Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:75/09.7BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:07/09/2020
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:RITI
TRANSMISSÕES INTRACOMUNITÁRIAS
PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS
Sumário:
I. O RITI aplica-se exclusivamente às transmissões de bens, não se aplicando, pois, às prestações de serviços intracomunitárias.

II. Se do teor das faturas resulta estar-se perante prestações de serviços, não tendo sido nunca posta em causa a correspondência entre este descritivo e a realidade, não se está no âmbito de aplicação do RITI, ainda que, erroneamente, o emitente da fatura tenha aposto a menção de se tratar de operação isenta ao abrigo do art.º 14.º do RITI.

III. Nas transmissões intracomunitárias de bens com instalação ou montagem noutro Estado Membro da União Europeia os movimentos dos bens não dão origem a transações intracomunitárias de bens.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 07.12.2016, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por M….., Lda (doravante Recorrida ou Impugnante), que teve por objeto o indeferimento do recurso hierárquico apresentado na sequência do indeferimento da reclamação graciosa que versou sobre as liquidações adicionais de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e as dos respetivos juros compensatórios, relativas aos anos de 1996 e 1997.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

“A) O presente recurso visa demonstrar à evidência o desacerto da posição sufragada pela douta decisão recorrida, no segmento da correcção que tomou por não verificada a isenção prevista no art. 14°, n° 1, alínea a), do RITI relativamente ao enquadramento jurídico dos factos titulados nas faturas n° ….., ….., …..e ….., desacerto que deriva, salvo melhor opinião, da incorreta valoração da prova, nomeadamente da prova documental - que logrou olvidar a informação que nela se mostra enunciada, e bem assim, da sua indissociável conjugação em função do rigor formalista do IVA (atentas as razões de interesse público que se visam proteger, como seja a fraude fiscal); do enquadramento da actividade da Impugnante para efeitos fiscais, dos seus deveres de colaboração, da posição que a própria assumiu em sede de procedimento administrativo e da inversão de sentido que logrou tomar em sede de Impugnação Judicial, e do ónus da prova que sobre ela recaiu, à luz do art. 74° da LGT, e subsidiariamente do art. 75°, n° 1 e 2, alíneas a) e b), da LGT.

B) Os SIT suportaram-se no facto do adquirente dos serviços não ter comprovado ser sujeito passivo noutro Estado membro, pois o número de identificação fiscal que nelas figura é inválido para efeitos de IVA, e na circunstância da empresa não possuir qualquer tipo de documento que comprovasse a isenção das operações efectuadas não obstante constar de cada uma das referidas faturas a menção "isento de IVA ao abrigo do art.14 do n.° 1, alínea a) do RITI", (factos provados C, D, E e H), para concluir que não se mostravam verificados os pressupostos da isenção prevista no art. 14°, n° 1, alínea a), do RITI

C) É facto admitido, consta do probatório e decorre do RIT que, a Impugnante no âmbito da sua actividade económica se dedicava à transmissão intracomunitária de bens, mostrando-se enquadrada em termos fiscais nesse sentido.

D) Está em causa a observação de operações eventualmente isentas, não sendo de menosprezar que, do ponto de vista jurídico e na ótica da relação jurídica do imposto, um facto ou uma operação isenta, não deixa de estar sujeita a imposto à luz das regras de incidência, embora sobre ela recaia um facto impeditivo da tributação-regra.

E) Não será de descurar, ademais, o rigor formalista que está presente no IVA, consabido que é, no âmbito deste imposto que foi intenção do legislador exigir mais da regularidade formal da documentação, motivado pelas preocupações atinentes à fraude fiscal (assim pelo menos é entendido pela jurisprudência consolidada dos nossos tribunais superiores), especialmente no que respeita à fraude internacional.

F) O douto tribunal a quo observou a fatura, nomeadamente, os serviços lá descritos; dá conta da existência da irregularidade no preenchimento da fatura com uma menção que face ao alegado pela Impugnante e que decorre da sua escrita se afigura ininteligível - Todavia, e à revelia das regras da experiência comum e da apreciação conjugada da prova isso não o impediu de inusitadamente se convencer que estamos perante a mera prestação de serviços.

G) Ignorou, por um lado, que a mera enunciação nas faturas do serviço prestado não é critério suficiente para atingir este desiderato, pois que tratando-se de transmissões intracomunitárias de bens com instalação ou montagem, a descrição do serviço não deixa de necessariamente figurar na fatura e, não obstante, a operação em causa não deixa de ser enquadrada como transmissão intracomunitária de bens, à luz do art. 9o do RITI. Por si só a descrição do serviço como seja a montagem dos bens transmitidos não é motivo decisivo para que a operação se mostre enquadrada como prestação de serviços, podendo e devendo sê-lo à luz do RITI.

H) Menosprezou sem se-lhe afigurar contraditório (apesar de levar a evidência ao probatório) que entendendo tratar-se de uma prestação de serviços, a própria Impugnante venha tipografar no rosto de cada uma das faturas a menção como (operação) isenta nos termos do art. 14°, n° 1, alínea a), do RITI.

I) Também não cuidou valorar a posição das partes ao longo da contenda, pois quem alegou que as faturas mais não são do que prestações de serviços foi a Impugnante, mas só o fez em sede de Impugnação Judicial. Até então aceitou o enquadramento das operações dado pelos SIT como transmissões intracomunitárias de bens, à luz do que decorre da análise à escrita, perante o modo como as operações foram contabilizadas pela própria Impugnante.

J) Só faz sentido a aposição da menção supra descrita se a mesma consubstanciar uma transmissão intracomunitária de bens. De facto, que outro motivo existe para ali se mostrar figurada esta expressão que não seja o facto dela pressupor a transmissão dos bens que vão ser alvo do serviço nela descrito?

L) A Impugnante nunca se preocupou até ao presente em dar uma justificação cabal para o conteúdo menção ali tipografada perante a inversão da posição que agora assume; também não justifica o motivo pelo qual à luz da sua escrita aquelas faturas terem sido contabilizadas como transmissões intracomunitárias de bens; de nunca ter impugnado senão agora o enquadramento feito pelos SIT sabendo que ao fazê-lo entra em contradição com o modo como em termos contabilísticos também ela assumiu a natureza das operações enunciadas nas faturas.

M) E o Tribunal a quo não obstante o contexto dogmático em que a correcção se insere dá como provado que as faturas continham aquelas menções indelevelmente paradoxais apostas pela Impugnante, e todavia coerentes com o que resulta da sua contabilidade, com a posição que a Impugnante até agora tinha aceitado e sem que esta tenha logrado apresentar prova do novo facto/posição agora alegado/tomada - mas entende, ao invés, atribuir aos SIT um erro de enquadramento jurídico, quando o maior erro é enquadrar aquelas operações como prestações de serviços sem um único fundamento decisivo e credível que as suportasse como tal.

N) A entender-se que as faturas titulavam meras prestações de serviços que não associadas a montagem de bens transmitidos intracomunitariamente, então cumpria ao tribunal a quo fundamentar a divergência/irregularidade que delas consta!

O) E, fosse qual fosse o enquadramento das operações, impunha-se que fosse apresentada prova (contratos de adjudicação, etc...) que suportasse a emissão daquelas faturas como meras prestações de serviços.

P) Se, como bem refere a decisão recorrida e decorre dos autos, o motivo da correção suportou-se no facto da “empresa não possui(r) qualquer tipo de documento que comprove a isenção das operações efectuadas” impunha-se à Impugnante, que no lugar de comodamente inverter a posição jurídica que tinha sobre o assunto, cumprisse o ónus que sobre si impende à luz do art. 74°, da LGT, logrando apresentar a aludida documentação - o que não foi feito

Q) Ainda que a alegação de que as faturas consubstanciam meras prestações de serviço não tivesse sido produzida pela Impugnante, os erros e irregularidades nelas presentes e a consequente errónea escrituração (que a sentença implicitamente acaba por concluir) - forçosamente ditariam a inversão do ónus da prova por ser manifesto que se da contabilidade não é possível sequer fazer o correto enquadramento fiscal das operações então a conclusão óbvia é que a escrita da Impugnante não merece credibilidade - gorando-se, assim, a presunção de boa fé declarativa que em termos gerais o contribuinte goza, justificando-se a aplicação do regime previsto no art. 75°, n° 2, da LGT.

R) Perante este quadro o que se impunha ao tribunal no lugar de sufragar o entendimento de que os SIT incorreram num erro de enquadramento jurídico, dar conta isso sim, de divergências e inconsistências nas faturas, na contabilidade, nas alegações produzidas nesta sede pela Impugnante, da ausência de prova carreada das alegações que produziu, e da violação de deveres acessórios, fazendo recair sobre a Impugnante o ónus de provar que aquelas faturas respeitam a meras prestações de serviços, à luz do art. 74°, n° 1, da LGT e 75°, n° 1 e 2, da LGT - e concluir que, pelo menos neste segmento, não tendo sido feita a prova das alegações que produziu e que lhe incumbia, tal facto haveria necessariamente de reverter contra si.

Está, pelo exposto, em causa erro de julgamento,

Pois que face ao que resulta do probatório e dos autos outra solução não será legalmente admissível à luz das regras da experiência comum e da prova conjugada senão manter este segmento da correção por não ter sido dado por provadas as alegações produzidas pela Impugnante à luz do art. 74°, n° 1 e art. 75°, n° 2, alíneas a) e b), ambos da LGT - julgando o recurso procedente e, em consequência, anular o segmento da sentença sobre o qual se recorre, substituindo-a por outra que julgue parcialmente procedente a presente impugnação judicial, mantendo na Ordem Jurídica a liquidação adicional que decorre da correcção ao exercício de 1996 e os correspondentes juros compensatórios que lhes estão associados, e retificando-se, consequentemente, o decaimento das respetivas custas processuais”.

A Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

“A- Em face do ponto A do probatório e ponto 2.3 do RIT não é facto admitido que a Recorrida se dedicava à transmissão intracomunitária de bens, mas sim ao comércio por grosso de materiais de construção, pelo que tem de decair a conclusão C) das alegações da AT;

B- A argumentação do que está isento é por que está sujeito, utilizada pela AT neste caso em concreto, é dúbia e até falaciosa, pois que estando nas referidas facturas inscrita a descrição de meras prestações de serviços, como mão de obra e trabalhos de assentamento, resulta claro que eram operações não sujeitas ao RITI, o qual só inclui a transmissão intracomunitária de bens, donde o que está não sujeito a imposto nunca pode estar isento, pelo que a conclusão D) não se afirma sustentável;

C- O rigor formalista a que alude a AT na conclusão E) dirige-se aos operadores económicos envolvidos e ao público em geral mas não tanto à AT que devia no âmbito do procedimento de ínspecção em causa, ainda antes de finalizar o relatório apurar do significado e conteúdo do descritivo da factura quanto à quantidade e denominação dos bens e dos serviços e determinar se era ou não sujeita a Iva por via do RITI, o que se inclui no princípio da verdade material a que alude o artº. 68 do RCPIT e que obriga a Inspecção Tributária no desenvolvimento desse procedimento administrativo, assim, se criticando esta conclusão da AT.

D- Por si só, e no caso destes autos, e em conformidade com a apreciação conjugada da prova e da experiência comum, a descrição como “trabalhos de assentamento" e "mão de obra" prestados na Alemanha por um sujeito passivo de Iva com sede em Portugal é suficiente para a qualificação do Tribunal como prestação de serviços não sujeita ao RITI, por este diploma só tributar transmissões de bens (artº. 1º do RITI) e mesmo que se tratasse de transmissão de bens com instalação e montagem, a partir de Portugal, também não seria uma operação tributável pois, de acordo com o nº. 1 do artº 9º do RITI, a regra de localização da transmissão do arts. 6º, nº. 1 do CIVA não tem aplicação relativamente "às transmissões de bens expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta para fora do território nacional quando os bens sejam instalados ou montados no território de outro Estado membro", o que torna descabidas e descontextualizadas as conclusões F), G) e N) das alegações da AT;

E- E não vale a pena afirmar, como faz a AT, que a aposição da menção descrita (isento de IVA, arts. 14º do RITI) só faz sentido se se consubstanciar numa transmissão intracomunitária de bens, porquanto, a materialidade da operação, demonstrada no contencioso judicial - que é um plano de intervenção garante dos direitos das empresas e dos cidadãos e acima do procedimento e contencioso administrativos -, é que se tratava de uma prestação de serviços de "trabalhos de assentamento" e de "mão de obra", que em conformidade com o RITI não é uma operação tributável, e assim se afastam as conclusões H), I) e J) e se afasta a ideia de erro de julgamento;

F- Trata-se de um exercício especulativo da AT, quer questionar a oportunidade, pela Impugnante, do enquadramento jurídico dos Serviços de Inspecção Tributária apenas em sede judicial e quanto àquelas facturas quer quanto à não demonstrada contabilização, não levada ao probatório, e que esta acentua sem fundamento algum para demonstrar um erro de julgamento que não existe, assim, se rebatendo as conclusões L) e M) das alegações;

G- Não errou o Tribunal quando não exigiu que fosse apresentada prova (contratos de adjudicação, etc) da isenção das operações efectuadas, pois sendo operações de prestações de serviços não sujeitas ao RITI e não sujeitas a IVA, não tinha que ser apresentada em face de qualquer pressuposto ou norma fiscal, porquanto só para a transmissão de bens os artigos 14º e 15º do RITI o exigem, decaindo, assim, as conclusões O) e P) das alegações da AT;

H- Pelo que não havendo erro de contabilização - porque não demonstrado pela AT no procedimentos inspectivo e não sendo a aposição da menção de isenção uma irregularidade - por não estar prevista legalmente nem determinar pagamento de imposto -, o que, em qualquer dos casos não foi provado, em primeiro lugar, peia AT, não pode haver lugar à propalada inversão do ónus de prova, a que se refere os artº. 75º, nº. 2 da LGT, pelo que têm de soçobrar as conclusões P), Q) e R) das alegações da AT;

I- No caso dos autos, o juiz não decidiu mal nem contra os factos apurados, pelo que não ocorreu erro de julgamento sobre a matéria de facto, e a alegação de que o descritivo das facturas nº.s …..,….., …..e …..não dizia respeito a transmissão de bens mas sim a mão de obra e trabalhos de assentamento, não tem de ser provada pela impugnante, decorrendo daquele descritivo e à evidência que os factos nelas descritos não se subsumem nas normas de incidência do RITI, o que se faz por mera operação intelectual de interpretação de normas, não necessitando de se possuir qualquer documento na isenção das operações efectuadas, justamente, por serem operações não tributáveis em sede de RITI, termos em que não podem vingar as conclusões A) e B) das alegações da AT.

J- Como refere a sentença recorrida, na parte final da al. a) do decisório: "Por se tratarem de facturas referentes a prestação de serviços e não a transmissões intracomunitárias de bens, não será aplicável o regime previsto no RITI, como erroneamente foi mencionado nas referidas facturas emitidas pela impugnante, não tendo, consequentemente, não estando reunidos os pressupostos para aplicação do disposto no artº. 14º do RITI, como fundamenta o relatório de inspecção que deu origem às liquidações controvertidas; razão pela qual se encontra bem decidida e fundamentada a decisão sob recurso”.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do então art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT) vem o processo à conferência.

É a seguinte a questão a decidir:
a) Há erro de julgamento, em virtude de, face à prova produzida e às regras do ónus da prova, não ser possível concluir que as faturas n.ºs ….., ….., …..e …..respeitam a prestações de serviços?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“A. A Impugnante exerce a actividade de “comércio por grosso de materiais de construção” [cf. fls. 22 do processo administrativo tributário].

B. O n.º de identificação fiscal para efeitos de transmissões intracomunitárias de bens da sociedade alemã M….. é ….. [cf. fls. 44 e 135/136 dos autos, e fls. 111 do PEF em apenso].

C. A 30.03.1996 foi emitida pela Impugnante a factura n.º ….., no montante de 21.673,10DM, destinado a M….., contribuinte n.º ….., onde consta a menção “isento de IVA ao abrigo do art.14 do n.º 1, alínea a) do RITI”, com o seguinte descritivo:

“(…)

Mão-de-obra

Semana 10

56 horas x 3 trabalhadores = 168 horas – DEM 34,--                                        5.712,--

Semana 11

57 horas x 3 trabalhadores = 171 horas – DEM 34,--                                          5.814,--

Semana 12

57 horas x 3 trabalhadores = 171 horas – DEM 34,--                                          5.814,--

Semana 13

57 horas x 3 trabalhadores = 171 horas – DEM 34,--                                          5. 814,--

Horas Extraordinárias

47 horas x 3 trabalhadores = 141 horas – DEM 34,--                                         719,--

(…)”

[cf. fls. 39, 130 dos autos e fls. 34 do processo administrativo tributário].

D. A 18.04.1996 foi emitida pela Impugnante a factura n.º ….., no montante de 10.236DM, destinado a M….., contribuinte n.º ….., onde consta a menção “isento de IVA ao abrigo do art.14 do n.º 1, alínea a) do RITI”, com o seguinte descritivo:

“(…)

Semana 14

46 horas x 3 trab = DEM 34,-- x 138 horas                                             4.692,--

5 dias x 3 trab. = 15 dias x DEM 25,--                                                       375,--

Semana 15

47 horas x 3 trab = DEM 34,-- x 141 horas                                             4.794,--

5 dias x 3 trab. = 15 dias x DEM 25,--                                                       375,--

(…)”

[cf. fls. 40 dos autos e fls. 34 do processo administrativo tributário].

E. A 30.04.1996 foi emitida pela Impugnante a factura n.º ….., no montante de 14.514DM, destinado a M….., contribuinte n.º ….., onde consta a menção “isento de IVA ao abrigo do art.14 do n.º 1, alínea a) do RITI”, com o seguinte descritivo:

“(…)

Semana 16

57 horas x 3 trab = DEM 34,-- x 171 horas                                              5.814,--

6 dias x 3 trab. = 18 dias x DEM 25,--                                                       450,--

Semana 17

55 horas x 3 trab = DEM 34,-- x 165 horas                                             5.610,--

6 dias x 3 trab. = 18 dias x DEM 25,--                                                       450,--

Semana 18

20 horas x 3 trab = DEM 34,-- x 60 horas                                               2.040,--

2 dias x 3 trab. = 6 dias x DEM 25,--                                                         150,--

(…)”

[cf. fls. 41 dos autos e fls. 34 do processo administrativo tributário].

F. A 30.04.1996 foi emitida pela Impugnante a factura n.º ….., pela venda à H….., no montante de ….. [cf. fls. 51 dos autos].

G. Foi emitido o CMR n.º ….., identificando a Impugnante como expedidora e H….. como destinatária, referente a “M…..”, com 10980kg, sendo transportado por “T….., Lda.”, onde foram apostas rubricas das três entidades [cf. fls. 52 dos autos].

H. A 09.05.1996 foi emitida pela Impugnante a factura n.º ….., no montante de 6.999DM, destinado a M….., contribuinte n.º ….., onde consta a menção “isento de IVA ao abrigo do art.14 do n.º 1, alínea a) do RITI”, com o seguinte descritivo:

“(…)

Trabalhos de Assentamentos

Semana 18

26 horas x 3 trab = DEM 34,-- x 78 horas                                               2.652,--

3 dias x 3 trab. = 9 dias x DEM 25,--                                                         225,--

Semana 19

36 horas x 3 trab = DEM 34,-- x 108 horas                                             3.672,--

6 dias x 3 trab. = 18 dias x DEM 25,--                                                       450,--

(…)”

[cf. fls. 42 dos autos e fls. 34 do processo administrativo tributário].

I. A 27.03.1997 foi emitida pela Impugnante a factura n.º ….., pela venda a M….., no montante de Esc.2.718.634$00 [cf. fls. 51 dos autos].

J. A 02.04.1997 foi emitida a factura n.º ….., pela R….., Lda., em nome da M….., referente a mármore da M….., com origem em Pero Pinheiro e destino em Seelze + Neu-Bamberg [cf. fls. 118 dos autos].

K. A 02.04.1997 foi emitido o CMR n.º ….., identificando a Impugnante como expedidora, “M…..”, como destinatária de “2 Ata de chapas de mármore e 3 paletas de mármore”, com 24.000kg,, e transporte efectuado por “T….., Lda.”, onde foram apostas rúbricas e carimbos das três entidades [cf. fls. 50 e 57 dos autos].

L. A 18.04.1997 foi emitida pela Impugnante a factura n.º ….., pela venda a M….., no montante de Esc.715.715$00 [cf. fls. 49 dos autos].

M. A 18.04.1997 foi emitida a factura n.º ….., pela R….., Lda., em nome da M….., referente a mercadoria da M….. e mais duas marcas, com origem em Pero Pinheiro e destino Germany [cf. fls. 119 dos autos].

N. A 18.04.1997 foi emitido o CMR n.º ….., identificando a Impugnante como expedidora, com o transportador denominado “T….., Lda.”, e como destinatária M….., de “6 paletes de mármor” correspondente a 4.000kg, onde foram apostas rúbricas e carimbos das três entidades [cf. fls. 48 e 58 dos autos].

O. A 04.07.1997 foi emitida pela Impugnante a factura n.º ….., pela venda a M….., no montante de DEM5.850 [cf. fls. 55 dos autos].

P. A 04.07.1997 foi emitida a factura n.º ….., pela R….., Lda., em nome da M….., referente a 4.500Kg de mármore da M….., com origem em Pero Pinheiro e destino em Neu-Bamberg [cf. fls. 117 dos autos].

Q. Foi emitido o CMR n.º ….., identificando a Impugnante como expedidora a M….. como destinatária de 5 paletes de mármor, com 4.500kg, transportado por “T…..”, onde foi aposto carimbos e rúbricas das três entidades [cf. fls. 54 e 59 dos autos].

R. Por fax de 18.11.1999 remetido pela M….. para a Impugnante, consta, nomeadamente o seguinte:

“(…)

Informamos que a mercadoria dos CMR n.ºs ….. – ….. – ….. – foi comprada por nós à firma M….., Lda., e transportada para a Alemanha. (…) [cf. fls. 54 dos autos].

S. Por fax de 08.05.2000 remetido pela H….. para a Impugnante, foi por aquela remetida cópia do CMR identificado em G) supra [cf. fls. 61 dos autos].

T. Com base na ordem de serviço n.º ….., de 12.11.1999, foi determinada a acção de inspecção externa à Impugnante relativa ao período 97/08, para verificação da correcta isenção de liquidação de IVA relativa às transmissões intracomunitárias [cf. fls. 31 dos autos].

U. A 03.04.2000 foi elaborado o relatório de inspecção, em sede do procedimento inspectivo identificado no ponto anterior, onde consta, nomeadamente, o seguinte:

“(…)

4 - Análise aos Documentos Contabilísticos

4.1 - IVA Dedutível

Foram verificadas, por amostragem, as facturas que estiveram na base da dedução do imposto, relativamente aos anos de 1996 e 1997. Na análise das mesmas não foram detectadas irregularidades, encontrando-se estas inscritas correctamente na contabilidade. Não se detectaram deduções indevidas nem documentos sem forma legal.

4.2 - Operações tributáveis e Isentas de Liquidação de IVA em Portugal

Relativamente às operações sujeitas a IV A em território nacional, verificou-se que as mesmas se encontram bem enquadradas em termos de IVA, estando o sujeito passivo a aplicar correctamente a taxa de 17% sobre o valor das mercadorias vendidas.

No que se refere às operações isentas de liquidação de IV A verificam-se duas situações:

• O sujeito passivo efectuou efectuou operações com a Alemanha, isentando-as ao abrigo do artigo 14° do RITI. Pelas suas operações com o seu cliente alemão, emitiu as facturas números ….., ….., ….. e ….., todas para o sujeito passivo M…... Este cliente forneceu um número de identificação fiscal inválido para efeitos de IVA na Comunidade Europeia. Desta forma não se comprova que o seu cliente é sujeito passivo de IVA noutro estado membro, pelo que a operação é tributável em Portugal nos termos do artigo 6° do CIVA

• O sujeito passivo efectuou transmissões intracomunitárias de mármore para a Alemanha, Emitiu, relativamente a essas transmissões de bens, as facturas com os números ….., ….., ….. e …... Para justificar a isenção de liquidação de imposto, ao abrigo do artigo 14.º do RITI, o sujeito passivo apenas possui os CMR's no exemplar do expedidor. Ouvido em termo de declarações, o sócio gerente da empresa declarou que não possui qualquer contrato de transporte ou pagamentos aos transportadores. Declarou também que o transitário contratado pelos clientes alemães emite os CMR's quando os camiões carregam as mercadorias nas suas instalações, apenas a título provisório, O transitário efectua o transbordo das mercadorias para outros camiões, emitindo novos CMR' s. Justificou, perante o sujeito passivo, que procede desta forma porque os adquirentes entregam as mercadorias directamente aos seus clientes, não querendo que estes saibam quem é o vendedor em Portugal dos produtos, de forma a não negociarem directamente com a empresa em análise. Junto dos seus clientes obteve a mesma resposta, não lhe tendo sido fornecidos quaisquer elementos que possam comprovar o destino efectivo das mercadorias. Desta forma não se verificam os pressupostos do artigo 14° do IVA, pelo que a empresa tem falta de liquidação de imposto nos termos do artigo 6.º do IVA, relativamente às transmissões intracomunitárias das facturas números 200, 230, 231 e 234.

5 - Determinação do Imposto em Falta

Relativamente às facturas números ….., ….., ….. e ….., o adquirente dos serviços não comprovou ser sujeito passivo noutro estado membro, pois o número fiscal constante nas facturas é inválido para efeitos de IVA. A empresa não possui qualquer tipo de documento que comprove a isenção das operações efectuadas, Não se verificam, desta forma, os pressupostos de isenção previstos no artigo 14° do RITI, pelo que a empresa tem imposto em falta, nos termos do artigo 6.º do IVA, no montante de 931.027$00, conforme cálculos de apuramento discriminados no quadro abaixo:

Facturas
Montante
TX.IVA
IVA Falta
……
2 235 645$
17%
380 060$
…..
1 047 890$
17%
178 141$
…..
1 484 448$
17%
252 356$
…..
708 649$
17%
120 470$
TOTAL
931 027$

No que respeita às facturas números ….., ….., …..e ….., o sujeito passivo possui contratos de transporte ou pagamentos ao transportador e/ou transitários. Apenas possui CMR's no exemplar do expedidor que, segundo afirmou o sócio gerente da empresa em termo de declarações, apenas serviu para o transporte entre as suas instalações e as do transitário. Desta forma não se encontram verificados os pressupostos do artigo 14.º do RITI, pelo que a empresa tem falta de liquidação de IVA nos termos do artigo 6.º do CIV A. O montante de imposto em falta ascende a 946.159$00, conforme se pode observar nos cálculos discriminados no quadro abaixo:

Facturas
Montante
Tx. IVA
IVA Falta
…..
1 541 887$
17%
262 121$
…..
2718634$
17%
462 168$
…..
715715$
17%
121 672$
…..
589405$
17%
100 199$
TOTAL
946 160$

6 - Direito de Audição Prévia

O sujeito passivo foi notificado, em 15 de Março de 2000, para exercer o seu direito de audição, por escrito ou oralmente, sobre o projecto de correcções à declaração periódica de IVA do período 97/08, decorrente da acção inspectiva externa, nos termos previstos no artigo 60.º da Lei Geral Tributária e artigo 60° do Regime Complementar da Inspecção Tributária.

Até à presente data, não foi recebida nestes serviços qualquer tipo de resposta a esta notificação. Desta forma o sujeito passivo não exerceu o seu direito de audição.

7 - Conclusões

O sujeito passivo não verificou os pressupostos do disposto no artigo 14.º do RITI no que concerne às facturas números …..de 30/03/1996, no montante de DM 21.673,10, com o contravalor em escudos de 2.235.645$00, …..de 18/04/1996 no montante de DM 10.236,00, com o contravalor em escudos de 1.047.890$00, ….. de 30/04/1996 no montante de DM 14.514,00, com o contravalor em escudos de 1.484.448$00 e ….. de 09/05/1996 de DM 6.999,00, com o contravalor em escudos de 708.649$00. O número fiscal constante das facturas do cliente alemão é inválido para efeitos de IV A, não comprovando que este é sujeito passivo de IVA noutro estado membro. A empresa não possui qualquer elemento que possa comprovar a correcta isenção de liquidação. Assim, não se verificando os pressupostos do artigo 14° do RITI, o sujeito passivo em análise, tem falta de liquidação de IVA nos termos do artigo 6° do CIVA, no montante de 946.160$00, relativamente a estas facturas.

No que se refere às facturas com os números ….., ….., …..e ….., a empresa também não verificou os pressupostos do artigo 14° do RITI. Não possui os CMR's no exemplar do destinatário ou do transportador com a recepção das mercadorias pelo cliente. Não efectuou qualquer contrato de transporte ou pagamento de fretes, pois estas despesas foram suportadas na totalidade pelo cliente. Assim, não se verificando os pressupostos do artigo 14° do RITI, o sujeito passivo em análise, tem falta de liquidação de IV A, nos termos do artigo 6° do CIVA, no montante de 931.027$00, relativamente a estas facturas.

A correcção total ascende a 1.877.187$00. A correcção total repartida por meses pode observar-se no quadro seguinte:

Período
Base
Taxa
Imposto
96/03
2,235,645$
17%
380,060$
96/04
4,074,225$
17%
692,618$
96/05
708,649$
17%
120,470$
97/03
2,718,634$
17%
462,168$
97/04
715,715$
17%
121,672$
97/07
589,405$
17%
100,199$
TOTAL
11,042,273$
17%
1,877,187$

Como o sujeito passivo não exerceu o seu direito à audição prévia, previsto nos artigos 60.° da Lei Geral Tributária e do Regime Complementar da Inspecção Tributária, que a correcção proposta no projecto de correcções, no montante de 1.877.187$00, não foi alterada.

Nesta data foram elaborados dois modelos 382, cujo total de correcções são no montante de 1.877.187S00 (1.193.148$00 para o ano de 1997 e 684.039$00 para o ano de 1996). Foi igualmente levantado o respectivo auto de notícia. (…)” [cf. fls. 31 a 38 dos autos].

V. Por ofício n.º ….., de 01.06.2000, da Direcção de Finanças de Lisboa, foi a Impugnante notificada do teor do relatório de inspecção supra identificado [cf. fls. 30 dos autos].

W. A 06.06.2000 foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ….., referente ao exercício de 1996, no valor de Esc.1.193.148$00 (€5.951,40), com data limite de pagamento em 31.08.2000 [cf. fls. 24 dos autos].

X. A 06.06.2000 foi emitida a liquidação de juros compensatórios n.º ….., referente ao período 96.03, no valor de Esc.202.122$00 (€1.008,18), com data limite de pagamento em 31.08.2000 [cf. fls. 21 dos autos].

Y. A 06.06.2000 foi emitida a liquidação de juros compensatórios n.º ….., referente ao período 96.04, no valor de Esc.360.550$00 (€1.798,42), com data limite de pagamento em 31.08.2000 [cf. fls. 22 dos autos].

Z. A 06.06.2000 foi emitida a liquidação de juros compensatórios n.º ….., referente ao período 96.05, no valor de Esc.61.400$00 (€306,26), com data limite de pagamento em 31.08.2000 [cf. fls. 23 dos autos].

AA. A 06.06.2000 foi emitida a liquidação adicional de IVA n.º ….., referente ao exercício de 1997, no valor de Esc.684.039$00 (€3.411,97), com data limite de pagamento em 31.08.2000 [cf. fls. 25 dos autos].

BB. A 06.06.2000 foi emitida a liquidação de juros compensatórios n.º ….., referente ao período 97.03, no valor de Esc.154.883$00 (€772,55), com data limite de pagamento em 31.08.2000 [cf. fls. 18 dos autos].

CC. A 06.06.2000 foi emitida a liquidação de juros compensatórios n.º ….., referente ao período 97.04, no valor de Esc.39.638$00 (€197,71), com data limite de pagamento em 31.08.2000 [cf. fls. 19 dos autos].

DD. A 06.06.2000 foi emitida a liquidação de juros compensatórios n.º ….., referente ao período 97.07, no valor de Esc.29.804$00 (€148,66), com data limite de pagamento em 31.08.2000 [cf. fls. 20 dos autos].

EE. Por fax datado de 24.11.2000 remetido pela sociedade M….. para a Impugnante consta, nomeadamente, o seguinte:

“(…)

Como pedido enviamos-lhe o nosso número de identificação fiscal, o tipo de imposto bem como a respectiva repartição de finanças

1) N.º de identificação fiscal: …..

Tipo de imposto: ordenado, contribuição para a igreja + segurança social

Repartição das Finanças: 35578 Wwtzlar Frankfurter Stra. 59

2) N.º de identificação fiscal: …..

Tipo de imposto: imposto sobre o valor acrescentado

Repartição das Finanças: 35390 Giessen Geothestrasse 58

3) N.º de identificação imposto sobre vendas: …..

[cf. fls. 43 e 132 dos autos].

FF. A 28.11.2000 foi pela Impugnante apresentada reclamação graciosa contra as liquidações de IVA e juros compensatórios identificadas em W) a DD) supra [cf. fls. 2 a 4 do processo de reclamação graciosa em apenso].

GG. Por despacho de 27.11.2001 da Chefe de Equipa da 1.ª Direcção de Finanças de Lisboa foi indeferida a reclamação identificada no ponto anterior [cf. fls. do processo de reclamação graciosa em apenso].

HH. A 29.10.2008 foi a Impugnante notificada da decisão identificada no ponto anterior [cf. fls. do processo de reclamação graciosa em apenso].

II. A 26.12.2001 foi pela Impugnante apresentado recurso hierárquico contra a decisão identificada em GG) supra [cf. fls. 151 a 195 do processo de reclamação graciosa em apenso].

JJ. Por despacho de 14.08.2008 do Subdirector-Geral da Direcção Geral dos Impostos foi o recurso hierárquico indeferido [cf. fls. do processo de reclamação graciosa em apenso].

KK. A 29.10.2008 foi a Impugnante notificada da decisão identificada no ponto anterior [cf. fls. do processo de reclamação graciosa em apenso].

LL. A petição inicial que deu origem à presente impugnação judicial foi apresentada em 23.01.2009 [cf. fls. 3 dos autos]”.

II.B. Refere-se ainda na sentença recorrida:

“Nada mais se provou com interesse para a decisão a proferir”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“Assenta a convicção deste Tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e no processo instrutor, não impugnados, referidos a propósito de cada alínea do probatório.

Foram ouvidas pelo tribunal duas testemunhas, J….., marido da técnica oficial de contas e sócio da sociedade de contabilidade que trabalhava para a Impugnante, e M….., trabalhadora num transitário que mantinha relações profissionais com a Impugnante, que revelaram ter alguns conhecimentos sobre a matéria de facto em questão, tendo deposto de forma convincente, convergente, espontânea e revelarem possuir conhecimento directo dos factos que relataram, em virtude das funções que exerciam à data dos factos.

Pelo primeiro foi testemunhado o esforço desenvolvido pela Impugnante após a acção de inspecção em pedir elementos que confirmassem a correcta identificação fiscal da sociedade M….., bem como em obter cópias dos CMR´s e declarações das empresas em como tinham recepcionado as mercadorias.

A segunda testemunha confrontada com os documentos identificados nas alíneas J) M) e P) dos factos assentes, declarou que era geralmente o cliente que pagava os transportes das mercadorias, porque nem sempre os clientes que compravam as mercadorias e que depois as revendiam para terceiros na Alemanha queriam que os seus futuros clientes soubessem quem eram os seus fornecedores em Portugal”.

II.D. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, acorda-se em aditar a seguinte matéria de facto provada:

MM. No âmbito do procedimento de reclamação graciosa foi elaborada proposta de decisão, sobre a qual recaiu despacho de concordância de 19.10.2001 (cfr. fls. 135 a 139, do processo administrativo – reclamação graciosa, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).

NN. Na sequência do mencionado em MM., a Impugnante apresentou, junto da direção de finanças de Lisboa, documento de exercício do seu direito de audição (cfr. fls. 142 a 144, do processo administrativo – reclamação graciosa, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento

Considera a Recorrente que o Tribunal a quo laborou em erro, na medida em que, face à prova produzida e às regras do ónus da prova, não era possível concluir que as faturas n.ºs ….., ….., …..e …..respeitam a prestações de serviços.

Está em causa uma das duas correções postas em causa pela Recorrida em 1.ª instância, correção essa no valor de 931.027$00 (4.643,94 Eur.), relativa a quatro faturas pela mesma emitidas a sujeito passivo alemão, nas quais foi aposta a menção “Isento de IVA ao abrigo do art. 14, nr.1, alínea a) do RITI”.

Como decorre do relatório de inspeção tributária (RIT) esta correção fundou-se em dois prismas: o primeiro, relacionado com o número de identificação fiscal (NIF) do adquirente, que não evidenciava ser relativo a sujeito passivo noutro estado membro; o segundo, atinente à inexistência de documento comprovativo da isenção das operações efetuadas.

Em sede de reclamação graciosa, a ora Recorrida, centrando-se apenas no primeiro dos fundamentos referidos supra (tendo interpretado o segundo como fundamentação a posteriori aduzida em sede de projeto de decisão da reclamação graciosa – entendimento afastado pelo Tribunal a quo), alegou que o adquirente indicou o seu NIF errado. A este respeito, na decisão proferida em sede de reclamação graciosa, aceitou-se que o NIF indicado foi o incorreto e que a situação foi corrigida (aliás, em consonância com o entendimento do Tribunal de Justiça da União Europeia expresso no Acórdão de 09 de fevereiro de 2017, Euro Tyre, C-21/16, ECLI:EU:C:2017:106); manteve-se, no entanto, a correção, considerando o segundo prisma mencionado supra.

No âmbito do recurso hierárquico, a ora Recorrida voltou a esgrimir, quanto a esta correção, a argumentação anteriormente esgrimida, atinente ao facto de o NIF do adquirente ter-lhe sido dado incorretamente; nesse mesmo documento refere que as faturas respeitam a prestações de serviços. A administração tributária (AT) indeferiu o recurso hierárquico.

Feito este enquadramento geral em termos de procedimento, cumpre apreciar.

Vejamos então.

O Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias (RITI) foi aprovado pelo DL n.º 290/92, de 28 de dezembro, visando a adaptação do regime jurídico do IVA à Diretiva do Conselho 91/680/CEE, de 16 de dezembro.

De acordo com o seu art.º 1.º (redação à época):

“Estão sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado (IVA):

a) As aquisições intracomunitárias de bens efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo dos referidos no n.º 1 do artigo 2.º, agindo como tal, quando o vendedor for um sujeito passivo, agindo como tal, registado para efeitos do IVA noutro Estado membro que não esteja aí abrangido por um qualquer regime particular de isenção de pequenas empresas, não efetue no território nacional a instalação ou montagem dos bens nos termos do n.º 2 do artigo 9.º nem os transmita nas condições previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 11.º;

b) As aquisições intracomunitárias de meios de transporte novos efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo, ainda que se encontre abrangido pelo disposto no n.º 1 do artigo 5.º, ou por um particular;

c) As aquisições intracomunitárias de bens sujeitos a impostos especiais de consumo, exigíveis em conformidade com o disposto no Decreto-Lei n.º 52/93, de 26 de Fevereiro, efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo que se encontre abrangido pelo disposto no n.º 1 do artigo 5.º;

d) As operações assimiladas a aquisições intracomunitárias de bens previstas no n.º 1 do artigo 4.º;

e) As transmissões de meios de transporte novos efetuadas a título oneroso, por qualquer pessoa, expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional, com destino a um adquirente estabelecido ou domiciliado noutro Estado membro”.

Atento o art.º 2.º do RITI, são sujeitos passivos de imposto, no âmbito das aquisições intracomunitárias, designadamente as pessoas singulares ou coletivas, previstas na a) do n.º 1 do art.º 2.º do CIVA, que realizem transmissões de bens ou prestações de serviços com direito total ou parcial à dedução de IVA.

No que respeita às operações abrangidas pelo regime de tributação em causa, é possível fazer a distinção entre aquisições (AIBS) e transmissões intracomunitárias (TIBS) de bens.

Quanto às primeiras, de acordo com o art.º 3.º do RITI, são aquelas de que decorre “a obtenção do poder de dispor, por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade, de um bem móvel corpóreo cuja expedição ou transporte para território nacional, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, com destino ao adquirente, tenha tido início noutro Estado membro”.

No que respeita às transmissões intracomunitárias, determina o art.º 14.º do RITI, que estão isentas de imposto:

“a) As transmissões de bens, efetuadas por um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional para outro Estado membro com destino ao adquirente, quando este seja uma pessoa singular ou coletiva registada para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado em outro Estado membro, que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição e aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens;

b) As transmissões de meios de transporte novos previstas na alínea d) do artigo 1.º;

c) As transmissões de bens referidas no n.º 2 do artigo 7.º que beneficiariam da isenção prevista na alínea a) deste artigo se fossem efetuadas para outro sujeito passivo;

d) As transmissões de bens sujeitos a impostos especiais de consumo, efetuadas por um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes a partir do território nacional para outro Estado membro, com destino ao adquirente, quando este seja um sujeito passivo isento ou uma pessoa coletiva estabelecida ou domiciliada em outro Estado membro que não se encontre registada para efeitos do IVA, quando a expedição ou transporte dos bens seja efetuada em conformidade com o disposto no Decreto-Lei n.º 52/93, de 26 de Fevereiro”.

Portanto, regra geral, as transmissões intracomunitárias de bens efetuadas são isentas de imposto no país de origem do vendedor, não obstante este poder deduzir o imposto suportado a montante, sendo tributadas de acordo com o princípio de tributação no destino, ou seja, caberá ao adquirente a liquidação do IVA.

Como resulta deste breve enquadramento, o RITI aplica-se exclusivamente às transmissões de bens, não se aplicando, pois, às prestações de serviços intracomunitárias.

Assim, para efeitos de definição da disciplina aplicável às prestações de serviços intracomunitárias há que atentar no disposto no art.º 6.º do Código do IVA.

É ainda pertinente chamar à colação o disposto no art.º 7.º do RITI, nos termos do qual:

“3 - Não são, no entanto, consideradas transmissões de bens nos termos do número anterior, as seguintes operações:

a) Transferência de bens para serem objeto de instalação ou montagem noutro Estado membro nos termos do n.º 1 do artigo 9.º ou de bens cuja transmissão não é tributável no território nacional nos termos dos n.ºs 1 a 3 do artigo 10.º…”.

Por seu turno, nos termos do art.º 9.º do RITI:

“1 - O disposto no n.º 1 do artigo 6.º do Código do IVA não terá aplicação relativamente às transmissões de bens expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta para fora do território nacional, quando os bens sejam instalados ou montados no território de outro Estado membro.

2 - São, no entanto, tributáveis as transmissões de bens expedidos ou transportados a partir de outro Estado membro, quando os bens sejam instalados ou montados em território nacional, pelo fornecedor, sujeito passivo nesse outro Estado membro, ou por sua conta”.

Apliquemos estes conceitos ao caso dos autos.

Como resulta provado, a Recorrida emitiu quatro faturas em nome da sociedade M….. (cfr. factos C., D., E. e H.), todas elas com a menção “isento de IVA ao abrigo do art.14 do n.º 1, alínea a) do RITI”.

O descritivo das faturas nunca foi em nenhuma das sedes posto em causa pela AT e é o constante da factualidade provada. Como se infere desse mesmo descritivo, estamos perante pagamentos relativos a mão-de-obra e trabalhos de assentamento.

Ou seja, tal como referido pelo Tribunal a quo, atento o teor das mencionadas faturas, repete-se, nunca posto em causa, estamos perante prestações de serviços e não perante transmissões de bens, pelo que se está fora do âmbito de aplicação do RITI.

Considera a FP que o Tribunal a quo desconsiderou uma série de elementos resultantes do procedimento, desde o enquadramento da atividade da Recorrida à posição assumida pela mesma durante o referido procedimento, que implicariam distinto entendimento, se considerados.

Ora, em relação ao enquadramento, desde logo se refira que o CAE em que a mesma estava inscrita (CAE 51532) abrangia o comércio por grosso de materiais de construção (exceto madeira) e equipamento sanitário (cfr. o Anexo do DL n.º 182/93, de 14 de maio, que reviu a classificação portuguesa de atividades económicas). Isto não significa, porém, que lhe esteja vedada a realização de prestação de serviços, podendo, isso sim, tal revelar um erro de enquadramento, que, quando muito, conduziria à necessidade de alterações em termos de CAE secundário. Como tal, o alegado pela Recorrente não tem as consequências pela mesma extraída.

O mesmo se refira quanto à posição da Recorrida durante o procedimento. Antes de mais, sublinhe-se que a Recorrida, ao contrário do sustentado pela Recorrente, nunca veio referir em sede graciosa que as faturas titulavam transmissões de bens. Com efeito, como resulta dos autos e já foi mencionado sumariamente supra, a Recorrida começou por se insurgir contra a correção em causa, em virtude de considerar como único fundamento da correção o erro na aposição do NIF do adquirente, sendo que, em sede de recurso hierárquico, veio expressamente invocar estar-se perante prestações de serviços. Ademais, sempre se diga que não há óbice a que, em sede de impugnação judicial, sejam esgrimidos fundamentos não suscitados em sede graciosa[1].

Por outro lado, é certo que, in casu, as faturas continham duas incorreções: a do NIF do adquirente, cujos esclarecimento e correção foram aceites pela AT, e a da menção ao art.º 14.º, n.º 1, al. a), do RITI. Não obstante, não se pode descurar o descritivo das faturas, nunca posto em causa pela AT e que evidencia, como já referimos, tratar-se de prestações de serviços intracomunitárias. Ora, perante esta circunstância, torna-se claro que a menção ao art.º 14.º do RITI foi um lapso de preenchimento, ao qual não se pode dar um valor tal que implique desconsiderar aquilo que resulta de fundamental nas faturas: a descrição dos serviços prestados. Se a AT considerava que aquela faturação, apesar de mencionar serviços, respeitava efetivamente a transmissões de bens, devia ter procedido nesse pressuposto em sede de ação inspetiva e agido em conformidade, o que não logrou fazer, nunca pondo em causa, reiteramos, a verdade subjacente a tal descrição. Ademais, não resulta dos autos qualquer menção específica atinente à contabilização destas faturas, carecendo, pois, de suporte tudo o alegado pela Recorrente a este respeito, designadamente quanto às alegadas incorreções ou contradições contabilísticas e consequente falta de credibilidade da contabilidade, que nunca foi suscitada, aliás, no tempo oportuno.

Assim, resultando das faturas que se estava perante prestações de serviços, nunca tendo o teor das mesmas sido posto em causa, não era exigível à Recorrida qualquer prova adicional atinente à veracidade das faturas em causa, em termos de descritivo, ao contrário do sustentado pela Recorrente.

Por outro lado, também não resulta minimamente demonstrado que se trate de transmissões intracomunitárias de bens com instalação ou montagem nem tal nunca foi suscitado pela AT em sede inspetiva. As faturas limitam-se a mencionar serviços. Sempre se refira que a transmissão de bens com instalação ou montagem não tem as consequências que parecem ser extraídas pela Recorrente, considerando, desde logo, o art.º 9.º do RITI. Refere a este respeito Clotilde Celorico Palma[2]: “O art.º 9.º contempla regras de localização para os casos de transmissão de bens com instalação ou montagem noutro Estado membro. (…) [N]estes casos os movimentos de bens não dão origem a transacções intracomunitárias de bens, pelo que estão excluídos expressamente do conceito de transmissão de bens, conforme o disposto na alínea a) do n.º 3 do art.º 7.º. (…) // Assim, o n.º 1 do art.º 9.º, dispõe que são tributáveis no país de destino as transmissões de bens expedidos ou transportados pelo sujeito passivo ou por sua conta para fora do território nacional, quando os bens sejam montados no território de outro Estado membro”.

Em suma, das faturas emitidas resulta que se está perante prestações de serviços, nas quais por lapso, porque não se trata substantivamente de transmissão de bens, se faz a menção à isenção do art.º 14.º, n.º 1, al. a), do RITI. As faturas nunca foram postas em causa, em termos daquilo que titulavam, pela AT, que, no tempo oportuno, não cuidou de aferir da eventual desconformidade do teor da fatura com a realidade.

Como tal, estando-se perante prestações de serviços, está-se fora do âmbito do RITI, motivo pelo qual a correção se mostra ilegal.

Assim, carece de razão a Recorrente.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:
a) Negar provimento ao recurso;
b) Custas pela Recorrente;
c) Registe e notifique.


Lisboa, 09 de julho de 2020

(Tânia Meireles da Cunha)

(Cristina Flora)

(Vital Lopes)


_____________________
[1] Cfr. os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.05.2011 (Processo: 0156/11), de 03.06.2015 (Processo: 0793/14) e de 03.07.2019 (Processo: 02957/16.0BELRS 070/18).
[2] Clotilde Celorico Palma, Introdução ao Imposto sobre o Valor Acrescentado, 3.ª Ed., Almedina, Coimbra, 2008, pp. 277 e 278.