Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06613/13
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:07/02/2013
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRC; MAIS-VALIAS SUSPENSAS DE TRIBUTAÇÃO; REGIMES DE DIREITO TRANSITÓRIO ALTERNATIVOS; RETROSPECTIVIDADE E PRINCÍPIO DA PROTECÇÃO DA CONFIANÇA;
Sumário:1)A Lei de Orçamento de Estado de 2002 [Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro] introduziu um regime transitório alternativo ao regime de diferimento previsto pela Lei n.º 30 - G/2000, regulado pelos n.os 8 e 9 do supra referido artº 32º. De acordo com tal regime transitório a parte da diferença positiva das mais e menos-valias realizadas antes de Janeiro de 2001 cujo valor de realização tivesse sido ou viesse a ser reinvestido, podia ser antecipadamente incluída na base tributável de qualquer exercício anterior ao da alienação, desde que posterior a Janeiro de 2001, por metade do seu valor, mas sem exigência de novo reinvestimento.

2)A opção por um dos dois regimes transitórios alternativos (o da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro e o da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro) é uma opção efectuada no quadro da escolha essencial, feita a montante, de diferir a tributação das mais-valias obtidas, cumprindo o requisito do reinvestimento das mesmas; donde resulta que assiste ao contribuinte a faculdade de optar entre o diferimento da tributação, durante dez anos, a contar da data da realização, em fracções iguais, caso se concretize, nos termos da lei, o reinvestimento da parte do valor de realização que proporcionalmente lhe corresponder (artigo 7.º/b) da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro) ou a antecipação da tributação de metade do valor das mais-valias realizadas, em qualquer exercício anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, desde que posterior a 1 de Janeiro de 2001 (artigo 32.º/8, da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro).

3)Dos preceitos da lei, da sua economia interna, resultam duas opções, as quais são mutuamente excludentes, isto é: ou se opta pelo diferimento proporcional ao reinvestimento e fraccionado no tempo da tributação das mais-valias obtidas ou se opta pela antecipação da sua tributação por metade do seu valor, com extinção do regime de diferimento.

4)Nas situações de retroactividade inautêntica ou retrospectividade, «a protecção do cidadão procura-se por outros meios, designadamente através dos direitos fundamentais – saber se a nova normação jurídica tocou desproporcionada, desadequada e desnecessariamente dimensões importantes dos direitos fundamentais, ou se o legislador teve o cuidado de prever uma disciplina transitória justa para as situações em causa».

5)No plano do direito transitório material, as soluções inscritas pelo legislador, quer na Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, quer Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, contemplam as expectativas dos destinatários das modificações legislativas em causa, permitindo-lhe optar entre o diferimento da tributação, fraccionada no tempo e proporcional ao valor do reinvestimento e a sua antecipação, por metade do valor de realização.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acórdão

I-Relatório
O Representante da Fazenda Pública interpõe recurso jurisdicional da sentença proferida a fls. 408/428 que julgou procedente a impugnação judicial da liquidação de IRC, referente ao exercício de 2004, no montante de €4.865.426,99 e juros compensatórios.
Nas alegações de recurso a recorrente formula as conclusões seguintes (fls. 448/462):
I. Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida pelo Tribunal a quo, julgando procedente a impugnação judicial deduzida, anulando o ato impugnado - liquidação de IRC referente ao exercício de 2004 no montante de €4.865.426,99 e respetivos Juros Compensatórios – por vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos.
II. A questão, ora suscitada prende-se com a interpretação do regime transitório previsto no n.º 8 do artigo 32º da Lei n.º 109-8B/2001, de 27 de Dezembro, para a tributação de mais-valias realizadas antes de 1 de Janeiro de 2001, objeto de reinvestimento.
III. À data a impugnante poderia optar pelo regime estabelecido na alínea b) do n.º 7 do art. 7º da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro (tributação diferida, devendo ser acrescentado ao lucro tributável 1/10 do saldo positivo entre as mais e as menos-valias, no exercício de realização e nos nove anos seguintes), ou, pelo regime previsto no n.º 8 do art. 32º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, (que previa a inclusão de 50% da totalidade da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias suspensa de tributação, no lucro tributável de qualquer exercício anterior ao da alineação total ou parcial dos ativos).
IV. Conforme informação retirada da modelo 22, a Impugnante acresceu no campo 225 do quadro 07 da declaração modelo 22, o valor de 6.360.204,26, relativo a 50% da mais-valia suspensa de tributação associada às obrigações do tesouro, em que se concretizou parte do reinvestimento do valor de realização das partes de capital alienadas em 2000, sendo certo que em 2005, alienou tais obrigações.
V. Assim, e da análise da referida modelo 22, ao contrário do referido na douta sentença, a AT não se substitui ao contribuinte ao considerar que o mesmo optou pelo regime de tributação considerado na Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, uma vez que foi o próprio que acresceu 50% da mais-valia suspensa de tributação.
VI. Ora, cumpre realçar que uma vez feita a opção pelo regime instituído pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias suspensa de tributação deve ser incluída, na sua totalidade, no lucro tributável do exercício anterior ao da alienação do correspondente ativo a que está associada, na hipótese de ainda não ter sido incluída num exercício anterior.
VII. Resulta assim que, de acordo com esta tese interpretativa, o regime em apreço não deixa na total disponibilidade do contribuinte a escolha da modalidade – de uma só vez ou faseadamente, isto é, à e na medida da alienação dos ativos – de inclusão daquela diferença positiva no lucro tributável de qualquer exercício desde que ultrapassado o limite temporal estabelecido, isto é, o exercício da alienação do correspondente ativo.
VIII. Dissecando o segundo argumento do douto tribunal que a interpretação que a AT faz do n.º 8 do art. 32º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, não tem correspondência mínima na letra da lei, nem ao espírito da mesma…
IX. Cumpre referir que, conforme informação resultante das notas interpretativas da respetiva norma, emitidas à data pela Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais: norma prevê que as empresas possam antecipar a tributação, para exercício anterior ao da alienação dos ativos que concretizaram ou venham a concretizar o reinvestimento, a qual, neste caso, incidirá apenas sobre 50% do valor das mais-valias em causa.
X. Entendimento este, corroborado pelo Centro de Estudos Fiscais “a lei não explicita se ao referir-se à “alienação” pretende abranger quer a alienação total quer parcial do correspondente ativo em que se concretizou o reinvestimento, todavia, é legítimo defender que se a intenção do legislador tivesse sido a de admitir a alienação parcial teria decerto aludido a critérios de repartição proporcional da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias à semelhança do previsto em outras disposições legais, como é o caso dos números 2 e 6 do artigo 45º do CIRC ou da alínea b) do n.º 7 do artigo 7º da Lei n.º 30-G/2000.”
XI. Em suma, parece-nos consensual a posição segundo a qual a norma em causa - n.º 8 do art. 32º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro – assenta no entendimento que a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias suspensas de tributação deve ser incluída, na sua totalidade, no lucro tributável do exercício anterior ao da alienação do correspondente ativo a que está associada.
XII. Por todo o exposto e, salvo o devido respeito, entende a AT que o tribunal a quo falhou no seu julgamento quando, perante os factos, decidiu julgar a impugnação judicial procedente. Não podendo acolher nem a interpretação nem os argumentos esgrimidos para a fundamentação da douta sentença, pelo que devem os mesmos decair in totum.
X
A fls. 463/529, a recorrida ofereceu contra-alegações, pugnando pela manutenção do julgado.
Formula as conclusões seguintes:
I. A sentença recorrida procedeu à anulação do acto tributário em crise nos presentes autos com base no vício de VIOLAÇÃO DE LEI por erro nos pressupostos de facto e de direito, maxime na aplicação do disposto no n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro.
II. Na sequência da conclusão pelo vício de VIOLAÇÃO DE LEI, a decisão recorrida procedeu também à anulação dos juros compensatórios e da derrama ilegalmente liquidados, e ainda à condenação da AT no pagamento de uma indemnização pela prestação e manutenção indevida de garantia bancária.
III. As alegações e conclusões da Recorrente versam apenas sobre o referido vício de erro nos pressupostos de facto e de direito, não se referindo aos demais vícios, de VIOLAÇÃO DE LEI E DE FORMA, invocados pela Recorrida em primeira instância e apreciados pela decisão recorrida.
IV. As alegações e conclusões da Recorrente não impugnam a fundamentação de FACTO dada por provada na decisão a quo que anulou o acto tributário em crise.
V. Nos presentes Autos de recurso discute-se uma liquidação adicional de IRC, derrama e juros compensatórios, referente ao exercício de 2004 – cfr. a fls. 42 e 43 dos Autos.
VI. A sentença a quo, deu como provado essencialmente que:
(i) A Recorrida exerce a actividade de gestão de participações sociais noutras empresas – cfr. a fls. 48 ab initio dos Autos;
(ii) A Recorrida foi objecto de uma acção de inspecção externa, em sede de IRC, no âmbito da qual foram efectuadas correcções à matéria colectável, de natureza meramente aritmética – cfr. relatório de inspecção a fls. 46 e ss. dos Autos;
(iii) Que em 20/01/2009 foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 3123200901003631, para cobrança da quantia referente à mencionada liquidação – cfr. a fls. 234 e 235 do Processo Administrativo;
(iv) Que a p.i. de impugnação foi apresentada junto do Tribunal Tributário de Lisboa em 27/03/2009 – cfr. a fls. 2 dos Autos; e,
(v) Que em 22/04/2009, foi prestada garantia n.º ………………….-B……….no âmbito do processo de execução fiscal n.º ……………………. resultante do não pagamento da mencionada liquidação cfr. a fls. 234 e 235 do Processo Administrativo.
VII. Foram ainda dados como provados pela sentença recorrida, por não se encontrarem controvertidos pelas partes, os seguintes FACTOS:
(vi) No exercício de 2000, a Recorrida alienou partes de capital que detinha pelo valor de €66.312.940,24, obtendo uma mais-valia contabilística de €52.013.239,36 e uma mais-valia fiscal de €44.306.543,20 – cfr. pp. 32 da sentença a fls. 506;
(vii) A Recorrida declarou a intenção de reinvestimento do valor de realização na declaração de IRC do exercício de 2000 – cfr. pp. 32 da sentença a fls. 506 dos Autos;
(viii) Por força de tal declaração e do reinvestimento subsequente em três distintos activos, a mais-valia fiscal obtida no exercício de 2000 ficou suspensa de tributação por força do disposto no artigo 44.º do Código do IRC, à data em vigor;
(ix) A Recorrida reinvestiu efectivamente o valor total de realização de 66.312.940,24 €, em 3 activos:
§ Em 2000, na aquisição de partes de capital da ‘I………… SGPS, SA.’, no valor de 37.826.015,75 €;
§ Em 2003, na aquisição de mais partes de capital da ‘I…………..SGPS, SA.’, no valor de 9.481.585,92 €;
§ Em 2003, na aquisição de obrigações do tesouro, no valor de 19.499.499,21 € – cfr. pp. 33 ab initio da sentença a fls. 507 dos Autos.
(x) Caso a Recorrida não tivesse reinvestido parte do valor de realização, teria pago a mais-valia suspensa correspondente a esse mesmo não reinvestimento.
(xi) Mercê do regime opcional disponibilizado (n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro), no exercício de 2004, a Recorrida acresceu no campo 225 do quadro 07 da declaração Mod. 22-IRC o valor de 6.360.204,26 €, relativo a 50% da mais-valia suspensa de tributação e associada às obrigações do tesouro em que se concretizou parte do reinvestimento do valor de realização das partes de capital alienadas em 2000.
(xii) No exercício de 2005, a Recorrida alienou as obrigações do tesouro adquiridas no âmbito do citado reinvestimento.
VIII. O regime fiscal à data da realização da mais-valia (2000) admitia que a Recorrida reinvestisse e diferisse a tributação, prevendo-se que a mais-valia não tributada seria deduzida, mais tarde, aquando da alienação, no custo de aquisição dos bens do activo imobilizado em que se concretizou o reinvestimento, para efeitos da determinação de qualquer resultado tributável em IRC relativamente aos mesmos.
IX. O legislador alterou várias vezes o regime da tributação das mais-valias, em particular, as obtidas pelas SGPS’s, designadamente através do Decreto-Lei n.º 198/01, de 3 de Julho de 2001, da Lei n.º 109-B/2001, 27 de Dezembro (2002), e da Lei n.º 32-B/2002, 30 de Dezembro de 2001. E,
X. Através destas alterações, concedeu várias opções aos contribuintes.
XI. Basicamente, os contribuintes podiam realizar a mais-valia e (i) não reinvestir, pagando a totalidade do imposto (mais-valia); (ii) reinvestir parcialmente, pagando o imposto proporcional ao não reinvestido; (iii) optar por pagar a mais-valia em prestações e ao longo de 10 anos; (iv) optar por pagar a mais-valia antecipadamente (no ano anterior à venda do bem reinvestido), mas por 50%, como decorre de cada um daqueles preceitos já referidos e transcritos na p.i.
In casu, a ora recorrida, optou por este último regime. Vejamos o preceito:
XII. O n.º 8 do artigo 32.º da citada Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro – o preceito central nesta controvérsia – estabeleceu que:
«A parte da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias, realizadas antes de 1 de Janeiro de 2001, cujo valor de realização tenha sido ou, no respectivo prazo legal, venha a ser objecto de reinvestimento em bens não reintegráveis pode, por opção do sujeito passivo, e em alternativa ao regime previsto na alínea b) do n.º 7 da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, ser antecipadamente incluída na base tributável de qualquer exercício que seja anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, desde que posterior a 1 de Janeiro de 2001, por metade do seu valor, nos termos previstos no artigo 45.º do Código do IRC, na redacção dada pela presente lei, mas sem exigência do novo reinvestimento subsequente consagrado neste último preceito» (cit., sublinhado nosso).
XIII. Em 2004, a Recorrida decidiu alienar parte dos bens em que tinha reinvestido; em concreto, decidiu vender as obrigações. E, analisando as diferentes opções, acabou por seguir o regime fiscal que exigia a antecipação da tributação de 50% da mais-valia suspensa associada às obrigações, tal como o entendia, e por isso acresceu 6.360.204,26 € à matéria colectável do exercício de 2004, posto que se preparava para alienar as obrigações em 2005.
XIV. E foi o que fez: deu à tributação aquela mais-valia e alienou as obrigações. Escolheu aquele regime fiscal porque se lhe afigurou o mais adequado aos seus interesses e depois de analisar todos os regimes aplicáveis e seu tratamento (análise realizada com contabilistas, TOC, Conselho Fiscal, consultores, advogados, etc…).
XV. No momento da escolha por aquele regime, a AT não tinha emitido qualquer orientação sobre a interpretação do n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro; e a interpretação feita parecia-lhe a melhor, a si, como às várias entidades intervenientes, e que a assessoraram nessa avaliação.
XVI. A posição da AT, mas já em sede de inspecção externa, foi a de que a Recorrida deveria ter pago de imediato (i.e. antecipadamente), por referência ao exercício de 2004, toda a mais-valia suspensa, ainda que associada a bens que não alienou em 2005 (nem em 2005, nem até à data presente, como bem referiram as testemunhas).
XVII. Tal posição consta de um «parecer» de folha e meia, recheado de ambivalências, incluindo mencionando a existência de pareceres contrários, com os quais dizia discordar; pareceres esses que a Recorrida solicitou, mas que a AT recusou entregar-lhe.
XVIII. Como bem decidiu a sentença recorrida, a aplicação da lei efectuada pela AT é ilegal por erro sobre os pressupostos de facto e de direito ao aplicar incorrectamente o citado n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, desde logo, por a posição sustentada pela AT não ter correspondência verbal na letra da lei.
XIX. No domínio do Código do IRC, sempre se permitiu, a respeito das mais-valias, que os valores de realização pudessem ser reinvestidos em activos do imobilizado corpóreo, fossem os mesmos um activo, dois activos, três, quatro, etc.; princípio esse que foi consagrado, como a sentença a quo reconhece, na própria Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, ao prever-se a tributação da mais-valia suspensa associada à «alienação do correspondente activo» (cit., itálico nosso).
XX. A Recorrida realizou o reinvestimento de todo o produto de realização das mais-valias geradas em 2000 em três activos que, de acordo com o POC, foram contabilizados em contas separadas do activo (global) da empresa.
XXI. O que pretende a AT é a tributação automaticamente da mais-valia suspensa mesmo quando – como sucedeu in casu –a maioria dos activos permaneceram na esfera do alienante; isso não resulta, todavia, da letra da lei, nem muito menos se afigura decorrer do seu espírito.
XXII. A posição adoptada pela AT quanto à interpretação e aplicação da norma do citado artigo 32.º, n.º 8, da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, consubstancia também uma aplicação retroactiva da lei fiscal, contrária à Constituição da República Portuguesa, na medida em que sujeita a mais-valia realizada em 2000 a tributação nova e mais pesada do que a prevista no exercício em que a mesma foi realizada, posto que, nessa data, o contribuinte poderia ter optado por reinvestir tudo em acções (como fez em grande parte) e não reinvestir nas obrigações – veja-se a este propósito o PARECER do Prof. J. L. Saldanha Sanches e de João Taborda da Gama – a fls. 279 e ss. dos Autos, maxime 296.
XXIII. Caso não tivesse reinvestido nas obrigações, teria tido um tratamento muito mais favorável…
XXIV. Do n.º 8 do artigo 32.º da Lei 109-B/2001, de 27 de Dezembro, não resulta a interpretação propugnada pela AT e consumida no acto originariamente em crise, tal como bem interpretado e aplicado pelo Tribunal a quo, o qual aceitou as posições anteriormente sustentadas pela ora recorrida, TOC, consultores, advogados, professores e vários reputados funcionários da DCGI.
XXV. O n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, ao contrário do entendimento dos serviços de inspecção, limita-se a exigir que, à medida que se venda qualquer bem em que se reinvestiu, se pague a mais-valia suspensa que lhe está associada de imediato e no ano anterior à venda do bem objecto do reinvestimento; ou seja, havendo uma venda da totalidade do bem reinvestido, deve-se pagar a mais-valia suspensa pela totalidade; mas, claro está, procedendo-se a uma venda parcial do bem reinvestido, deve pagar-se imposto proporcionalmente, pela mais-valia que lhe estiver associada (i.e., respeitante ao activo correspondente).
XXVI. Por isso, bem andou a sentença a quo ao seguir a posição de que o intérprete não deve criar lei nem distinguir onde o legislador não distinguiu, e bem andou ao concluir pela anulação do imposto ilegalmente liquidado por assente em erro nos pressupostos de FACTO e de DIREITO.
XXVII. Na sequência da conclusão pelo vício de violação de lei – n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109/2001, de 27 de Dezembro – bem andou igualmente o Tribunal a quo quanto à anulação dos juros compensatórios e, bem assim, derrama.
XXVIII. Efectivamente, tanto os juros como a derrama foram liquidados conjuntamente com o imposto, constituindo parte integrante da própria dívida de imposto – vide, para os juros em especial, o n.º 8 do artigo 35.º da LGT.
XXIX. Bem andou o Tribunal a quo ao anular a derrama adicionalmente liquidada e os juros compensatórios integrantes da dívida de imposto, por os mesmos incorrerem em VÍCIO DE VIOLAÇÃO DE LEI, por violação do disposto no n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109/2001, de 27 de Dezembro, razão pela qual se pugna pela manutenção da sentença recorrida também a esse respeito.
XXX. Acresce que o acto originariamente em crise padece de outros vícios que não apenas a violação do disposto no n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109/2001, de 27 de Dezembro, vícios esses que foram alegados junto do tribunal a quo, não tendo merecido provimento.
XXXI. Caso se entenda – por mera hipótese e sem conceder – que a decisão a quo merece censura e/ou que o acto em crise nos Autos não padece do vício de violação do disposto no n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109/2001, de 27 de Dezembro, importa, subsidiariamente e à cautela, nos termos do artigo 684.º-A, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi o disposto nos artigos 2.º al. e) e 281.º do CPPT, ampliar o âmbito do recurso interposto, como ora se requer.
XXXII. Desde logo importa realçar que a obrigação fiscal – apesar de ter sido formalmente liquidada por referência ao ano de 2004 – respeita a uma mais-valia de 2000 que não foi tributada nessa data.
XXXIII. Pelo que ainda que existisse obrigação, a mesma estava prescrita à data em que foi deduzida a impugnação judicial, posto que já tinham decorrido mais de 8 anos sobre o facto tributável sem que o prazo tivesse sido interrompido ou suspenso.
XXXIV. A sentença a quo considera que o facto tributário ocorre apenas em 2004, apesar de confirmar que a mais-valia foi gerada em 2000, pois só em 2004 era possível a tributação, não compreendendo que a liquidação de 2000 estava suspensa até 2004 e, verificando-se a condição resolutiva em 2004 com a venda das obrigações, despoleta-se necessariamente a obrigação de imposto.
XXXV. Ou seja, a decisão a quo não analisou o vício da prescrição com referência a esta condição resolutiva, mas deveria tê-lo feito, pois é disso que se trata quando nos referimos a diferimento na tributação.
XXXVI. Neste sentido, veja-se o PARECER do Prof. J. L. Saldanha Sanches e de João Taborda da Gama a fls. 32 a 44 e 82 dos Autos e o próprio Parecer do MP – cfr. PARECER a fls. 470 e ss. dos Autos.
XXXVII. Só assim não seria se tivesse ocorrido um facto interruptivo da prescrição até 1 de Janeiro de 2009, o que não ocorreu – note-se que a decisão a quo não dá como provado qualquer facto interruptivo ou suspensivo.
XXXVIII. Aliás, não conhecendo este vício, o próprio Tribunal a quo acabou por concluir que a prescrição acorreria em finais de 2012, pelo que também, segundo essa orientação, estaria prescrita a obrigação tributária.
XXXIX. Encontrando-se a dívida em questão prescrita nos termos do n.º 1 do artigo 48.º da LGT, não pode a mesma ser exigida pela AT, devendo a este respeito ser alterada a decisão a quo por erro de julgamento em sede de VIOLAÇÃO DE LEI.
XL. Por outro lado, em 2008, também já havida caducado o direito à liquidação ainda que se entendesse que a data de referência correspondia a 2004, posto que o prazo de caducidade in casu era de 3 anos por se verificar erro evidenciado na declaração de imposto – cfr. n.º 2 do artigo 45.ºda LGT.
XLI. Não se pode concordar com a decisão a quo quando esta afirma que a inclusão da mais-valia suspensa «não se apura pela simples análise da declaração Mod. 22-IRC» posto que era, efectivamente, possível analisar as mais-valias tributadas ao abrigo de regimes anteriores com recurso à análise à Declaração Anual e à Modelo 31, sobretudo porque a própria Recorrida havia invocado pretender reinvestir.
XLII. No mesmo sentido vejam-se as vozes autorizadas do saudoso Prof. J. L. Saldanha Sanches e João Taborda da Gama, em PARECER anexo aos Autos a fls. 50 e seguintes, 271 a 278, e 308 e seguintes dos Autos.
XLIII. Sendo o prazo de caducidade do direito à liquidação de 3 anos in casu, no momento da liquidação em crise (2008) já se encontrava caducado o direito à liquidação de imposto, quer se considerasse o mesmo reportado ao ano de 2000 ou de 2004, devendo a este respeito ser alterada a decisão a quo por erro de julgamento com base em vício de VIOLAÇÃO DE LEI nos termos do n.º 2 do artigo 45.º da LGT.
Acresce que, o acto de liquidação padece também do VÍCIO DE FORMA por fundamentação insuficiente e de VIOLAÇÃO DE LEI por incongruência da informação prestada em clara violação do dever de boa fé.
XLIV. Não é possível concordar com a sentença a quo (segundo a qual o relatório de inspecção encontra-se devidamente fundamentado) quando os próprios serviços de inspecção tributária não tinham a certeza do entendimento a adoptar, como se depreende do relatório de inspecção e anexos e decorria dos várias pareceres contraditórios da AT (e.g. Centro de Estudos Fiscais) juntos aos autos.
XLV. Não se pode considerar devidamente fundamentado um acto de liquidação de imposto assente num exemplo previsto numa circular quando esse exemplo não é aplicável in casu, assim como não se pode considerar que a AT agiu de boa-fé quando sonegou informação e recusou entregar pareceres internos do Centro de Estudos Fiscais que davam razão à Recorrida.
XLVI. Não existindo uma fundamentação clara, suficiente e completa, de facto e de direito, o acto impugnado carece de anulação por estar feridos do VÍCIO DE FORMA por fundamentação insuficiente e incongruente, e do VÍCIO DE VIOLAÇÃO DE LEI por VIOLAÇÃO dos deveres procedimentais de colaboração e da boa fé, devendo a este respeito ser alterada a decisão a quo por erro de julgamento.
XLVII. Apesar de tudo e mesmo que não se entendesse como atrás se alegou – o que apenas se admite como hipótese meramente académica – também nunca poderia proceder-se à presente correcção que consiste numa tributação contrária aos princípios da boa-fé, da confiança e da proporcionalidade, posto que se propõe um regime com o qual a Recorrida nunca poderia contar e que se mostra claramente excessivo e desproporcionado.
XLVIII. A decisão recorrida entende que a mera circunstância de ter existido um regime fiscal anterior mais favorável não acarreta uma violação do princípio da boa-fé e da confiança… e, nestes termos, até se poderia compreender a decisão…
XLIX. Simplesmente, este entendimento coloca a tónica apenas na perspectiva da violação da boa fé e da confiança e não foi apenas nesses precisos termos que a ora Recorrida equacionou a questão de constitucionalidade por si suscitada, em que avulta também a violação do princípio da proporcionalidade, entendido como máxima que vale para todas as funções do Estado, em resultado da ideia de Estado de direito consagrada no artigo 2.º da Constituição.
L. À Recorrida foi-lhe dada a oportunidade de optar por um regime – o disposto no n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro – com regras próprias que consubstanciavam um equilibro na relação com o Estado; naturalmente, tal equilibro deixaria de existir caso se permitisse (como pretende a AT) que poderia ser tributada automaticamente toda a mais-valia suspensa, caso a maioria dos activos permanecessem na esfera do alienante tal como sucedeu com a Recorrida.
LI. Só depois de a ora Recorrida ter optado pelo regime constante do n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, e de já não poder arrepiar caminho, é a que a mesma se vê confrontada com uma interpretação daquele regime que, para além de ser claramente contra legem significaria, a proceder, uma actuação da Recorrida contra os seus próprios interesses e também contra a própria ponderação de interesses subjacente à solução plasmada no citado regime.
LII. A interpretação defendida pela AT põe em causa a racionalidade ou proporcionalidade em sentido estrito inerente à medida legislativa em causa, na medida em que o interesse do Estado em antecipar a tributação da mais valia não encontra qualquer contrapartida no interesse do contribuinte em corresponder a essa antecipação e em ter reinvestido nas obrigações (mais valia o não ter feito, posto que seria muito menos tributada…).
LIII. Em face do exposto, parece evidente que a interpretação da norma do n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, no sentido de sujeitar à tributação todas as mais-valias suspensas quando apenas foi vendido um dos bens em que se concretizou o reinvestimento mantendo-se os demais na esfera do contribuinte, é violadora dos princípios constitucionais da proporcionalidade, da boa-fé e da confiança, consagrados nos artigos 2.º e 266.º da CRP, porque se revela ser muito mais onerosa do que aplicar o regime anterior sem considerar o reinvestimento (i.e. liquidar IRC pela parte do reinvestimento não realizado) não levando em linha de conta a ponderação de interesses subjacente àquela norma.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr. fls. 495 dos autos), no qual se pronuncia no sentido da recusa de provimento ao presente recurso jurisdicional.
X
Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência para decisão.
X
II- Fundamentação
2.1. De Facto
A Sentença recorrida considerou provada a seguinte factualidade com relevo para a decisão:
A) A impugnante exerce a actividade de gestão de participações sociais noutras empresas, correspondente ao CAE n.º 064202 (cfr. fls. 48 dos autos).
B) A impugnante foi objecto de uma acção de inspecção externa, em sede de IRC, no âmbito da qual foram efectuadas correcções à matéria colectável, de natureza meramente aritmética resultante de imposição legal, ao exercício de 2004, no montante de 15.793.067,34€ (cfr. relatório de inspecção de fls. 46 dos autos).
C) As correcções mencionadas na alínea anterior foram efectuadas com o seguinte fundamento, que aqui se transcreve na parte com interesse para a decisão (cfr. relatório de inspecção tributária a fls. 48 a 56 dos autos):
“III- Descrição dos Factos e Fundamentos das Correcções Meramente Aritméticas à Matéria Tributável
III.1 - Mais-valias fiscais realizadas no exercício de 2000.
No exercício de 2000 a I…………… alienou partes de capital que detinha nas sociedades "I…………. SGPS SA e "Banco …………………., SA", pelo valor de € 66312940,24, obtendo uma mais-valia contabilística de € 52 013 239,36 e uma mais-valia fiscal de € 44 306 543,20, conforme mapa das mais-valias e menos­valias fiscais, em anexo n.º 1;
2.
A mais-valia fiscal obtida no exercício de 2000, ficou suspensa de tributação por força do disposto no art.º 44 do CIRC, à data em vigor, por remissão do n.º 2 do art.s 7 do Decreto-Lei n.º 495/88 de 30.12, tendo mencionado a intenção de reinvestimento do valor de realização (no quadro 10 do anexo A à declaração anual para o exercício de 2000 - conforme n.º 6 do art.º 44 do CIRC, à data em vigor), em anexo n.º 2;
3.
No exercício de 2000, a I………… deduziu no campo 229 - mais-valias contabilísticas do quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22, o montante de €52.013.239,36.
4.
O valor de realização, €66.312.940,24, obtido em 2000, foi integralmente reinvestido, com a aquisição em 2000 de partes de capital da I………….SGPS, SA, no valor de €37.826.015,75 e em 2003 de partes de capital da I………….. SGPS, SA, e obrigações do tesouro, nos montantes de € 9.481.853,92 e € 19.499.499,21, respectivamente, conforme documento apresentado pela I……………., em anexo n.o 3;
5.
No exercício de 2004 a I…………..optou pelo regime previsto no artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27.12, tendo acrescido no campo 225 do quadro 07 da declaração modelo 22 exercício de 2004, o valor de €6.360.204,26, relativo a 50% da mais-valia suspensa de tributação e associada às obrigações do tesouro, em que se concretizou parte do reinvestimento do valor de realização das partes de capital alienadas em 2000, em anexo n.º 3.
6.
No exercício 2005 a I……………..alienou os títulos da divida pública, conforme anexo n.o 4.
III.2. legislação aplicável à situação descrita em III.1.
III.2.1.Regime transitório das mais valias previsto no n.º 8 do art. 32.0 da Lei n.º 109­-B/2001 de 27 de Dezembro
"8 -A parte da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias, realizadas antes de 1 de Janeiro de 2001, cujo valor de realização tenha sido ~ no respectivo prazo legal, venha a ser objecto de reinvestimento em bens não reintegráveis pode, por opção do sujeito passivo, em alternativa ao regime previsto na alínea b) do n.º 7 da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, ser antecipadamente incluída na base tributável de qualquer exercício que seja anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, desde que posterior a 1 de Janeiro de 2001, por metade do seu valor, nos termos previstos no artigo 45.º do Código do IRC, na redacção dada pela presente lei, mas sem exigência do novo reinvestimento subsequente consagrado neste último preceito.”
III.2.1.Orientações administrativas relativas ao regime transitório previsto no n.º 8 do art. 32 da Lei n.o 109-8/2001 de 27.12
III.2.2.1. Parecer n.º 19/2003 do Centro de Estudos Fiscais de 2003.04.28
Do Parecer n.º 19/2003 de 2003.04.28, em anexo n.º 5, salientamos os seguintes factos:
" ... Importa, por isso, em primeiro lugar, pôr em destaque as principais características que diferenciam os dois regimes transitórios que actualmente coexistem: o regime previsto no n.º 8 do art. 32 da Lei n.o 109­-B/2001, de 27.12, que opera por opção do sujeito passivo em alternativa ao anterior regime de diferimento ou de roll-over vertido na alínea b) do n.º 7 do art.º 7 da Lei n.º 30-G/2000, de 29.12.
Assim, recorrendo, para efeitos de interpretação do n.º 8 do art. 32 da Lei n.º 109-B/2001, à respectiva nota justificativa divulgada pela Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, constata-se que nela se refere que o mesmo teve em vista permitir que, relativamente à diferença positiva entre as mais valias e as menos valias realizadas anteriormente a 1 de Janeiro de 2001 e pendente de tributação "as empresas possam antecipar a tributação, para o exercício anterior ao da alienação dos activos que concretizaram ou venham a concretizar o reinvestimento" oferecendo-se como contrapartidas: um desagravamento fiscal - inclusão no lucro tributável em metade do seu valor - e a não exigência de novo reinvestimento".
Ou seja, este regime vem claramente dissociar o momento da tributação das mais valias (ou, melhor, da diferença positiva entre as mais valias e as menos valias) do momento da ocorrência da alienação dos activos a que estão associadas, contrário ao que é preconizado pelo regime alternativo instituído pela Lei n.º 30-G/2000.
Deste modo, as mais valias podem perfeitamente ser integradas no lucro tributável de um qualquer exercício ainda que os correspondentes activos em que se concretizou o reinvestimento permaneçam no activo das empresas.
Como consequência, outro elemento distintivo a salientar é o de que, diferentemente da redacção da alínea b) do n.º 7 do art. 7 da lei n.º 30-G/2000, em que de forma expressa se consagra um critério de repartição proporcional daquela diferença positiva, para efeitos de tributação, em função do valor de realização dos activos em que se concretizou o reinvestimento, tal não sucede na redacção da norma que regula o novo regime porque a antecipação que lhe é inerente pressupõe que a tributação ocorra em exercício anterior.
Parece, pois, ser possível concluir que, uma vez feita a opção pelo regime instituído pela lei n.o 109­-B/2001, a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias suspensa de tributação deve ser incluída, na sua totalidade, no lucro tributável do exercício anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, na hipótese de ainda não ter sido incluída num exercício anterior.
Resulta assim que, de acordo com esta tese interpretativa, o regime em apreço não deixa na total disponibilidade do contribuinte a escolha da modalidade - de uma só vez ou faseadamente, i. é., à e na medida da alienação dos correspondentes activos - de inclusão daquela diferença positiva no lucro tributável de qualquer exercício desde que ultrapassado o limite temporal estabelecido, i. é., o exercício da alienação do correspondente activo".
III.2.2.2.1nformação vinculativa - Proc. 3582/2002, com despacho concordante do Senhor Subdirector-Geral do IR, em 2003.06.03, Regime transitório das mais-valias previsto na Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro.
No mesmo sentido do Parecer n.º 19/2003, mencionado no ponto anterior, foi elaborada a Informação vinculativa - Proc.: 358212002, com despacho concordante do Senhor Subdirector-Geral do IR, em 2003.06.03, Regime transitório das mais-valias previsto na Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, conforme anexo n. º 6 ao presente Projecto, que abaixo se transcreve:
A Lei n.º 109-B/2001 de 27 de Dezembro, estabelece no n.º 8 do seu art. 32.º, um regime transitório relativo à diferença positiva entre as mais valias e as menos valias realizada antes de 01.01.2001 e cujo reinvestimento dos respectivos valores de realização seja efectuada em bens não reintegráveis, alternativo ao previsto na alínea b) do n.º 7 do art. 7.º da Lei n.º 30 - G/2000 de 29.12.
Esse regime consubstancia-se na possibilidade de os sujeitos passivos optarem por, antecipadamente, incluir na base tributável de qualquer exercício que seja anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, desde que seja posterior a 01.01.2001, 50% do seu valor, nos termos previstos no art. 45.º do CIRC, mas sem exigência de novo reinvestimento.
Feita a opção pelo regime instituído na Lei n.º 109-B/2001, a totalidade da diferença positiva entre as mais valias e as menos valias suspensa de tributação deve ser incluída em 50%, no lucro tributável de qualquer exercício anterior ao da alienação total ou parcial dos activos. Ou seja, o limite temporal para que a totalidade daquela diferença seja incluída, em 50%, no lucro tributável é o exercício anterior ao da alienação de qualquer dos activos a que está associada, não podendo o sujeito passivo optar por incluir tal diferença de uma só vez ou faseadamente se e na medida da alienação de cada um desses activos".
III.3. Correcções Propostas
III.3.1 - Correcções ao Lucro Tributável
Tendo em conta os factos descritos no ponto 111.1, verificamos que a I………… optou pelo regime transitório das mais valias previsto no n.º 8 do art. 32.º da Lei n.º 109-B/2001 de 29.12, incluindo no lucro tributável do exercício de 2005, através do acréscimo no campo 216 do quadro 07 da declaração modelo 22, o valor de € 6360204,26, relativo a 50% de mais valias imputadas (associadas) aos títulos da dívida pública.
Deste modo, verificamos que a I………… não incluiu 50% da totalidade da diferença positiva entre as mais valias e as menos valias suspensa de tributação, obtidas no exercício de 2000, no montante de € 22 153 271,60 (50% x € 44 306 543,20), conforme dispõem, a legislação e as orientações administrativas mencionadas no ponto 111.2, pelo que se propõe o acréscimo ao lucro tributável declarado em 2004, de € 15 793067,34 (€ 22153271,60 - € 6 360 204,26, já incluídos), passando o lucro tributável de € 7157298,23 para € 22 950 365,57.(…)
VIII - Direito de Audição
Nos termos dos artigos 60.º da Lei Geral Tributária e 60.º do Regime Complementar de Procedimento de Inspecção Tributária, aprovados, pelo D.L. n.º 398/98 de 17.12 e D.L. n.º 413/98 de 31.12, foi notificada a I………… , através do nosso ofício n.º 55523 de 22.07.2008, para exercer no prazo de dez dias, se assim o entender, o direito de audição sobre o Projecto de Relatório da Inspecção Tributária. // Através de exposição escrita, em anexo n.º 7, recebida nestes Serviços no dia 04.08.2008, com o n.º 68041, pronunciou-se sobre o Projecto de Relatório da Inspecção Tributária, discordando "da interpretação e aplicação da lei propugnada pelos Serviços de inspecção e da proposta de correcções apresentada" com os seguintes fundamentos: // "O n.º 8 do artigo 32.º da Lei 109-B/2001 de 27.12, não previa a solução que resulta da proposta de correcções" (conforme alíneas a) e c) do ponto 3, alínea a) do ponto 11 e pontos 12, 13, 14, 15, 18 e 19 do direito de audição); // Em relação à fundamentação das correcções propostas, remetemos para os capítulos 111.2.1 e 111.2.2. incluídos no presente Relatório. // "Da Circular 7/2002 da DGCI, que se debruçou sobre o regime transitório das mais-valias e menos­-valias realizadas, não decorre o tratamento vertido no Projecto de Relatório" (conforme alínea b) do ponto 11 do exercício do direito de audição); // Relativamente ao alegado pela I………. verificamos que a circular acima mencionada vai no mesmo sentido, da fundamentação apresentada no ponto 111.2 do presente Relatório (a inclusão no lucro tributável de metade da diferença positiva das mais e menos valias suspensas de tributação num determinado exercício, deve ocorrer em qualquer exercício anterior à alienação de um dos activos a que se encontra associada), conforme exemplo 5 - Reinvestimento em bens não reintegráveis - opção pelo regime da Lei n.º 109-B/2001, de 27.12, anexo à circular 7/2002. // "O Parecer da Directora do CEF" sugere que "deveria ser fixado entendimento segundo o qual o limite temporal para que aquela diferença seja incluída, na sua totalidade, no lucro tributável é o exercício anterior ao da alienação total ou parcial do correspondente activo a que está associada". Esta sugestão nunca foi adoptada e tornada de conhecimento público (conforme alíneas c) e d) do ponto 11 do exercício do direito de audição); // O Projecto de Relatório "alude a uma decisão proferida no âmbito de um processo concreto (L é, Proc. N.º 358212002 - pedido de informação vinculativa), mas a verdade é que esta decisão foi apenas dada a conhecer ao contribuinte que a solicitou e não à ora requerente" (conforme alínea e) do ponto 11 do exercício do direito de audição); // Em relação ao alegado pela I……………., verificamos que a informação vinculativa (Proc.: 3582/2002, com despacho concordante do Senhor Subdirector-Geral do IR, em 2003.06.03, Regime transitório das mais-valias previsto na Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro) transcrita no ponto 111.2.2.2. do presente Relatório, foi divulgada, por exemplo, na base de dados que a CTOC fornece a todos os seus associados, conforme anexo n.º 8, bem como no "site" da DGCI, indicando o entendimento da Administração Fiscal relativamente à citada norma. // Deste modo, o entendimento divulgado terá de ser aplicado a todos os sujeitos passivos que apliquem a norma de forma diversa, assegurando assim o princípio da igualdade tributária. // D) A caducidade do direito à liquidação, visto que, não só a correcção respeita a uma mais-valia de 2000, como a uma situação declarada e evidenciada na declaração de rendimentos modelo 22 de 2004; a ter lugar qualquer correcção, o que admite como mera hipótese académica, seria decorrente do não reinvestimento parcial da mais-valia realizada em 2000 (conforme alínea b) do ponto 3 e pontos 16 e 17 do exercício do direito de audição);
Em relação à alegada caducidade, por se tratar de uma mais-valia obtida em 2000, verificamos que:
- a mais-valia se encontrava suspensa pelo facto de a Impreger ter manifestado a intenção de reinvestir e concretizado o reinvestimento nos termos previstos na lei (conforme descrito pela Impreger no exercício de direito de audição);
- Relativamente à diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias realizadas antes de 1 de Janeiro de 2001, foram criados regimes transitórios estabelecidos, no n.º 7 do artigo 7.º da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro e nos n.ºs. 8 e 9 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro (alternativo ao regime do artigo 7.º da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, e mediante opção do sujeito passivo) que permitem a tributação das mais-valias líquidas;
Quanto à alegada caducidade, nos termos do n.º 2 do artigo 45.º da LGT (nos casos de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo, o prazo de caducidade é de 3 anos), verificamos que:
- "Erro evidenciado na declaração do sujeito passivo é aquele que é detectável mediante simples análise da declaração", conforme página 143 da Lei Geral Tributária, comentada e anotada de Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, da Vislis Editores, ano de 1999;
- O valor acrescido pela Impreger no campo 216 da declaração modelo 22 de 2004, corresponde ao campo com o descritivo, "mais-valias fiscais (artigo 43.º)", conforme anexo n.º 9, onde eram, à data dos factos, incluídas as mais-valias resultantes dos vários regimes fiscais em vigor (incluindo as mais-valias que se encontravam suspensas e eram tributadas nos termos dos regimes transitórios). Com a publicação dos modelos (da declaração periódica de rendimentos modelo 22), aprovados pelo Despacho n.º 9/2007, de 04 de Janeiro, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, através da Declaração n.º 34/2007, em anexo n." 10, foi introduzido no quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22, o campo 276 com o descritivo "Mais valias fiscais - regime transitório (art. 7, n.º 7, ali. b) da Lei n.º 30-G/2000 de 29.12 e art. 32, n.º 8 da Lei n.º 109-B/2001 de 27.12) que permitiu diferenciar as mais-valias fiscais incluídas na declaração de rendimentos modelo 22, tributadas nos termos dos regimes transitórios (art. 7, n.º 7, ali.b) da Lei n.º 30-G/2000 de 29.12 e art. 32, n.º 8 da Lei n.º 109-B/2001 de 27.12).
Deste modo, verifica-se que não era possível, pela simples análise do campo 216 do quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22 de 2004, em anexo n.º 11, detectar qualquer irregularidade. // Acresce, que os factos que originaram a proposta de correcção foram detectados no âmbito de acção inspectiva (Despacho n.º D1200702315) que tinha como objectivo, certificar o reinvestimento dos valores de realização associados à alienação de participações sociais efectuadas no exercício de 2000.
Atendendo ao alegado, o seu comportamento não é censurável, razão pela qual não podem ser liquidados quaisquer juros compensatórios, nem fixadas quaisquer penalidades (conforme alínea d) do ponto 3 e ponto 20 do exercício do direito de audição);
Em relação ao pretendido pela I……………, verificamos que as correcções propostas têm base legal (com a Lei e com as interpretações administrativas divulgadas, assegurando assim a aplicação uniforme da norma para todas as situações identificadas) não havendo assim a violação do artigo 103.º da CRP (princípio da legalidade tributária), pelo que, se deverá proceder ao cálculo dos juros compensatórios nos termos dos artigos 94.º do CIRC e 35.º da LGT e promover o respectivo procedimento contra-ordenacional.
Nos restantes pontos do direito de audição, que correspondem à descrição dos factos, a Impreger não apresentou elementos novos.
Apesar de não ter sido referenciado pela I………….. no direito de audição, por lapso foi mencionado, campo 225 do quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22, quando se queria referenciar campo 216 (conforme nota de rodapé 1) e o exercício de 2005 quando se queria referir o exercício de 2004 (conforme nota de rodapé 4), que corresponde ao exercício em análise.
Face ao exposto, mantém-se as correcções propostas, na sua totalidade.”
D) Na sequência das correcções efectuadas, em 08/10/2008, foi emitida a liquidação de IRC n.º 2008 8310036764, no montante de 4.865.426,99€, referente ao exercício de 2004, cujo prazo limite de pagamento voluntário terminou a 29/12/2008 (cfr. documento de fls. 42 dos autos, e fls. 228 do Processo Administrativo).
E) A liquidação dos juros compensatórios foi remetida à Impugnante por registo postal n.º RY471876896PT, recebida a 27/11/2008, na qual consta que o período de tributação foi o de 01/01/2004 a 31/12/2004, imposto IRC, período de cálculo dos juros 01/06/2005 a 16/09/2008, com base no valor de 4.298.288,44, à taxa anual de 4%, apurando-se um valor de 567.138,55€ (cfr. fls. 234, 235, 238, 239 do Processo Administrativo).
F) Em 20/01/2009 foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 3123200901003631, para cobrança da quantia referente à liquidação mencionada em D) (cfr. fls. 234 e 235 do Processo Administrativo).
G) A Impugnação foi apresentada junto do Tribunal Tributário de Lisboa em 27/03/2009 (cfr. fls. 2 dos autos).
H) Em 22/04/2009 foi prestada garantia n.º …………..-B………, no valor de 6.264.242,14€, no âmbito do processo de execução fiscal n.º …………………. (cfr. fls. 234 e 235 do Processo Administrativo).
X
A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte:
Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados. // Em sede de motivação do julgamento da matéria de facto consignou-se, de forma expressa, na decisão recorrida que, «Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos, no processo administrativo em apenso.»

X
2.2. De Direito
2.2.1. Nos presentes autos, vem sindicada a sentença proferida a fls. 408/428 que julgou procedente a impugnação judicial da liquidação de IRC, referente ao exercício de 2004, no montante de €4.865.426,99 e juros compensatórios.
2.2.2. Da alegada prescrição da dívida impugnanda [conclusões XXXII a XXXIX]
Antes de se proceder à apreciação do mérito do presente recurso jurisdicional, importa aferir da alegada prescrição da dívida impugnada.
A recorrida alega que a dívida em causa se encontra prescrita.
Apesar de ter sido liquidada por referência ao ano de 2004, a dívida respeita a uma mais-valia de 2000, que não foi tributada nessa data.
Cumpre repristinar, nesta sede, o discurso fundamentador da sentença recorrida, sendo de referir como segue.
«A impugnante invoca, desde logo, a prescrição da obrigação tributária, por decurso do prazo de oito anos previsto no artigo 48.º/1, da LGT, considerando que o imposto em falta corresponde ao IRC do exercício de 2000, não obstante os serviços terem liquidado o imposto por referência ao exercício de 2004. // Com efeito, entende a impugnante que o facto tributário não deixa de ser a alienação das participações ocorrida em 2000, sendo que a sua liquidação estava suspensa até 2004, mas verificando-se a condição resolutiva em 2004, ou seja, verificando-se a decisão de vender as obrigações e dar à tributação a mais-valia correspondente gerada em 2000, despoleta-se a obrigação de imposto, ou seja, levanta-se o obstáculo que se opunha à sua tributação, podendo a mais-valia ser tributada. // Apreciando. // Nos termos do artigo 304.º do CC, «completada a prescrição, tem o beneficiário dela a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito». // A prescrição põe termo a um direito já definido, e isto pelo seu não exercício durante um certo tempo, constituindo uma excepção peremptória nos termos dos artigos 493.º e 496.º do CPC, conduzindo assim à absolvição do pedido. // Antes de mais, in casu, cumpre determinar o momento em que surge o facto tributário, que para a impugnante é o ano de 2000, mas sem razão. // Conforme resulta dos autos, a mais-valia em causa foi apurada no exercício de 2000. Não obstante, há que atender ao regime de tributação então vigente, quer nessa data, quer na data em que a impugnante opta por aplicar o regime transitório das mais valias previsto no n.º 8 do art.º 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 29 de Dezembro e aliena parte do reinvestimento efectuado, para se determinar quando efectivamente se verifica o facto tributário. // Assim sendo, in casu, apesar de a mais-valia ter sido gerada em 2000, o facto tributário não se verifica nesse ano, porquanto nesse momento, não era ainda possível serem tributadas por força do regime de diferimento da tributação que se encontrava em vigor. De igual modo, com a Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro, não obstante as alterações introduzidas, mantém-se o regime de tributação diferida das mais-valias. // Por outro lado, com o regime transitório das mais valias previsto no n.º 8 do art.º 32.º da Lei n.º 109-B/2001,de de 29 de Dezembro, dá-se a possibilidade de opção pelo novo regime de tributação, e nessa medida, cessaria a tributação diferida, passando a ser tributável parcialmente, em 50%, o saldo entre as mais e as menos-valias. // Com efeito, in casu, o facto tributário apenas se verifica no momento em que o imposto pode ser liquidado, ou seja, quando o regime de tributação diferida cessa, por a impugnante optar por, antecipadamente, incluir na base tributável de qualquer exercício que seja anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, ou seja, 2004. // Por conseguinte, o facto gerador da obrigação de tributar as mais-valias surge em 2004, quando a impugnante opta por aplicar o regime transitório das mais-valias previsto no n.º 8 do art.º 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 29 de Dezembro, e aliena parte do reinvestimento efectuado. É apenas nesse momento que surge a obrigação de inclusão dos 50% da totalidade da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias suspensas de tributação, obtidas no exercício de 2000. // Assente que o facto tributário apenas ocorre em 2004, vejamos então se a obrigação tributária se encontra prescrita. // Considerando a data do facto tributário, é aplicável o disposto no art.º 48.º da LGT, cujo n.º 1 estabelece o prazo de prescrição de 8 anos, e cuja contagem se inicia “nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário”, ou seja, no caso em apreço, o prazo de prescrição começou a correr em 01.01.2005. // Assim, se não ocorresse qualquer causa de suspensão ou interrupção que se encontram previstas no art.º 49.º da LGT, a dívida estaria prescrita em 31.12.2012, pelo que nesta data é manifesto que não se encontra prescrita».
Desde já se diga que a dívida não se encontra prescrita na presente data. É que, nos termos do artigo 48.º/1, da LGT, o prazo de prescrição conta-se, nos impostos periódicos, como é o caso em que se trata de IRC, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário; donde decorre que sendo o facto tributário - a realização de mais-valias - datado de 2000 – e sendo o prazo de oito anos, a dívida parece estar prescrita. Sucede que o presente raciocínio não se ajusta ao caso dos autos, porquanto o facto tributário não se completa com a realização das mais-valias em 2000, mas antes com a alienação do activo às mesmas associado e a sua inclusão no rendimento tributável do exercício anterior à alienação por metade do valor; o que significa a opção por um regime de tributação antecipada (previsto no n.º 8 do art.º 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 29 de Dezembro) em vez do diferimento da tributação (previsto no artigo 7.º/b) da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro), com o preenchimento dos pressupostos relativos apenas na data da opção. As razões de certeza e segurança jurídica, ínsitas ao instituto da prescrição, determinam que o facto tributário se consume apenas com a opção feita por um dos dois regimes transitórios de tributação das mais-valias suspensas. A tributação, in casu, não depende apenas da realização das mais-valias, mas também do reinvestimento, da alienação do activo às mesmas associado e da opção pela sua inclusão no rendimento colectável. Donde resulta que o termo a quo do prazo de prescrição se conta a partir de 01.01.2005, dado que o facto tributário se consumou em 2004, com a efectivação da referida opção.
Mais se refere que o prazo da prescrição suspendeu-se à luz do disposto no artigo 49.º/4, da LGT [versão conferida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, entrada em vigor em 01.01.2007]; com efeito, o prazo de prescrição encontra-se suspenso, desde 22/04/2009 (data da prestação de garantia idónea), dado que, estando pendente, desde 27.03.2009, a presente impugnação judicial, a prestação de garantia idónea determina a suspensão da execução (artigo 169.º/1, do CPPT); a suspensão do prazo de prescrição verifica-se até ao trânsito em julgado da decisão que ponha termo ao pleito (artigo 49.º/4, da LGT). Donde decorre que a dívida em causa não está prescrita.
Termos em que se julga improcedente a presente imputação.

2.2.3. No que respeita ao erro de julgamento quanto ao vício de violação de lei/erro nos pressupostos de direito, consistente na incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 44.º do IRC e art.º 32.º, n.º 8, da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro.
A recorrente assaca à sentença em crise erro de julgamento quanto ao regime aplicável ao saldo das mais e menos valias, subjacente ao acto de liquidação impugnado.
Para julgar procedente o presente fundamento da impugnação, a sentença esteou-se na fundamentação seguinte: «[c]onforme resulta dos autos e não se encontra controvertido pelas partes, no exercício de 2000, a impugnante alienou partes de capital que detinha nas sociedades “Imprensa SGPS” e “Banco Português Privado, SA”, pelo valor de €66.312.940,24, obtendo uma mais-valias contabilística de €52.013.239,36, e uma mais-valia fiscal de €44.306.543,20. // A impugnante, no anexo A da declaração de IRC do exercício de 2000, declarou a intenção de reinvestimento do valor de realização. // Ora, por força de tal declaração, a mais-valia fiscal obtida no exercício de 2000, ficou suspensa de tributação, por força do disposto no artigo 44.º do CIRC, à data em vigor, por remissão do n.º 2 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 495/88, de 30.12. // E efectivamente, a impugnante reinvestiu o valor total de realização de €66.312.940,24, do seguinte modo: - Em 2000, na aquisição de partes de capital da Imprensa, SGPS, SA, no valor de €37.826.015.75; // - Em 2003, na aquisição de partes de capital da Imprensa, SGPS, SA, no valor de €9.481.853,92; // - Em 2003, na aquisição de obrigações do tesouro, no valor de €19.499.499,21. // No exercício de 2004, a impugnante utilizou a faculdade prevista no regime transitório estabelecido no n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-8/2001, de 27 de Dezembro, para a tributação de mais-valias realizadas antes de 1 de Janeiro de 2001, objecto de reinvestimento. // Dispõe tal preceito legal que «[a] parte da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias, realizadas antes de 1 de Janeiro de 2001, cujo valor de realização tenha sido ou, no respectivo prazo legal, venha a ser objecto de reinvestimento em bens não reintegráveis pode, por opção do sujeito passivo, em alternativa ao regime previsto na alínea b), do n.º 7 da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, ser antecipadamente incluída na base tributável de qualquer exercício que seja anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, desde que posterior a 1 de Janeiro de 2001, por metade do seu valor, nos termos previstos no artigo 45.º do Código do IRC, na redacção dada pela presente lei, mas sem a exigência de novo reinvestimento subsequente consagrado neste último preceito». // Ora, é na interpretação deste preceito legal que reside a questão de fundo a decidir nos presentes autos. // Com efeito, no âmbito da acção de inspecção, com base em orientações administrativas relativas ao regime transitório previsto no n.º 8 do art.º 32.º, supra citado, designadamente, o parecer n.º 19/2003, do Centro de Estudos Fiscais de 28.04.2003, e uma informação vinculativa proferida no processo n.º 3582/2002, em que a impugnante, note-se, não era parte, entendeu a AT, em síntese, que “(…) uma vez feita a opção pelo regime instituído pela Lei n.º 109-B/2001, a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias suspensa de tributação deve ser incluída, na sua totalidade, no lucro tributável do exercício anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, na hipótese de ainda não ter sido incluída num exercício anterior”. // Ou seja, em tal entendimento subjaz a obrigatoriedade de incluir a totalidade da diferença entre as mais-valias e as menos-valias suspensas de tributação. Dito de outro modo, não se admite a possibilidade de, como no caso dos autos, o reinvestimento das mais-valias se ter operado na aquisição de vários activos, se incluir apenas a diferença entre as mais-valias e as menos-valias suspensas relativa a um dos activos. // Vejamos então. // Tal como já referimos, a Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, no seu art.º 8.º, vem estabelecer um regime transitório relativo à diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias realizadas antes de 01.01.2001, que foram objecto de reinvestimento. // Trata-se de um regime estabelecido em alternativa ao regime previsto na alínea b) do n.º 7 da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, e apenas pode ser desencadeado por opção exclusiva do sujeito passivo. // In casu, a impugnante acresceu no campo 225 do quadro 7 da declaração modelo 22, o valor de €6.360.204,26, relativo a 50% da mais-valia suspensa de tributação e associada às obrigações do tesouro, em que se concretizou parte do reinvestimento do valor de realização das partes de capital alienadas em 2000, sendo certo que em 2005, alienou tais obrigações. // Por conseguinte, desde logo, se dirá que, ainda que fosse de considerar, tal como a AT pretende, que a interpretação do preceito legal ora em causa, não admite que se inclua apenas a diferença entre as mais-valia e as menos-valia suspensa relativa a um dos activos, ainda assim, sempre a correcção enfermaria de vício de violação de lei, porquanto faltaria a opção da impugnante relativamente à totalidade dos activos, tal como é pressuposto da aplicação desse regime, considerando que apenas declarou parte, pelo que a AT não se pode substituir ao contribuinte e concluir que há que considerar a totalidade da diferença das mais-valias apuradas, quando a impugnante apenas manifestou a opção “parcial”. // Ou seja, a correcção sempre teria de ter assentado no entendimento de que a impugnante não optou devidamente pelo regime transitório, e por conseguinte, não estariam reunidos os pressupostos do mesmo, não sendo de o aplicar. O que não sucedeu, pelo que, desde logo, por esse motivo a correcção sempre enfermaria de vício de violação de lei. // Por outro lado, entende-se ainda que a interpretação dada pela AT ao n.º 8 art.º 32.º do diploma, em questão, não tem a mínima aderência à letra da lei. // Com efeito, e desde logo, no preceito legal em discussão, refere-se a “alienação do correspondente activo a que está associada” e não “activos”. // Ou seja, o legislador utiliza o singular, e não o plural, relativamente ao objecto de reinvestimento da mais-valia realizada antes de 1 de Janeiro de 2001. // Assim, fica patente que se pretendeu possibilitar a opção pelo regime transitório relativamente a cada dos activos nas quais as mais-valias foram reinvestidas. // Aliás, nada na letra da lei induz à interpretação que lhe é dada pela AT, nem tão-pouco fica demonstrado que a interpretação preconizada corresponde ao espírito da lei. // Na verdade, no art.º 11.º/1, da LGT o legislador consagrou a “regra geral” da interpretação das normas fiscais: “Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as normas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis”. // Assim, nos termos deste preceito legal, as normas tributárias interpretam-se de acordo com os princípios gerais de hermenêutica jurídica, ou seja, interpretam-se como quaisquer outras normas jurídicas, o que corresponde à doutrina tradicional em sede de interpretação da lei fiscal. Deste modo, prevalece a aplicação dos critérios estabelecidos no art.º 9.º do Código Civil. // Estabelece este preceito legal que a interpretação “não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”. // Mas não pode ser considerado pelo intérprete “o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
Em sentido contrário à solução interpretativa acolhida na sentença recorrida, coloca-se a orientação propugnada pela AT. A mesma extrai-se do parecer n.º 19/2003, do Centro de Estudos Fiscais, n.º 19/2003, de 28.04.2003, e assume os termos seguintes:
«Importa, por isso, em primeiro lugar, por em destaque as principais características que diferenciam os dois regimes transitórios que actualmente coexistem: o regime previsto no n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, que opera por opção do sujeito passivo e em alternativa ao anterior regime de diferimento ou de roll-over vertido na alínea b) do n.º 7 da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro. // Assim, recorrendo, para efeitos de interpretação do n.º 8 do artigo 32.º da Lei n.º 109-B/2001, à respectiva nota justificativa divulgada pela Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, constata-se que nela se refere que o mesmo teve em vista permitir que, relativamente à diferença positiva entre as mais-valias e as menos valias, realizadas anteriormente a 1 de Janeiro de 2001 e pendente de tributação “as empresas possam antecipar a tributação, para exercício anterior ao da alienação dos activos que concretizaram ou venham a concretizar o reinvestimento”, oferecendo-se como contrapartidas: um desagravamento fiscal – inclusão no lucro tributável em metade do seu valor – e a não exigência de novo reinvestimento. Ou seja, este regime vem claramente dissociar o momento da tributação das mais-valias (ou melhor, a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias) do momento da ocorrência da alienação dos activos a que estão associadas, ao contrário do que é preconizado pelo regime alternativo instituído pela Lei n.º 30-G/2000. Deste modo, as mais-valias podem perfeitamente ser integradas no lucro tributável de um qualquer exercício ainda que os correspondentes activos em que se concretizou o reinvestimento permaneçam no activo das empresas. Como consequência, outro elemento distintivo a salientar é o de que, diferentemente da redacção da alínea b), do n.º 7 do artigo 7.º da Lei n.º 30-G/2000, em que de forma expressa se consagra um critério de repartição proporcional daquela diferença positiva, para efeitos de tributação, em função do valor de realização dos activos em que se concretizou o reinvestimento, tal não sucede na redacção da norma que regula o novo regime porque a antecipação que lhe é inerente pressupõe que a tributação ocorra em exercício anterior. // Parece, pois, ser possível concluir que, uma vez feita a opção pelo regime instituído pela Lei n.º 109-B/2001, a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias suspensa de tributação deve ser incluída, na sua totalidade, no lucro tributável do exercício anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, na hipótese de ainda não ter sido incluída num exercício anterior. Resulta assim que, de acordo com esta tese interpretativa, o regine em apreço não deixa na total disponibilidade do contribuinte a escolha da modalidade – de uma só vez ou faseadamente, i.e., à e na medida da alienação dos activo – de inclusão daquela diferença positiva no lucro tributável de qualquer exercício desde que ultrapassado o limite temporal estabelecido, i.e., o exercício d alienação do correspondente activo. // Efectivamente, a lei não explicita se ao referir-se à “alienação” pretende abranger quer a alienação total, quer a alienação parcial do correspondente activo em que se concretizou o reinvestimento, todavia, é legítimo defender que se a intenção do legislador tivesse sido a de admitir a alienação parcial teria decerto aludido a critérios de repartição proporcional da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias - por exemplo, em função do custo de aquisição ou do respectivo valor de realização dos activos – à semelhança do previsto em outras disposições legais, como é o caso dos números 2 e 6 do artigo 45.º do CIRC ou da alínea b), do n.º 7 do artigo 7.º da Lei n.º 30.G/2000. // Em face do que precede, e mesmo reconhecendo que a ambiguidade da redacção da lei é propiciadora de dúvidas e de diferentes interpretações que, por si só, justificariam a divulgação de orientações administrativas, é também inegável que o objectivo que presidiu à criação desse novo regime foi o de “fazer desaparecer” o mais rapidamente possível as diferenças positivas entre as mais-valias e as menos-valias pendentes de tributação, e para que esse desiderato seja cumprido afigura-se que deveria ser fixado o entendimento segundo o qual o limite temporal para que aquela diferença seja incluída, na sua totalidade, no lucro tributável é o do exercício anterior ao da alienação total ou parcial do “correspondente activo a que está associada”».
Vejamos.
Como se escreve no Acórdão do STA, de 22.05.2013, P. 01041/11, «[u]ma correcta aproximação do problema pressupõe que se analise a evolução do regime de tributação das mais valias obtidas por SGPS em caso de reinvestimento até à sua revisão pela Lei do Orçamento de Estado de 2002 (Lei nº 109-B/2001)». Até 2000, o regime fiscal destas sociedades encontra-se regulado no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro, que determinava que «[à]s mais-valias e menos-valias obtidas pelas SGPS, mediante a venda ou troca das quotas ou acções de que sejam titulares, é aplicável o disposto no art.º 44.º do CIRC, sempre que o respectivo valor de realização seja reinvestido, total ou parcialmente, na aquisição de outras quotas, acções ou títulos emitidos pelo Estado, no prazo aí fixado». «Ou seja, era diferida a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias realizada sempre que o valor de realização fosse reinvestido até ao fim do segundo exercício seguinte ao da sua realização» (1). «Contudo, nos termos do regime introduzido pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro (vulgarizada por ‘Lei da Reforma Fiscal”), cuja entrada em vigor ocorreu a 1 de Janeiro de 2001, o regime das mais-valias apuradas pelas SGPS foi alterado, passando a ser possível apenas diferir, durante cinco anos, a tributação das mais-valias resultantes da alienação por venda ou troca de acções ou quotas em caso de reinvestimento do correspondente valor de realização em novas participações sociais entre o início do exercício anterior e o final do segundo exercício seguinte ao dessa realização. Ao abrigo deste sistema, um quinto da mais-valia seria tributada no ano da alienação e os quatro quintos restantes ao longo dos quatro exercícios subsequentes» (2) (3) Nas palavras da lei [artigo 45.º/1, do CIRC], «[a mais-valia realizada] é considerada por um quinto do seu valor no exercício da respectiva realização e por igual montante em cada um dos quatro exercícios subsequentes, sempre que, no exercício anterior ao da realização, no próprio exercício, ou até ao fim do segundo exercício seguinte, o valor de realização (…) seja reinvestido». Em síntese, dir-se-á que as alterações introduzidas pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, são as seguintes: «[i] de acordo com o n.º 1 do artigo 45.º do CIRC, a mais-valia líquida realizada na transmissão onerosa de elementos do activo imobilizado, é considerada por um quinto do seu valor no exercício seguinte ao da realização e por igual montante nos 4 exercícios seguintes posteriores, desde que o valor realizado seja reinvestido na aquisição, fabricação ou construção de elementos do activo imobilizado corpóreo afectos à exploração; // [ii] o regime é aplicável apenas às mais-valias apuradas nos períodos de tributação iniciados a partir de Janeiro de 2001; // [iii] é previsto um regime transitório, que vem definir o tratamento a dar às mais-valias realizadas até ao início da vigência da Lei, determinando que se existir reinvestimento até ao fim do 2.º exercício ao da realização, mantém-se o regime de exclusão até ao momento da alienação dos bens em que se havia concretizado o reinvestimento e é deferida a tributação destas mais-valias pelo período de 10 anos a contar do ano de realização» (4). Mais se refere que o regime do artigo 45.º do CIRC é aplicável às mais-valias obtidas por SGPS ex vi do artigo 31.º/2, do EBF.
«Com a entrada em vigor da referida Lei n.º 109-B/2001 de 27 de Dezembro [Lei do Orçamento de Estado para 2002] passou a aplicar-se ao regime fiscal das SGPS o disposto nos n.º 1 e 5.º do art. 46.º do CIRC (redacção então em vigor) e nos n.os 1 e 4. do art. 45.º do mesmo diploma, conforme previsto no n.º 1 do art. 31.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Assim, de harmonia com este normativo, na redacção que lhe foi conferida Lei nº 109-B/01, de 27/12, às SGPS e às SCR era aplicável o disposto nos n.os 1 e 5 do artigo 46.º do Código do IRC, sem dependência dos requisitos aí exigidos quanto à percentagem de participação e ao período de detenção, bem como o disposto no n.º 1 e no n.º 4 do artigo 45.º daquele Código, neste último caso sem dependência dos requisitos aí exigidos quanto à percentagem de participação. Por força deste regime, e da remissão do artº 31º do EBF, a mais valia líquida seria considerada em metade do seu valor, se no exercício anterior ao da realização, no próprio exercício ou até ao fim do 2º exercício seguinte, se verificasse o reinvestimento do valor de realização» (5) (6).
«Porém a referida Lei de Orçamento de Estado de 2002 introduziu também um regime transitório alternativo ao regime de diferimento previsto pela Lei n.º 30 - G/2000, regulado pelos n.os 8 e 9 do supra referido artº 32º. De acordo com tal regime transitório a parte da diferença positiva das mais e menos-valias realizadas antes de Janeiro de 2001 cujo valor de realização tivesse sido ou viesse a ser reinvestido, podia ser antecipadamente incluída na base tributável de qualquer exercício anterior ao da alienação, desde que posterior a Janeiro de 2001, por metade do seu valor, mas sem exigência de novo reinvestimento. Por outro lado, às mais-valias realizadas em 2001, possibilitava-se a opção pelo regime de diferimento previsto na Lei 30-G/2000 (5 anos desde que existisse reinvestimento) ou pelo regime de exclusão parcial da tributação previsto na Lei n.º 109-B/2001 (tributação de 50% da diferença positiva entre mais e menos-valias)» (7).
«Posteriormente a Lei de Orçamento de Estado 2003, veio alterar o regime de tributação das mais-valias detidas pelas SGPS estabelecendo, através do artº 31º, nº 2 do EBF um regime de exclusão de tributação das mais-valias realizadas na transmissão onerosa de participações detidas por período superior a um ano, estabelecendo também que as menos-valias e os encargos financeiros suportados com a aquisição das partes sociais deixam de concorrer para a formação do lucro tributável» (8) (9).
O dissídio entre as partes reside, pois, na interpretação a dar ao disposto no artigo 32.º/8, da Lei do Orçamento de Estado para 2002 (Lei n.º 109-B/2001). Para a impugnante e para a sentença recorrida, a norma permite, em relação às mais-valias realizadas em exercícios anteriores a Janeiro de 2001, cujo valor de realização tenha sido reinvestido, na íntegra, a sua integração na base tributável de qualquer exercício anterior ao da alienação, por metade do seu valor, sem a exigência de novo investimento, na proporção do valor objecto de alienação. É o presente entendimento que é colocado sob a censura da presente intenção recursória.
A este propósito dir-se-á que o imperativo de interpretação dos preceitos legais assenta na referência ao sistema jurídico e aos princípios que lhe são estruturantes, aos lugares paralelos do sistema e à teleologia das normas jurídicas, desde que dentro do limite dos sentidos literais possíveis da disposição legislativa (artigos 9.º do Código Civil e 11.º da LGT). Constituindo a norma ou regra jurídica o sentido preceptivo que se extrai dos textos legais em função do seu sistema interno, importa aquilatar da ratio que subjaz ao regime de tributação de mais-valias realizadas por SGPS. Desde já se diga que o referido regime não se distingue das mais-valias realizadas pelas demais sociedades. «Com este regime pretendeu o legislador incentivar o investimento produtivo por parte das empresas, permitindo-lhes deduzir ao lucro tributável do exercício as mais valias realizadas, obtendo-se desta forma uma exclusão de tributação das mesmas (apenas) no exercício em que são geradas (…). // Trata-se, mais precisamente, não de uma exclusão de tributação mas de um diferimento da mesma. // Ora o regime transitório introduzido pelo artº 32º, nº 8 da Lei de Orçamento de Estado, permitindo a antecipação da tributação da parte da diferença positiva das mais e menos-valias realizadas antes de Janeiro de 2001 cujo valor de realização tivesse sido ou viesse a ser reinvestido é, também, ainda assim, um regime de reinvestimento. // De facto, como se esclarece nas Notas Prévias do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais ao Orçamento de Estado de 2002 não é objectivo deste regime optativo dispensar o reinvestimento a que as empresas se comprometeram, no exercício da realização, para efeitos da suspensão e diferimento da tributação de mais valias, apenas não se exige um novo reinvestimento subsequente (…). // Assim, (…), residindo a teleologia de um tal regime de suspensão e diferimento de tributação de mais-valias no reinvestimento do valor realizado com a alienação do activo que operou a mais-valia, forçoso é concluir que constitui elemento basilar de tal regime a conexão entre o valor de realização, o reinvestimento e as mais valias que lhe são subjacentes, pelo que havendo reinvestimento parcial, a redução na tributação será proporcional. // (…). // Daí que (…) se possa concluir que, tal como sucede no regime especial de tributação das mais e menos valias previsto no artigo 45.º do Código do IRC, se apenas se verificar o reinvestimento parcial do valor de realização, a aplicação do regime referido se circunscreverá à parte proporcional da diferença positiva entre as mais e as menos valias a que o mesmo se refere (…), sendo que será essa parte que será antecipadamente incluída, por metade do seu valor, na base tributável de qualquer exercício que seja anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada» (10).
Descendo ao caso dos autos, do probatório resultam os elementos seguintes:
1) No exercício de 2000, a impugnante obteve mais-valias fiscais com alienação de participações sociais, no montante de €44.306.543,20.
2) No exercício de 2000, a impugnante deduziu ao campo 229 – mais-valias contabilísticas da declaração de rendimentos o montante de €52.013.239,36.
3) A mais-valia obtida ficou suspensa de tributação, nos termos do artigo 44.º do CIRC, uma vez que a impugnante mencionou a intenção de reinvestimento do valor de realização.
4) O valor de realização foi completamente reinvestido.
5) No exercício de 2004, a impugnante declarou optar pelo regime previsto no artigo 32.º/8 e 9, da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, tendo acrescido ao campo 225, do quadro 07, da declaração de rendimentos do exercício de 2004, o valor de €6.360.204,26, relativa a 50% da mais-valia suspensa de tributação.
6) No exercício de 2005, a impugnante alienou parte dos títulos associados ao reinvestimento.
Em face dos dados coligidos nos autos, outra não pode ser a solução que a acolhida pela AT, pelas razões que se enunciam de imediato:
1) É certo que assiste ao contribuinte a possibilidade de optar entre o diferimento da tributação e a inclusão de 50% do saldo das mais-valias no exercício anterior ao da alienação do activo; essa opção é realizada aquando da decisão do reinvestimento, tendo em vista o deferimento da tributação; o contribuinte pode optar quer pelo reinvestimento integral das mais-valias obtidas, com o inerente diferimento da tributação quer pela tributação das mais-valias realizadas. A possibilidade de rever a escolha efectuada no passado é preservada pela existência dos dois regimes alternativos de direito transitório em que ambas as soluções são possíveis: o diferimento da tributação, fraccionada e proporcionada ou a tributação antecipada, com redução de 50%.
2) É que recorde-se, estando em causa um benefício fiscal, a norma que o consagra deve ser interpretada de acordo com o disposto no artigo 9.º do EBF, com a reposição automática da tributação-regra, uma vez cessados os respectivos pressupostos; no caso, sendo ambos os regimes de direito transitório alternativos (o da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro e o da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro), regimes de reinvestimento, não se vê como pode o legislador reduzir em 50% a tributação das mais-valias obtidas em relação a cada activo, entretanto, alienado, dado que essa alienação, não assume relevância, depois de 2002, do ponto de vista da suspensão ou do diferimento da tributação das mais-valias. Com efeito, com a redacção introduzida ao artigo 31.º/2 do EBF, pela Lei de Orçamento de Estado para 2003 [Lei n.º 32-B/2002, de 20 de Dezembro], passou a vigorar a exclusão da tributação das mais-valias obtidas na alienação de participações sociais por parte de SGPS/sociedades gestoras de participações sociais ou SCR/sociedades de capital de risco, desde que detidas por período não inferior a um ano.
3) Sendo o reinvestimento a condição de obtenção do benefício fiscal, através do diferimento ou suspensão da tributação, a opção do contribuinte é, antes de mais, aquela que resulta da suspensão da tributação por via do reinvestimento, uma vez que decide diferir no tempo o momento da tributação, em vez de dar, no momento da realização, a mais-valia obtida à tributação. Opção que o contribuinte continua a poder efectuar através dos regimes de direito transitório alternativos, ou seja: escolher entre o diferimento proporcional ao reinvestimento e fraccionado no tempo da tributação das mais-valias realizadas e a antecipação da tributação das mesmas, por metade do seu valor, aquando da alienação dos activos a que estão associadas.
4) A opção por um dos dois regimes transitórios alternativos (o da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro e o da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro) é uma opção efectuada no quadro da escolha essencial, feita a montante, de diferir a tributação das mais-valias obtidas, cumprindo o requisito do reinvestimento das mesmas; donde resulta que assiste ao contribuinte a faculdade de optar entre o diferimento da tributação, durante dez anos, a contar da data da realização, em fracções iguais, caso se concretize, nos termos da lei, o reinvestimento da parte do valor de realização que proporcionalmente lhe corresponder (artigo 7.º/b) da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro) ou a antecipação da tributação de metade do valor das mais-valias realizadas, em qualquer exercício anterior ao da alienação do correspondente activo a que está associada, desde que posterior a 1 de Janeiro de 2001 (artigo 32.º/8, da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro). Dos preceitos da lei, da sua economia interna, resultam duas opções, as quais são mutuamente excludentes, isto é: ou se opta pelo diferimento proporcional ao reinvestimento e fraccionado no tempo da tributação das mais-valias obtidas ou se opta pela antecipação da sua tributação por metade do seu valor, com extinção do regime de diferimento.
5) O diferimento da tributação não permite a redução do valor da matéria colectável ao invés do que sucede com o regime de antecipação; o regime de antecipação não permite o fraccionamento e a tributação casuística em função do valor da mais-valia associada ao activo alienado e-ou não reinvestido.
6) No caso em exame, tendo sido reinvestido o montante integral das mais-valias realizadas, mas suspensas de tributação, e tendo sido alienado um dos activos a que está associado o reinvestimento, o contribuinte escolheu a cessação do regime de diferimento, com a tributação do valor total das mais-valias suspensas, ainda que reduzido a metade.
Em face do acima escrito, a sentença recorrida, na parte em que decidiu anular o acto tributário sindicado, com fundamento em violação de lei/erro nos pressupostos de direito, não pode manter-se na ordem jurídica, devendo ser revogada, salvo se houver outros fundamentos da impugnação que possam servir-lhe de esteio.
Importa, pois, conhecer dos demais fundamentos da impugnação, cujo conhecimento é determinado pela ampliação do objecto do recurso, requerida pela recorrida.


2.2.4. No que respeita ao erro de julgamento quanto à preterição do prazo de caducidade do direito à liquidação [conclusões XL a XLIII]
Sob o presente item, a recorrente invoca que o prazo de caducidade do direito à liquidação era de três anos, por se verificar erro evidenciado na declaração de imposto, pelo que o mesmo devia ter sido declarado caduco.
Cumpre repristinar, nesta sede, o discurso fundamentador da sentença recorrida, sendo de referir como segue.
«Invoca a Impugnante vício de violação de lei por caducidade do direito à liquidação, nos termos do disposto no art. 45.º, n.º 2 da LGT, por já ter decorrido o prazo de três anos sobre o erro evidenciado na declaração. // Neste contexto, a Impugnante entende que, aquando a emissão da liquidação em 2008, já havia decorrido o prazo de caducidade supra referido, quer se considere a data do facto tributário o ano de 2000, ou 2004. // Dispõe o n.º 2 do art. 45.º da LGT que “2 - Nos casos de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo ou de utilização de métodos indirectos por motivo da aplicação à situação tributária do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade previstos na presente lei, o prazo de caducidade referido no número anterior é de três anos.” // Ou seja, no caso de erro evidenciado na declaração, o prazo de caducidade do direito de liquidação é de 3 anos. // Assim, verifica-se um erro evidenciado na declaração, quando a AT possa detectar um erro com base no simples exame da declaração e seus anexos sem recurso a quaisquer outros documentos. // Nesse sentido, no Ac. do STA de 14/06/2012, processo n.º 0402/12, decidiu-se que “[p]or erro evidenciado na declaração do sujeito passivo deve entender-se aquele que é detectável mediante simples leitura ou análise sumária da declaração.” // Nesse mesmo sentido, o erro evidenciado na declaração é “aquele que é detectável mediante simples análise da declaração” (cfr. Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária, Comentada e Anotada, 3ª Edição, 2003, Anotação 9 ao art. 45º), ou, no dizer de Lima Guerreiro (Lei Geral Tributária, Anotada, Rei dos Livros, Nota 2 ao art. 45º, pag. 214), “o erro que a AT possa detectar por um mero exame da coerência dos seus elementos, sem recurso a qualquer outra documentação externa, mesmo quando esta esteja em poder da administração tributária, e obtida por inspecção interna ou externa ou por meios de qualquer outra natureza.” // Ora, considerando que o que está em causa é saber se há ou não inclusão da totalidade da mais-valia suspensa derivada da opção pelo regime instituído na Lei n.º 109-B/2001, não se apura pela simples leitura da declaração modelo 22, implicando, ao invés, uma análise de diversa factualidade e de documentação para que este fosse detectado. // Assim sendo, não estamos perante um erro que resulte evidenciado através da simples leitura da declaração de modelo 22, e nessa medida, não se aplica o n.º 2 do art. 45.º da LGT, mas sim o n.º 1, que estabelece o prazo geral de 4 anos. // Deste modo, considerando que o prazo de 4 anos previsto no disposto no n.º 1 do art. 45.º da LGT, conta-se a partir de 1 de Janeiro de 2005 (conforme supra exposto, o facto tributário verifica-se quando cessa o diferimento da tributação, ou seja em 2004 para efeitos do n.º 4 do preceito legal em causa), e que a liquidação foi emitida em 29/12/2008, não se verifica a caducidade do direito de liquidação. // Por conseguinte, não se verifica o vício de violação de lei, por caducidade do direito de liquidação».
Não se apura erro na presente argumentação, pela que a mesma é de manter.
Em face do exposto, impõe-se julgar improcedente a presente questão.

2.2.5. No que respeita ao erro de julgamento quanto à violação do dever de fundamentação clara, suficiente e completa do acto de liquidação [conclusões XLIV a XLVI]
Sob o presente item, a recorrida invoca a preterição do dever de fundamentação expressa do acto de liquidação, vício que não foi devidamente apreciado pela sentença recorrida, defende.
Cumpre repristinar, nesta sede, o discurso fundamentador da sentença recorrida, sendo de referir como segue.
«Relativamente ao vício de falta de fundamentação (art. 77.º da LGT, e 268.º, n.º 3 da CRP), invocado pela Impugnante, porquanto entende que, o acto tributário se baseia num relatório, cuja fundamentação assenta em pareceres contraditórios, ambíguos e inconcludente, de igual modo não assiste razão à Impugnante. // O princípio constitucional da fundamentação dos actos administrativos (art. 268° n°3 CRP) encontra-se densificado nos artigos 124.° e 125.° CPA e no art. 77.° n.°s 1 e 2 LGT. // O direito à fundamentação do acto tributário, ou em matéria tributária, constitui uma garantia específica dos contribuintes e, como tal, visa responder às necessidades do seu esclarecimento, procurando-se informá-lo do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto por forma a permitir-lhe conhecer as razões de facto e de direito que determinaram a sua prática e porque motivo se decidiu num sentido e não noutro. // Tem, aliás, conforme expresso no Acórdão do STA de 02/02/2006, Procº nº 1114/05, "o dever legal de fundamentação, a par de uma função exógena- dar conhecimento ao administrado das razões da decisão, permitindo-lhe optar pela aceitação do acto ou pela sua impugnação-, uma função endógena consistente na própria ponderação do ente administrador, de forma cuidada e séria". // Neste sentido, a fundamentação deve externar, de forma sucinta, os elementos e critérios de facto e de direito que serviram de suporte à decisão tomada, por forma a possibilitar aos interessados uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa (artigo 77.º n.º 1 da LGT). // Fundamentação essa que tem de ser contextual, ou seja, contemporânea e integrada no próprio acto, ainda que sob forma remissiva, na perspectiva da respectiva sindicabilidade na via contenciosa. // A fundamentação do acto administrativo há-de ser expressa, traduzida na exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que pela leitura do seu teor se apreendam com precisão os factos e as normas jurídicas conducentes à decisão; suficiente, permitindo um conhecimento concreto da motivação da decisão; congruente, por forma a que a decisão seja a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação. // Por outro lado, é equivalente à falta de fundamentação, a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareça, concretamente, a motivação do acto. // As características enunciadas são exigência da fundamentação formal do acto tributário, sendo distintas da chamada fundamentação substancial, a qual deve exprimir a real verificação dos pressupostos de facto invocados e a correcta interpretação e aplicação das normas indicadas como fundamento jurídico. // Aplicando o supra exposto ao caso dos autos, o relatório de inspecção encontra-se devidamente fundamentado, indicando de forma suficiente, adequada e clara, os factos relevantes para a correcção (cfr. ponto III.1 do relatório de inspecção), e identificando a legislação aplicável aos factos (cfr. ponto III.2 do relatório de inspecção). // Por outro lado, o facto de se analisarem orientações administrativas relativas ao regime transitório das mais-valias não torna o parecer confuso ou contraditório, repare-se que no fim da alusão ao referido regime, há o cuidado de, com base nele, se extrair as consequências jurídicas para a Impugnante. // Com efeito, conclui-se de forma clara que “Feita a opção pelo regime instituído na Lei n.º 109-8/2001, a totalidade da diferença positiva entre as mais valias e as menos valias suspensa de tributação deve ser incluída em 50%, no lucro tributável de qualquer exercício anterior ao da alienação total ou parcial dos activos. Ou seja, o limite temporal para que a totalidade daquela diferença seja incluída, em 50%, no lucro tributável é o exercício anterior ao da alienação de qualquer dos activos a que está associada, não podendo o sujeito passivo optar por incluir tal diferença de uma só vez ou faseadamente se e na medida da alienação de cada um desses activos". // Ou seja, a fundamentação constante do relatório de inspecção é adequada e suficiente para que um destinatário normal compreenda o percurso cognoscitivo que conduziu à correcção em causa. // Por conseguinte, não se verifica o vício invocado pela Impugnante».
Não se apura na presente argumentação, pela que a mesma é de manter.
Em face do exposto, impõe-se julgar improcedente a presente questão.

2.2.6. No que respeita ao erro de julgamento quanto à violação dos princípios da confiança e da boa fé [conclusões XLVII a XVLIII]
A recorrida censura a sentença recorrida por ter desvalorizado o argumento segundo o qual a recorrida não podia contar com regime que foi aplicado ao caso, o qual se mostra excessivo e desproporcionado.
É o seguinte o discurso fundamentador a sentença:
«A Impugnante invoca ainda, o vício de violação de lei por violação dos princípios da boa-fé e da confiança (art. 266.º da CRP), porquanto, a correcção se revela uma penalização mais gravosa do que aplicar o regime anterior sem considerar o reinvestimento, isto é, sem liquidar o IRC pela parte do reinvestimento não realizado, relevando apenas o acréscimo à matéria colectável do exercício de 2004 já feito e o imposto já pago. // No entanto, não se verifica a invocada violação. Com efeito, a circunstância de um determinado regime jurídico fiscal anterior ser mais favorável não consubstancia qualquer violação do princípio da boa-fé e da confiança, pois em matéria fiscal, sendo ainda certo que não se encontra constitucionalmente estatuído qualquer princípio da aplicação da lei mais favorável que possa criar expectativas legítimas dignas de tutela. // Por conseguinte, não se verifica o vício invocado».
Como se sabe, o princípio da protecção da confiança é um padrão fundamental da actuação da AF. «Sem a possibilidade, juridicamente, garantida, de poder calcular e prever os possíveis desenvolvimentos da actuação dos poderes públicos susceptíveis de se repercutirem na sua esfera jurídica, o individuo converter-se-ia, em última análise com violação do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, em mero objecto do acontecer estatal» (11). Mais se dirá que nas situações de retroactividade inautêntica ou retrospectividade, «a protecção do cidadão procura-se por outros meios, designadamente através dos direitos fundamentais – saber se a nova normação jurídica tocou desproporcionada, desadequada e desnecessariamente dimensões importantes dos direitos fundamentais, ou se o legislador teve o cuidado de prever uma disciplina transitória justa para as situações em causa» (12).
No caso em exame, a recorrida parece confundir dois planos distintos, a saber: o da modificação legislativa do regime da tributação de mais-valias obtidas com a alienação das participações sociais e o dos regimes de direito material transitório aprovados precisamente para acomodar as expectativas dos sujeitos jurídicos. É que, se em relação ao plano das modificações legislativas, se pode afirmar que «a tributação das mais e menos-valias tem sido sujeita a diversas vicissitudes que têm variado desde a consideração de um regime de total exclusão de tributação, diferimento da tributação condicionado ao reinvestimento, exclusão parcial de tributação igualmente condicionado ao reinvestimento até ao regime “específico” hoje previsto no EBF, criado pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (Lei do OE 2003)» (13), não menos verdade é que, no plano do direito transitório material, as soluções inscritas pelo legislador, quer na Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, quer Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, contemplam as expectativas dos destinatários das modificações legislativas em causa, permitindo-lhe optar entre o diferimento da tributação, fraccionada no tempo e proporcional ao valor do reinvestimento e a sua antecipação, por metade do valor de realização. Acresce que a impugnante, na presença de dois regimes de direito transitório material distintos e alternativos, não se quedou indiferente perante os mesmos, tendo optado pela aplicação de um deles.
Acresce que no procedimento de liquidação do imposto, constante do probatório, não se apura violação dos deveres de colaboração e de boa fé a cargo da AF, tanto mais que o entendimento em causa nos autos foi veiculado pela mesma através de circulares interpretativas a que a impugnante tinha acesso.
Em face do exposto, impõe-se concluir pela improcedência da presente imputação.

2.2.7. Do erro de julgamento quanto à violação do princípio da proporcionalidade [conclusões XLIX a LIII]
Na tese da recorrida, o entendimento da norma em causa nos autos no sentido de sujeitar à tributação todas as mais-valias suspensas quando apenas foi vendido um dos bens em que se concretizou o reinvestimento, mantendo-se todos os demais na esfera do contribuinte, é violadora dos princípios constitucionais da proporcionalidade, da boa fé e da confiança.
A este propósito, dir-se-á, por um lado, que constitui jurisprudência constitucional assente a de que: «a) a afectação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação na ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas deles constantes não possam contar, e ainda, // b) quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes», por outro, lado, que, o princípio da proporcionalidade assume três dimensões normativas, a saber: adequação – a medida adoptada deve ser apta à prossecução do fim a ela subjacente; exigibilidade ou necessidade – a medida deve ser a menos gravosa possível para a esfera jurídica do seu destinatário; proporcionalidade em sentido estrito – deve existir uma relação justa, ponderada entre os meios e os fins.
No caso em exame, verifica-se que, perante a sucessão de regimes legais de tributação das mais-valias, o legislador criou regimes transitórios materiais que permitem acomodar as expectativas dos sujeitos jurídicos. O desagravamento fiscal é obtido, no caso, quer através da opção pela redução da matéria colectável em 50%, permitida pelo disposto no artigo 32.º/8, da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, ainda que com a antecipação da tributação no exercício anterior ao da alineação do activo a que está associada, quer pela possibilidade de opção pelo diferimento da tributação pelo prazo de dez anos, desde a data da realização, nos termos do artigo 7.º/b), da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro.
Em face do exposto, não se antolha o alegado excesso ou desequilíbrio na referida normação e na sua aplicação ao caso concreto.
Termos em que se impor julgar improcedente a presente imputação.

Com a revogação da sentença, na parte em que determinou a anulação do acto tributário, os segmentos decisórios que dele dependem também não podem subsistir; ou seja, a anulação da liquidação de juros compensatórios, a anulação da derrama e a condenação na indemnização por prestação de garantia não podem subsistir, na medida em que dependem do invocado erro de direito da liquidação, o qual não se substantiva nos autos, nos termos vistos, pelo que se impõe também a sua revogação.
Sem embargo, no que respeita ao arbitramento de juros compensatórios, importa apreciar se a respectiva liquidação não soçobra perante os demais vícios que lhe são assacados pela impugnante.
A recorrida insurge-se contra a referida liquidação, quer por falta dos requisitos de que dependa a constituição da obrigação indemnizatória em apreço, quer por falta de fundamentação.
Estatui o artigo 35.º/1, da LGT, que «[s]ão devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente ou retido no âmbito da substituição tributária». Nos termos do artigo 35.º/9, da LGT, «[a] liquidação deve sempre evidenciar claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respectivo cálculo e distinguindo-os de outras prestações devidas». No mesmo sentido depõe o disposto no artigo 94.º do CIRC.
No caso, em exame, verifica-se que o imposto não foi pago, na sua totalidade, por motivo imputável ao contribuinte, uma vez que não procedeu à autoliquidação do mesmo, nos termos que são devidos. No entanto, considerando a incerteza do regime jurídico-fiscal aplicável, em razão quer da sucessão de regimes legais, quer da imperfeição da técnica legislativa utilizada, dir-se-á que o erro em que incorreu o contribuinte é desculpável, atendendo ao padrão de exigibilidade médio, em função das circunstâncias do caso concreto. Impõe-se, por isso, julgar procedente a impugnação no que respeita à liquidação de juros compensatórios.
Motivo porque julga procedente a presente imputação.
DISPOSITIVO
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em, concedendo provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, revogar a sentença recorrida, nessa parte; em negar provimento ao recurso interposto pela impugnante, mantendo, nessa parte, a sentença recorrida; em substituição, julgar improcedentes os pedidos de anulação da derrama e de condenação na indemnização por prestação de garantia e julgar procedente o pedido de anulação da liquidação de juros compensatórios.
Custas pela recorrida, em ambas as instâncias, na proporção do decaimento.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)

(1º. Adjunto)

(2º. Adjunto)
(1) Miguel Luís Cortês Pinto de Melo, A tributação das mais-valias realizadas na transmissão onerosa de partes de capital pelas SGPS, Almedina, 2007, p. 49.
(2) Acórdão do STA, de 22.05.2013, P. 01041/11, citado.
(3) Artigo 7.º/10, da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro - «A remissão constante do artigo 7.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro, que estabelece o regime fiscal aplicável às mais-valias e menos-valias obtidas pelas sociedades gestoras de participações sociais, mediante a venda ou troca das quotas ou acções de que sejam titulares e que constituam imobilizações financeiras, considera-se efectuada para o artigo 44.º do Código do IRC, com a redacção em vigor no momento da realização das mais-valias e menos-valias».
(4) Miguel Luís Cortês Pinto de Melo, A tributação das mais-valias realizadas na transmissão onerosa de partes de capital pelas SGPS, Almedina, 2007, p. 49.
(5) Acórdão do STA, de 22.05.2013, P. 01041/11, citado.
(6) O artigo 45.º/1, do CIRC, passa a ter a redacção seguinte: «Para efeitos de determinação do lucro tributável, a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias, calculadas nos termos dos artigos anteriores, realizadas mediante a transmissão onerosa de elementos do activo imobilizado corpóreo, detidos por um período não inferior a um ano, ou em consequência de indemnizações por sinistros ocorridos nestes elementos, é considerada em metade do seu valor, sempre que, no exercício anterior ao da realização, no próprio exercício ou até ao fim do segundo exercício seguinte, o valor de realização correspondente à totalidade dos referidos elementos seja reinvestido na aquisição, fabricação ou construção de elementos do activo imobilizado corpóreo afectos à exploração, com excepção dos bens adquiridos em estado de uso a sujeito passivo de IRS ou IRC com o qual existam relações especiais nos termos definidos no n.º 4 do artigo 58.º».
(7) Acórdão do STA, de 22.05.2013, P. 01041/11, citado.
(8) Acórdão do STA, de 22.05.2013, P. 01041/11, citado.
(9) V. sobre a evolução legislativa, Miguel Luís Cortês Pinto de Melo, A tributação das mais-valias realizadas na transmissão onerosa de partes de capital pelas SGPS, Almedina, 2007, pp. 49/54.
(10) Acórdão do STA, de 22.05.2013, P. 01041/11, citado.
(11) Jorge Reis Novais, Os princípios constitucionais estruturantes a República Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, p. 262.
(12) José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 3.ª Ed., p. 257.
(13) Júlio Tormenta, As sociedades gestoras de participações sociais como instrumento de planeamento fiscal e os seus limites, Coimbra Editora, 2001, p. 139.