazenda Pública:

a) Que ao invés do alegado e sufragado na douta Sentença do Tribunal a quo, o presente pedido de execução de julgados é intempestivo, razão pela qual não deveria ser admitido, nem outra deveria ter sido a decisão proferida, pelo Tribunal a quo, que a de o julgar intempestivo, abster-se de o conhecer e absolver a Executada da instância, nos termos da alínea e), do n.° 1, do artigo 278.° do Código de Processo Civil - NCPC;

b) Que a sentença, exarada em 31 de Maio de 2013, e decorrente do processo de impugnação n.° 211/08.0BEALM, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, já foi executada;

c) Que douta Sentença, de que ora se recorre, ao decidir com o decidiu, violou ainda o estatuído no artigo 100.° da LGT, na medida em que o dever de cumprir espontaneamente o julgado tributário surge com o trânsito em julgado deste e não com a remessa do processo ao órgão competente para a execução.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a Vossas Excelências, se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e, em consequência, ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue o pedido de Execução de Julgados intempestivo, absolvendo a Executada da instância, nos termos da alínea e), do n.° 1, do artigo 278.° do Código de Processo Civil - NCPC.»

3. A M..., devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.

4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto, não emitiu parecer, uma vez que no caso dos autos, os “interesses em causa não são nenhum daqueles enunciados no referido art. 146.º do CPTT”.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.

II – QUESTÃO A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, a questão que importa apreciar e decidir é a de saber se a sentença padece de erro de julgamento ao julgar improcedente a excepção de caducidade do direito da acção suscitada pela Executada, ora Recorrente.


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III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«A) A 28 de fevereiro de 2008, foi deduzida impugnação judicial junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, contra o indeferimento tácito do recurso hierárquico deduzido do despacho de indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada contra o ato de liquidação adicional de IRS n° 50…, referente ao ano de 2002, no valor de €105.457,52 (cfr. fls. 1 do processo de impugnação judicial apensos a estes autos de execução de julgado);

B) No âmbito do processo de impugnação judicial referido na alínea antecedente, que correu termos com o n° 211/08.0 BEALM, a Impugnante procedeu ao pagamento de taxa de justiça inicial no valor de €624,00 (cfr. fls. 29 e 30 do processo de impugnação judicial apensos a estes autos de execução de julgado);

C) No âmbito do processo de impugnação judicial referido na alínea antecedente, que correu termos com o n° 211/08.0 BEALM, a Fazenda Pública procedeu ao pagamento de taxa de justiça inicial no valor de €960,00 (cfr. fls. 98 e 99 do processo de impugnação judicial apensos a estes autos de execução de julgado);

D) A Impugnante, ora Exequente, não procedeu à apresentação de nota discriminativa de custas de parte no âmbito do processo de impugnação judicial referido em A) (facto que se extrai da consulta ao processo de impugnação judicial apensos a estes autos de execução de julgado);

E) A 31 de maio de 2013, foi proferida decisão no âmbito do processo de impugnação judicial referido em A), que a julgou totalmente procedente, anulando o ato de liquidação adicional de IRS n° 500 …, referente ao ano de 2002, extraindo-se na parte que para os autos releva, designadamente, o seguinte:


«Imagem no original»


(cfr. fls. sentença a fls. 67 a 93 do processo de impugnação judicial apensos a estes autos de execução de julgado);

F) De ofícios do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datados de 04 de junho de 2013, expedidos via postal registada nessa mesma data para o Impugnante e para o Representante da Fazenda Pública, foram os mesmos notificados da sentença referida na alínea antecedente (cfr. ofícios a fls. 96 e verso do processo de impugnação judicial apensos a estes autos de execução de julgado);

G) A decisão referida na alínea E) não foi objeto de recurso jurisdicional (facto não controvertido e que se extrai da consulta do processo de impugnação judicial apensos a estes autos de execução de julgado);

H) Foi instaurado pelo Chefe do Serviço de Finanças do Montijo, o processo de execução fiscal n° 219…, no valor global de €108.944,40, respeitando €105.457,52 a quantia exequenda e €3.163,74 a juros de mora, referente ao ato de liquidação de IRS do ano de 2002, referido em A) (cfr. fls. 28 processo de impugnação judicial apensos a estes autos de execução de julgado; facto alegado no artigo 42.° da p.i.; facto que se extrai do doc. junto com a contestação a fls. 48 dos autos );

I) A 13 de agosto de 2007, a fração denominada com a letra “H”, do prédio urbano inscrito sob o artigo matricial 11328 da freguesia do Montijo, com o valor patrimonial tributário (VPT) de €194.990,00 foi objeto de penhora para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal n° 2194…, melhor referido na alínea antecedente, tendo a garantia sido fixada em € 136.064,19 (facto expressamente reconhecido pelo órgão da execução fiscal e que resulta de fls. 48 dos autos não impugnada);

J) Na sequência de avaliação ao VPT do bem imóvel referido na alínea antecedente, ocorrida em novembro de 2008, foi atribuído novo VPT de €89.160,00 (facto expressamente reconhecido pelo órgão da execução fiscal e que resulta de fls. 48 dos autos e não impugnado);

K) A 13 de dezembro de 2012, face à insuficiência do VPT do bem imóvel referido em I) para suspender a execução fiscal e ao recálculo da garantia fixada em €142.655,38, foi a Impugnante notificada para proceder ao reforço de garantia no valor de €53.495,38 (facto expressamente reconhecido pelo órgão da execução fiscal e que resulta fls. 48 dos autos e não impugnado);

L) Em resultado da notificação constante na alínea antecedente, a Exequente prestou a garantia bancária n.° 720…, emitida em 25 de janeiro de 2013, pelo C…, no valor de €53.495,38 (cinquenta e três mil, quatrocentos e noventa e cinco euros e trinta e oito cêntimos), para suspensão do processo de execução fiscal referido na alínea H) (cfr. doc. a fls. 14 dos autos; facto corroborado pelo doc. junto com a contestação a fls. 48 dos autos e não impugnado);

M) A 25 de janeiro de 2013, e em resultado da prestação de garantia referida na alínea antecedente, foi outorgado no Cartório Notarial de Bragança, escrito denominado de “abertura de crédito com hipoteca”, constando como primeiro outorgante F… em representação da C… e como segundos outorgantes a Exequente e marido no âmbito do qual a primeira outorgante “abre a pedido e a favor dos segundos contraentes, um crédito até ao montante de cinquenta e três mil, quatrocentos e noventa e cinco euros e trinta e oito cêntimos” com a finalidade de “ assegurar o pagamento até ao referido montante, das quantias devidas e de todas e quaisquer obrigações do(a/s) MUTUÁRIO (A/ S), não lhe podendo ser dado outro uso ou destino” (cfr. doc. de abertura de crédito a fls. 76 a 98 dos autos notificado ao Executado e não impugnado, sendo certo que a junção do aludido documento foi requerida pelo Tribunal e para efeitos de prova dos factos alegados nos artigos 49.° e 50.° da p.i.; a conexão com a garantia bancária e com a inerente suspensão do processo de execução fiscal decorre desde logo da declaração emitida pelo C... na qual evidencia como encargos da garantia bancária tendentes à suspensão do processo de execução fiscal o I.Selo respeitante a Comissão de Abertura 17.3.4, e bem assim valores respeitantes a avaliação de imóveis; afere-se, outrossim, do montante em questão, e da data da sua outorga);

N) A liquidação adicional de IRS n° 500 …, referente ao ano de 2002, no valor de €105.457,52, não foi objeto de pagamento (facto não controvertido e reconhecido no artigo 42.° da p.i; e corroborado pela prestações de garantias referidas nas alíneas antecedentes e confirmado pelo teor do doc. de fls. 48 dos autos e não impugnado);

O) A 2 de setembro de 2013, foi exarado pelo Chefe do Serviço de Finanças do Montijo despacho de liberação de garantia bancária descrita em L) e de cancelamento do registo da penhora efetuada sobre o bem imóvel referido em I) (facto não controvertido e facto expressamente reconhecido pelo órgão da execução fiscal e que resulta do doc. de fls. 48 dos autos e não impugnado);

P) O processo de execução fiscal n° 21942… referido em H) foi extinto em 6 de setembro de 2013 (facto expressamente assumido pelo órgão da execução fiscal a fls. 48 dos autos e não impugnado; cfr. fls. 50 e 51 dos autos);

Q) Em resultado do despacho referido na alínea O), a 6 de setembro de 2013 foi entregue o original da garantia bancária descrita em L) à Exequente (facto não controvertido e corroborado pelo teor do doc. de fls. 48 dos autos e não impugnado);

R) A 24 de outubro de 2013, foi lavrada certidão de despacho de levantamento da penhora sobre o bem imóvel referido em I) (facto não controvertido e corroborado pelo teor do doc. de fls. 48 dos autos e não impugnado);

S) Em resultado da garantia bancária prestada e melhor referida na alínea L), a Exequente pagou e suportou a título de encargos com a prestação da mesma, os valores que infra se discriminam:

(cfr. declaração a fls. 14 e 15 dos autos);

T) Em resultado do escrito de abertura de crédito com hipoteca melhor referido na alínea M), a Exequente pagou a título de encargos com a outorga da mesma o valor total de €766,05 (cfr. doc. 4 junto com a p.i. a fls. 16 dos autos);

U) Na sequência do cancelamento da hipoteca referida em M), a Exequente procedeu ao pagamento da quantia de €250,00 (cfr. doc. 5 junto com a p.i. a fls. 17 dos autos);

V) O processo de impugnação judicial referido em A), foi remetido ao Serviço de Finanças do Montijo, em 24 de setembro de 2013 (cfr. fls. 103 do processo de impugnação judicial apensos a estes autos de execução de julgado);

W) A 26 de junho de 2014, foi remetida via postal registada com a indicação alfanumérica RD 147…PT, a presente petição de execução de julgados para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada (cfr. comprovativo de expedição via postal registada agrafado na contracapa dos presentes autos);


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FACTOS NÃO PROVADOS

Não existem factos não provados, em face das possíveis soluções de direito, com interesse para a decisão da causa.

MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO

A decisão da matéria de facto efetuou-se com base no exame dos documentos não impugnados, que constam dos autos e na posição das partes, do processo de impugnação judicial apenso aos presentes autos, conforme remissão feita em cada alínea do probatório.


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2. DE DIREITO

A única questão que importa apreciar é a de saber se sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar improcedente a excepção suscitada pela Fazenda Pública de caducidade do direito de acção.

O Tribunal a quo para decidir improcedente a execpção da caducidade do direito de acção, estruturou o seguinte discurso fundamentador:

De harmonia com o disposto no artigo 146.°, sob a epígrafe de “meios processuais acessórios” do CPPT:

“ 1 - Para além do meio previsto no artigo seguinte, são admitidos no processo judicial tributário os meios processuais acessórios de intimação para a consulta de documentos e passagem de certidões, de produção antecipada de prova e de execução dos julgados, os quais serão regulados pelo disposto nas normas sobre o processo nos tribunais administrativos.

2 - O prazo de execução espontânea das sentenças e acórdãos dos tribunais tributários conta-se a partir da data em que o processo tiver sido remetido ao órgão da administração tributária competente para a execução, podendo o interessado requerer a remessa no prazo de 8 dias após o trânsito em julgado da decisão.” (destaques e sublinhados nossos).

Dispõe o artigo 175.°, nº 1 do CPTA, na redação anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 214-G/2015, de 2 de outubro que: “Salvo ocorrência de causa legítima de inexecução, o dever de executar deve ser integralmente cumprido no prazo de três meses” (destaque e sublinhado nosso).

Mais preceitua o artigo 176.° do CPTA, na redação anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 214-G/2015, de 2 de outubro que: “ 1- Quando a Administração não dê execução à sentença de anulação no prazo estabelecido no n°1 do artigo anterior, pode o interessado fazer valer o seu direito à execução perante o tribunal que tenha proferido a sentença em primeiro grau de jurisdição.

2 - A petição, que é autuada por apenso aos autos em que foi proferida a sentença de anulação, deve ser apresentada no prazo de seis meses contados desde o termo do prazo do n°1 do artigo 1° do artigo anterior ou da notificação da invocação de causa legítima de inexecução a que se refere o mesmo preceito”. (destaque e sublinhado nosso).

Resulta, assim, da interpretação conjugada dos preceitos legais supra transcritos que o prazo de execução espontânea das sentenças é de três meses, devendo a petição de execução de julgado dar entrada no prazo de seis meses. De relevar, neste particular, que o prazo de três meses é um prazo procedimental contando-se nos termos do artigo 72.° do CPA com a redação anterior ao Decreto-Lei n.° 4/2015, de 7 de janeiro, enquanto o prazo de seis meses é um prazo cujo cômputo se realiza nos termos do artigo 138.° do CPC, cujo n.° 1 determina que prazos iguais ou superiores a 6 meses, além de contínuos, não se suspendem no período de férias judiciais.

Neste particular, atente-se no teor do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo n°06056, de 07 de Abril de 2010, disponível em www.dgsi.pt, que doutrina que: “Os prazos de três e seis meses estabelecidos nos artigos 175°, n° 1 e 176°, n° 2 do CPTA são distintos e autónomos e contam-se o primeiro, por ser um prazo administrativo, de acordo com o previsto no artigo 72° do CPA, e o segundo de harmonia com o fixado no artigo 144° do CPCivil”.

Com efeito, o início do cômputo do prazo de três meses ocorre no dia útil seguinte ao da remessa do processo ao órgão competente e conta-se, como visto, em dias úteis. Cumpre esclarecer que este prazo de três meses, quando abranja período(s) de suspensão (decorrente maxime de férias judicias - art. 138° n.°s 1 e 4, do CPC de 2013, ex vi art. 58° n.° 3, do CPTA) - situação que se verifica no caso sub judice, deve ser convertido em 90 dias, já que, conforme critério estabelecido no art. 279.° al. a), do Cód. Civil, um mês são trinta dias de calendário.

Vide igualmente a este propósito MÁRIO AROSO DE ALMEIDA que doutrina “(...) [o] prazo de trinta dias do n° 1 deste artigo 170.° é igualmente um prazo procedimental. Deve ser, por isso, contado nos termos do artigo 72.°, n.° 1, do CPA, suspendendo-se nos sábados, domingos e feriados».

Porquanto, do teor dos normativos convocados resulta que contrariamente ao defendido pelo Executado, em face da regra especial contemplada no artigo 146.°, n°2 do CPPT, o prazo de execução espontânea da sentença não se inicia com o trânsito em julgado da mesma que se tem em vista executar, mas sim com a data da remessa desses autos aos Serviços competentes para dar cumprimento à execução espontânea do julgado. De referir que a ratio legis do n° 2 do artigo 146.° do CPTA, como tem sido entendimento reiterado da Jurisprudência dos Tribunais Superiores, reside no facto de na maior parte das vezes, atenta a especificidade dos processos em causa, o dever de reposição do lesado na situação em que estaria não fora a verificação do facto lesivo, consagrado no artigo 100.º da LGT, só ser possível de ser observado e acautelado se e quando os órgãos competentes para a execução estiverem na posse do processo.

De sublinhar, outrossim, que em nada releva o facto de, por um lado, o Exequente não ter requerido a remessa dos autos e bem assim do órgão competente para a execução do julgado ter tido conhecimento da sentença antes da remessa integral do processo. E isto porque, por um lado o facto de o Exequente não ter requerido a remessa dos autos cuja execução se pretende ver realizada não pode relevar para efeitos de coartar qualquer garantia ao Exequente, uma vez que a consagração de remessa dos autos mais não representa que uma faculdade que o legislador conferiu ao lesado de impulsionar celeremente a execução do julgado e não um requisito substancial. E por outro lado, sendo a letra da lei inequívoca constando expressamente que a data relevante é a da remessa do processo, não pode, desde logo por uma questão de tutela de confiança, o cômputo do prazo iniciar-se com o momento em que o Executado tem conhecimento da sentença.

Aqui chegados, tecidos os considerandos de direito que relevam para a apreciação da tempestividade da presente ação vejamos, então, o cômputo em concreto do prazo.

Conforme resulta da factualidade assente o processo de impugnação judicial foi remetido ao Serviço de Finanças do Montijo, em 24 de setembro de 2013, logo o prazo de 90 dias terminou em 30 de janeiro de 2014, e o prazo de seis meses expirou em 30 de julho de 2014, ora tendo a ação dado entrada em 26 de junho de 2014, resulta perentório que a presente execução de julgado é tempestiva.

Improcede, assim, a exceção da caducidade do direito de ação arguida pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública.

A Recorrente insurge-se contra o decidido pela primeira instância, no entendimento, em síntese, de que ao invés do sufragado na sentença recorrida o prazo de 3 meses previsto no artigo 175.º, n.º 1, do CPTA, para a execução espontânea, contado nos termos o artigo 160.º, ambos do CPTA, inicia-se com o trânsito em julgado sentença, terminou em 05/11/2013, e consequentemente, o prazo previsto no n.º 2, do artigo 176.º do mesmo diploma, de 6 meses, para a apresentação da petição de execução, consumou-se em 05/11/2013.

Mais alega que a Executada procedeu ao cumprimento do julgado, em tempo útil, em cumprimento da obrigação decorrente da lei, atenta a hierarquia das leis, e o estatuído no artigo 100.º da LGT, não compreendendo, que nesta matéria, e relativamente à Exequente, não se coloque idêntica exigência, face à constatação de, no caso da norma do artigo 146.º, n.º 2 do CPPT, se estar perante uma norma inconstitucional, como reconhecido por Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, na medida em que não se compatibiliza com o disposto no artigo 100.º da LGT.

Defende, pois, a Recorrente que o prazo de 6 meses para requerer a execução se inicia com o termo do prazo de execução espontância, contado a partir do trânsito em julgado e não da remessa do processo ao Serviço de Finanças competente, e que se assim não for entendido, estar-se-á perante um inexplicável dualismo de critérios, dificilmente compaginável com aquilo que se julga ser o espirito e a letra da lei, ou, com aquilo que esta corporiza, a sua finalidade em termos objectivos.

Vejamos, então.

No presente caso, como já ficou expresso supra, a Recorrente não se conforma com o segmento da sentença recorrida que considerou tempestiva a apresentação da petição de execução do julgado por aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 146.º do CPPT.

Sobre esta questão pronunciou-se o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em Acordão de 28/11/2018, proferido no processo n.º 076/05.4BECBR-A 0441/18, que em adesão à sua proficiente fundamentação, com a devida vénia, passamos a transcrever, na parte relevante:

«O Acórdão Recorrido, a fls. 125 a 140 verso dos autos, negou provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente por entender, em suma, ser “inequívoco que logo que a sentença transita em julgado, a AT deve providenciar pela sua imediata execução, podendo o contribuinte, que conhece a data em que a decisão transitou em julgado (e assim não tem de estar na expectativa de uma eventual notificação que, afinal, ninguém tem ideia sobre o momento em que a mesma irá ser efectuada), no momento oportuno, recorrer à figura da execução de julgado caso a AT não tenha executado a decisão no prazo que tinha para o fazer de forma espontânea, situação que salvaguarda os princípios e interesses apontados pela Recorrente”.

Discorda do decidido a Recorrente, para quem o prazo para a execução espontânea de decisões judiciais “apenas se inicia com a remessa do processo de impugnação para o Serviço ou órgão de execução local que tenham procedido ao apossamento (…) e a notificação dessa remessa ao exequente, nos termos do art.º 146.º, n.º 2, do CPPT. A notificação ao exequente desta remessa, para efeitos de determinação do seu prazo para pedir a execução judicial do julgado no tribunal competente ao abrigo do disposto nos art.ºs 146.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT e 170.º, n.º 2, do CPTA, é exigida constitucionalmente para que se lhe possam ser atribuídos efeitos jurídicos externos ou eficácia externa (art.º 268.º, n.º 3, da CRP), na medida em que sem essa notificação o acto apenas produz efeitos para a administração para quem o processo haja sido remetido, pois só esta dela tem conhecimento”.

Entendimento diferente é o sufragado pela Recorrida AT, que defende que “a interpretação adequada dos preceitos legais aplicáveis é a de que o prazo para que a Administração Fiscal dê cumprimento espontâneo às decisões dos tribunais se inicie com o trânsito em julgado e não com a remessa do processo para o serviço de finanças competente”, devendo "o prazo da execução espontânea [ser] contado a partir desse momento, não a partir da notificação a que se refere o art.º 146.º/2, do CPPT”. Para a Recorrida, “é claro que tanto a AT., como a Exequente, fazendo ambas parte do processo, têm conhecimento da decisão e sabem que, corridos os prazos, se verifica o trânsito em julgado. Pelo que os intervenientes deverão proceder em conformidade, por um lado, a execução espontânea por banda da AT [e] por outro, quando tal não aconteça, poderá o interessado fazer valer o seu direito à execução perante o tribunal que tenha proferido a sentença em primeiro grau de jurisdição, mas, apenas, no prazo de seis meses contados nos termos do disposto no art.º 176.º/2, do CPTA”.

O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste STA, no seu parecer junto aos autos, pronuncia-se pelo provimento do recurso.

Vejamos.

Não é a primeira vez que a questão sub judice é colocada ao Supremo Tribunal Administrativo, não existindo motivo para nos afastarmos da posição assumida no Acórdão Fundamento e que tem vindo a ser seguida por este Tribunal (cfr., para além do que Acórdão que serve de fundamento ao presente recurso, o Acórdão proferido por este Supremo Tribunal em 15/05/2013, no processo nº 1317/12 e o Acórdão proferido por este Supremo Tribunal em 17/06/2009, no processo n.º 073/09).

Neste particular contexto, iremos seguir de perto a fundamentação expendida no Acórdão proferido por este Supremo Tribunal a 17/06/2009 no recurso n.º 073/09, por sufragarmos a doutrina que dele emana sem reservas de convicção (dispensando o uso das aspas aquando da realização de transcrições por forma a agilizar o discurso, em face das alterações demandadas pelo caso sub judice).

Por força do disposto no n.º 1 do artigo 102.º da LGT e do n.º 1 do artigo 146.º Código do CPPT, a execução de sentenças dos tribunais tributários segue o regime previsto para a execução de sentenças dos tribunais administrativos, sendo que aos autos são aplicáveis as regras sobre a matéria constantes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), pois que a petição de execução foi enviada ao tribunal em 3/6/2015 (cfr. fls 1 dos autos), ou seja, tem-se como instaurada em data posterior à da entrada em vigor daquele diploma (cfr. os arts. 5.º, n.º 4 e 7.º da Lei n.º 15/2002, de 22/2, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 4-A/2003, de 19/2) com a redacção anterior às alterações introduzidas pela Lei n.º 214-G/2015, de 2/10.

Nos termos do n.º 2 do artigo 176.º do CPTA (na redacção em vigor à data da interposição da acção de execução de julgados sub judice), o prazo para pedir ao tribunal a execução do julgado é de “seis meses” contados desde o termo do prazo para a execução espontânea do decidido, ou seja, nos termos dos números 1 e 3 do artigo 175.º do CPTA, três meses ou 30 dias, este último aplicável quando a execução de sentença consista no pagamento de uma quantia pecuniária.

Dispõe, contudo, a primeira parte do n.º 2 do artigo 146.º do CPPT que “o prazo de execução espontânea das sentenças e acórdãos dos tribunais tributários conta-se a partir da data em que o processo tiver sido remetido ao órgão da administração tributária competente para a execução (…)”, no que parece pretender fixar um termo inicial para a execução espontânea de julgados diverso (e mais dilatado no tempo) daquele que decorre do artigo 100.º da LGT (e do n.º 2 do artigo 205.º da Constituição, diga-se).

Entende-se que esta norma é atendível para os estritos efeitos de contagem do prazo para requerer a execução do julgado, pois que constituindo lex scripta os interessados não deverão ser prejudicados em matéria de prazos para a utilização dos seus meios de defesa por confiarem no que dispõe a lei tributária.

Se, como dissemos, o prazo de 6 meses para requerer a execução de julgado se inicia após o termo do prazo legal para a execução espontânea do decidido, existindo norma tributária que estabelece que o prazo para essa execução espontânea se conta da remessa do processo ao órgão da administração tributária competente para a execução (havendo a faculdade do interessado, que não o dever, de requerer essa remessa), deve entender-se que a remessa do processo ao órgão da Administração tributária teria de ser oficiosamente notificada pela secretaria do tribunal à interessada, nos termos do n.º 2 do artigo 229.º do Código de Processo Civil, pois que o direito processual da parte à execução do julgado não depende de prazo a fixar pelo juiz nem de prévia citação, antes decorre da lei, que fixa o seu termo inicial na dependência da prática de um acto do próprio Tribunal (a remessa do processo ao serviço de finanças).

Assim, e de acordo com o Acórdão deste Supremo Tribunal proferido a 15/05/2013 no processo nº 1317/12, “significa isto que o prazo para executar coercivamente o julgado, fixado no art. 176º, nº 2, do CPTA, reportando-se ao termo do prazo para a execução espontânea previsto no art. 175º do mesmo diploma legal, terá de ser determinado a partir da data da notificação da remessa do processo ao órgão da administração tributária, a que se refere o art. 146º, nº 2, do CPPT, de modo a garantir o direito à tutela jurisdicional efectiva consagrado no art. 268º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa”.

É também esta a posição da melhor doutrina.

Rui Duarte Morais in “Manual de Procedimento e Processo Tributário”, Almedina, 2016, pp. 333 e 334 explica que a fixação do prazo de seis meses “pode redundar num “prémio” à inércia da administração fiscal, pois os contribuintes, confiados no cumprimento espontâneo, ainda que tardio (que é a regra), poderão facilmente deixar caducar o seu direito à ação executiva”. Nesta medida, o Professor “não pod[e] estar mais de acordo” com a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, concluindo que “uma vez que [a notificação da remessa do processo], por regra não acontece, o sujeito passivo estará, na prática, sempre em tempo (sem prejuízo do decurso do prazo prescricional) de interpor a ação executiva”.

Para o Jorge Lopes de Sousa in CPPT anotado e comentado 6ª edição vol. II pag.530, “determinando a remessa do processo à administração tributária indirectamente o início do prazo para o contribuinte requerer a execução de julgado, deverá entender-se que a preclusão do seu direito de requerer a execução só ocorrerá se lhe for efectuada notificação da data em que for efectuada a remessa, pois sem esse conhecimento o contribuinte não terá conhecimento da data em que terminará o prazo de execução espontânea, que é também aquela em que começa o prazo de que dispõe para requerer a execução de julgado”.

Todavia, não foi este entendimento vertido na sentença do Tribunal de 1.ª Instância e do Acórdão Recorrido, que situaram o início do prazo para a execução do julgado na data do trânsito em julgado da decisão. Ora, conforme se pode ler no Acórdão deste Supremo Tribunal proferido a 15/05/2013 no processo nº 1317/12, esta ilação estaria correcta “sob o ponto de vista do cumprimento do dever que impende sobre a administração tributária, nos termos do artigo 100º da LGT, de proceder à imediata e plena reconstituição da legalidade, mas não o é para o efeito de delimitar o prazo da execução coerciva, em que se impõe, nos termos expostos, atender à data da notificação da remessa do processo.

E, nesta circunstância, não se podia ter julgado, como se julgou, precludido o prazo para a interposição de execução do julgado sem previamente saber se foi ou não efectuada essa notificação e, no caso afirmativo, em que data ela ocorreu”.» (disponível em www.dgsi.pt/).

Na esteira da jurisprudência vertida no acórdão do Pleno do STA de 28/11/2008 transcrito, entendemos que para efeitos estritos de aferir da tempestividade do presente meio processual de execução de julgado é atendível a data da remessa do processo ao órgão de administração tributária, por os interessados não deverem ser prejudicados em matéria de prazos para a utilização dos meios de defesa, por confiarem no que dispõe a lei tributária, que no caso presente é o que dispõe o n.º 2, do artigo 146.º do CPPT.

A alegada inconstitucionalidade do artigo 146º, n.º 2 do CPPT é de afastar, tendo presente a interpretação supra referida dos preceitos em causa, no sentido de que a remessa do processo ao órgão competente não tem por função criar o dever de executar, pois, ela já existe desde o trânsito em julgado da sentença, por força do artigo 100.º LGT, mas apenas determinar o início o momento a partir do qual o interessado pode reagir judicialmente contra a inércia da administração tributária em dar execução ao julgado.

Nas palavras de Jorge Lopes de Sousa «(…) entendendo-se que a remessa do processo não terá por função criar o dever de executar (que já existe anteriormente desde o trânsito em julgado, por força do art. 100.°- da LGT), mas determinar (…) o momento a partir do qual o interessado pode reagir judicialmente contra a inércia da administração tributária em dar execução ao julgado . Isto é, existirá um dever de execução imediato a partir do trânsito em julgado, (…)» (in Código do Procedimento e do Processo Tributário, anotado e comentado, Vol II,, áreas Editora, pag. 529).

Dos autos não resulta provado que a Exequente tenha sido notificada oficiosamente pela unidade orgânica do Tribunal a quo da remessa do processo de impugnação judicial à Executada, como o impunha o n.º 2, do artigo 220.º do CPC, nem que a Exequente tenha requerido tal remessa no prazo de oito dias após o trânsito em julgado, como lhe era facultado pelo n.º 2, do artigo 146.º do CPPT.

Assim, impõe-se concluir que, no caso presente, não se encontrava caducado o direito de acção da Exequente na data em que requereu a execução do julgado.

Termos em que, sem necessidade de mais amplas considerações, impõe-se concluir pela improcedência de todas as conclusões de recurso, negando provimento ao presente ao mesmo.


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Conclusões/Sumário:

I. Na esteira da jurisprudência vertida no acórdão do Pleno do STA de 28/11/2008 transcrito, entendemos que para efeitos estritos de aferir da tempestividade do presente meio processual de execução de julgado é atendível a data da remessa do processo ao órgão de administração tributária, por os interessados não deverem ser prejudicados em matéria de prazos para a utilização dos meios de defesa, por confiarem no que dispõe a lei tributária, que no caso presente é o que dispõe o n.º 2, do artigo 146.º do CPPT.

II. A alegada inconstitucionalidade do artigo 146º, n.º 2 do CPPT é de afastar, tendo presente a interpretação supra referida dos preceitos em causa, no sentido de que a remessa do processo ao órgão competente não tem por função criar o dever de executar, pois, ela já existe desde o trânsito em julgado da sentença, por força do artigo 100.º LGT, mas apenas determinar o início o momento a partir do qual o interessado pode reagir judicialmente contra a inércia da administração tributária em dar execução ao julgado.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, confirmar a sentença a quo no segmento recorrido.

Custas pela Recorrente.

Notifique.

Lisboa, 3 de Dezembro de 2020.


Maria Cardoso - Relatora
Catarina Almeida e Sousa – 1.ª Adjunta
Hélia Gameiro Silva – 2.ª Adjunta
(assinaturas digitais)