Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09699/16
Secção:CT
Data do Acordão:07/13/2016
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:PLANO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO/PRESTAÇÃO DE GARANTIA/PRESSUPOSTOS/ÓNUS DA PROVA/AUDIÇÃO PRÉVIA
Sumário:I – Independentemente de entendimento que se perfilhe quanto à natureza do acto de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia - acto materialmente administrativo praticado no processo de execução fiscal ou acto predominantemente processual – é sempre de concluir que não há, nessa situação, lugar ao exercício do direito de audiência previsto no art. 60º da LGT.
II – A existência do PER, só por si, não determina necessariamente a dispensa de garantias nas execuções fiscais em que estejam em causa a cobrança de dívidas tributárias, sobretudo nas situações em que a Administração Tributária expressamente condiciona a sua posição, no que à aprovação do PER respeita, a essa mesma prestação de garantia ou a eventual reconhecimento da sua isenção para efeitos de um futuro prosseguimento ou suspensão da execução.
III – Não obstante a jurisprudência do nosso Supremo Tribunal tenha já expendido o entendimento de que em matéria de garantias carece de sentido falar-se em indisponibilidade de créditos tributários, mantém-se intocável a asserção de que constitui obrigação do executado requerer, sendo essa a sua pretensão, a dispensa da prestação de garantia e de alegar e comprovar que reúne os pressupostos a essa concessão, isto é, que a prestação de garantia lhe acarretará prejuízo irreparável ou a falta de meios económicos para a prestar, bem como, em qualquer um dos casos, que a insuficiência ou inexistência dos bens não lhe é imputável, isto é, que por essa insuficiência não é responsável (artigo 52.º, n.º4, da Lei Geral Tributária)
IV – Tendo o requerente da dispensa de prestação alegado e juntado documentos tendentes a provar todos os pressupostos referidos em III, não pode a Administração Tributária indeferir o requerido exclusivamente suportado numa insuficiência de prova, impondo-se-lhe que convide a recorrente a suprir as incorrecções do requerimento deficientemente instruído, sobretudo quando está ciente de todo um contexto em que o pedido foi formulado, as negociações que o antecederam, as condições de facto e direito em que o PER foi aprovado, em suma, da específica situação concreta da requerente e que a decisão a tomar, pela delicadeza que comportaria em termos de potenciais efeitos, não podia deixar de ser ponderada «na perspectiva do equilíbrio entre o objectivo da (…) recuperação económica e da salvaguarda do interesse público em garantir a boa cobrança dos créditos fiscais.».
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
I – Relatório

A Fazenda Pública, notificada da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra - que julgou procedente a reclamação judicial deduzida nos termos dos artigos 276º e seguintes do CPTA, pela sociedade executada, denominada D…, Lda e anulou o despacho de indeferimento do pedido de dispensa de prestação da garantia da dívida exequenda por aquela executada formulado no âmbito do processo de execução fiscal nº e apensos – dela veio interpor o presente recurso jurisdicional

Com o requerimento de interposição do recurso apresentou a Recorrente as respectivas alegações que encerrou com a formulação das seguintes conclusões:


«I. Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou procedente a Reclamação apresentada por D. LDA, NIPC , contra a decisão de indeferimento da dispensa de prestação de garantia, proferida pela Divisão de Gestão da Divida Executiva (DGDE), com fundamento em "vício de forma consistente na falta de fundamentação".


II. Nos termos do nº1 do artigo 77° da LGT, "A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição da razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas,..", podendo esta fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anterior parecer, informação ou proposta, que, neste caso, constituirão parte integrante do respectivo acto (fundamentação por adesão ou remissão).


III. Com efeito, "A exigência legal e constitucional de fundamentação dos actos tributários visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa", cfr., excerto extraído do sumário do acórdão do STA; de 15-04-2009, processo n° 065/09, pelo que um acto apenas se encontra fundamentado quando um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal (bonus pater famílias) - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o acto sindicado, fica em condições de conhecer o itinerário funcional cognoscitivo e valorativo do autor do acto, isto é, todo o percurso da apreensão e valoração dos pressupostos de facto e de direito que suportam a decisão e os motivos pelos quais se decidiu em determinado sentido e não noutro divergente.


IV. Nestes termos, não se pode concordar, com o devido respeito, quando a douta Sentença, ora recorrida, consagra que "...o despacho reclamado nada refere quanto a (in)susceptibilidade de os meios de prova juntos pela Reclamante para concluir no sentido por aquele pretendido, nem tão pouco quanto à sua (in)suficiência para esse efeito".


V. Constatamos que o despacho reclamado fez a devida ponderação fundamentadora acerca da situação económica e patrimonial da sociedade Reclamante, sem que, a nosso ver, tenha logrado obter a justa valoração do Tribunal a quo para efeitos da boa decisão da causa.


VI. Perante os elementos apresentados, e não olvidando as regras de distribuição do ónus da prova no caso que nos ocupa, não se conjectura como poderia a AT carrear para os autos os elementos probatórios atinentes aos factos alegados pela executada, de que a prestação de garantia lhe iria provocar prejuízo irreparável, traduzido, por exemplo, na impossibilidade de continuar a exercer a sua actividade económica, ou que a mesma não dispõe de meios económicos suficientes para a prestar revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, estando a Reclamante em melhores condições - e a isso obrigada -de satisfazer tal prova de harmonia com a factualidade por si alegada.


VIl. Como sabemos, e no que à irresponsabilidade do executado pela situação de insuficiência/inexistência de bens toca, trata-se de um requisito com carácter obrigatório e que a executada, nem sequer alegou, como também não conseguiu provar conforme lhe competia.


VIIl. No estrito cumprimento dos princípios do inquisitório e cooperação, a AT, no despacho que apreciou e indeferiu o requerimento apresentado pela Reclamante, informou que sempre se admitiria, em alternativa à alegada - mas não provada - insuficiência/inexistência de bens penhoráveis "a penhora de estabelecimento comercial da sociedade executada, nos termos do artº782º do Código de Processo Civil, aplicável ao processo de execução fiscal, por remissão do artº2° do CPPT." Informação que a Reclamante descartou e nem em sede de reclamação considerou.


IX. Não pode a Reclamante escudar-se nos princípios do inquisitório e colaboração porquanto não pode deixar de estar ciente, perante a claríssima letra da lei, do seu dever de iniciativa e de instrução, e na medida em que é ela quem está em melhores condições para apresentar os meios de prova da factualidade por si alegada.


X. Por outro lado, não pode esquecer-se a reciprocidade do dever de colaboração que Lei Geral Tributária estabelece (artigo 59°) e que exige também ao contribuinte que coopere activamente com a administração no sentido da descoberta da verdade, dever que não pode deixar de ser lido em conjugação com o princípio geral relativo ao ónus da prova: cabendo-lhe o ónus de invocar e demonstrar que se encontram reunidos os pressupostos para ser dispensado da prestação de garantia, cabe-lhe o dever de apresentar os meios de prova que permitam dar por verificados esses requisitos, sob pena de a sua inércia probatória e de o non liquet que daí resulta ter de ser resolvido contra si.


XI. Por outro lado, também não podemos concordar que o Tribunal a quo tenha estribado o seu sentido decisório no facto de que "o despacho reclamado limita-se a indeferir o pedido formulado pela Reclamante, invocando que não se encontram verificados os requisitos exigidos no artigo 52º nº 4 da LGT...".


XII. Pois que a Administração Fiscal fez uma apreciação de mérito ao peticionado pela Reclamante, a qual consolidou através da análise documentos disponibilizados, tendo procedido a uma fundamentação em conformidade com a apreciação realizada, sendo que, não só o pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado pela Reclamante não se encontra instruído com a necessária prova documental, como também, da análise, ainda que perfunctória, da DGDE à situação económica da Reclamante, e que fundamenta o acto reclamado, resulta que, embora a insuficiência material de bens penhoráveis constitua um indício de uma possível falta de meios económicos, ela não determina, só por si e necessariamente, uma situação de manifesta falta de meios económicos, devendo ser estabelecido um nexo de casualidade adequada a cada situação.


XIII. Pelo que, não se vislumbra, qualquer ilegalidade na conduta da administração tributária, nomeadamente no que ao domínio dos princípios da cooperação e do inquisitório considerando que a Recorrente, não invocou e, por consequência, não comprovou, como era seu ónus, a ausência de culpa na situação de inexistência/insuficiência de bens, quando é sabido que o requerimento para dispensa de prestação de garantia tem de conter as razões de facto e de direito que fundamentam o pedido, com a alegação da materialidade fáctica necessária à evidenciação dos enunciados requisitos, e tem de ser acompanhado dos elementos probatórios necessários à comprovação da materialidade alegada.

XIV. Veja-se, neste sentido o acórdão do STA, de 07-01-2015. Proc. 01489/14: "Sendo expressas e claras as razões que levaram o órgão da execução fiscal a concluir pela falta de verificação de um dos requisitos contidos no artº52° nº4 da LGT - relativo a irresponsabilidade da sociedade executada na insuficiência ou inexistência de bens - e que o conduziram a indeferir o pedido de dispensa de prestação de garantia, não pode dar-se por verificado o vício de falta de fundamentação. II - No âmbito do procedimento para dispensa de prestação de garantia, o executado tem o ónus de alegar e comprovar os pressupostos factuais para a requerida dispensa, nomeadamente que a situação de inexistência/insuficiência de bens não lhe é imputável. O que, no caso, não fez, pois o requerimento que apresentou não continha a mínima menção a esse requisito, não tendo sido esboçada qualquer factualidade que permitisse, uma vez comprovada, excluir a sua responsabilidade nessa matéria, pelo que sempre se tomava inviável e inútil o convite à prova desse requisito. Ill - E embora a administração tributária deva, ao abrigo do princípio do inquisitório e do dever de colaboração e de cooperação recíprocas com o contribuinte, solicitar ao requerente o esclarecimento de dúvidas e solicitar elementos de prova adicionais ou complementares, o certo é que tal dever deve ser interpretado em termos hábeis, já que a investigação oficiosa pressupõe que tenham sido alegados os factos e oferecidos meios de prova pelo interessado que não ditem o indeferimento imediato do pedido".


XV. E assim, o dever de fundamentação terá sempre que ser aferido face ao acto efectivamente praticado, perante o qual terá que ser cotejada a sua adequação, sobretudo quando se trata de actuação ao abrigo de poderes vinculados, como acontece no caso do acto reclamado, porque, como muito bem faz notar o acórdão do STA, de 05-06-2013, Proc. 0867/13, cujo sumário se transcreve: "O dever legal de fundamentação deve responder às necessidades de esclarecimento do destinatário, informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do respectivo acto e permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito que determinaram a sua prática. É de considerar suficientemente fundamentado (fundamentação formal) o despacho que indeferiu pedido de dispensa de prestação de garantia para obtenção da suspensão da execução fiscal, por remissão para a fundamentação de antecedente informação prestada pelos serviços que se funda na falta de comprovação, por parte da requerente, de um dos pressupostos cumulativos da isenção de prestação de garantia expressos no nº4 do art.º52º da LGT: irresponsabilidade da actuação empresarial ou da administração da executada na génese da situação de insuficiência ou inexistência de bens".


XVI. Com o devido respeito, que é muito, a Reclamante, ao contrário do que ficou decidido na douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, compreendeu as razões que levaram a Administração Fiscal a decidir no sentido que decidiu e não noutro, e tal resulta expressamente da leitura da sua p.i., na qual a Reclamante veio, efectivamente, questionar o acto reclamado, apontando-lhe não só o vício de falta de fundamentação, mas contestando a sua legalidade e, logo, pondo em causa os respectivos fundamentos, o que é sintomático do pleno conhecimento e apreensão do mesmo e da respectiva fundamentação.


XVII. Pelo que, à Fazenda Pública, não se conformando com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, não resta senão concluir, salvo o devido respeito, que a douta Sentença se estribou numa errónea apreciação da matéria de facto relevante para, a nosso ver, a boa decisão da causa, tendo violado o disposto no artigo 77° da LGT.


TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DEVE A DOUTA SENTENÇA, ORA RECORRIDA, SER REVOGADA, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!».

Notificada da admissão do recurso jurisdicional a Recorrida “D, Lda” apresentou contra-alegações que encerrou nas seguintes conclusões:


«a) Por sentença datada de 24-03-2016 o tribunal a quo deu razão à reclamante decidindo que "o acto reclamado enferma de falta de fundamentação", vindo a recorrente defender que a sentença proferida pelo Tribunal a quo "se estribou numa errónea apreciação da matéria de facto relevante para a boa decisão da causa".


b) Na verdade, vem a recorrente dizer que a AT não fundamentou mais porque a D não alegou nem provou factos que se subsumissem ao preenchimento dos requisitos necessários para a dispensa de garantia.


c) De acordo com o artigo 77º, nº1 da LGT o dever de fundamentação vem no sentido de garantir o direito constitucionalmente consagrado de o contribuinte ter ciência das razões que levam a Administração Fiscal a actuar num determinado sentido, possibilitando-lhes reagir.


d) O despacho reclamado, que nega provimento ao pedido de dispensa de garantia, alega, em síntese que não se encontram provados os requisitos exigidos pelo artigo 52º da LGT, não se encontrando suficientemente fundamentado, especialmente porque não rebate os argumentos expendidos pela reclamante nem faz alusão as informações que dispõe acerca da situação económica da reclamante.


e) Nos termos do artigo 52°, nº4 da LGT, o benefício da isenção fica assim dependente de dois pressupostos alternativos: ou a (i) existência de prejuízo irreparável decorrente da prestação da garantia ou (ii) a falta de meios económicos para a prestar. Sendo necessário o preenchimento de um outro pressuposto cumulativo: que a insuficiência ou inexistência dos bens não seja da responsabilidade do executado que pretende a isenção.


f) Relativamente a este último pressuposto entende a recorrente que a reclamante nada disse. Todavia a este respeito refere ainda o Tribunal a quo que "o pressuposto da irresponsabilidade na insuficiência ou inexistência de bens implica a prova de um facto negativo não infirma a conclusão de que o ónus da prova impende sobre o executado."


g) Aclara a este propósito o acórdão do STA, proferido no processo nº01320/12 de 19/12/2012 que na prova de factos negativos "não se esta perante uma situação de impossibilidade pratica de provar o facto necessário para o reconhecimento de um direito (...) pois ao executado é possível demonstrar aquele facto negativo através de factos positivos, como são as reais causas de tal insuficiência ou inexistência de bens."


h) A reclamante veio assim no seu requerimento dirigido à AT explicar os requisitos de que depende o deferimento do pedido por si formulado, aludindo à situação concreta, subsumindo-se essa situação a cada um dos requisitos exigidos, demonstrando assim insuficiência e inexistência de bens, fazendo em consequência prova desse facto negativo.


i) Para fazer essa prova juntou a documentação que entendeu conveniente e suficiente e enunciou ainda a reclamante as diligências que vinha efectuando para cumprir as suas obrigações financeiras, designadamente com a AT, aclarando que havia atravessado um procedimento extrajudicial de conciliação, onde forem integrados os créditos tributários.


j) A reclamante tentou assim regularizar as dividas tributarias com recurso ao pagamento da divida em prestações, no âmbito do PEC, tendo nessa altura dado como garantia bens de terceiro, que não foram aceites pela AT para esse fim. Ficando já nessa altura provada a inexistência de bens.


k) Não pode a AT socorrer-se assim do desconhecimento sobre a situação económica da reclamante ou sequer sobre a existência de bens.


i) Ainda assim em sede de recurso vem a AT dizer que "a reclamante se limita a alegar que não dispõe de outros bens penhoráveis, sendo os únicos bens da empresa são os créditos futuros que a AT tem vindo a penhorar"


m) Na realidade, desde a instauração do PEC que a reclamante vem dialogando com a AT diligenciando no sentido de liquidar a sua divida, pelo que alem do requerimento e da documentação junta com o mesmo, a AT detinha já de informação adicional, sobretudo no que a existência de bens diz respeito e aos esforços que a reclamante vinha e envidar para recuperar a viabilidade da empresa pagando os seu créditos.


n) É verdade que o ónus de prova é do executado, acontece que o despacho reclamado nada refere quanto a insusceptibilidade dos meios de prova oferecidos pela reclamante para decidir como decidiu.


o) Sendo certo que se a administração tributária julgava que os factos necessitavam de prova adicional, tinha a responsabilidade, ao abrigo do princípio do inquisitório e da colaboração, de notificar a reclamante para juntar prova adicional, o que não fez.


p) Neste sentido veja-se o acórdão do STA com o nº519/13 de 15/05/2013 onde se pode ler "se a recorrente alegou os pressupostos da isenção da prestação de garantia previsto no nº4 do artigo 52º da LGT, mas não juntou a documentação necessária a fazer prova dos mesmos, não subsistem razões que impeçam a Administração Tributária de convidar a recorrente a suprir as incorrecções do requerimento deficientemente instruído."


q) Mas a recorrente vai mais longe dizendo que "não olvidando as regras de distribuição do ónus da prova no caso que nos ocupa, não se conjectura como poderia a AT carrear para os autos os elementos probatórios atinentes aos factos alegados pela executada, de que a prestação de garantia lhe iria provocar prejuízo irreparável, traduzido, por exemplo, na impossibilidade de continuar a exercer a sua actividade económica, ou que a mesma não dispões de meios económicos suficientes para prestar revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, estando a Reclamante em melhores condições- e a isso obrigada- de satisfazer tal prova de harmonia com a factualidade por si alegada."


r) Todavia, os artigos 15º, 16º e 17º do requerimento inicial não deixam dúvidas que a actividade da empresa seria posta em causa com a penhora de créditos o que acarretaria necessariamente um prejuízo irreparável, ou seja o encerramento da empresa.


s) Com o requerimento foi junta prova documental, nomeadamente foi junto o Plano de revitalização, onde é aprofundada a questão de dependência económica da empresa em relação aos créditos da , o que evidencia que se estes forem penhorados inviabilizavam a actividade da empresa.


t) Na realidade, apesar de o requerimento inicial se encontrar perfeitamente fundamentado e documentado, sempre se dirá, como o faz a própria recorrente a propósito do dever fundamentação que impende sobre a AT, que "um acto apenas se encontra fundamentado quando um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal (bonus pater famílias) - colocado na situação concreta fica em condições de conhecer o itinerário funcional, ou seja todo o percurso da apreensão e valoração dos pressupostos."


u) Com isto quer-se dizer, que a AT era perfeitamente conhecedora de todo o percurso económico da executada, pelo que, ao abrigo do princípio da colaboração, do inquisitório e de garantir aos administrados os direitos que lhe são concedidos por lei, lhe era exigida uma actuação diferente.


v) Aqui chegados cumpre dizer que os despachos de indeferimento de pedido de dispensa de prestação de garantia não são precedidos de audição prévia, pelo que o dever de fundamentação e de colaboração assumem assim uma dimensão maior.


w) Como bem refere a sentença da qual se recorre, resulta do requerimento apresentado que a reclamante:

"-invocou a ocorrência de prejuízo irreparável, enunciando descritivamente quais as exigências da Administração Tributaria que o determinaram e porquê;

-alegou a manifesta falta de meios económicos para a prestar evidenciada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da divida exequenda e acrescido;

- alegou a inexistência de responsabilidade na insuficiência de bens, o que fez alegando que o seu património não sofreu qualquer diminuição, porque nem sequer existiu previamente."


x) Já em sede de reclamação vem a reclamante juntar o balancete geral, ainda assim entende a DGE que tal documento permite apenas verificar os registos contabilísticos de um mês isolado, mas dele não se retira a possibilidade de prestar ou não garantia.


y) A reclamante sempre referiu que o único bem penhorável que dispunha eram justamente os créditos da MEO, analisando o balancete verifica-se a relevância da na contabilidade da reclamante, pelo que deveria ser esta a leitura feita pela DGDE, fazendo prova idónea para demonstrar a real situação financeira e patrimonial da executada e da sua impossibilidade de prestar garantia.


z) Aqui chegados, cumpre evidenciar que não assiste razão à recorrente, pois o requerimento apresentado enuncia os requisitos de que depende o deferimento do pedido de isenção da prestação de garantia por si formulado, subsumindo-se a sua situação concreta em cada um deles.


aa) Assim, só se pode concluir como concluiu o Tribunal a quo, o acto reclamado enferma de falta de fundamentação, pois apreciou de forma insuficiente o pedido apresentado.


Termos em que se requer a V. exa que o recurso apresentado pela Reclamada não tenha qualquer provimento, devendo em consequência ser mantida a decisão da qual se recorre em toda a sua extensão».

Neste Tribunal Central, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, no qual se pronunciou, a final, no sentido da improcedência do recurso.

Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza do processo (cfr. artigos 657º do Código de Processo Civil e 278º, n.º 5 do Código de Procedimento e de Processo Tributário), cumpre agora apreciar e decidir.

II. Objecto de recurso

Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente, este objecto, assim delimitado, pode vir a ser, expressa ou tacitamente, restringido nas conclusões da alegação (n°2 e e 3 do artigo 635.° do Código de Processo Civil). Pelo que, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos por seguro que, in casu, o objecto do mesmo está circunscrito á questão de saber se o tribunal a quo, ao ter julgado que o despacho objecto de reclamação se encontrava insuficientemente fundamentado e ao determinar, em conformidade, a sua anulação, errou na apreciação dos factos apurados.

III. Fundamentação de Facto

A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:

A) Em 16 de Julho de 2012, o Serviço de Finanças de autuou o PEF n°, em que era Executada, a ora Reclamante, D..., LDA., com o NIF , para cobrança de dívida no valor de € 127,50, proveniente de coimas e acrescido. - cf. autuação e certidão de dívida n°, cf. fls. 1 e 2do PEF apenso


B) Em 31 de Julho de 2013, o departamento técnico do IAPMEI formulou parecer favorável à viabilidade económica e financeira da Reclamante, D..., LDA., com o NIF , através da implementação do acordo previsto no âmbito do Procedimento Extra Judicial de Conciliação com o n°. - cf. documento 11 junto pela Reclamante - acta final referente ao PEC - Processo n°, a fls. 61 e 62


C) O parecer a que se refere a alínea anterior, com as condições de regularização de dívida da Reclamante à Fazenda Nacional, foi subscrito, entre outros, pela Autoridade Tributária, com autorização do SubDirectorGeral, formulada nos seguintes termos:

"A sociedade "D…, Lda." – (…) tem em curso um Procedimento Extrajudicial de Conciliação (...), ao qual foi atribuído o n°, pejo Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (IAPMEI). (...)

A Autoridade Tributária e Aduaneira, no que se refere à regularização dos seus créditos, encontra-se vinculada à observância dos princípios da legalidade, da proibição da moratória e da indisponibilidade estabelecidos, designadamente, nos arts. 30° e 36° da LGT, e art. 85° do CPPT.

Todavia, o método de regularização dos créditos tributários proposto pela requerente, perante o IAPMEI, poderá enquadrar-se no regime prestacional consagrado no art.196° do CPPT.

(...) determino o seguinte:

- "deverá mostrar-se regularizada a situação tributária com referência à data posterior à apresentação da entidade devedora a procedimento, no prazo de trinta dias a contar da notificação efectuada pelos serviços da Administração Fiscal para o efeito;

- no caso de as garantias constituídas ainda antes da conclusão do acordo por iniciativa da Administração Fiscal, sob a forma de hipoteca legal ou penhor, ou por iniciativa da própria entidade devedora, não se revelarem suficientes para garantiras dívidas à Fazenda Nacional abrangidas pelo procedimento, deverá exigir-se a constituição, no prazo de 15 dias a contar da notificação que autorizar o pagamento em prestações, de garantias reais sob a forma de hipoteca voluntária, igualmente complementada por outras de idêntica natureza real, ou garantia bancária, cuja idoneidade e suficiência, nos termos do artº199° do CPPT, deverá ser aferida pelo órgão de execução fiscal competente para a tramitação das execuções fiscais;

- os credores abrangidos pelo acordo devem representar mais de 50% das dívidas da devedora;

- as condições de regularização para os restantes credores não poderão mostrar-se mais favoráveis do que as que forem acordadas para a regularização das dívidas da Fazenda Nacional". cf. Doc. 11 junto pela Reclamante-acta final referente ao PEC - Processo n° e Anexo II - despacho de 3 de Julho de 2013, do SubDirector Geral, José , a fls. 61, 62, 67 e 63


D) Em 4 de Outubro de 2013, foi deferido o pedido de pagamento em prestações apresentado pela Reclamante no PEF nº e apensos. - cf. pedido, informação e despacho, a fls. 3 do PEF apenso

E) A Reclamante requereu ao Serviço de Finanças de , a prestação de garantia para suspensão dos PEF nºs e apensos, mediante constituição unilateral de penhor mercantil pela sociedade T, Lda., sobre um conjunto de bens a que foi atribuído o valor de € 24.692,96. - cf. requerimento e documento de Constituição Unilateral de Penhor Mercantil, com anexo descritivo de bens, a fls. 4 e 5 do PEF apenso


F) O pedido a que se refere a alínea anterior foi indeferido por existir uma penhora sobre o veículo automóvel constante da lista de bens e por os bens objecto de penhor serem "propriedade de uma entidade terceira”, considerando que tal "facto que poderá inviabilizar a execução da garantia". - cf. informações e despachos, a fls. 6 e 7 do PEF apenso.


G) Em 9 de Setembro de 2013, o Serviço de Finanças de … emitiu mandado de penhora dos bens pertencentes à Executada, D.... LDA.. com o NIF …, nos PEF nºs …. - cf. Mandado da Penhora, a fls. 12.


H) Em 20 de Abril de 2015, a Autoridade Tributária informou a Administradora Judicial Provisória, nomeada no Processo n°…/15.3T8SNT, da composição das dívidas tributárias da ora reclamante, D..., LDA., com o NIF …, que ascendia a € 64.282,80, referentes a quantia exequenda, juros de mora e custas. - cf. ofício n°, de 20 de Abril de 2015 e certidão de dívida, de fls.de 15 a 21 do PEF apenso


l) A Autoridade Tributária informou a Reclamante, relativamente ao Processo Especial de Revitalização (PER) - proc. Nº…/15.3T8SNT, das suas condições para participação nas negociações no âmbito daquele plano. - cf. ofício com numeração e data ilegíveis, a fls. 22 do PEF apenso.


J) A Autoridade Tributária informou a Reclamante, relativamente ao Processo Especial de Revitalização (PER) - proc. N°…/15.3T8SNT, das suas condições para votação favorável do plano de revitalização apresentado. - cf. ofício n°2844, com data ilegível, a fls. 27 do PEF apenso.


K) Em 27 de Março de 2015, o Serviço de Finanças de …, penhorou no PEF n°…, o crédito que a Executada, D.... LDA., com o NIF …, ora Reclamante, detinha naquela data sobre a sociedade "M, S.A.", no montante de €3.090,93, para cobrança da dívida cujo saldo, à data, era de € 9.690,93.- cf. documento 9 junto pela Reclamante -Auto de Penhora de Créditos, a fls. 39.


L) Em 31 de Julho de 2015, foi elaborado Plano Especial de Revitalização da ora, Reclamante, D..., LDA., com o NIF …, a apresentar no processo n°…/15.3T8SNT, a tramitar no Tribunal da Comarca Lisboa Oeste - Sintra - inst. Central - Sec. Comércio — J1. - cf. Doc. 7, junto pela Reclamante - Plano de Plano de Revitalização, de fls. 34 a 49.


M) Entre os credores constantes do Plano de Revitalização a que se refere a alínea anterior, inclui-se um crédito à Autoridade Tributária com proposta de pagamento da respectiva dívida, nos seguintes termos:

"1) Crédito - 100% do crédito reclamado (capital e juros)

2) Data de Referência: Data da homologação do Plano

3) Prazo e prestações:

Pagamento em regime prestacional, nos termos do artigo 196° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), ou seja:

a) As prestações são mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira até ao final do mês seguinte ao terminus do prazo previsto no n°5 do artigo 17-D do CIRE.

b) Número máximo de prestações: o pagamento do crédito reconhecido à Fazenda Nacional em 60 prestações mensais, iguais e sucessivas;

Não haver lugar à redução de coimas e custas;

• Não haver lugar a qualquer moratória.

4) Garantias:

Mais se requer, a isenção de prestação de garantia durante o período em que esteja a ser cumprido o regime prestacional, visto que, como é manifesto, a empresa revela falta de meios económicos e insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido. Tanto assim é que a D recorreu ao Processo Especial de Revitalização, pois bem sabia que a solução para a sua recuperação e satisfação dos seus credores passa por um plano de insolvência que dilua o passivo no tempo e pela sua utilização de investimentos dos meios libertos pela empresa que isso permitirá. Caso tenha que prestar garantias a sua prestação causar-lhe-á prejuízo irreparável pondo em causa a subsistência da empresa. Deste modo encontram-se reunidos os pressupostos de isenção de prestação de garantia (n°4 do artigo 52° da LGT) e em consequência a suspensão dos processos executivos.

5) Inicio: A primeira prestação terá que se vencer até ao final do mês seguinte à data da sentença homologatória do plano" - cf. Doc. 7 junto pela Reclamante - Plano de Plano de Revitalização referido na alínea anterior- informação constante do segmento "E) Medidas Propostas 1. Credores Reclamantes B) Credores Públicos Autoridade Tributária/ Fazenda Nacional", a fls. 45 a 47.


N) O Plano Especial de Revitalização a que se refere a alínea L) supra, foi aprovado com 98,89% de votos a favor, entre os quais se inclui o voto da Fazenda Pública, correspondente a 10,33% dos créditos reclamados. - cf. Documento 4 junto pela Reclamante - Acta de Contagem de votos, de 20 de Agosto de 2015, de 27 a 29.


O) Em 23 de Setembro de 2015, foi homologado o Plano de Revitalização da ora Reclamante, a que se refere a alínea L) supra, no processo n°…/15.3T8SNT, a tramitar no Tribunal da Comarca Lisboa Oeste - Sintra - Inst. Central - Sec. Comércio - J1. - cf. documento. 6, junto pela Reclamante - decisão de homologação do Plano Especial de Revitalização, elaborado em 31 de Julho de 2015, de fls. 31 33.


P) Em 29 de Setembro de 2015, a Reclamante requereu, perante o SF …, a suspensão do processo referido na alínea L) supra, com dispensa de prestação de garantia, juntando seis documentos e alegando, além do mais, o seguinte:

"17° A continuidade da penhora dos créditos futuros que a D detém junto da M, ou a penhora de quaisquer outros pequenos créditos que eventualmente venham a existir junto de outras entidades, tem como consequência a inviabilização da actividade o que causa prejuízo irreparável e obrigará a empresa a encerrar a breve trecho.

18° O executado carece de meios económicos que lhe permitam neste momento prestar a garantia exigida para a suspensão do processo atento o valor em questão.

19° Se assim não fosse não teria a requerente recorrido ao PER como fez numa tentativa de recuperar a empresa e salvaguardar os credores.

20° Não dispõe igualmente de bens móveis ou imóveis que lhe permitam prestar garantia.

21° Estando a atravessar um período de dificuldades económicas e financeiras que se agravam com a grave crise económica que se encontra instalada.

22° Nos termos do artigo 52°, n°4 da LGT, a requerente reúne assim as duas condições necessárias à concessão do benefício de isenção da garantia". - cf. requerimento de fls.32 a 34 do PEF apenso.


Q) Em 26 de Outubro de 2015, foi proferido despacho de indeferimento do pedido a que se reporta a alínea anterior, "por não se encontrarem verificados os pressupostos do n° 4 do Art°52 da LGT". — cf. despacho do Director Adjunto, Carlos , a fls. 50 verso, do PEF apenso.


R) O despacho a que se reporta a alínea anterior, teve por base informação elaborada pela técnica responsável, de cujo teor se extrai o seguinte:

"No caso em apreço, o executado, nada alegou para demonstrar o prejuízo irreparável.

Na verdade a executada deveria demonstrar o quantum das despesas que suporta e demonstrar quais os concretos prejuízos, que em termos de causalidade adequada, provavelmente lhe advirão com a prestação de garantia, e que simultaneamente, sejam susceptíveis de serem qualificados como irreparáveis. (....)

Na verdade, não se pode afirmar que a executada não dispõe de bens para garantir o processo ora em análise, dado que se admite a penhora do estabelecimento comercial da sociedade executada, nos termos do art.° 782.° do Código de Processo Civil, aplicável ao processo de execução fiscal, por remissão do art.2° do CPPT.

Quanto à irresponsabilidade do executado pela situação de insuficiência /inexistência de bens, cumpre lembrar que se trata de um requisito com carácter obrigatório e que o executado também não conseguiu provar conforme lhe competia", concluindo com a proposta de "indeferimento do pedido de dispensa de garantia, por não se encontrarem verificados os pressupostos do n°4 do Art°52 da LGT, designadamente no que respeita ao prejuízo irreparável, à manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis e, que em qualquer dos casos, que não é da sua responsabilidade tal insuficiência ou inexistência nos termos acima expostos". - cf. informação elaborada em 23 de Outubro de 2015, a fls. 51 do PEF apenso.


S) No dia 13 de Novembro de 2015, a Reclamante recebeu a decisão reclamada - cf. ofício n° , de 11 de Novembro de 2015 e aviso de recepção, a fls. 52 do PEF apenso.


T) A Reclamante tem como principal cliente a M… e aufere uma comissão por cada cliente novo ou renovação - cf. documento 7 junto pela Reclamante - Plano de Plano de Revitalização referido na alínea L) supra - informação constate do segmento "B) Caracterização da empresa", a fls. 39, corroborada e explicada pelas declarações de parte e depoimento da testemunha inquirida.


U) As despesas mensais da Reclamante, incluindo as despesas com o Plano de Revitalização, correspondem a uma elevada percentagem das receitas mensais. cf. declarações de parte e depoimento da testemunha inquirida


V) A Empresa funciona num imóvel arrendado e tem como activos apenas o material de escritório e computadores - cf. declarações de parte e depoimento da testemunha inquirida.

3.2. Mais ficou consignado, a título de «Factos não provados» que: «Não resulta provado que a Reclamada seja detentora de qualquer património de que não tenha dado conhecimento à Autoridade Tributária.

Não resulta igualmente provado que a Reclamada tenha sido detentora de património idóneo para garantir as dívidas exequendas e que o mesmo tenha sido mal administrado ou dissipado.

Inexistem outros factos não provados com relevância para a decisão da causa».

3.3. Em sede de «Motivação da decisão de facto» ficou exarado na sentença recorrida que «A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos constantes dos autos e do PEF apenso, não impugnados, complementados e enquadrados com as declarações do representante da Reclamante, Mário , e com o depoimento da testemunha João , com destaque para os referidos a propósito de cada alínea do probatório.

As declarações e depoimento prestado neste Tribunal revelaram-se credíveis e permitiram esclarecer as condições em que se desenvolve a actividade da Reclamante, e quais as consequências, na continuidade da sua actividade, da imposição de determinadas medidas, em concreto, da continuidade da penhora de créditos junto da M, tendo contribuindo para a fixação dos factos assentes nas alíneas T), U) e V) supra.

Quer o declarante, quer a testemunha falaram com conhecimento directo dos factos, o primeiro, atenta a sua qualidade, e o segundo por ter sido sócio da Reclamante e exercer, actualmente, uma actividade com o mesmo modelo de negócio numa outra empresa

No que para os presentes autos releva, resultou claro das declarações de ambos, que a facturação da Reclamante provêm essencialmente do cliente M e que, privá-la dessa receita, na totalidade, obsta à continuidade da sua actividade, por ficar privada da sua, quase exclusiva, fonte de rendimento».

IV. Fundamentação de direito

Como linearmente resulta dos pontos I e II supra, é uma só a questão a decidir neste recurso: saber se o Tribunal a quo, ao decidir pela anulação do despacho de indeferimento do pedido de dispensa de garantia formulado pela ora recorrida julgou desacertadamente face aos factos apurados e, consequentemente, é merecedor do juízo de censura que a recorrida pretende ver-lhe assacado.

Adiantamos, desde já, que a resposta a esta questão é negativa, ainda que se admita que o julgamento que ora realizamos quanto ao acerto da decisão apenas parcialmente assenta no juízo que foi realizado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.

Explicitemos, então, porque assim o entendemos, começando por recordar o contexto de facto em que esse pedido foi formulado, já que, ainda que este Tribunal Central, e o Tribunal de 1ª instância, estejam limitados pelo concreto pedido que foi dirigido à Administração Tributária e pelos termos (requerimento) em que o mesmo foi formulado, foi naquele contexto geral que esse requerimento foi interpretado e apreciadas as exigências – julgadas não observadas – que sobre aquela entidade decisora recaiam.

Nesse sentido, importa reter, antes de mais, que o pedido de dispensa de garantia apresentado pela executada surge no âmbito de um conjunto de processos executivos (devidamente apensados) e num específico contexto, qual seja, o de estar em curso o cumprimento de um processo especial de revitalização (PER) em que as dívidas tributárias aqui em causa estão também integradas.

É certo, sabemo-lo, e já o dissemos em acórdãos por nós relatados em recurso que anteriormente fomos chamados a decidir, que a existência do PER, só por si, não determina necessariamente a dispensa de garantias nas execuções fiscais em que estejam em causa a cobrança de dívidas tributárias, tanto mais que, como ressalta claramente dos factos apurados, in casu, a Administração Tributária claramente condicionou a essa prestação ou a eventual reconhecimento da sua isenção um futuro prosseguimento ou suspensão da execução.

Assim, e não obstante a jurisprudência do nosso Supremo Tribunal tenha já, inclusive, expendido o entendimento de que em matéria de garantias carece de sentido falar-se em indisponibilidade de créditos tributários,(1) não se nos afigura correcto ter qualquer dúvida quanto a, no presente caso, tendo em conta o estado do processo executivo, constituir obrigação do executado requerer, sendo essa a sua pretensão, a dispensa da prestação de garantia e de alegar e comprovar que reúne os pressupostos a essa concessão, isto é, que a prestação de garantia lhe acarretará prejuízo irreparável ou a falta de meios económicos para a prestar, bem como, em qualquer um dos casos, que a insuficiência ou inexistência dos bens não lhe é imputável, isto é, que por essa insuficiência não é responsável.

Foi, precisamente, o que a recorrida fez, como se constata da leitura do requerimento acolhido no probatório (alínea P, do ponto III supra).

Sobre tal requerimento, após informação prestada pelos serviços da administração tributária, acolhida na decisão objecto de reclamação, foi proferido despacho de indeferimento alicerçado, inequivocamente, num argumento fulcral: não obstante a Requerente ter alegado o prejuízo irreparável, a insuficiência de meios através dos quais pudesse prestar garantia e que a responsabilidade por essa insuficiência lhe não podia ser assacada, os factos invocados para esse efeito e, sobretudo, a prova junta para os demonstrar, não era bastante a que pudessem ser dados como comprovados.

Em suma, é ostensivo, quer do teor da informação acolhida pela decisão, quer das próprias alegações de recurso que transcrevemos no ponto I supra, que o indeferimento assentou, nitidamente, numa alegada falta de prova do alegado para suporte do pedido formulado.

O Tribunal a quo, após discorrer brevemente sobre os requisitos plasmados no artigo 52.º n.º 4, da Lei Geral Tributária e de analisar os deveres que, em termos de ónus probatório, decorrem para o requerente da dispensa, em moldes inteiramente coincidentes, de resto, com a jurisprudência pacifica dos Tribunais Superiores e também aceite, em abstracto, pela ora Recorrente, veio, porém, a concluir, que o despacho reclamado padecia de falta de fundamentação.

Para tanto, exarou, para o que ora releva - uma vez que é a esta parte do julgamento que o ataque à sentença vem especialmente dirigido - o seguinte discurso fundamentador:

«Em termos de ónus probatório, cumpre relevar que impende sobre o executado o ónus da prova do preenchimento dos pressupostos de que depende a isenção de prestação de garantia constantes do artigo 52° n° 4 da LGT, desde logo, atenta a regra geral sobre o ónus da prova constante do artigo 342° do Código Civil e o disposto no artigo 74° da LGT.

Deste modo, impende sobre o executado o ónus de provar que a prestação de garantia lhe causa prejuízo irreparável ou que carece manifestamente de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, bem como que a insuficiência ou inexistência de bens não é da sua responsabilidade.

Sublinhe-se, desde já, que a circunstância do pressuposto da irresponsabilidade na insuficiência ou inexistência de bens implicar a prova de um facto negativo não infirma a conclusão de que o ónus da prova impende sobre o executado, sendo certo que as regras sobre ónus da prova supra referidas não comportam qualquer excepção aplicável à prova dos factos negativos.

(…)

Aqui chegados, vejamos o que resulta da aplicação do direito aos factos relevados nos presentes autos.

No seu requerimento inicial o Reclamante faz completa alusão e convoca os enunciados requisitos constantes no artigo 52° n° 4 da LGT.

Senão, vejamos.

No requerimento dirigido à Autoridade Tributária (parcialmente transcrito na alínea P) da factualidade assente), a Reclamante enuncia os requisitos de que depende o deferimento do pedido por si formulado, subsumindo a sua situação concreta em cada um deles.

Nesse sentido, começa por descrever as diligências que tem vindo a adoptar para tentar cumprir as suas responsabilidades financeiras para com entidades terceiras, entre as quais, a Autoridade Tributária.

Em concreto, a celebração de um Procedimento Extra Judicial de Conciliação e, posteriormente, de um Processo Especial de Revitalização, que integrou os créditos tributários e mereceu o acordo da Autoridade Tributária por cumprir os pressupostos legais para o efeito.

Estes procedimentos foram provados nos presentes autos, resultando das alíneas B), C) e H) a I) da factualidade assente.

Dos autos resulta, igualmente, que:

- por um lado, a Reclamante tem tentado regularizar a sua situação tributária, promovendo as diligências que se lhe afiguram pertinentes, como é o caso do pedido de pagamento de uma dívida em prestações, para a qual ofereceu como garantia bens de terceiro, que não foram aceites para tal fim; (cf. alíneas D) a F) supra)

- por outro lado, a Autoridade Tributária tem intensificado a actividade de cobrança, privando a Reclamante das suas principais receitas, e obstando às suas tentativas de apresentar soluções que estejam ao seu alcance, (cf. alíneas F), G), K) e P) a R) supra)

Aqui chegados, afigura-se que, embora as diligências promovidas pela Autoridade Tributária, a fim de cobrar a dívida exequenda encontrem suporte legal, a sua actuação está a revelar-se cega e acrítica.

Ou seja, se por um lado, se reconhece o dever que impende sobre a Autoridade Tributária de cobrança das receitas tributárias, no cumprimento de tal dever devem ser observados todos os demais deveres que impendem sobre si, desde logo o de inquisitório e de garantir aos Administrados os direitos que lhe são concedidos por lei, como é o caso do recusado pedido de dispensa de garantia, tendo igualmente em vista o interesse do Estado em que as empresas prossigam a sua actividade económica. O que, desde logo, constitui uma premissa de base da continuação da receita tributária.

Dito de outro modo, a Autoridade Tributária deve pautar a sua actuação pelo limite de esforço comprovado das empresas executadas, não as "sufocando" ao ponto de ficarem impedidas de prosseguir a actividade económica.

Ora, no caso dos autos, desde a instauração do PEF que a Executada vem "dialogando" com a Autoridade Tributária, e procurando solver a sua dívida, pelo que, além do conteúdo do requerimento e documentação apresentados para obter a dispensa de garantia, a Autoridade Tributária encontrava-se já dotada de informação adicional sobre a Reclamante, como esta alega na sua petição.

Conforme acima descrito, resulta evidente dos autos, que a Reclamante, no pedido dirigido à Administração Tributária:

- invocou a ocorrência de prejuízo irreparável, enunciado descritivamente quais as exigências da Administração Tributária que o determinariam e porquê;

- alegou a manifesta falta de meios económicos para a prestar evidenciada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido;

- alegou a inexistência de responsabilidade na insuficiência de bens, o que fez alegando que o seu património não sofreu qualquer diminuição, porque nem sequer existiu, previamente.

Porém, o despacho reclamado limita-se a indeferir o pedido formulado pela Reclamante, invocando que não se encontram verificados os requisitos exigidos no artigo 52° n°4 da LGT, assentando nas seguintes premissas (cf. alíneas Q) e R) supra), que resultam refutadas nos presentes autos, como seguidamente se expõe:

- "o executado, nada alegou para demonstrar o prejuízo irreparável", ora a Reclamante alega e alicerça o prejuízo irreparável, no encerramento da empresa que decorrerá da manutenção da penhora de créditos já ordenada, e que prosseguirá se os PEF não forem suspensos;

- "a executada deveria demonstrar o quantum das despesas que suporta e demonstrar quais os concretos prejuízos, que em termos de causalidade adequada, provavelmente lhe advirão com a prestação de garantia", também aqui a executada, ora Reclamante, apresentou documentação que considerou idónea para o efeito, pelo que, a revelar-se insuficiente, competia à Autoridade Tributária promover diligências instrutórias adicionais a fim de se esclarecer ou convencer. O que não lhe é lícito, à luz do disposto nos artigo 58° da LGT e 50° do CPPT, é limitar-se a considerar não provados tais factos, sem sequer ter apreciado a idoneidade, ou falta dela dos documentos apresentados para esse fim pela executada;

- "não se pode afirmar que a executada não dispõe de bens para garantir o processo ora em análise, dado que se admite a penhora do estabelecimento comercial da sociedade executada", ora se a Autoridade Tributária considera que existe um bem idóneo para o fim pretendido pela Reclamante, competia-lhe, ao abrigo do princípio da colaboração consagrado nos artigos 59° da LGT e 48° do CPPT, aferir da viabilidade de prestação de garantia por essa via, junto do contribuinte, não resultando do despacho reclamado que tenha sido realizada qualquer diligência com esse fim;

- "o executado também não conseguiu provar conforme lhe competia" a sua irresponsabilidade na insuficiência dos bens - tratando-se de um facto negativo, como acima se referiu, haverá que ser menos exigente com a produção de prova e valorar a prova que permita concluir em sentido contrário. No caso concreto, resultando dos autos as diligências das executada e a inexistência de património, pelo menos desde 2013 (data em que foi acordado o Procedimento Extra Judicial de Conciliação, cf. alíneas B) e C) supra), competia à Autoridade Tributária, fazer prova da anterior existência de património e da sua dissipação, em prejuízo da receita tributária. É que não pode provar-se a falta de responsabilidade na redução de bens que nunca existiram.

Aqui chegados, concluímos que o despacho reclamado, nada refere quanto à (in)susceptibilidade de os meios de prova juntos pela Reclamante para concluir no sentido por aquele pretendido, nem tão pouco quanto à sua (in)suficiência para esse efeito.

Sendo certo que, como acima referimos, se a Administração Tributária entendia que os factos elencados careciam de prova adicional, então deveria, observando o princípio da colaboração e do inquisitório, notificar a Reclamante para juntar a prova adicional, documental ou outra, que reputasse relevante.

Até porque, não sendo os despachos de indeferimento de pedido de dispensa de prestação de garantia precedidos de audição prévia, o inquisitório, o dever de fundamentação e de colaboração têm/devem assumir uma dimensão com maior significado e alcance.

E no caso dos autos, a ilegalidade do acto reclamado decorre, justamente, da omissão de apreciação das alegações e da prova apresentada pela Reclamante, porquanto se limita a afirmar a não verificação dos pressupostos.».

Ora, com o devido respeito, sendo correctíssima a asserção extraída pelo Tribunal a quo quanto a ter sido omitida na actuação da Administração Fiscal a observância de deveres que inquestionavelmente sobre si impendem, como sejam o do inquisitório e da cooperação, mútuas, tendo em vista uma decisão materialmente correcta e juridicamente justa, dessa omissão não decorre qualquer falta de fundamentação formal, nem, in casu, com o devido respeito, houve qualquer omissão na apreciação critica da prova documental produzida ou na sua exteriorização (patente no despacho impugnado e referida na sentença recorrida, que expressamente a transcreveu e analisou, contrariando as ilações extraídas pela Administração Fiscal), mas, sim, uma manifesta e deficiente actividade instrutiva e inquisitória que se veio a reflectir negativamente na validade substancial da própria decisão.

Efectivamente, e como de forma lapidar se sumariou em acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, «Se a recorrente alegou os pressupostos da isenção de prestação de garantia previstos no n° 4 do art. 52° da LGT, mas não juntou a documentação necessária a fazer prova dos mesmos, não subsistem razões que impeçam a Administração Tributária de convidar a recorrente a suprir as incorrecções do requerimento deficientemente instruído"(2), sendo, para nós, seguro, que não assumindo a Administração Fiscal esse dever, não pode, a final, fundar a decisão desse indeferimento exclusivamente, como o fez, na inexistência de prova bastante a serem dados como comprovados os factos alegados e tendentes ao preenchimento dos requisitos legais convocados.

E se este nosso entendimento constitui regra que não pode ser olvidada pela actividade administrativa nos procedimentos que em geral são instaurados tendo em vista a dispensa de garantia ao abrigo do preceituado no artigo 52.º, n.º 4 da Lei Geral Tributária, muito menos essa regra pode deixar de ser observada em procedimentos como o que ora analisamos, em que a Administração Fiscal estava ciente de todo um contexto em que o pedido havia sido formulado, as negociações que o antecederam, as condições de facto e direito em que o PER havia sido aprovado, em suma, da específica «situação concreta da requerente» e que a decisão a tomar, pela delicadeza que comportaria em termos de potenciais efeitos, não podia deixar de ser ponderada «na perspectiva do equilíbrio entre o objectivo da (…) recuperação económica e da salvaguarda do interesse público em garantir a boa cobrança dos créditos fiscais.».(3)

É, pois, evidente, em nosso entender, que o despacho reclamado, alicerçado numa insuficiente instrução do procedimento, de cuja direcção está, em primeira mão, incumbida a Administração Fiscal, veio a traduzir uma errada interpretação dos pressupostos de facto e direito aplicáveis e, consequentemente, não podia, como foi, deixar de ser anulado.

V- Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes que integram a Secção de Contencioso do Tribunal Central Administrativo Sul, negando provimento ao recurso jurisdicional, em manter, com os fundamentos por nós exarados no ponto IV deste acórdão, a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique

Lisboa, 13 de Julho de 2016

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[Anabela Russo]

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[Lurdes Toscano]

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[Ana Pinhol]

(1)Cfr. Acórdão de 31 de Março de 2016, proferido no processo n.º 182/16, integralmente disponível em www.dgsi.pt

(2)Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Maio de 2013, proferido no processo 519/13, integralmente disponível em www.dgsi.pt.

(3)Neste sentido, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo já citado, de 31 de Março de 2016, processo n.º 182/16.