Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2399/11.4 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:10/28/2021
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:CARTA REGISTADA COM AR
PRESUNÇÃO
ASSINATURA
INFORMAÇÃO OFICIAL SITE DOS CTT
Sumário:I- Do teor do artigo 39.º do CPPT dimana inequívoco que o legislador estatuiu que a notificação por aviso de receção se materializa na data da assinatura do aviso de receção.
II- Não obstante a informação sobre a expedição e entrega disponibilizada no site oficial dos CTT possa assumir relevo, mormente, nas situações em que no aviso de receção não vem contemplada qualquer data de assinatura, a verdade é que nas situações em que está contemplada, de forma legível, uma data no item “data e assinatura” constante no aviso de receção, a mesma se afigura congruente com a da expedição do registo, e nada sendo demonstrado para a desconformidade de datas, o cômputo inicial do prazo far-se-á por referência e atendibilidade à data constante no aviso de receção.
III- A informação constante no site oficial dos CTT e a função desse serviço é permitir aos clientes dos CTT acompanhar a entrega de objetos postais, não tendo por função certificar, perante o tribunal ou o destinatário da carta, a data da entrega dela.
IV- Existindo desconformidade entre a data constante no aviso e a constante no site dos CTT, terá de prevalecer a data que a lei atribui valor para o efeito.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I-RELATÓRIO

C., veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou verificada a exceção da caducidade do direito de ação, com a consequente absolvição do pedido, relativamente à impugnação judicial deduzida contra a decisão de indeferimento de pedido de revisão oficiosa concernente à liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), dos anos de 2005, 2006 e 2007.

A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso nas quais formulou as conclusões que infra se reproduzem:

I. O Tribunal “a quo” errou na apreciação da matéria de facto, nomeadamente no que respeita aos factos constantes das alíneas H) e K),

II. Factos esses determinantes para se declarar procedente a exceção da caducidade do direito de acção, absolvendo-se por esta via a Fazenda Publica do pedido.

III. Não corresponde à verdade que «(H) A decisão contante a alínea anterior foi recebida pela Impugnante em 13 de Setembro de 2011», e que «(K) A Petição Inicial da presente acção deu entrada neste Tribunal em 15 de Dezembro de 2011.»

Com efeito,

IV. Existem elementos nos autos que permitem alterar a decisão relativa àqueles factos dados como provados,

V. Nomeadamente o documento junto pela recorrente com o seu requerimento datado de 26.01.2015, correspondente ao registo informático do correio,

VI. de onde se extrai que a aqui Recorrente foi notificada da decisão objecto de impugnação a 14.09.2011,

VII. devendo prevalecer esta informação em detrimento do aviso de recepção junto pela Fazenda Publica.

Acresce que,

VIII. Também não corresponde à verdade que a aqui Recorrente tenha apresentado a sua Petição Inicial em 15.12.2011,

IX. resultando de uma simples consulta ao SITAF que a Petição Inicial deu entrada em 14.12.2011,

X. devendo, por conseguinte, considerar-se a mesma apresentado dentro do prazo estabelecido no n.º 1 do artigo 102.º do CPPT,

XI. não se verificando, assim, a caducidade do direito de acção decidida.

Termos em que – e nos demais de Direito que V. Exa. doutamente suprirão – deve conceder-se provimento ao presente Recurso, revogando-se a decisão proferida, e em consequência determinar a baixa dos autos à Primeira Instância, seguindo-se os ulteriores tramites legais.

Assim se fazendo a acostumada, JUSTIÇA!”


***

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

***

O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

***

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

***

II) FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A decisão recorrida fixou a seguinte factualidade:

Para a apreciação da invocada excepção cumpre fixar a seguinte matéria de facto:

A) Em 16 de Outubro de 2009 foi remetido à Impugnante o projecto de correcções do relatório de inspecção para exercício do direito de audição, para a morada CC da Quintinha, 71, 5. Esq., 1070-223 Lisboa. (Cfr. documento a fls. 30 e 31 do PAT)

B) A Impugnante não se pronunciou em sede do direito de audição referido na alínea anterior. (Acordo)

C) Em 17 de Novembro de 2009 foi remetido à Impugnante o relatório de inspecção tributária. (Cfr. documento a fls. 32 e 33 do PAT)

D) Em 10 de Dezembro de 2010 a Impugnante requereu a revisão das liquidações de IVA, a seguir identificadas:

(Cfr. documento a fls. 2 e 3 do P.A.T.)

E) Em 29 de Julho de 2011 foi emitida a informação n.º 2266 pela Administração Tributária, indicando que tendo o requerimento da Impugnante sido realizado nos termos do n.º 4 do artigo 78.º da L.G.T, os pressupostos de aplicação do referido preceito não são aplicáveis, concluindo pelo indeferimento do pedido de revisão apresentado pela Impugnante, não apreciando o respectivo mérito, constando da mesma, nomeadamente, o seguinte teor:

“(…)

(…)

(…)

(Cfr. documento a fls. 26 a 36 dos autos)

F) Em 16 de Agosto de 2011, a informação constante na alínea anterior mereceu despacho de concordância do Substituto legal do Director Geral da Administração Tributária. (Cfr. documento a fls. 25 dos autos)

G) A decisão de indeferimento constante na alínea anterior foi remetida à Impugnante em 12 de Setembro de 2011 para a morada P. J. G., n.º 1., ... (Cfr. documento a fls. 24 dos autos e fls. 87 do P.A.T.)

H) A decisão contante a alínea anterior foi recebida pela Impugnante em 13 de Setembro de 2011. (Cfr. aviso de recepção junto ao PAT a fls. 67)

I) O domicílio fiscal da Impugnante registado na base cadastral da Administração Tributária, em 31 de Dezembro de 2007 é CC da Q., .., 1070-… Lisboa. (Cfr. documento a fls. 10 do P.A.T.)

J) O domicílio fiscal da Impugnante desde 4 de Julho de 2011 P. J. G., n.º 1., .... (Cfr. documento emitido do portal das finanças, junto como documento n.º 2 da Petição Inicial)

K) A Petição Inicial da presente acção deu entrada neste Tribunal em 15 de Dezembro de 2011. (Cfr. documento a fls. 37 dos autos).


***

A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:

“Não existem factos não provados com interesse para a decisão da presente excepção.”


***

A motivação da matéria de facto, assentou no seguinte: “[n]a análise do teor dos documentos constantes nos autos, e no acordo das partes, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.”

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***


III) FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou verificada a exceção da caducidade do direito de ação, com a consequente absolvição do pedido.

Cumpre, desde já, relevar que em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto importa, assim, decidir se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto porquanto, por um lado, não valorou factualidade reputada relevante para a presente lide, e, por outro lado, interpretou erradamente factualidade alicerçada em suporte documental junto aos autos, e erro de julgamento de direito por incorreta apreciação dos pressupostos de facto e de direito, ao julgar verificada a exceção perentória da caducidade do direito de ação.

Vejamos, então.

Comecemos pelo erro de julgamento de facto.

A Recorrente começa por defender que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto, porquanto valorou incorretamente os factos constantes nas alíneas H) e K).

Ora, se o que está em causa é o Tribunal a quo ter errado o seu julgamento de facto, cumpre ter em conta a tramitação processual atinente à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.

Para o efeito, importa começar por aferir se a Recorrente cumpriu os requisitos consignados no artigo 640.º do CPC.

Preceitua o aludido normativo que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”
Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida (1)

Feitos estes considerandos iniciais, verifica-se que, in casu, a Recorrente impugna a matéria de facto cumprindo os requisitos contemplados na lei e supra citados, uma vez que requer a alteração do probatório com base em prova documental que identifica com precisão.

Vejamos, então.

A Recorrente requer a alteração das aludidas alíneas, por entender que as mesmas padecem de erro.

Com efeito, aduz no atinente à alínea H) que conforme resulta do print do sistema informático dos CTT, a decisão foi recebida a 14 de setembro de 2011, e não, conforme resulta da matéria de facto, a 13 de setembro de 2011.

De relevar, desde já, que independentemente da bondade -entenda-se em termos de fundamentação jurídica e inerente procedência, e que será analisada em sede própria- o Tribunal ad quem entende alterar a alínea H), porquanto sendo controvertida a data da notificação da decisão, a factualidade não deve reproduzir essa conclusão, mas sim contemplar as asserções fáticas atinentes ao efeito, para ulteriormente e com base nelas, aquilatar-se da data da notificação e inerente cômputo do prazo de impugnação judicial.

E por assim ser, altera-se a alínea H) da factualidade, não para fazer constar como data de recebimento o dia 13 de setembro de 2021, conforme requerido pela Recorrente, mas sim para contemplar o facto com a descrição dos elementos atinentes para o efeito.

Nesta conformidade, o Tribunal ad quem, altera as alíneas G), e H) da factualidade assente, aditando, igualmente, uma alínea por forma a espelhar, fidedignamente, a factualidade que releva para efeitos da análise do erro de julgamento quanto à caducidade do direito de ação, e como infra se descreve:

G) A 12 de setembro de 2011, foi expedida carta registada com aviso de receção, com a indicação alfanumérica RC586856…PT, pela Direção de Finanças de Lisboa, endereçada para C.M…., para a P. J. G., n.º 1., ..., tendente à notificação da decisão referida em F) (cfr. talão de expedição e aviso de receção a fls. 67 e 68 do PA apenso);

H) O Talão de aviso de receção evidenciado na alínea anterior, contempla no item “a completar no destino”, no espaço reservado à data e assinatura a seguinte inscrição ”13/9/2011. J. R.” (cfr. talão de expedição e aviso de receção a fls. 67 e 68 do PA apenso);

L) Na plataforma oficial dos CTT, no item respeitante à pesquisa de objetos, mediante inserção da indicação alfanumérica contemplada em G), consta a seguinte informação:

Imagem: original nos autos

(cfr. print a fls. 75 dos autos);

Prosseguindo, na análise da impugnação da matéria de facto.

A Recorrente pretende, também, a alteração da alínea K), da factualidade assente, porquanto contrariamente ao fixado no probatório a petição inicial não foi deduzida a 15 de dezembro de 2011, mas sim a 14 de dezembro de 2011, conforme resulta expresso da consulta à plataforma SITAF.

E, de facto, assim é, porquanto a petição inicial foi, efetivamente, incorporada na plataforma SITAF, a 14 de setembro de 2011.

Nessa medida, procede-se à alteração requerida pela Recorrente, passando a constar na alínea K), a seguinte redação:

“K) A Petição Inicial da presente ação deu entrada, via plataforma SITAF, no dia 14 de dezembro de 2011” (cfr. fls. 1 da plataforma SITAF);

Assim, face a todo o exposto, procede-se à alteração das alíneas G), H) e K), do probatório e ao aditamento como infra se descreve:

Alteração das Alíneas G), H) e K):

G) A 12 de setembro de 2011, foi expedida carta registada com aviso de receção, com a indicação alfanumérica RC586856…PT, pela Direção de Finanças de Lisboa, endereçada para C.M…., para a P. J. G., n.º 1., ..., tendente à notificação da decisão referida em F) (cfr. talão de expedição e aviso de receção a fls. 67 e 68 do PA apenso);

H) O Talão de aviso de receção evidenciado na alínea anterior, contempla no item “a completar no destino”, no espaço reservado à data e assinatura a seguinte inscrição ”13/9/2011. J. R.” (cfr. talão de expedição e aviso de receção a fls. 67 e 68 do PA apenso);

K) A Petição Inicial da presente ação deu entrada, via plataforma SITAF, no dia 14 de dezembro de 2011” (cfr. fls. 1 da plataforma SITAF);

Aditamento da Alínea L):

L) Na plataforma oficial dos CTT, no item respeitante à pesquisa de objetos, mediante inserção da indicação alfanumérica contemplada em G), consta a seguinte informação:

Imagem :original nos autos

(cfr. print a fls. 75 dos autos);


***


Aqui chegados, uma vez estabilizada a matéria de facto, importa aferir do erro de julgamento de direito no atinente à exceção da caducidade do direito de ação para deduzir impugnação judicial e inerente absolvição do pedido.

Vejamos, então.

A Recorrente sustenta que, não obstante a data constante no aviso de receção corresponder, efetivamente, ao dia 13 de setembro de 2011, a verdade é que do print dos CTT consta a data de 14 de setembro de 2011, logo “será mais provável ter existido erro na colocação da data manuscrita do que no sistema informático, já que, à data, a inserção das datas no sistema informático dos CTT se fazia por leitura de código de barras.”

E por assim ser, advoga que tendo em consideração que o dies a quo é o dia 15 de setembro de 2011, tendo a petição sido apresentada em 14 de dezembro de 2011, é a mesma tempestiva.

Apreciando.

Comecemos, então, por atentar na data em que a Recorrente se tem por notificada.

O Tribunal a quo, como visto, entendeu que a notificação ocorreu a 13 de setembro de 2011, data essa correspondente à da assinatura do aviso de receção, por seu turno, a Recorrente propugna que ter-se-á de dar prevalência ao contemplado no print do site oficial dos CTT.

Adiantamos, desde já, que não logra provimento a esteira de entendimento da Recorrente.

Senão vejamos.

Para o efeito, importa ter presente o que o CPPT regulamenta a propósito da perfeição de notificações, particularmente, das cartas registadas com aviso de receção.

Nesse conspecto, importa convocar o disposto no artigo 39.º do CPPT, com a redação à data aplicável, mormente, os números 3 a 5 e que, neste particular, dispõem:

“3 - Havendo aviso de receção, a notificação considera-se efetuada na data em que ele for assinado e tem-se por efetuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.
4 - O distribuidor do serviço postal procederá à notificação das pessoas referidas no número anterior por anotação do bilhete de identidade ou de outro documento oficial.
5 - Em caso de o aviso de receção ser devolvido ou não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efetuada nos 15 dias seguintes à devolução por nova carta registada com aviso de receção, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação da mudança de residência no prazo legal.”

Ora, do teor do citado normativo dimana inequívoco que o legislador estatuiu que a notificação por aviso de receção se materializa na data da assinatura do aviso de receção, em nada convocando o consignado no site oficial dos CTT.

De relevar, neste particular, que não obstante a informação sobre a expedição e entrega disponibilizada no site oficial dos CTT possa assumir relevo, mormente, nas situações em que no aviso de receção não vem contemplada qualquer data de assinatura, a verdade é que nas situações em que está contemplada, de forma legível, uma data no item “data e assinatura” constante no aviso de receção, a mesma se afigura congruente com a da expedição do registo, e nada sendo demonstrado para a desconformidade de datas, o cômputo inicial do prazo far-se-á por referência e atendibilidade à data constante no aviso de receção.

Não podendo, neste e para este efeito, lograr provimento a afirmação da Recorrente no sentido de que havendo desconformidade entre a data constante na assinatura do aviso de receção e a data inserta nos dados contemplados no site oficial dos CTT, ter-se-á de assumir que a correta é a inserta no aludido site, face à leitura dos códigos de barras, não só, porque tal alegação mais não representa que uma prognose, como carece de qualquer fundamento legal, inexistindo qualquer diploma que lhe confira valor de prova qualificada.

É certo que, uma vez recebida a notificação por via postal e assinado o aviso de receção, este é devolvido ao remetente, no caso à Direção de Finanças de Lisboa, não ficando na posse do notificando qualquer elemento relativo à data da receção, no entanto tal não significa que inexista qualquer controlo atinente ao efeito, porquanto o mesmo ter-se-á de realizar no momento da aposição da sua assinatura ou, sendo esta de terceiro, mediante o que este lhe comunicar como tendo sido a data sobre a qual assinou.

Note-se que, o recetor da carta, quando assina, sabe, ou, no limite, tem obrigação de saber, qual a data em que a entrega é dada por feita e, se for terceiro, deverá comunicá-la ao notificando.

O Tribunal ad quem não descura que a presunção contemplada no artigo 39.º do CPPT é ilidível, e bem assim que o juiz deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las. Contudo, in casu, a Recorrente não convoca qualquer realidade de facto, mormente, que permita inferir qualquer erro na sua aposição, mas, tão-só, que a data constante no site é a que prevalece.

Pelo que, consagrando o citado artigo 39.º do CPPT uma presunção legal de que o aviso de receção foi recebido na data em que foi assinado, a mesma não se considera ilidida mediante a mera exibição da informação constante no site (2)

Como doutrinado no Aresto do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo nº 2348/18.5TUIS, datado de 15 de junho de 2021:

“A função do serviço é permitir aos clientes dos CTT acompanhar a entrega de objectos postais. Ele não tem por função certificar, perante o tribunal ou o destinatário da carta, a data da entrega dela.”

Assim, desempenhando o aviso de receção uma função primordial e com uma filosofia própria, que vai além da que é desempenhada pela simples carta registada, constituindo uma formalidade adicional, que visa garantir e reforçar a necessidade de certeza quanto à ocorrência do ato de entrega da respetiva data, ter-se-á de concluir que a data em que ela teve lugar há de resultar do próprio aviso de receção.

Destarte, in casu, existindo desconformidade entre a data constante no aviso e a constante no site dos CTT, terá de prevalecer a data que a lei atribui valor para o efeito, e nessa medida, a Recorrente considera-se, no caso vertente, notificada em 13 de setembro de 2011.

Mas continuemos, então, com o cômputo, em concreto, do prazo.

Consignava, o artigo 102.º do CPPT, com a redação à data aplicável, que:

“1 - A impugnação será apresentada no prazo de 90 dias contados a partir dos factos seguintes:
a) Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte;
b) Notificação dos restantes atos tributários, mesmo quando não dêem origem a qualquer liquidação;
c) Citação dos responsáveis subsidiários em processo de execução fiscal;
d) Formação da presunção de indeferimento tácito;
e) Notificação dos restantes atos que possam ser objeto de impugnação autónoma nos termos deste Código;
f) Conhecimento dos atos lesivos dos interesses legalmente protegidos não abrangidos nas alíneas anteriores.
2 - Em caso de indeferimento de reclamação graciosa, o prazo de impugnação será de 15 dias após a notificação.
3 - Se o fundamento for a nulidade, a impugnação pode ser deduzida a todo o tempo.
4 - O disposto neste artigo não prejudica outros prazos especiais fixados neste Código ou noutras leis tributárias.”
Ainda no concernente ao cômputo concreto do prazo importa ter em consideração que o prazo de impugnação judicial é um prazo de natureza substantiva, de caducidade e perentório, que se conta nos termos do artigo 279.º do Código Civil, aplicável ex vi do artigo 20.º, n.º 1, do CPPT.(3)

É, portanto, um prazo contínuo, correndo em férias judiciais. Contudo, de acordo com a alínea e) do artigo 279.º do Código Civil, o termo do prazo de 90 dias transfere-se para o primeiro dia útil seguinte se terminar em domingo ou dia feriado. Terminando o prazo nas férias judiciais, a impugnação pode ser intentada no primeiro dia útil seguinte.(4)

Feito o enquadramento jurídico da questão, vejamos, então, o que resulta do acervo fático dos autos.

Do probatório resulta que a decisão de indeferimento expresso do pedido de revisão oficiosa do ato foi expedida por carta registada com aviso de receção assinada a 13 de setembro de 2011, logo o dies a quo cifrou-se no dia 14 de setembro de 2011, logo o dies ad quem materializou-se no dia 12 de dezembro de 2011.

Assim, tendo a presente impugnação judicial sido deduzida a 14 de dezembro de 2011, está, efetivamente, caducado o direito de ação, pelo que a decisão recorrida que assim o ajuizou, não padece do erro de julgamento que lhe vem assacado, mantendo-se, por conseguinte, na ordem jurídica.


***


IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

-NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO e manter a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe. Notifique.


Lisboa, 28 de outubro de 2021

(Patrícia Manuel Pires)

(Cristina Flora)

(Luísa Soares)


1) António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 6505/13, de 2 de julho de 2013.
2) Vide, designadamente, Acórdãos do TCAN, proferidos nos processos nº 0008/10.8, de 30.10.2014 e 00011/10
3) Veja-se, por todos, o Acórdão do STA, de 16.04.2008, proferido no processo n.º 77/08, e demais jurisprudência aí citada.
4) Vide Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 6-06-2012, proferido no processo n.º 1064/11, integralmente disponível para consulta em www.dgsi.pt.