Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08145/14
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:11/27/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL.
ERRO NA FORMA DO PROCESSO. NULIDADE PROCESSUAL DE CONHECIMENTO OFICIOSO.
PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA.
PASSÍVEL DE EXAME NOUTRAS FORMAS DE PROCESSO, QUE NÃO A OPOSIÇÃO A EXECUÇÃO.
DETERMINAÇÃO DO REGIME DE PRESCRIÇÃO A APLICAR AO CASO CONCRETO.
REGIMES DE SUSPENSÃO E INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO.
APLICAÇÃO DE DIFERENTES REGIMES DE PRESCRIÇÃO NO QUE RESPEITA ÀS CAUSAS DE SUSPENSÃO OU INTERRUPÇÃO. ARTº.297, Nº.1, DO C.CIVIL. ARTº.12, Nº.2, DO C.CIVIL.
REGIME DE TRANSFORMAÇÃO DO EFEITO INTERRUPTIVO EM SUSPENSIVO DA PRESCRIÇÃO.
ARTº.49, Nº.2, DA L.G.T.
Sumário:1. A análise da propriedade do meio processual empregue pela parte e da sua consequente e eventual admissibilidade legal, deve ser efectuada levando em atenção o princípio da economia processual que enforma todo o direito adjectivo (cfr.artº.130, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P. Tributário).

2. O erro na forma do processo consubstancia nulidade processual de conhecimento oficioso (cfr.artºs.193 e 196, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.T.), deve ser conhecido no despacho saneador (cfr.artº.595, nº.1, al.a), do C.P.Civil) ou, não existindo este, até à sentença final (cfr.artº.200, nº.2, do C.P.Civil) e só pode ser arguido até à contestação ou neste articulado (cfr.artº.198, nº.1, do C.P.Civil), sendo que, a causa de pedir é irrelevante para efeitos de exame do eventual erro na forma do processo, para os quais apenas interessa considerar o pedido formulado pela parte.

3. No processo judicial tributário o erro na forma do processo igualmente substancia uma nulidade processual de conhecimento oficioso, consistindo a sanação na convolação para a forma de processo correcta, importando, unicamente, a anulação dos actos que não possam ser aproveitados e a prática dos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, tanto quanto possível, da forma estabelecida na lei (cfr.artº.97, nº.3, da L.G.T.; artº.98, nº.4, do C.P.P.T.).

4. A prescrição consubstancia uma excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário), a qual é passível de exame noutras formas de processo, que não a oposição a execução fiscal, nomeadamente, no âmbito de reclamação de decisão do órgão da execução fiscal prevista no artº.276 e seg. do C.P.P.T., mesmo quando o objecto inicial de tal reclamação nada tenha a ver com a apreciação da prescrição, mais devendo tal excepção ser conhecida pelo Tribunal nos casos em que o órgão de execução fiscal o não tiver feito (cfr.artº.175, do C.P.P.T.).

5. A determinação do regime de prescrição a aplicar ao caso concreto faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei (cfr.artº.297, nº.1, do C.Civil).

6. Como se retira do preceituado nos artºs.318 a 320, do C.Civil, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo. Os factos suspensivos são de natureza duradoura, obstando ao começo e ao decurso do prazo de prescrição enquanto perdurarem, como se infere dos citados artºs. 318, 319 e 320, do C.Civil. Nas leis tributárias prevêem-se factos especiais a que é atribuído efeito suspensivo, pelo que serão essas as regras a aplicar em matéria de prescrição da obrigação tributária (cfr.v.g.artº.49, nº.4, da L.G.Tributária). Concluindo, para além da especificidade dos factos a que é atribuído efeito suspensivo, o regime da suspensão da prescrição da obrigação tributária não tem especialidades no domínio do direito tributário, pelo que, face a qualquer facto com natureza suspensiva, enquanto este surtir efeitos, a prescrição não começa nem corre.

7. Por sua vez, a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de toda o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr.artº.326, nº.1, do C.Civil). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr.artº.327, nº.1, do C.Civil).

8. A aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais, em resultado da previsão normativa do artº.297, nº.1, do C.Civil, não impõe a aplicação de um ou outro regime em bloco, pois só se refere tal normativo à lei que altere o prazo e não aos termos em que se conta, nem a tudo o que releva para o seu curso. O texto do artigo e a respectiva epígrafe revelam que se tem em vista apenas as leis que alteram prazos e não as que alteram os efeitos das causas interruptivas ou suspensivas da prescrição. Por isso, as leis que alteram causas de suspensão ou interrupção não sendo leis sobre “alteração de prazos”, não estão abrangidas na previsão do referido artº.297, do C.Civil. Estas leis seguem a regra de aplicação no tempo do artº.12, nº.2, do mesmo diploma. Nos termos do disposto no artº.12, nº.2, do C.Civil, a lei aplicável aos factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição será, portanto, a vigente no momento em que os mesmos ocorreram.

9. O regime de transformação do efeito interruptivo em suspensivo, derivado da paragem do processo por mais de um ano (cfr.artº.49, nº.2, da L.G.T., na redacção anterior à Lei 53-A/2006, de 29/12), por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito interruptivo, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, deduziu salvatério dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.71 a 80 do presente processo, através da qual julgou totalmente procedente a reclamação de acto do órgão de execução fiscal deduzida pelo reclamante/recorrido, José ……………….., visando despacho exarado no âmbito do processo de execução fiscal nº……………. que corre seus termos no 12º. Serviço de Finanças de Lisboa, o qual ordenou a venda de bens penhorados no espaço da identificada execução.
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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.89 a 105 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-O presente recurso visa reagir contra a sentença que declara a anulação da decisão reclamada - a marcação de venda, tendo como causa a prescrição da dívida;
2-Refere a sentença proferida pelo Tribunal ad quo que: "Com efeito, a prescrição invocada pelo reclamante, embora sendo fundamento de oposição à execução fiscal tal como o mesmo defende, é excepção peremptória que põe termo ao processo de conhecimento oficioso do tribunal em qualquer fase do processo executivo, sempre que o mesmo a não tenha apreciado, nos termos do disposto no art.175° do CPPT";
3-Ora, não nos podemos conformar com tal decisão por ser desconforme com a douta jurisprudência adaptável ao caso, se desde logo tivermos em conta que a questão em apreço não foi apreciada pelo órgão de execução fiscal. Como tal, no aresto proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, Acórdão de 10/01/2007 (Proc. n°01152/06), decidiu o colendo Tribunal: «Na reclamação dirigida ao Juiz, em que se questiona uma decisão do órgão da Administração que dirige a execução fiscal, não cabe apreciar questão que àquele órgão não foi colocada e que não foi por ele incluída naquela decisão»;
4-Ademais, nos casos de extemporaneidade ou de preclusão, também previstos nos artigos 97, 200 e 278 do Código do Processo Civil aplicável subsidiariamente ao processo judicial tributário por via do art.°2 do CPPT (Código de Procedimento e de Processo Tributário), o Tribunal deve conhecer das nulidades previstas no artigo 193 "Erro na forma do processo ou no meio processual" logo no despacho saneador. Concretamente, impõe o art.°193 do CPC que o erro na qualificação processual do meio utilizado pela parte seja corrigido oficiosamente pelo juiz, devendo este determinar que os termos sigam os meios processuais adequados. No presente caso o meio processual adequado é o processo de oposição, como previsto na alínea d) do n°1 do art.204 do CPPT;
5-Ainda quanto ao meio processual utilizado, acentua Jorge Lopes de Sousa quanto à impropriedade da designação de reclamação quando seria mais adequado designar-se o meio como recurso, por estarem em causa pedidos de reapreciação, se tempestiva;
6-Como se pode concluir, sem qualquer margem para dúvidas, a prescrição da dívida exequenda é fundamento de oposição à execução fiscal, tal como previsto na alínea d) do n°1 do art.204 do CPPT, processo que constitui o meio próprio para discussão de tal pedido. Neste sentido refere Jorge Lopes de Sousa no seu CPPT anotado e comentado, "Áreas Editora", 5ª edição, vol II, págs. 658: "IV -A prescrição da dívida exequenda é fundamento de oposição à execução fiscal, previsto na alínea d) do n°1 do art.204.°. V - Não deve ser ordenada a convolação do processo de impugnação judicial em oposição à execução fiscal, se está pendente um processo deste último tipo em que são colocadas as mesmas questões (acórdão do STA de 13-7-2005, recurso n°504/05).";
7-Acresce que, não se encontrando pendente tal acção e não sendo a mesma interponível, por intempestividade ou qualquer outra eventual nulidade, deveria necessariamente a reclamada ser absolvida da instância (arts 2°, n°1, e 7°, do CPPT (Código de Processo nos Tribunais Administrativos), 199°, e 288°, do CPC (Código de Processo Civil). Logo, não podendo a petição inicial ser aproveitada, deve ser julgada procedente a excepção dilatória da inadequação do meio processual, anulando-se todo o processo, com a consequente absolvição do Réu da instância;
8-Assim, quanto ao processo deveria ter sido promovida a respectiva correcção do meio utilizado, impulsionando a sua convolução na forma adequada, pelo que importa imediatamente apenas sublinhar que essa referida inadequação do meio processual configura uma nulidade por erro na forma do processo, questão que deveria ter sido resolvida previamente a qualquer outra no despacho saneador;
9-Por outro lado, a sentença do TT reconhece a prescrição da dívida entendendo a esse respeito, sumariamente que:
"A decisão judicial proferida no âmbito do processo de impugnação judicial, transitou em julgado dez dias depois de 26/09/2011, logo a partir dessa data o processo de execução fiscal deixou de estar suspenso reiniciando-se a contagem do prazo prescricional. Assim, considerando o tempo decorrido desde Outubro de 2011 até ao presente acrescido dos 6 anos e 8 meses e 10 dias, conclui-se que na presente data o processo já se encontra prescrito.";
10-Também não nos conformamos com tal entendimento uma vez que, como defende inúmera jurisprudência quanto à redacção da lei aplicável ao caso "Antes da alteração introduzida pela Lei 53-A/2006, de 29/12, que entrou em vigor em 1/1/2007, dispunha o artigo 49° da LGT, no seu n°1, que a citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompiam a prescrição", tal implicaria que após prolação da sentença o prazo de prescrição reiniciasse a contagem do zero;
11-No mesmo sentido refere ainda o sumário o acórdão 0415/08 do STA " l - Nos termos das disposições combinadas dos artigos 34° do CPT, 49° da LGT e 326° e 327° do Código Civil, não havendo paragem por mais de um ano, dos respectivas processos, todas as causas, tanto interruptivas como suspensivas, ocorridas antes de 1 de Janeiro de 2007, produzem os seus efeitos próprios: de eliminação do período de tempo anterior à sua ocorrência e suspensão do decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente. II - Pelo que todo o período decorrido para a prescrição fica eliminado, só começando a correr novo prazo após o trânsito em julgado, ou equivalente, da decisão que puser termo ao último dos processos a terminar." Nestes termos, como se pode concluir, a dívida não se encontra ainda prescrita uma vez que a notificação da decisão em apreço data de 26/09/2011 e que, a jurisprudência, pacífica, entendeu interpretar que a interposição de impugnação, por vontade do contribuinte, será uma causa apenas a ele imputável;
12-Ademais, atente-se a que está em causa a impugnação judicial n°97/2003BEALM onde o contribuinte atacou a legalidade da liquidação oficiosa n.°……….., relativa a IRS/1998, tendo o TCA Sul por via de recurso, por sua vez, julgado parcialmente procedente a pretensão do impugnante e, ordenado a anulação do imposto liquidado em excesso;
13-Posteriormente, em cumprimento da decisão proferida nesse acórdão foi anulado o imposto liquidado em excesso, conservando-se parcialmente a liquidação no valor restante. Esta correcção foi materializada através da liquidação nº ……………, onde foi mantido o valor de € 169.556,68 de imposto devido, e anulado o imposto em excesso no montante de € 2.855.075,44. Após emissão de uma nota de compensação, a compensação n° ……………., foi feita a respectiva correcção a favor do sujeito passivo, reflectida no PEF, como referimos, por via de anulação;
14-Pelo que com se pode concluir, a liquidação correctiva não é uma liquidação em substituição da liquidação impugnada porque com a emissão da nota de compensação e, a A.T. nada acrescentou ao acto de liquidação impugnado, estando em apreciação apenas a concretização da decisão judicial, ou seja, um acto subtractivo do imposto em excesso, anteriormente liquidado. Com a notificação dessa nota de compensação, a AT apenas deu conhecimento ao contribuinte que, cumprira já a sentença judicial e corrigira a liquidação impugnada, expurgando-a do montante de imposto indevido;
15-Como esclarecem várias decisões judiciais de que enumeramos apenas o acórdão do STA, processo n°01195/09, datado de 18-02-2010:
"III - A liquidação correctiva opera a sanação por reforma da liquidação inicial, retroagindo os seus efeitos à data do acto reformado.
IV - A certidão de dívida de imposto emergente de acto de liquidação correctiva válido e eficaz constitui título executivo dotado de força executiva (artigos 162.° e 163° do CPPT).";
16-Assim sendo, a liquidação impugnada, já expurgada do montante liquidado em excesso, mantém-se válida e, na parte não anulada, continua em cobrança no processo de execução fiscal;
17-Ou seja, a impugnação na sequência da notificação dessa liquidação correctiva apenas consubstancia uma manobra dilatória, pois o impugnante não pode deduzir impugnação fundamentado na ilegalidade da mesma correcção uma vez que, sanado o anterior acto de liquidação impugnado, quanto ao montante imposto apurado resultante da correcção, por via do não pagamento voluntário, pode o mesmo ser exigido coercivamente em execução fiscal;
18-Em consequência, face a todas as razões aduzidas de facto e de direito, deve manter-se o despacho em crise;
19-Quanto à sentença recorrida, não pode a mesma manter-se na ordem jurídica por dela resultar prejudicado o interesse público, sendo que, conforme já alegado, a sua fundamentação de direito é contrária à ordem jurídica por violar normas de direito substantivo e, proceder à interpretação e aplicação incorrectas quer de critérios de julgamento quer das normas reguladoras aplicáveis;
20-Enunciando as normas legais violadas, enumerem-se apenas as que se seguem:
- a norma prevista no artigo 193° do CPC que determina que o erro na qualificação processual do meio utilizado pela parte seja corrigido oficiosamente pelo juiz, devendo este decidir que os termos sigam os meios processuais adequados;
- Quanto ao meio processual adequado por ser o processo de oposição, foi violada a alínea d) do n°1 do art.204° do CPPT;
- Foram ainda violadas as disposições dos artigos 34° do CPT, 49° da LGT e 326° e 327° do Código Civil que devem ser interpretados no sentido de que todas as causas, tanto interruptivas como suspensivas, ocorridas antes de 1 de Janeiro de 2007, produzem os seus efeitos próprios: de eliminação do período de tempo anterior à sua ocorrência e suspensão do decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente. II - Pelo que todo o período decorrido para a prescrição fica eliminado, só começando a correr novo prazo após o trânsito em julgado, ou equivalente, da decisão que puser termo ao último dos processos a terminar.";
- Foram violados adicionalmente os artigos 162° e 163° do CPPT que determinam que a certidão de dívida de imposto emergente de acto de liquidação correctiva válido e eficaz constitui título executivo dotado de força executiva".
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.142 a 145 dos autos) no sentido de se negar provimento ao recurso.
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Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.657, nº.4, do C.P.Civil; artº. 278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.73 a 76 dos autos):
1-Em 15/04/2003, foi deduzida impugnação judicial à liquidação adicional de IRS/98 n°…………………, no valor de € 3.024.632,12 (cfr.documentos juntos a fls.12 a 30 do processo executivo apenso);
2-Em 6/06/2003, foi instaurado no ex 12º.Serviço de Finanças de Lisboa, atual 5º.Serviço de Finanças de Lisboa , o processo de execução fiscal nº……………… por dívidas de IRS/98 no valor de € 3.024.632,12, no qual surgem como executados José …………………. e Maria Odete ……………….. (cfr.documentos juntos a fls.1 e 2 do processo executivo apenso);
3-Em 4/09/2003, o executado José …………….. foi pessoalmente citado pelo serviço de finanças (cfr.documento junto a fls.5 do processo executivo apenso);
4-Entre 4/09/2003 e 4/09/2004, o processo executivo esteve parado (cfr.acordo e informação constante de fls.13 dos presentes autos);
5-Face à apresentação de impugnação judicial da liquidação adicional de IRS/98 (proc. n°97/2003BEALM) em 30/11/2005, o reclamante é notificado para apresentar garantia no valor de € 4.007.900,58 (cfr.documentos juntos a fls.8, 9 e 10 do processo executivo apenso);
6-Em 13/12/2005, o executado/reclamante, solicitou junto do órgão de execução fiscal a isenção de prestação de garantia (cfr.documento junto a fls.11 do processo executivo apenso);
7-Em 31/01/2006, o pedido de isenção de prestação de garantia foi indeferido pelo órgão de execução fiscal (cfr.documento junto a fls.31 do processo executivo apenso);
8-Em 12/09/2006, no âmbito do processo de execução fiscal nº…………………. foi efetuada a penhora dos veículos com as matrículas ………., …….. e ……. (cfr. documentos juntos a fls.38 e 54 a 59 do processo executivo apenso);
9-Em 18/04/2007, foi registada penhora do imóvel urbano, correspondente ao 3° andar "B", fração "S" do artigo urbano …….. da freguesia de ………., …….. descrito na 6ª. Conservatória do Registo Predial de Lisboa (cfr.documento junto a fls.93 do processo executivo apenso);
10-Em 30/07/2007, o reclamante apresenta requerimento solicitando a caducidade da garantia e o levantamento das penhoras efetuadas (cfr.documentos juntos a fls.97 a 103 do processo executivo apenso);
11-Em 26/06/2007, o TAF de Almada proferiu decisão que determinou o levantamento das penhoras efetuadas a que se reportam os pontos 8 e 9 do presente probatório (cfr.documento junto a fls.105 a 107 do processo executivo apenso);
12-Em 14/12/2007, o Chefe do Serviço de Finanças ordena o levantamento das penhoras efetuadas bem como o cancelamento dos registos realizados na Conservatória do Registo Automóvel bem como o cancelamento da penhora do imóvel descrito no ponto 9 (cfr.documentos juntos a fls.117 a 132 do processo executivo apenso);
13-A impugnação com nº.97/2003 BEALM foi julgada parcialmente procedente por acórdão de 26/09/2011 do TCA Sul (recurso n° 02964/09) (cfr.acordo);
14-Em cumprimento do acórdão referido no ponto anterior, foi emitida a liquidação n°………….., de 23/06/2012 apurando-se o imposto devido de € 169.556,68 de imposto devido e efetuada a compensação n°………….. a favor do reclamante no valor de €2.855.075,44 (cfr.documentos juntos a fls.174 e 179 do processo executivo apenso);
15-Devido à decisão proferida no acórdão de 26/09/2011 do TCA Sul, a dívida exequenda passou a ser de € 169.556,68 e acrescido (cfr.documento junto a fls.175 do processo executivo apenso);
16-Em 9/08/2012, o Chefe do Serviço de Finanças profere despacho para prosseguimento do processo executivo e, para em dez dias o executado proceder ao pagamento do valor em dívida nos autos (cfr.documento junto a fls.175 do processo executivo apenso);
17-Em 20/09/2012 é registada a penhora na Conservatória do Registo Predial de Loulé a favor da Fazenda Nacional do imóvel urbano, lote de terreno para construção, propriedade do reclamante, denominado " lote 4.7.1/15B", situado em ………., artigo urbano n°………, freguesia de ……… (cfr.documentos juntos a fls.199 a 201 do processo executivo apenso);
18-Em 20/09/2012, é registada a penhora na Conservatória do Registo Predial de Almada, do imóvel urbano situado na ………….., Rua ……………. 5, 5º esquerdo, inscrito na matriz n° ……., freguesia do ……, a que corresponde a fração "I" do artigo urbano 3471 do concelho de Almada (cfr.documentos juntos a fls.208 a 212 do processo executivo apenso);
19-Por despacho de 6/09/2013, foi determinado que se procedesse à marcação da venda dos bens penhorados (cfr.documento junto a fls.274 a 276 do processo executivo apenso);
20-Por despacho de 24/04/2014, do Chefe do 5º.Serviço de Finanças de Lisboa, foi determinada a venda dos imóveis indicados nos pontos 17 e 18 deste probatório, para os dias 11 de Agosto e 28 de Julho, respetivamente (cfr.documento junto a fls.285 do processo executivo apenso);
21-Tendo sido deduzida a presente reclamação em 27/07/2014, o Chefe do 5º.Serviço de Finanças de Lisboa profere despacho determinando a suspensão das vendas dos imóveis, supra identificados, até à decisão da presente reclamação (cfr.documento junto a fls.308 do processo executivo apenso).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não existem factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados…”.
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A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos não impugnados, juntos aos autos e expressamente referidos no probatório supra…”.
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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
22-O período de paragem do processo de execução fiscal nº……………… identificado no nº.4 do probatório não foi imputável ao executado (cfr.exame do processo executivo apenso);
23-A penhora de imóvel identificada no nº.9 da factualidade provada operou a suspensão da execução fiscal em virtude de correr termos o processo de impugnação com o nº.97/2003 BEALM (cfr.exame do processo executivo apenso; informação exarada a fls.12 a 19 dos presentes autos).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada um dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese, julgar procedente a reclamação deduzida pelo reclamante/recorrido, José ………………., mais tendo declarado a prescrição da dívida exequenda no âmbito do processo de execução fiscal nº………………. e extinto este.
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Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Aduz o recorrente, em primeiro lugar, que a prescrição da dívida exequenda é fundamento de oposição à execução fiscal, previsto no artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.T. Que devia ter sido promovida a respectiva correcção do meio utilizado, impulsionando a sua convolução na forma adequada, pelo que importa sublinhar que essa referida inadequação do meio processual configura uma nulidade por erro na forma do processo, questão que deveria ter sido resolvida previamente a qualquer outra, mais se anulando todo o processo, com a consequente absolvição do Réu da instância (cfr.conclusões 1 e 8 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, segundo percebemos, consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Na apreciação deste fundamento do recurso deve recordar-se que a análise da propriedade do meio processual empregue pela parte e da sua consequente e eventual admissibilidade legal, deve ser efectuada levando em atenção o princípio da economia processual que enforma todo o direito adjectivo (cfr.artº.130, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P. Tributário).
O erro na forma do processo consubstancia nulidade processual de conhecimento oficioso (cfr.artºs.193 e 196, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.T.), deve ser conhecido no despacho saneador (cfr.artº.595, nº.1, al.a), do C.P.Civil) ou, não existindo este, até à sentença final (cfr.artº.200, nº.2, do C.P.Civil) e só pode ser arguido até à contestação ou neste articulado (cfr.artº.198, nº.1, do C.P.Civil), sendo que, a causa de pedir é irrelevante para efeitos de exame do eventual erro na forma do processo, para os quais apenas interessa considerar o pedido formulado pela parte (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/3/2013, proc.6415/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6862/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/2/2014, proc.7256/13; José Lebre de Freitas e Outros, C.P.Civil anotado, Volume I, Coimbra Editora, 1999, pág.344).
No processo judicial tributário o erro na forma do processo igualmente substancia uma nulidade processual de conhecimento oficioso, consistindo a sanação na convolação para a forma de processo correcta, importando, unicamente, a anulação dos actos que não possam ser aproveitados e a prática dos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, tanto quanto possível, da forma estabelecida na lei (cfr.artº.97, nº.3, da L.G.T.; artº.98, nº.4, do C.P.P.T.; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 29/2/2012, rec.441/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/6/2012, proc.4704/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7103/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.88 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, não nos encontramos perante qualquer erro na forma do processo e consequente nulidade processual de conhecimento oficioso, contrariamente ao defendido pelo recorrente. Assim é, porquanto, embora o legislador consagre, há muito, a possibilidade da prescrição da dívida exequenda constituir fundamento de oposição à execução (cfr.artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), a mesma prescrição consubstancia uma excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário), a qual é passível de exame noutras formas de processo, que não a oposição a execução fiscal, nomeadamente, no âmbito de reclamação de decisão do órgão da execução fiscal prevista no artº.276 e seg. do C.P.P.T., mesmo quando o objecto inicial de tal reclamação nada tenha a ver com a apreciação da prescrição, mais devendo tal excepção ser conhecida pelo Tribunal nos casos em que o órgão de execução fiscal o não tiver feito (cfr.artº.175, do C.P.P.T.; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 3/10/2007, rec.702/07; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 27/2/2013, rec.82/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.285 e seg.).
Concluindo-se pela adequação da forma de processo ao conhecimento da excepção da prescrição alegada, é forçoso julgar improcedente este fundamento do recurso e confirmar a decisão recorrida, neste semento.
Aduz, igualmente, o apelante que foram violadas as disposições dos artºs.34, do C.P.T., 49, da L.G.T., e 326 e 327, do Código Civil, as quais devem ser interpretados no sentido de que todas as causas, tanto interruptivas como suspensivas, ocorridas antes de 1 de Janeiro de 2007, produzem os seus efeitos próprios de eliminação do período de tempo anterior à sua ocorrência e suspensão do decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente. Pelo que todo o período decorrido para a prescrição fica eliminado, só começando a correr novo prazo após o trânsito em julgado, ou equivalente, da decisão que puser termo ao último dos processos a terminar. Que foram violados pela decisão recorrida, igualmente os artºs.162 e 163, do C.P.P.T., os quais determinam que a certidão de dívida de imposto emergente de acto de liquidação correctiva válido e eficaz constitui título executivo dotado de força executiva (cfr. conclusões 9 a 19 do recurso), com base em tais alegações pretendendo consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
O decurso do prazo de prescrição extingue o direito do Estado à cobrança do imposto. O instituto da prescrição, tal como o da caducidade, tem na sua base o interesse da certeza e segurança jurídicas, encontrando aquele igualmente fundamento na negligência do credor (cfr.Pedro Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.274 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98 e seg.).
O prazo de prescrição das obrigações tributárias em geral é actualmente de oito anos (cfr.artº.48, da L.G.Tributária), sendo anteriormente de dez anos (cfr.artº.34, do C.P.Tributário), e antes de vinte anos nos termos do artº.27, do C.P.C.Impostos. Embora mais favorável ao contribuinte, o prazo actual não é de aplicação retroactiva, devendo, em tal situação, lançar-se mão dos princípios consagrados no artº.297, do C. Civil, no que diz respeito ao cômputo do mesmo. Nestes termos, o prazo de dez anos consagrado no artº.34, do C. P. Tributário, ou o prazo de oito anos consagrado no artº.48, da Lei Geral Tributária, somente se contam a partir da entrada em vigor dos respectivos diplomas (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/4/93, Acórdãos Doutrinais, nº.385, pág.461; ac.T.T.2ª.Instância, 29/10/91, C.T.F.365, pág.243 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.94 e seg.).
O termo inicial do prazo de prescrição conta-se em função da ocorrência do facto tributário, sendo computado a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, nos impostos periódicos, ou a partir da data em que o facto tributário ocorreu, nos impostos de obrigação única, salvo em relação ao I.V.A. em que tal prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que ocorreu a exigibilidade do tributo, se o regime aplicável for o previsto na L.G.T.- cfr.artº.48, nº.1, da L.G.Tributária.
Já quanto ao C.P.Tributário, o prazo de prescrição conta-se desde o início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, independentemente da natureza periódica ou de obrigação única do tributo em causa (cfr.artº.34, nº.2, do C.P.T.).
Não existem definições legais de imposto periódico e de imposto de obrigação única, pelo que se terá de partir do pressuposto de que o legislador ao utilizar tais conceitos pretendeu acolher as noções doutrinalmente elaboradas. A característica essencial apontada pela doutrina aos impostos periódicos é a de assentarem num facto tributário de carácter duradouro, enquanto o elemento caracterizador do imposto de obrigação única é ter por base um facto instantâneo. Em alguns casos, o facto tributário reporta-se a um determinado período de tempo e as obrigações tributárias renovam-se em cada novo período, como sucede com I.R.C. e o I.R.S., os quais se devem configurar como impostos periódicos, de periodicidade anual (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/1/2013, proc.5512/12; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.45 e seg.).
A instauração de processo de execução fiscal contra o devedor principal, consubstancia facto interruptivo da prescrição, quer quanto ao mesmo devedor principal, quer quanto aos responsáveis subsidiários, independentemente do momento em que estes vierem a ser citados para a execução ou em que se vier a operar a reversão (cfr.artº.34, nº.3, do C.P.Tributário). Cessa, no entanto, o efeito interruptivo da prescrição a que se alude, o qual se transforma em efeito suspensivo, quando o processo (v.g.execução fiscal) estiver parado durante mais de um ano devido a facto não imputável ao sujeito passivo, caso em que se soma o prazo decorrido após esse período de um ano ao que se tiver verificado até à autuação dos autos (cfr.artº.34, nº.3, do C.P.Tributário; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 5/6/96, rec.17809; ac.T.C.A.-2ª.Secção, 23/5/2000, proc.3350/00; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09).
Passemos à determinação do regime de prescrição a apor ao caso dos autos. A determinação do regime de prescrição a aplicar faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei (cfr.artº.297, nº.1, do C.Civil; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.94).
“In casu”, sendo o marco inicial do prazo de prescrição o dia 1/1/1999, face à dívida exequenda de I.R.S. de 1998 (cfr.artº.48, nº.1, da L.G.T.), mais levando em consideração que a L.G.T. entrou em vigor na mesma data (cfr.artº.6, do dec.lei 398/98, de 17/12), conclui-se ser aplicável ao caso em apreciação o regime previsto neste diploma, neste segmento confirmando a decisão recorrida.
Analisemos agora os factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição. A suspensão da prescrição tem o seu regime civil previsto nos artºs.318 e seg., do C.Civil. Por sua vez, a interrupção da prescrição está regulada nos artºs.323 e seg., do C.Civil.
Como se retira do preceituado nos artºs.318 a 320, do C.Civil, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo. Os factos suspensivos são de natureza duradoura, obstando ao começo e ao decurso do prazo de prescrição enquanto perdurarem, como se infere dos citados artºs. 318, 319 e 320, do C.Civil. Nas leis tributárias prevêem-se factos especiais a que é atribuído efeito suspensivo, pelo que serão essas as regras a aplicar em matéria de prescrição da obrigação tributária (cfr.v.g.artº.49, nº.4, da L.G.Tributária). Concluindo, para além da especificidade dos factos a que é atribuído efeito suspensivo, o regime da suspensão da prescrição da obrigação tributária não tem especialidades no domínio do direito tributário, pelo que, face a qualquer facto com natureza suspensiva, enquanto este surtir efeitos, a prescrição não começa nem corre.
Por sua vez, a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de toda o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr.artº.326, nº.1, do C.Civil). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr.artº.327, nº.1, do C.Civil). Resultam, assim, destes artºs.326 e 327, do C. Civil, dois conceitos de interrupção da prescrição: um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição do tempo decorrido); outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição). Nas leis tributárias prevêem-se factos a que é atribuído efeito interruptivo da obrigação tributária, pelo que não há que fazer apelo às normas do C.Civil, no que concerne a determinar os factos interruptivos. Porém, os efeitos da interrupção da prescrição não estão completamente regulados, assim devendo aplicar-se, quanto a estes, subsidiariamente o regime do Código Civil (cfr.Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.52 e seg.).
Todavia, a aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais, em resultado da previsão normativa do artº.297, nº.1, do C.Civil, não impõe a aplicação de um ou outro regime em bloco, pois só se refere tal normativo à lei que altere o prazo e não aos termos em que se conta, nem a tudo o que releva para o seu curso. O texto do artigo e a respectiva epígrafe revelam que se tem em vista apenas as leis que alteram prazos e não as que alteram os efeitos das causas interruptivas ou suspensivas da prescrição. Por isso, as leis que alteram causas de suspensão ou interrupção não sendo leis sobre “alteração de prazos”, não estão abrangidas na previsão do referido artº.297, do C.Civil. Estas leis seguem a regra de aplicação no tempo do artº.12, nº.2, do mesmo diploma (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/2/2011, rec.807/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/10/2011, proc. 5009/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/1/2014, proc.7016/13; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.92).
Nos termos do disposto no artº.12, nº.2, do C.Civil, a lei aplicável aos factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição será, portanto, a vigente no momento em que os mesmos ocorreram. Assim sendo, constituem factos interruptivos nos termos do artº.49, nº.1, da L.G.T., a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo, a que acresce a citação como facto interruptivo por força da redacção dada à referida norma pela Lei 100/99, de 26/7, cuja vigência se iniciou em 1/8/1999.
Mais consagrava o artº.49, nº.2, da L.G.T. (redacção anterior à Lei 53-A/2006, de 29/12 - O.E. de 2007), que a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito interruptivo, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
No caso concreto, atenta a matéria de facto provada, assume relevância, desde logo, como vector interruptivo da prescrição, a dedução de impugnação judicial visando a liquidação que constitui a dívida exequenda, a qual ocorreu em 15/04/2003 (cfr.nº.1 da matéria de facto provada).
Tal facto interruptivo inutilizou todo o tempo decorrido anteriormente. Relembre-se que ocorrendo uma causa de interrupção e findos os efeitos da mesma, inicia-se uma nova contagem do prazo, ou seja, mais 8 anos no caso concreto. Concretizando, a contagem do novo prazo de prescrição de oito anos passa a ter o seu termo inicial em 16/4/2003 (cfr.artº.279, al.b), do C.Civil), dado que nos encontramos perante facto interruptivo (dedução de impugnação judicial) de natureza instantânea.
Continuando a examinar a factualidade provada, surge-nos a seguir, como vector interruptivo do prazo de prescrição a citação do reclamante, enquanto executado, no processo executivo e em 4/09/2003 (cfr.nº.3 do probatório), tudo nos termos do artº.49, nº.1, da L.G.T., na versão em vigor em 2001 (resultante da Lei 100/99, de 26/7). Tal facto interruptivo inutilizou todo o tempo decorrido anteriormente. Relembre-se que ocorrendo uma causa de interrupção e findos os efeitos da mesma, inicia-se uma nova contagem do prazo, ou seja, mais 8 anos, conforme mencionado acima, dado que nos encontramos perante facto interruptivo (a citação do reclamante) de natureza instantânea. Concretizando, a contagem do novo prazo de prescrição de oito anos passa a ter o seu termo inicial em 5/9/2003.
Seguidamente, aparece como vector factual que gera a transformação do efeito interruptivo em suspensivo, derivado da paragem do processo executivo por mais de um ano (cfr.artº.49, nº.2, da L.G.T., na redacção anterior à Lei 53-A/2006, de 29/12), conforme se retira dos nºs.4 e 22 do probatório, verificando-se a consequente retoma do cômputo do prazo prescricional de 8 anos em 5/9/2004, e devendo somar-se o tempo que decorrer após esse período suspensivo ao que tiver decorrido até à data da autuação do processo executivo. De acordo com este último vector, o cômputo do prazo prescricional de 8 anos teria o seu termo final em 23/5/2008.
Retomemos o exame da factualidade provada.
De acordo com os nºs.9, 13 e 23 do probatório e nos termos do artº.49, nº.4, da L.G.T., o prazo de prescrição encontra-se suspenso entre 19/04/2007 e 6/10/2011, em virtude da suspensão do processo de execução, devido a correr termos a impugnação com o nº.97/2003 BEALM, assim faltando um ano, um mês e quatro dias para operar a prescrição após esta última data (6/10/2011), pelo que o termo final do prazo de prescrição de oito anos ocorreria, ressalvado qualquer outro evento interruptivo ou suspensivo do mesmo, em 10/11/2012.
Ora, do probatório somente se retira novo facto interruptivo do prazo prescricional com a dedução da presente reclamação, intentada em 27/07/2014 (cfr.nº.21 da factualidade provada), portanto, em momento posterior ao termo final do prazo de prescrição da dívida exequenda, o qual se verificou na aludida data de 10/11/2012, assim se confirmando a decisão do Tribunal "a quo".
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o recurso deduzido e, nessa medida, confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 27 de Novembro de 2014

(Joaquim Condesso - Relator)

(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)

(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)