Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:6022/12.1BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:06/25/2020
Relator:ISABEL FERNANDES
Descritores:IRC;
MÉTODOS INDIRECTOS.
Sumário:I – Nos termos do preceituado no artigo 639º do CPC, ao Recorrente cabe o dever de indicar os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

T... - SOCIEDADE DISTRIBUIDORA DE G..., LDA, veio deduzir impugnação judicial contra a liquidação de IRC referente aos exercícios de 1997 e 1998, nos montantes de € 83.093,35 e € 81.928,49 respectivamente.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, por decisão de 27 de Abril de 2012, julgou improcedente a impugnação.

Não concordando com a sentença, a T... - SOCIEDADE DISTRIBUIDORA DE G..., LDA veio interpor recurso da mesma, tendo nas suas alegações, formulado as seguintes conclusões:

«79. Os actos tributários sub judice são nulos por preterição das formalidades essenciais, por falta de notificação para exercer o direito de audição antes da decisão de aplicação dos métodos indirectos.

80. São ainda nulos porquanto a notificação das liquidações não contêm todos os elementos previstos no n°2 do art. 36° do CPPT.

81. O procedimento de inspecção externa ultrapassou o prazo de seis meses e a ora Recorrente não foi notificada do despacho da prorrogação antes de expirado o prazo de 6 meses, pelo que o procedimento é ilegal.

82. O relatório definitivo não foi notificado à ora Recorrente no prazo de um ano, prazo máximo para o procedimento, se forem consideradas legais as prorrogações havidas, o que implica a ilegalidade das liquidações.

83. Sem conceder a administração fiscal procedeu à determinação da matéria tributável através de métodos indirectos e simultaneamente com as correcções técnicas à contabilidade que no entender da administração fiscal não tem credibilidade e é o fundamento para aquela forma de determinação, já que se a todo o período aplicam métodos indirectos seria toda a matéria tributável calculada nesta base.

84. Na determinação da matéria colectável não foram consideradas as regularizações efectuadas pela ora Recorrente, e que englobam as efectuadas pela administração fiscal com a diferença daquelas serem efectuadas em escudos e estas em litros.

85. Na determinação da matéria colectável a administração fiscal não observou os normativos legais, nomeadamente o disposto no art. 90° da Lei Geral Tributária,

86. Nem observou as orientações da própria administração fiscal e as rácios de rentabilidade, previstas no art. 90º da LGT, quantificados em instruções administrativas.

87. A administração fiscal considerou a contabilidade não credível, no entanto a determinação da matéria colectável baseou-se fundamentalmente na contabilidade essencialmente no que se refere aos custos.

88. Na Comissão de revisão a administração fiscal recusou-se a utilizar rácios de rentabilidade e margens de lucro para o sector de actividade, previstos na lei, por as considerar de base não científica.

89. O acto tributário carece de fundamentação de acordo com o direito positivo, que não se baseie em conceitos vagos ou meros juízos conclusivos para relatar os interesses que os motivou.

90. A tributação que a administração fiscal pretende para a ora Recorrente, ultrapassa de tal forma as rácios da rentabilidade e margens de lucro para o sector de actividade, traduzindo-se no apuramento de um lucro irreal, absurdo e utópico que ultrapassa os limites do razoável e as linhas de orientação da própria administração fiscal.

Nestes termos e nos demais de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, consequentemente, serem anulados os actos tributários sub judice como é da mais elementar JUSTIÇA.»


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A recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.

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A Exma. Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificada para o efeito, ofereceu aos autos o seu parecer, alegando que “(…) Entende-se que deve ser desde logo decidido pelo não conhecimento do mérito do recurso com a rejeição do mesmo, por incumprimento do n° 1 do art. 685-B do CPCivil.
III - Caso assim não seja entendido e se venha a apreciar o mérito do recurso, refere-se que a apreciação da matéria de facto que determinou a decisão de direito está devidamente fundamentada, pelo que não merece qualquer censura.
Pelo exposto, entende-se que a decisão recorrida deve ser mantida por correcta interpretação dos elementos de facto constantes dos autos e correcta aplicação do direito, pelo que se emite parecer no sentido do não provimento ao recurso.”
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Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta 1ª Sub-Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«1. A impugnante, T... - Sociedade Distribuidora de G..., Lda., com o NIF 5… e com sede em Rua C..., n.º 8-B em Almeirim, encontrava-se, à data dos factos a exercer a actividade de comércio a retalho de combustíveis - cfr. consta dos autos.

2. A Impugnante foi objecto de uma acção inspectiva por parte dos Serviços de Inspecção Tributária - D.P.I.T. 11, da Direcção de Finanças de Santarém de acordo com a Ordem de Serviço n.018984 de 01/09/2000, que decorreu entre 05/09/2000 e 26/07/2001 tendo por fim o controlo de sector de óleos minerais de âmbito geral e aos exercícios de 1997 e 1998 - cfr. pág. 2 do relatório da acção inspectiva junto ao PA

3. O prazo da realização da acção inspectiva foi prorrogado por duas vezes, tendo nesse sentido sido dirigidas comunicações ao sujeito passivo aqui Impugnante com os n.ºs 1425 de 05/03/2001 e 3615 de 28/05/2001, tendo deste último, sido dado conhecimento pessoal à interessada, que nesse sentido assinou no canto superior direito do mesmo com a indicação de 'Recebi o original' - cfr. fls. 223 e seguintes dos autos.

4. No âmbito da acção inspectiva supra os serviços de Fiscalização concluíram que a contabilidade do sujeito passivo não revelava a verdadeira situação patrimonial da empresa e procederam à determinação do Lucro Tributável através de métodos indirectos, apurando para o ano de 1997 38.195.002$00 e para o ano de 1998 43.185.317$00, com a fundamentação que a seguir parcialmente se transcreve:



«Imagem no original»




«Imagem no original»








«Imagem no original»



Tudo conforme consta do relatório elaborado no âmbito da acção inspectiva e que, no mais, aqui se dá por integralmente reproduzido - Doe. 3 junto ao PA.

5. A Impugnante teve conhecimento do projecto de conclusões do relatório supra, por carta registada com aviso de recepção que foi assinado em 27/07/2001, com a indicação expressa de que poderia, '...querendo, exercer o direito de audição, por escrito ou oralmente, sobre o projecto de conclusões do Relatório de Inspecção, que se anexa, nos termos previstos no artigo 60º da Lei Geral Tributária...',- cfr. Doe. 4 junto ao PA aqui em anexo.

6. A Impugnante teve conhecimento do conteúdo do relatório supra e da fixação da Matéria Tributária Fixada para o exercício de 1997 (38.195.002$00) e de 1998 (43.185.317$00), através do Oficio n.º 4572 datado de 04/09/2001, conforme consta da certidão de notificação assinada por J... TOC da Impugnante, que ali se comprometeu a dar conhecimento ao sócio gerente da Impugnante - cfr. fls. 47 do autos e 180 do PA aqui em anexo

7. Dá-se por reproduzido o of. n.º 4572 de 04/09/2001, que para além dos valores fixados refere as normas legais de suporte, remete para o relatório quanto à fundamentação e identifica os meios de defesa - cfr. fls. 47 e 48 dos autos.

8. Em 12/10/2001, a Impugnante apresentou junto do Director de Finanças do Distrito de Santarém requerimento a solicitar a revisão das matérias tributárias fixadas por métodos indirectos (IRC 1997 e 1998), nos termos do req. de fls. 38 e seguintes dos autos quer aqui se dá por integralmente reproduzido.

9. A Comissão de Revisão reuniu em 11/12/2001 na Direcção de Finanças de Santarém, não tendo conseguido o acordo, cada um dos peritos elaborou o respectivo laudo e o por despacho do Director de Finanças de Santarém de 22/01/2002, foi decidido em conformidade com a posição defendia pelo Perito da Administração Tributária , por ser a mais razoável tendo em consideração o exposto no respectivo parecer e os factos explicitados no relatório elaborado pelos Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária - tudo conforme Doc.s 5 e 6 junto ao PA e que aqui se dão por reproduzido.

10. No seu laudo, o Perito do Contribuinte, refere as conclusões que a seguir se transcrevem:










Tudo conforme Doc. 5 junto ao PA, aqui em anexo

11. No seu laudo, o Perito da Administração Tributária consta síntese que a seguir se transcreve:





Tudo conforme Doc. 5 junto ao PA, aqui em anexo

12. Face ao IRC assim corrigido foram elaboradas as liquidações n.º 8310007659 relativamente ao ano de 1997 no montante de € 83.093,35 e n.0 8310007660 relativamente ao exercício de 1998 no montante de € 81.928,49, ambas com data limite de pagamento em 17/06/2002, com a indicação de "Poderá reclamar ou impugnar nos termos e prazos estabelecidos no art. 128.0 do CIRC" - cfr. fls. 36 e 37 dos autos.

13. Apresente Impugnação foi deduzida em 13/09/2002 - cfr. fls. 1 dos autos.

Factos não provados:

Dos factos com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provou que o aqui impugnante tenha tido conhecimento comunicações n.º 1425 de 05/03/2001 referida no ponto 3., do probatório referente à 1.ª prorrogação do prazo para a realização da acção inspectiva.

Também não resultam provados os valores de auto consumo (397 l de gasóleo).

Não se provaram outros factos susceptíveis de afectar a decisão de mérito e que, em face das possíveis soluções de direito, importe registar como não provados.


«»


A convicção do Tribunal no estabelecimento deste quadro factológico fundou-se, no teor dos documentos citados nas alíneas supra.

Quanto ao facto dado por não provada resulta da falta de prova documental que o ateste, não tendo por isso, sido relevada a informação do ilustre Representante da Fazenda Pública no articulado junto aos autos em 09/06/2008 (fls . 221/222).

Quanto ao valores de auto consumo, dados por não provados resulta por um lado de não ter sido exibida qualquer prova documental e por outro da falta de consistência dos depoimentos das testemunhas arroladas quanto ao numero de camiões que a Impugnante tinha ao tempo ao se serviço, sendo referido por:

- C..., 1.ª testemunha a existência de 'dois camiões pesados com consumo na ordem dos o litros aos 100 Km, os quais eram utilizados diariamente em deslocações da zona do Porto para Almeirim e vice versa',

- J..., 2.ª testemunha que 'a mesma tinha ao seu serviço quatro ou cinco camiões cisterna e para transporte de gás, os quais diariamente se deslocavam para os locais de venda de combustíveis por parte da P.... Assim, havia viagens para Sines, Setúbal, Aveiras e zona do Porto;

- J..., 4.ª testemunha que 'a impugnante possuía dois camiões para o transporte de gás dos fornecedores para o armazém, em Almeirim e Rio Maior e seis ou sete carrinhas de distribuição domiciliária.

A imprecisão dos testemunhos quanto ao número de veículos e percursos contrasta com a unanimidade e precisão com que foi relatado o procedimento interno de controle de consumo de combustíveis, de que a titulo de exemplo se transcreve parte do depoimento da testemunha J... '...tem conhecimento que sempre foi e é prática da impugnante que os funcionários que conduzem camiões e carrinhas ao serviço daquela, abastecem de gasóleo em posto (bomba) de combustível e nas instalações da impugnante, procedendo em seguida cada um ao registo em documento tipo, onde consta a data do abastecimento e o número de litros utilizado. Estes documentos são em seguida remetidos ao escritório onde é elaborado um mapa que apura o total do gasóleo utilizado por todas as viaturas ao serviço da impugnante. O depoente esclarece que a indicada bomba de abastecimento é aferida pela Direcção Geral de Energia.'

No entanto, e apesar desta unanimidade nos depoimentos, a impugnante não logrou exibir os referidos mapas., nem provar a quantidade exacta de combustível utilizado com a própria frota.»



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- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Lidas as conclusões das alegações de recurso apresentadas pela Recorrente T... – Sociedade Distribuidora de G..., Ldª, resulta que a Recorrente nem ao de leve, se refere ao decidido pela sentença recorrida, não lhe imputando qualquer vício ou erro. Toda a argumentação alinhada em sede de recurso vem dirigida à actuação da AT, no âmbito do procedimento inspectivo e suas decorrências, como, aliás, disso dá conta a DMMP, no seu parecer. Mais, nem sequer o pedido tem qualquer relação com a sentença recorrida.

Como refere a DMMP, no seu parecer, resumiram-se as alegações de recurso e respectivas conclusões a traduzir o descontentamento da recorrente perante a actuação da AT, não afrontando directamente a fundamentação de facto ou de direito da sentença recorrida.

Recorde-se que, nos termos do preceituado no artigo 639º do CPC, ao Recorrente cabe o dever de indicar os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida. Ora, in casu, nada disto foi feito. Não foram indicados quaisquer razões ou fundamentos que justificassem a alteração do decidido.

Assim sendo, não tendo a Recorrente atacado, minimamente, o decidido em 1ª instância o recurso está votado ao insucesso, sendo de manter a sentença recorrida.

III- Decisão


Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 25 de Junho de 2020


(Isabel Fernandes)

(Jorge Cortês)

(Lurdes Toscano)