Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05555/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:02/27/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:INCIDENTE DE NULIDADE DE ACÓRDÃO.
FUNDAMENTOS.
DELIMITAÇÃO OBJECTIVA DO RECURSO.
PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO.
Sumário:1. A possibilidade de dedução do incidente de nulidade da sentença (acórdão) visa satisfazer a preocupação de realização efectiva e adequada do direito material e o entendimento de que será mais útil à paz social e ao prestígio e dignidade que a administração da Justiça coenvolve, corrigir do que perpetuar um erro juridicamente insustentável, conforme se retira do preâmbulo do dec.lei 329-A/95, de 12/12.
2. Tal como as sentenças de 1ª. Instância, os acórdãos proferidos pelos Tribunais Superiores podem ser objecto de arguição de nulidade. Além das nulidades previstas nas diferentes alíneas do artº.615, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, surgem-nos ainda duas situações decorrentes da colegialidade do Tribunal que profere o acórdão e que dão origem a nulidades específicas deste: o acórdão ser lavrado contra o vencido e, por outro lado, sem o necessário vencimento (cfr.artº.666, nº.1, e 667, do C.P.Civil).
3. As conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário). Na delimitação objectiva do recurso funciona, em regra, o princípio do dispositivo (cfr.artº.635, nº.2, do C.P.Civil), em consonância com a natureza disponível da maior parte das questões que integram o objecto do processo. Independentemente do âmbito definido pelo recorrente no requerimento de interposição do recurso, é legítimo restringir o objecto do recurso nas conclusões do mesmo, assim se identificando, concretamente, qual a decisão (ou parte da decisão) visada pela impugnação.





O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
“... , S.A.”, notificado do acórdão datado de 14/11/2013 e exarado a fls.282 a 293 dos presentes autos, deduziu incidente de nulidade de acórdão (cfr.fls.303 e 304 dos autos), alegando, em síntese:
1-Que interpôs recurso da sentença proferida pelo T.A.F. de Leiria, a qual julgou totalmente improcedente o pedido de anulação das liquidações de I.R.C. e juros compensatórios relativas aos exercícios de 1997 e 1998;
2-Sucede, porém, que nas alegações de recurso, tal como nas respectivas conclusões, apenas mencionou o exercício de 1998, por lapso manifesto;
3-Que não obstante o lapso manifesto, este Tribunal fez uma apreciação do recurso de acordo com a delimitação objectiva do mesmo, o qual abarcava ambos os exercícios, portanto 1997 e 1998;
4-Sendo expressão de tal, desde logo, a inclusão no probatório dos pontos 10 a 12, tal como o enquadramento jurídico efectuado;
5-Daí que se deva suprir a nulidade do acórdão no sentido de se considerar delimitado o recurso apreciado como abrangendo a parte relativa ao I.R.C. proporcional aos custos corrigidos pela Fazenda Pública respeitantes às comissões debitadas à recorrente pela firma "... Limited" nos exercícios de 1997 e 1998;
6-Termina pugnando pela procedência da nulidade arguida, com as legais consequências, assim devendo ser anuladas, parcialmente, as liquidações de I.R.C. e juros compensatórios relativas aos exercícios de 1997 e 1998.
X
Notificado do requerimento a suscitar o presente incidente, o recorrido nada disse (cfr.fls.312 dos autos).
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da improcedência do presente incidente (cfr.fls.315 e 316 dos autos).
X
Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação (cfr.artºs.657, nº.4, e 666, nº.2, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.Tributário).
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Uma vez proferida a sentença (ou acórdão), imediatamente se esgota o poder jurisdicional do Tribunal relativo à matéria sobre que versa (cfr.artº.613, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Excepciona-se a possibilidade de reclamação com o objectivo da rectificação de erros materiais, suprimento de alguma nulidade processual, esclarecimento da própria sentença ou a sua reforma quanto a custas ou multa (cfr.artºs.613, nº.2, e 616, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.125, do C.P.P.Tributário).
Tanto a reclamação, como o recurso, passíveis de interpor face a sentença (ou acórdão) emanada de órgão jurisdicional estão, como é óbvio, sujeitos a prazos processuais, findos os quais aqueles se tornam imodificáveis, transitando em julgado. A imodificabilidade da decisão jurisdicional constitui, assim, a pedra de toque do caso julgado (cfr.artºs.619 e 628, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6).
A possibilidade de dedução do incidente de nulidade da sentença (acórdão) visa satisfazer a preocupação de realização efectiva e adequada do direito material e o entendimento de que será mais útil à paz social e ao prestígio e dignidade que a administração da Justiça coenvolve, corrigir do que perpetuar um erro juridicamente insustentável, conforme se retira do preâmbulo do dec.lei 329-A/95, de 12/12 (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.400/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 19/10/2011, rec.497/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/4/2013, proc.3013/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc. 5594/12; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.356 e seg.; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.321 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.133 e seg.).
Tal como as sentenças de 1ª. Instância, os acórdãos proferidos pelos Tribunais Superiores podem ser objecto de arguição de nulidade. Além das nulidades previstas nas diferentes alíneas do artº.615, nº.1, do C.P.Civil, surgem-nos ainda duas situações decorrentes da colegialidade do Tribunal que profere o acórdão e que dão origem a nulidades específicas deste: o acórdão ser lavrado contra o vencido e, por outro lado, sem o necessário vencimento (cfr.artº.666, nº.1, e 667, do C.P.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc. 5594/12; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.133 e 134; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.59 e seg.).
“In casu”, o requerente alega a existência da nulidade do acórdão exarado nos presentes autos, em virtude de se dever considerar delimitado o recurso apreciado como abrangendo a parte relativa ao I.R.C. proporcional aos custos corrigidos pela Fazenda Pública relativos às comissões debitadas à recorrente pela firma "... Limited", tanto em relação ao exercício de 1997, como no que respeita a 1998. Embora reconheça que nas alegações e conclusões do recurso que deduziu somente tenha feito menção do exercício de 1998, por lapso manifesto.
Deve recordar-se ao requerente que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário). Por outro lado, na delimitação objectiva do recurso funciona, em regra, o princípio do dispositivo (cfr.artº.635, nº.2, do C.P.Civil), em consonância com a natureza disponível da maior parte das questões que integram o objecto do processo. Ainda, independentemente do âmbito definido pelo recorrente no requerimento de interposição do recurso, é legítimo restringir o objecto do recurso nas conclusões do mesmo, assim se identificando, concretamente, qual a decisão (ou parte da decisão) visada pela impugnação (cfr.António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Julho de 2013, pág.83 e seg.).
Em virtude do acabado de mencionar, reproduz-se, integralmente, a parte do acórdão exarado a fls.282 a 293 dos presentes autos, que interessa para a decisão do presente incidente:
“(…)
Levando em consideração o trânsito em julgado da sentença da 1ª. Instância nesta parte (cfr.artº.635, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) não deve este Tribunal apreciar a sentença recorrida no trecho que manteve a liquidação de I.R.C. relativa ao ano de 1997, tal como na relativa ao ano de 1998, com excepção da correcção referente a comissões pagas pelo recorrente e identificada no nº.11 do probatório supra.
(...)".

Concluindo, não se vislumbra qualquer nulidade, devido a eventual omissão de pronúncia, de que padeça o acórdão exarado nestes autos a fls.282 a 293 do processo. O requerente é que, por lapso, como ele próprio refere, se esqueceu de mencionar o ano de 1997 nas alegações e conclusões da apelação, não cabendo ao julgador substituir-se à parte e incluir no objecto do recurso esse ano.
Está-se assim, manifestamente, perante uma situação não enquadrável nos artºs.615, nº.1, e 666, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6.
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se totalmente improcedente este incidente de nulidade de acórdão, ao que se provirá na parte dispositiva.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em INDEFERIR A REQUERIDA NULIDADE DO ACÓRDÃO exarado a fls.282 a 293 do presente processo.
X
Condena-se o requerente, “... , S.A.”, em custas pelo presente incidente, fixando-se a taxa de justiça em três (3) U.C. (cfr.artº.7 e Tabela II, do R.C.Processuais).
X
Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 27 de Fevereiro de 2014



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Aníbal Ferraz - 2º. Adjunto)