Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03149/09
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:10/31/2013
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:SISA. AVALIAÇÃO.
Sumário:1.No campo do procedimento, privativo, de liquidação da, extinta, sisa, o legislador, com o DL. 115/84 de 5 de abril, em resposta a, contemporâneas, registadas, frequentes, situações de, manifesta, fuga e evasão fiscal, conferiu, à Fazenda Nacional, a possibilidade de promover avaliação dos bens transmitidos, na condição de, relativamente a prédios inscritos na matriz, haverem “elementos fundados para suspeitar que o valor sobre que incidiu ou incidiria a sisa é inferior em 100 contos, pelo menos, ao preço por que os bens foram transmitidos,…”.

2.Trata-se da concessão de um mecanismo específico, com um raio de atuação limitado, especialmente, sujeito ao cumprimento de um conjunto de condicionantes incontornáveis, vocacionado, na ótica do outorgante, para, em cédula de sisa, afrontar, de forma célere e consistente, as situações de simulação do preço dos bens transmitidos, passíveis da incidência do tributo em causa.

3.Sendo esta a leitura e valoração, que nos parece correta, do espírito subjacente ao art. 57.º CIMSISSD, necessariamente, temos de concordar, com a Recorrente/Rte, quando afirma e sustenta que o mesmo “em nada colide com a legitimidade inspectiva da AF para, sempre que o julgue pertinente, desencadear acção de fiscalização tendente a apurar da realidade tributária nos termos do artigo 75° do CPT, desde que cumpridos os demais requisitos legais, (…)”.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: I
JOSÉ ………………., contribuinte n.º …………….. e com os demais sinais constantes dos autos, impugnou liquidação de Imposto Municipal de Sisa, Imposto do Selo e juros compensatórios, efetuada em 1997, tendo, a final, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, sido proferida sentença, que decidiu julgar a impugnação procedente e anular a liquidação visada.
Refutando o judiciado, a FAZENDA PÚBLICA interpôs recurso jurisdicional, cuja alegação finaliza com as seguintes conclusões: «
A) A douta sentença de que se recorre incorre em errónea interpretação do artigo 57° do CIMSISDD e viola o disposto no artigo 75° do CPT.
B) A liquidação impugnada tem na sua génese uma denúncia na qual se questionavam os reais valores envolvidos na transacção de um bem imóvel.
C) Do teor da versada denúncia, ressaltava, desde logo e de entre outros factos, fortemente indiciado que o valor declarado da transmissão do imóvel era bastante inferior ao seu valor real de transmissão.
D) Destarte, perante estes elementos foi encetada pela AF procedimento inspectivo tendente a averiguar da conformidade tributária dos factos descritos na denúncia recebida no SF de Tomar, de entre os quais se colocava em questão o real valor da transmissão da vivenda sita no Lote 26 do …………., em Tomar.
E) Ora, à data do procedimento inspectivo desencadeado pelos serviços inspectivos da Direcção de Finanças de Santarém, vigorava o Código de Processo Tributário.
F) Compêndio legal este que legitimava a AF a lançar mão de acção de fiscalização nos termos preceituados no artigo 75°.
G) Estava em causa no âmbito da análise à denúncia recebida nos serviços da AF, perceber se as irregularidades fiscais relatadas tinham ou não efectivo fundamento, razão pela qual foi elaborada a ordem de serviço n.° 9279.
H) Estava-se no caso dos presentes autos perante a alegação de um conjunto de factos, entre os quais se questionava o real valor da transmissão do dito imóvel, razão pela qual considerou a Direcção de Finanças de Santarém pertinente que se procedesse à averiguação desses mesmos factos, o que veio a suceder via acção de fiscalização, cuja cópia do relatório se encontra junta a estes autos.
I) Não cura neste âmbito saber se o Chefe de Finanças podia ou não igualmente lançar mão do procedimento constante do artigo 57° do CIMSISSD, mas antes perceber se este normativo impedia ou não que a AF prosseguisse acção de fiscalização relativamente ao apuramento da conformidade da situação tributária dos contribuintes, no âmbito das competências legais de que esta goza para o efeito.
J) O artigo 57° do CIMSISSD em nada colide com a legitimidade inspectiva da AF para, sempre que o julgue pertinente, desencadear acção de fiscalização tendente a apurar da realidade tributária nos termos do artigo 75° do CPT, desde que cumpridos os demais requisitos legais, como seja, por exemplo, a notificação da liquidação no prazo de caducidade.
L) O artigo 57° do CIMSISSD constitui não uma norma derrogativa relativamente ao conteúdo do artigo 75° do CPT, antes consubstanciando, face à especificidade da natureza e apuramento da SISA e Imposto de Selo, um meio complementar e distinto relativamente ao constante no artigo 75° do CPT que à AF é conferido para que in casu possa o próprio Chefe de Finanças da situação do prédio a desencadear um procedimento de avaliação ao imóvel transmitido.
M) Aliás, as realidades não são confundíveis, no caso do artigo 57° do CIMSISSD, o que está em causa é a avaliação do prédio promovida pelo respectivo Chefe de Finanças.
N) Enquanto que nos termos do artigo 75° do CPT, a finalidade é o apuramento da conformidade da situação tributária dos contribuintes, não obrigando o legislador que seja o Chefe de Finanças a desencadeá-la, nem limitando a lei que tal divergência na base tributável tenha de ser obrigatoriamente obtida por via de nova avaliação, como é o caso do procedimento que está subjacente à doutrina do artigo 57° do CIMSISSD.
O) Tendo presente a origem do procedimento inspectivo - denúncia - e os factos nela relatados, não foi (nem tinha obrigatoriamente de o ser) promovida qualquer avaliação ao prédio transmitido, nem tão pouco tendo sido promovida pelo respectivo Chefe de Finanças.
P) A vingar a tese aqui propugnada pela douta sentença, estar-se-ia, ademais, a esvaziar de sentido o prazo de caducidade de dez anos estabelecido na redacção então vigente no artigo 92° do CIMSISSD, uma vez que, para além dos 180 dias da transmissão, estaria prejudicada a liquidação adicional de SISA.
Q) O artigo 57° do CIMSISSD limita-se pois a conferir ao Chefe de Finanças uma prerrogativa que este não tem para os restantes impostos não aqui em causa, mas em lado algum do preceituado no artigo 57° se lê ou legitimamente infere que este é o único meio ou procedimento apto a alterar o valor pelo qual deve ser liquidada a SISA e Imposto de Selo relativamente à transmissão de um imóvel.
R) Interpretar o artigo 57° do CIMSISSD no sentido de proibir a possibilidade da AF proceder a acção fiscalizadora de onde, entre outras correcções, se procedesse à correcção do valor sujeito a SISA e SELO pela transmissão sempre constituiria um intolerável cerceamento da actividade de averiguação da AF e, em consequência uma verdadeira denegação dos princípios constitucionais de justiça tributária ínsitos no artigo 103° e 104° da Constituição da República Portuguesa.
S) A interpretação assim efectuada ao artigo 57° do CIMSISSD pelo Meritissimo Juiz a quo é destarte claramente violadora dos preceitos constitucionais constantes do artigo 103° e 104° da Constituição da República Portuguesa.
T) Não decorre sequer da letra, muito menos do espírito que presidiu à redacção do normativo em causa, a proibição da AF em averiguar pelos meios legalmente estabelecidos para o efeito no âmbito do artigo 75° do CPT, da conformidade tributária da situação dos contribuintes, onde se inclui naturalmente a conformidade dos valores declarados de transmissão e a consequente sujeição a SISA e SELO.
U) A douta sentença de que se recorre é também violadora do preceituado nos n.° 1, 2 e 3 do artigo 9° do Código Civil porquanto não logrou de modo nenhum reconstituir, tenuemente que fosse, o pensamento legislativo, muito menos sopesou a unidade e sistematicidade do sistema jurídico-tributário, sendo certo que a interpretação efectuada não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal.
V) A interpretação concretamente efectuada parte do errado pressuposto que a norma do artigo 57° do CIMSISSD não permite que no âmbito da fiscalização do artigo 75° do CPT se viesse a concluir pela existência de divergência na base tributável para SISA e SELO relativamente à realidade imobiliária transmitida.
X) Ora, não existe na letra do preceito legal - artigo 57° do CIMSISSD - qualquer correspondência que permita concluir que a única forma de repor a verdade tributária sela a promoção pelo Chefe de Finanças da avaliação do prédio transmitido.
W) De onde, o entendimento vertido na douta sentença é claramente abusivo e desvirtuador quer do sentido literal, quer do pensamento legislativo, bem como assim da unicidade e funcionamento do sistema jurídico-tributário, no que aos impostos em apreço diz respeito.
Y) A solução da douta sentença de que se recorre é também ela contrária a tudo quanto se dispõe no n.° 3 do artigo 9° do Código Civil, distorção do sentido do preceito desagua na inobservância da presunção segundo a qual o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento.
Z) Do teor da douta sentença, em momento algum se elide a presunção de que o legislador não se exprimiu adequadamente ou que não foram consagradas as soluções mais acertadas, pelo que não pode a interpretação da douta sentença de que se recorre merecer provimento.
AA) E tal limitação não decorre do seu teor, nem tão pouco do artigo 75° do CPT se colhendo que as diligências inspectivas estejam limitadas ao impulso do Chefe de Finanças a desencadear em prazo não superior a 180 dias e limitadas exclusivamente à nova avaliação do prédio transmitido cujo valor declarado a AF não aceita.
BB) Como facilmente se alcança, poderia inclusivamente suceder que desencadeado o procedimento constante do artigo 57° do CIMSISSD, o resultado da avaliação estivesse em linha com o declarado aquando da transmissão, nada impedindo que a AF viesse a comprovar, por via inspectiva, de forma segura através dos meios probatórios em Direito permitidos, que a transmissão havia tido lugar por um valor efectivamente superior àquele que havia sido declarado e apurado em sede dessa mesma nova avaliação.

Nestes termos e nos demais de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência ser a douta sentença anulada e substituída por outra que reconheça a legalidade do procedimento inspectivo para efeito da liquidação da SISA e Imposto de Selo ora impugnados »
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Não houve lugar a contra-alegação.
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O Exmo. Procurador-geral-adjunto emitiu parecer, no sentido do provimento do recurso, da revogação da sentença recorrida e da anulação do ato tributário, por errónea quantificação do valor tributável.
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Colhidos os vistos legais, compete conhecer.
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II
Mostra-se consignado, na sentença: «
II. Fundamentação
i) de Facto
Atenta a prova documental produzida, dão-se como provados os seguintes factos com relevância para a decisão:
A) Em 3 de Julho de 1997 a Divisão de Prevenção e Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Santarém, elaborou o relatório de fls. 58 a 66, que se dá por integralmente reproduzido, do qual se destaca o seguinte:
«I – INTRODUÇÃO
Em cumprimento da ordem de serviço n° 9279 de 22-10-96 foram encetadas as diligências consideradas convenientes a fim de apurar a veracidade dos fundamentos da denúncia entrada nesta Repartição de Finanças de Tomar e que ficou registada sob o n.° 13866 do respectivo livro de entradas.
II - FUNDAMENTOS DA DENÚNCIA
1 - Por escritura de compra e venda de 31 de Agosto de 1989 o Sr Pedro …………… adquiriu ao Sr. Manuel ……….. e mulher, pelo preço declarado de 5 500 000$, que os vendedores declararam ter recebido, uma moradia de três pisos, sita no …….., LOTE 26, freguesia …………, descrita na Conservatória (...).
2 - O comprador ora denunciado, beneficiou da isenção de SISA, em virtude de o valor declarado na escritura ser inferior ao valor máximo previsto para a isenção da mesma.
3 - Porém, o preço real da compra foi de 25 000 000$ que à data da escritura nem sequer haviam sido pagos aos vendedores, ao contrário do que nela se declarou.
4 - Apesar da vivenda se encontrar em nome dos vendedores, a mesma havia sido construída em sociedade de facto com o Sr. João ………….., tendo sido com este que foi acordada a transacção.
5 - A escritura foi marcada por João de Jesus Mendes que esteve presente no acto para receber o valor da venda.
6 - No entanto, o denunciado não pagou nada no acto da escritura e posteriormente no seu escritório, apresentou-lhe um “acordo” que lhe foi imposto contra a sua vontade. MAS, de facto o preço real da vivenda foi o referido nesse acordo, ou seja 25 000 000$.
7 - É ainda denunciado que mais tarde, em 29 de Dezembro de 1993 o Sr. Pedro …………………. vendeu o mesmo imóvel a António …………….. e a José ……………… e esposa, pelo preço simulado de 20 000 000$ mas que o preço real foi de 42 000 000$.
8 - A reforçar os valores indicados no parágrafo anterior é ainda apresentado o facto de o Sr. Lourinho ter oferecido pela compra da vivenda ao Pedro …………, o valor de 40 000 000$, pelo que seria ridículo que tivesse sido vendido por 20 000 000$.
III - APRECIAÇÃO DE DENÚNCIA
Para análise da denúncia em apreço, contactámos e ouvimos em Termos de Declarações os intervenientes relacionados com as transacções postas em causa. A saber:
- João ……………………
- Manuel ……………………….
- José ……………………………
- José António ……………………
- João Pereira ……………….
- Pedro ……………………..
Com a intenção de tornar mais perceptível a nossa apreciação, iremos dividi-la em duas partes, tratando em separado as duas transacções a que foi sujeita a vivenda sita no …………, Lote 26 em ………….
1.ª PARTE
TRANSACÇÃO DA VIVENDA ENTRE OS CONSTRUTORES E O
COMPRADOR PEDRO ALEXANDRE …………….
(...)
2.ª PARTE
TRANSACÇÃO DA VIVENDA, ENTRE O VENDEDOR PEDRO ………….. E OS COMPRADORES ANTÓNIO ……………………; JOSÉ ………………………….. E MARIA …………….
Por escritura notarial de compra e venda que se junta em ANEXO VIII, foi, a moradia sita no ……………., LOTE 26 em ……….., negociada pelos intervenientes acima referidos.
Assim sendo, ouvimos em “TERMOS DE DECLARAÇÕES” José …………….. (...), bem como Pedro ………………. (...).
Com base na denúncia apresentada ouvimos ainda João …………….. e João …………….. em termos de declarações (...).
Analisados os factos recolhidos, verificámos existirem certas incoerências.
Parece-nos muito estranho, que havendo uma proposta de compra por 37 500 000$, como declararam os senhores João ……………… e João de Jesus ………; a moradia tenha sido vendida por valor inferior; contudo, estas afirmações são contrariadas por Pedro ………………. que declarou ter sido abordado ocasionalmente por João …………. mas não chegaram a concretizar qualquer valor, pois se tivesse oportunidade de vender a casa por 37 500 000$, não o faria por valor inferior.
Não deixa, porém, de ser bem evidente a intenção de fuga ao pagamento da SISA como comprova o termo de declarações do Sr José ………. (...) quando afirma que aceitou o valor proposto pelo vendedor mas que reformulou a proposta atribuindo aos móveis um valor superior ao pedido para poder diminuir o valor do imóvel (SUJEITO A SISA).
IV- CONCLUSÃO
Em face dos factos descritos, concluímos que:
1 - (…)
2 - Quanto à “2.ª PARTE” da nossa apreciação, a transacção deverá, no mínimo, ser tributada pelo valor de 29 300 000$00, uma vez que é por demais evidente a intenção de diminuir o valor do imóvel, elaborando para o efeito, uma relação de móveis que na sua maioria fazer parte integrante de qualquer imóvel, (...), pretendendo assim camuflar o valor indicado na escritura notarial para poder beneficiar de um pagamento de SISA mais reduzido.
Embora contrariado pelo vendedor (PEDRO ……….), não podemos também deixar de considerar o facto declarado por João ………………. (como interessado comprador) e confirmado por João de Jesus .…………(como mediador desse pretenso negócio), em que ambos afirmam ter sido proposto para compra da vivenda ao Sr. Pedro ……….., o valor de 37 500 000$.
Para além do mais, estando comprovado, sem margem para dúvidas, que a vivenda custou ao Sr. Pedro …………….. 25 000 000$00, seria verdadeiramente ilógico que 4 anos depois, essa moradia fosse vendida por preço inferior ao de aquisição, pois, corno é do conhecimento geral, a tendência do mercado foi sempre no sentido contrário, tendência essa prevista fiscalmente através da publicação de PORTARIAS anuais em que são indicados os coeficientes de desvalorização da moeda com a finalidade de actualizar o valor dos bens imobilizados.
Neste caso concreto, para um bem vendido em 1993 e que havia sido adquirido em 1989, o coeficiente indicado pela Portaria n.° 470/93 de 5 de Maio é de 1,37, obtendo-se assim o valor actualizado da vivenda de 34 250 000$, conforme cálculos a seguir indicados:
25 000 000$ X 1,37 = 34 250 000$
V- CORRECÇÕES
De harmonia com o exposto, propõe-se as seguintes correcções:
(…)
3 - IMPOSTO (SISA) A PAGAR POR JOSÉ ……………………………………, ESPOSA E FILHO
Liquidação de SISA de acordo com o art° 33° do Código da SISA e respectivos juros a partir de 29 de Dezembro de 1993, correspondente à diferença entre o valor da SISA que deveria ter sido liquidado e o valor efectivamente cobrado, relativamente à aquisição da moradia sita no …………….., LOTE 26 em ……………, conforme a seguir indicados:
VALOR DA SISA QUE DEVERIA TER SIDO LIQUIDADO........29 300 000$ x 70% = 2 930 000$
VALOR DA SISA COBRADO À DATA DA AQUISIÇÃO.............................................- 1 341 000$
VALOR DA SISA EM FALTA.........................................................................................1 589 000$
4 - IMPOSTO DE SELO A PAGAR POR JOSÉ ………………….., ESPOSA E FILHO
Liquidação adicional do Imposto de Selo de acordo com o art° 50° da sua tabela geral e, respectivos juros de mora a partir de 29 de Dezembro de 1993, conforme cálculos que a seguir se indicam:
IMPOSTO DE SELO QUE DEVERIA TER SIDO LIQUIDADO.........29 300 000$ x 8%o = 234 400$
IMPOSTO DE SELO COBRADO À DATA DA AQUISIÇÃO..............................................- 160 000$
IMPOSTO DE SELO EM FALTA...........................................................................……………74000$
(...)».
B) Consequentemente, em 13/10/1997, procedeu-se à liquidação adicional de Sisa e Imposto de Selo - fls. 43 do apenso.
C) Em 18/10/97, o impugnante foi notificado para pagamento da sisa, juros compensatórios e imposto de selo, conforme ofício de fls. 44 do apenso, que se dá por integralmente reproduzido - fls. 44 vº.

Com interesse para a decisão, não se provaram outros factos.
**
A convicção do tribunal baseou-se no teor dos documentos mencionados em cada uma das alíneas antecedentes. »
***
O veredicto, sob escrutínio, de anular o ato tributário impugnado, assentou, exclusivamente, na verificação, segundo o tribunal recorrido, da ocorrência de “preterição de formalidade essencial à liquidação objecto dos autos”, derivada de, por imposição do disposto no art. 57.º CIMSISSD, “quando, como na situação sub judice, a Fazenda Nacional tenha razões para suspeitar que o valor sobre que incidiu a sisa é inferior em, pelo menos, 100 contos, ao preço por que o bem fora transmitido, deve solicitar autorização à Direcção Geral das Contribuições e Impostos para promover a avaliação desse prédio. Sendo certo que, conforme resulta do já exposto, só mediante este procedimento avaliativo fica a administração fiscal legalmente habilitada a proceder à liquidação adicional de sisa.”.
Contra esta fundamentação, a Recorrente/Rte sustenta que encerra errado julgamento, porquanto, em síntese, a previsão do coligido normativo, à data dos acontecimentos, não colidia com o funcionamento do art. 75.º CPT, outorgante, aos serviços competentes da administração fiscal, do poder de efetuarem fiscalização, a fim de se averiguar da situação tributária dos contribuintes.
Sem delongas, a razão está do lado desta.
No campo do procedimento, privativo, de liquidação da, extinta, sisa, o legislador, com o DL. 115/84 de 5 de abril, em resposta a, contemporâneas, registadas, frequentes, situações de, manifesta, fuga e evasão fiscal, conferiu, à Fazenda Nacional, a possibilidade de promover avaliação dos bens transmitidos, na condição de, relativamente a prédios inscritos na matriz, haverem “elementos fundados para suspeitar que o valor sobre que incidiu ou incidiria a sisa é inferior em 100 contos, pelo menos, ao preço por que os bens foram transmitidos,…”. Como nos parece evidente, decorre, em particular (1), desta transcrita exigência, estarmos na presença da concessão de um mecanismo específico, com um raio de atuação limitado, especialmente, sujeito ao cumprimento de um conjunto de condicionantes incontornáveis, vocacionado, na ótica do outorgante, para, em cédula de sisa, afrontar, de forma célere e consistente, as situações de simulação do preço dos bens transmitidos, passíveis da incidência do tributo em causa. Por outras palavras, da autoria do Exmo. Pga, o versado normativo “limita-se a conferir ao Senhor Chefe de Finanças uma prerrogativa que este não tem para os restantes tributos, mas em lado algum do citado artigo se pode legitimamente inferir que este é o único meio ou procedimento apto (para) alterar o valor pelo qual deve ser liquidada a SISA e SELO relativamente à transmissão de um imóvel”.
Sendo esta a leitura e valoração, que nos parece correta, do espírito subjacente ao art. 57.º CIMSISSD, necessariamente, temos de concordar, com a Rte, quando afirma e sustenta que o mesmo “em nada colide com a legitimidade inspectiva da AF para, sempre que o julgue pertinente, desencadear acção de fiscalização tendente a apurar da realidade tributária nos termos do artigo 75° do CPT, desde que cumpridos os demais requisitos legais, (…).
O artigo 57° do CIMSISSD constitui não uma norma derrogativa relativamente ao conteúdo do artigo 75° do CPT, antes consubstanciando, face à especificidade da natureza e apuramento da SISA e Imposto de Selo, um meio complementar e distinto relativamente ao constante no artigo 75° do CPT que à AF é conferido para que in casu possa (ser) o próprio Chefe de Finanças da situação do prédio a desencadear um procedimento de avaliação ao imóvel transmitido.
Aliás, as realidades não são confundíveis, no caso do artigo 57° do CIMSISSD, o que está em causa é a avaliação do prédio promovida pelo respectivo Chefe de Finanças. Enquanto que nos termos do artigo 75° do CPT, a finalidade é o apuramento da conformidade da situação tributária dos contribuintes, não obrigando o legislador que seja o Chefe de Finanças a desencadeá-la, nem limitando a lei que tal divergência na base tributável tenha de ser obrigatoriamente obtida por via de nova avaliação, (…).”.
Sem prejuízo da inaplicabilidade à situação julganda, dada a proximidade, não podemos deixar de referenciar o regime estabelecido no art. 39.º LGT, para a tributação dos negócios jurídicos simulados, onde o legislador ressalvou, expressa e inequivocamente, o exercício dos poderes de correção da matéria tributável conferidos, por lei, à administração tributária/at, sintoma nítido do propósito de conferir individualidade, independência, ao procedimento inspetivo.
Posto isto, a sentença recorrida, por errado julgamento desta matéria, tem de ser revogada, merecendo, portanto, provimento o recurso interposto. Sucede que aquela, face ao sentido do judiciado, deixou de conhecer, por prejudicadas, de outras questões colocadas na petição inicial do processo de impugnação, pelo que, face ao prescrito no art. 665.º n.º 2 CPC, delas, agora, cumpre tratar (2).
Para sustentar a ilegalidade da liquidação e pugnar pela respetiva anulação, a impugnante invocou vício de violação de lei, por errónea quantificação do valor tributável, que lhe serviu de base – cfr. art. 112) segs. da p.i.
Quanto a este, como decorre do teor do ponto A) dos factos provados, a at, rejeitando o valor declarado (e constante da escritura de compra e venda), pelo impugnante, de 20.000.000$00, para efeitos de liquidação dos impostos de sisa e do selo, decidiu que a transação devia, no mínimo, ser tributada pelo valor de 29.300.000$00, tendo sido, para suportar este montante, somente, pretextado, pelos serviços intervenientes, ser “por demais evidente a intenção de diminuir o valor do imóvel, elaborando para o efeito, uma relação de móveis que na sua maioria fazer parte integrante de qualquer imóvel, (...), pretendendo assim camuflar o valor indicado na escritura notarial para poder beneficiar de um pagamento de SISA mais reduzido.
Embora contrariado pelo vendedor (PEDRO ………..), não podemos também deixar de considerar o facto declarado por João …………… (como interessado comprador) e confirmado por João de Jesus ………… (como mediador desse pretenso negócio), em que ambos afirmam ter sido proposto para compra da vivenda ao Sr. Pedro ………., o valor de 37 500 000$.
Para além do mais, estando comprovado, sem margem para dúvidas, que a vivenda custou ao Sr. Pedro ……………………. 25 000 000$00, seria verdadeiramente ilógico que 4 anos depois, essa moradia fosse vendida por preço inferior ao de aquisição, pois, como é do conhecimento geral, a tendência do mercado foi sempre no sentido contrário, (…).”.
Ponderada esta argumentação, tal como defende o Exmo. Pga, é patente que a at não cumpre o ónus, sobre si impendente, de apurar e revelar indícios objetivos e fundados de que o imóvel foi vendido pela importância de 29.300.000$00, sustentando a sua posição “em meras suposições e conclusões sem apoio em dados objectivos e palpáveis”. Ademais, mostra-se incompreensível que, tendo sido feito apelo a mecanismo legal de atualização do valor dos bens imóveis, capaz de alicerçar a fixação do disputado valor em 34.250.000$00 (3), a decisão final se tenha vindo a fixar numa cifra, bastante, inferior. Todo este circunstancialismo é suficiente para que possamos afirmar a ocorrência de fundada dúvida sobre a quantificação do facto tributário em apreço, motivo determinante, só por si, da pretendida anulação do ato tributário impugnado, nos termos e para os efeitos do art. 121.º n.º 1 CPT (art. 100.º n.º 1 CPPT).
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III
Pelo exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, acorda-se:
- conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida;
- julgar, em substituição ao tribunal recorrido, procedente a impugnação judicial, anulando-se o ato tributário de liquidação objetado.
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Sem custas.
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(Elaborado em computador e revisto, com versos em branco)
Lisboa, 31 de outubro de 2013
Aníbal Ferraz
Jorge Cortês
Eugénio Sequeira

(1) Sem olvidar que tal promoção tinha de ocorrer dentro dos 180 dias seguintes à data da liquidação ou, se esta não tivesse lugar, do ato ou facto translativo dos bens sujeitos a tributação.
(2) Sem que se promova a audição das partes, por desnecessária, presente a discussão que das mesmas fizeram ao longo do processo judicial.
(3)Tanto mais que era certo o valor da aquisição inicial.