Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:634/12.0BELSB
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:03/02/2017
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:CONCURSO PARA RECRUTAMENTO PARA CONSTITUIÇÃO DE RELAÇÕES JURÍDICAS DE EMPREGO PÚBLICO POR TEMPO INDETERMINADO.
PRIORIDADE PARA OS CANDIDATOS TITULARES DE RELAÇÃO JURÍDICA DE E EMPREGO PÚBLICO.
LEI Nº 12-A/2008, DE 27.02.
Sumário:I) – Por força do disposto no nº 4 do art.° 6° nº4 da Lei 12-A/2008, de 27.02.o recrutamento para constituição de relações jurídicas de emprego público por tempo indeterminado nas modalidades previstas no nº1 do artigo 9.º inicia-se sempre de entre trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida.

II) - Porém como decorre dos termos em que foi definido e anunciado, o concurso levado a efeito, foi realizado ao abrigo do art° 6° n° 6 do mesmo diploma que estipula que em caso de impossibilidade de ocupação de iodos ou de alguns postos de trabalho por aplicação do disposto nos números anteriores, o órgão ou serviço, precedendo parecer favorável dos membros do Governo responsáveis pelas finanças e pela Administração Pública, pode proceder ao recrutamento de trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo determinado ou determinável ou sem relação jurídica de emprego público previamente estabelecida.

III) – Do cotejo das indicadas normações, no caso concreto há que marcar antes der tudo uma distinção e precisão à questão sub judice pois é uma questão que tem de ser avaliada previamente à abertura do concurso, pois estamos na hipótese de concurso nos termos referidos em II) em que o concurso deve ser precedido de parecer favorável dos membros do Governo responsáveis pelas Finanças e pela Administração Pública.
IV) – Ora, o concurso, realizado nos referidos termos, veio a ser previamente autorizado por despachos dos Ministros da Tutela, deles se vendo claramente que não estabeleceram qualquer prioridade para os candidatos titulares de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, tendo no entanto que ser respeitada a prioridade legal para os trabalhadores do sistema de mobilidade especial (SME),sendo os restantes candidatos colocados de acordo com a sua graduação.

V) – Por assim ser, nenhum reparo é objectivável à sentença ao perfilhar o entendimento de que o citado n° 4 do art° 6° não consagra qualquer regra de prioridade apenas impõe que o recrutamento para constituição de relações jurídicas de emprego público por tempo indeterminado se inicie sempre de entre trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida. Dito de outro modo: daqueles incisos legais apenas emerge que só pode recorrer-se a um concurso externo quando os detentores de vínculo incluindo os do SME não sejam suficientes para o preenchimento das vagas postas a concurso.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I- RELATÓRIO

O presente recurso jurisdicional foi interposto pelo Autor SINDICATO DOS TRABALHADORES DOS IMPOSTOS, em representação e defesa dos interesses individuais dos seus associados melhor identificados no intróito da p.i., da decisão que julgou improcedentes as excepções de inimpugnabilidade dos actos impugnados e de ilegalidade da cumulação de pedidos, bem como o pedido impugnatório, absolvendo o R. do mesmo.

Na alegação a recorrente formulou as seguintes conclusões:

“1. Do disposto nos n.ºs 5 e 6 do artº 6, e do n.º 2 do art.º 50º, ambos da LVCR extrai-se a ideia de que, neste momento, vigora na Administração a regra de que todo e qualquer procedimento concursal deverá sempre dirigir-se, prioritariamente, aos trabalhadores com vinculo em funções públicas!
2. O nosso regime jurídico de recrutamento de trabalhadores para o exercício de funções públicas, consagra um regime de prioridades que tem que ser respeitado, o que não sucedeu no caso vertente;
3. Os representados do A. já detêm vínculo de relação jurídica de emprego público, pelo que a seguir aos trabalhadores colocados em mobilidade especial, deveriam ter tido prioridade no recrutamento para as vagas abertas;
4. A interpretação e entendimento perfilhado pelo douto acórdão a quo revela-se contrário aos normativos legais invocados e para com o regime legal actualmente em vigor, sendo, pois, mister concluir que o mesmo não poderá ser mantido.
5. O douto acórdão a quo não pode aceitar a consagração da prioridade de recrutamento de quem se encontre colocado em situação de mobilidade especial, sem que aquela também seja extensível aos detentores de prévio vinculo por tempo indeterminado. Nada na lei estatuiu diferente solução, pelo que o entendimento perfilhado revela-se violador do regime legal vigente.
Termos em que, e sem prescindir do douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser julgado procedente e provado, revogando-se, pelo vício de que padece e que se enumerou, o douto acórdão a quo, fazendo-se assim a costumada Justiça.”

Foram apresentadas contra-alegações assim concluídas:

1) A Lei n° 12-A/2008, de 27 de Fevereiro - LVCR, na redação em vigor à data da abertura do concurso em causa, não estabelecia qualquer prioridade no recrutamento relativamente a quem, como era o caso dos associados do Recorrente, tinha uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida.
2) Carece de total sustentação a alegação de que o princípio da prioridade no recrutamento, do qual alegadamente beneficiariam os associados do Recorrente, se encontrava consagrado no n° 4 do artigo 6° da Lei n° 12-A/2008, de 27 de Fevereiro (LVCR).
3) Com efeito, esse n° 4 do artigo 6° da Lei n° 12-A/2008 não é aplicável ao concurso dos autos, o qual, conforme constou do preâmbulo do respetivo Aviso de abertura, foi externo.
4) A interpretação defendida pelo Recorrente, de que o n° 4 do artigo 6° da LVCR é aplicável ao concurso dos autos, não encontra qualquer apoio na letra deste preceito e, para lá disso, está em frontal contradição com o disposto no artigo 54°, n° 1, alínea d), da mesma Lei n° 12-A/2008.
5) No caso vertente, em que o recrutamento revestiu a modalidade de concurso, estabelecia o artigo 54°, n° 1, da Lei n° 12-A/2008, que "O recrutamento efectua-se pela ordem decrescente da ordenação final dos candidatos colocados em situação de mobilidade especial e, esgotados estes, dos restantes candidatos".
6) Uma vez que não era essa a situação dos associados do Recorrente, isto é, os mesmos não se encontravam na situação de mobilidade especial (SME), eles não gozavam de qualquer prioridade no recrutamento relativamente aos candidatos sem relação jurídica de emprego público previamente estabelecida que ficaram classificados em lugares que davam acesso às vagas postas a concurso.
7) Que o entendimento sustentado pelo Recorrente está inquinado, por carecer de total apoio legal, mostra-o a alteração legislativa, que passou a vigorar a partir de 1 de Janeiro de 2012.
8) Na realidade, a Lei n° 64-B/2011, de 30.12 (respetivo artigo 39°), que aprovou o Orçamento do Estado para o ano de 2012, inaplicável ao concurso dos autos, por ser posterior à abertura do mesmo (por força do princípio "tempus regit actum"), relativamente aos procedimentos concursais estabeleceu o princípio da prioridade no recrutamento relativamente aos candidatos aprovados com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida.
9) A Lei n° 12-A/2008, de 27 de fevereiro, alterada pelas Leis n°s 64-A/2008, de 31 de dezembro, 3-B/2010, de 28 de abril, 34/2010, de 2 de setembro, 55-A/2010, de 31 dezembro, 64-B/2011, de 30 de dezembro, 66/2012, de 31 de dezembro, e 66-B/2012, de 31 de dezembro, e pelo Decreto- Lei n° 47/2013, de 5 de abril, na matéria em causa, foi revogada pela Lei n° 35/2014, de 20 de junho (respetivo artigo 42°), a qual aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
10) Neste momento, ao invés do que alega o Recorrente, "o recrutamento efetua-se pela ordem decrescente da ordenação final dos candidatos colocados em situação de requalificação e, esgotados estes, dos restantes candidatos" (artigo 37°, n° 3, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas).
11) O entendimento perfilhado pelo douto Acórdão recorrido revela-se inteiramente conforme com os preceitos legais vigentes à data da abertura do concurso, e aplicáveis ao mesmo, merecendo, por isso, ser mantido.
Termos em que, e com o douto suprimento de V.Exas, deve o presente recurso jurisdicional ser julgado improcedente, devendo o douto Acórdão recorrido ser confirmado.”

O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso pelas razões que infra serão expostas e às quais,. Notificado, o Recorrente manifestou oposição para concluir como no recurso.

Recolhidos os vistos, cumpre decidir.

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2.- DA FUNDAMENTAÇÃO

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida, com relevo para a apreciação da matéria de excepção, bem como do mérito da causa, consideram-se provados os factos seguintes:
“1- Por Aviso n° 8928/2010, da Direcção de Serviços de Gestão dos Recursos Humanos (DSGRH) da então DGCI (actual Autoridade Tributária e Aduaneira), publicado no D.R n.°87, 2.a série, de 05.05.2010, procedeu-se à abertura, peto prazo de 15 dias úteis, do concurso externo de admissão a período experimental para a constituição de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, tendo em vista a ocupação de 350 postos de trabalho da categoria de Inspector Tributário, nível l, da carreira de inspecção tributária (GAT) do mapa de pessoal da DGCI, conforme documento n"3 junto á p.i;
2- Os aqui associados do A. foram opositores ao concurso, admitido e aprovados (acordo);
3- Todos os associados do A. à data da candidatura eram (e são) já detentores de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado da então DGCI (actual Autoridade Tributária e Aduaneira), conforme documentos nº 4 a documento nº 19 juntos aos autos;
4- O ponto 2, do Aviso de Abertura acima identificado estipulava que o presente procedimento concursal rege-se pelo disposto, entre outros diplomas, na Lei 12-A/2008, mormente peto seu art,° 6°.
5 - Dando cumprimento ao disposto no ponto 9 do referido Aviso de Abertura, em 28.05.2011 realizou-se a prova escrita de conhecimentos específicos - único método de selecção previsto, e os aqui associados do A. obtiveram todos uma classificação final superior a 9,5 valores (vd. lista de homologação final junta à p.i sob o documento n.º 20), ficando, assim, aprovados, tal como se previa no ponto 9. l do referido Aviso de Abertura;
6- Esta lista de classificação final foi objecto de despacho de homologação proferido pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, em 14 de Novembro de 2011, conforme resulta do Aviso (extracto) nº 22968/2011, de 16.11, publicado no DR, 2a Série, n.° 225, de 23.11, junto à p.i sob documento n" 21;
7- No âmbito do procedimento concursal em apreço, veio a ser divulgado pela Direcção de Serviços de Gestão de Recursos Humanos da DGCI, no dia 6 de Dezembro de 2011, um Aviso subscrito peto respectivo Chefe de Divisão, com a seguinte epígrafe: "Admissão de candidatos ao concurso externo para inspector tributário", cf documento n.°1 junto á p.i;
8- Através do referido Aviso, a DSGRH comunica no ponto l que, "Para os devidos efeitos, informa-se que a DGCI vai proceder à notificação aos primeiros 350 classificados do procedimento concursal em epígrafe, em conformidade com o Despacho n."2007/2011, de 21 de Novembro, de Sua Excelência o Secretário de Estado da Administração Pública, depois de deduzida a quota prevista no n." 12 do Aviso de Abertura, publicado no DR, nº 87, de 05.05.2010, para apresentação dos seguintes documentos ...";
9- A DSGRH informa, ainda, no ponto 2 do Aviso em questão, que a candidatura aos lugares e tocais para realização do estágio seria efectuada via internet no Portal das Finanças, entre os dias 16 e 20 de Dezembro de 2011, sendo a data previsível de assinatura do contrato para início do período experimental o dia 30 de Dezembro de 2011;
10- A maior parte dos aqui representados do A., aquando da divulgação do Aviso em análise, por discordarem do mesmo, reclamaram, por escrito, para o então Director-Geral dos Impostos (actual Director-Geral da AT) sobre a não aplicação do princípio da prioridade no recrutamento previsto no n° 4, art°. 6° da Lei 12-A/2008, de 27.02, cf documentos nº 22 a 24 juntos à p.i;
11 - Na sequência do exposto no Aviso em questão, a Direcção de Serviços de Gestão de Recursos Humanos notificou os primeiros 350 classificados para a apresentação da documentação necessária, com vista à celebração de contrato para realização do período experimental, tendo em 21.12.2011 publicado e divulgado a lista de colocação daqueles candidatos nos postos de trabalho para a realização do estágio na categoria de Inspector Tributário, nível l (cf documento n.º 25 junto à p.i), tendo o contrato com o qual se dava início ao período experimental sido celebrado no dia 30 de Dezembro de 2011;
12 - Em lace da aplicação do referido aviso pela Direcção de Serviços de Gestão de Recursos Humanos, para efeitos de celebração de contrato para realização do período experimental, os aqui associados do A. não procederam à outorga do mesmo;
13 - Os associados do Autor, conforme elementos de fls. 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, e 19, tiveram notas compreendidas entre 9,6 e 10,4 valores, tendo ficado classificados em 432°, 467°, 513°, 518°, 580°, 638°, 655°, 664°, 714°, 715°, 747°, 783°, 785°, 813°, 856° e 874° lugares na lista de ordenação final (acordo);
14 - Os concorrentes que, nos termos do Aviso de 6 de Dezembro de 2011, subscrito pelo Chefe de Divisão da Direcção de Serviços de Gestão de Recursos Humanos, foram notificados para a presentação de documentos ficaram classificados até ao 414° lugar, sendo que a nota da última concorrente notificada para esse efeito (Sílvia Alexandra Pinto Lopes) foi de 10,8 valores, tendo ficado classificada em 414° lugar.”
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2.2.- MOTIVAÇÃO DE DIREITO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA (correspondentes aos artigos 660º nº 2, 664º, 684º nºs 3 e 4 e 690º do CPC antigo).
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pelas recorrentes, a questão que cumpre decidir passa pela reapreciação da Sentença proferida que ostenta o seguinte dispositivo (i)Julgar improcedentes as excepções de inimpugnabilidade dos actos impugnados e de ilegalidade da cumulação de pedidos e julgar improcedente o pedido impugnatório, absolvendo-se o Réu do mesmo.
Como decorre do petitório o A e ora recorrente, em defesa e representação de interesses individuais dos associados identificados na PI propôs contra o Ministério das Finanças e da Administração Pública a Acção Administrativa Especial visando a anulação de acto administrativo e de condenação à prática de acto devido, com invocação do art° 46° n° 2 a) e e) do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA), concretamente, a anulação do acto identificado no Aviso emanado do Chefe de Divisão da Direcção de Serviços de Gestão dos Recursos Humanos (DSGRH) da então Direcção Geral dos Impostos (actual Autoridade Tributária e Aduaneira - ATA) e do Despacho n° 2007/2011, de 21 de Novembro, proferido pelo Secretário de Estado da Administração Pública, sobre o qual aquele se consubstanciou, ambos publicados e divulgados junto dos seus associados em 06/12/2011.
O pedido principalmente formulados é o de condenação dos Ministros das Finanças e da Administração Pública a revogar os mencionados despachos e que no âmbito do concurso em questão, na tese do A. e ora recorrente, terão desrespeitado e não cumprido o princípio da prioridade no recrutamento por quem já detivesse uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, consagrado no n° 4 do art° 6° da Lei 12-A/2008, assim como no art° 23° da Lei do Orçamento de Estado (OE) de 2010 e do art° 39° da Lei do OE de 2012 e ainda condenados a reconhecer, no âmbito do procedimento concursal, a prioridade na colocação de todos os candidatos que já detinham uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado.
Reitera o A. em sede recursória, que os actos que impugna padecem dos vícios de violação de lei e de falta de suporte legal e que a sentença errou ao não ter perfilhado o enfoque dado à causa de pedir e ao pedido nos termos acabados de sumariar, sendo certo que a sentença transitou em julgado no que tange à excepcionalidade suscitada pela Entidade Demandada e consistente na inimpugnabilidade dos actos objecto da acção e na ilegal cumulação dos pedidos, impugnatório e condenatório, excepções que foram julgadas improcedentes.
São as conclusões da alegação do recorrente que definem o objecto e delimitam o âmbito do recurso, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontram nos autos os elementos necessários à sua consideração (cf. art° 635° n° 4 do CPC, ex vi art° 1° do CPTA).
Nesse sentido, propugna o recorrente que, contrariamente ao considerado na sentença, decorre do preceituado nos n°s 4 a 6 do art° 6° e do n° 2 do art° 50°, ambos da LVCR, a imperatividade da regra para a Administração Pública de que em qualquer procedimento concursal o recrutamento deverá iniciar-se, sempre, de entre trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, regime de prioridade que não foi respeitado, tendo a sentença errado ao não anular o acto.
Isso porque os representados pelo A. já detinham relação jurídica de emprego público, o que implicava que, a seguir aos trabalhadores colocados em regime de mobilidade especial, deveriam ter tido prioridade no recrutamento e ocupação das vagas existentes.
Quid juris?
Como bem assinala a EPGA no seu douto Parece cujo teor e conclusão geral acompanhamos, como sempre, com a devida vénia, o tribunal a quo identificou como questão decidenda a de saber se num concurso externo, na colocação dos candidatos aprovados deve ser dada prioridade aos candidatos aprovados que sejam já titulares de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado relativamente àqueles candidatos que não sejam titulares de uma relação dessa espécie, por virtude da aplicação do disposto no art° 6° n° 4 da Lei n° 12-A/2008.
Para responder a essa questão valeu-se da matéria de facto cuja fixação o A. e aqui Recorrente não impugnou minimamente, patenteando o probatório que por aviso n° 8928/2010, da ATA, publicado no DR, II Série de 05/05/2010, se procedeu, pelo prazo de 15 dias, a concurso externo de admissão a período experimental para a constituição de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, tendo em vista a ocupação de 350 postos de trabalho, da categoria de Inspector Tributário, nível l, da carreira de inspecção tributária (GAT) do mapa de pessoal da DGCI.
Mais emerge do probatório que os associados do A. foram opositores ao concurso, admitidos e aprovados, sendo que, à data da candidatura, eram já detentores de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado da então DGCI.
Também se consignou no probatório que o ponto 2 do Aviso estipulava que o concurso se regia, entre outros, pela Lei n°12-A/2008.
E que, em 28/05/2011 realizou-se a prova escrita de conhecimentos específicos e os associados do A. obtiveram todos uma classificação final superior a 9,5 valores, ficando aprovados, de acordo com a lista de homologação final, divulgada em 14/11/2011, como resulta do aviso n° 22968/2011.
Na sequência, reza também o quadro fáctico-conclusivo, a DGCI, como anunciado, notificou os primeiros 350 classificados em conformidade com o despacho n° 2007/2011, depois de deduzida a quota prevista no n° 12 do Aviso de Abertura publicado em 2010/05/05, para apresentarem a documentação necessária com vista à celebração do contrato para realização do período experimental e foi publicada em 2011/12/21 a lista de colocação dos candidatos nos postos de trabalho para a realização do estágio, na categoria de Inspector Tributário, nível l.
Vê-se ainda da tela factual que os representados do A. tiveram notas compreendidas entre 9,6 e 10,4, tendo ficado posicionados em 432° a 874°, sendo que o último concorrente notificado foi o colocado em 414° lugar e obteve 10,8 valores.
Com base nesta factualidade, foi o seguinte o enquadramento jurídico dado na sentença intentando dar resposta à questão decidenda supra identificada:
“(…)
O nº 4 do art.° 6° nº4 da Lei 12-A/2008, de 27.02., dispõe que "O recrutamento para constituição de relações jurídicas de emprego público por tempo indeterminado nas modalidades previstas no nº1 do artigo 9º inicia-se sempre de entre trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida", extraindo daqui o A. que este preceito estabelece a prioridade no recrutamento por quem já detém uma relação de emprego pública previamente estabelecida.
Recorda-se que, conforme resulta do Aviso de abertura em análise, a abertura do concurso realizou-se ao abrigo do disposto no nº 6 do artigo 6° ("Gestão dos recursos humanos em função dos mapas de pessoal") da Lei nº 12-A/2008, de 27.02, o qual dispõe que "Em caso de impossibilidade de ocupação de todos ou de alguns postos de trabalho por aplicação do disposto nos números anteriores, o órgão ou serviço, precedendo parecer favorável dos membros do Governo responsáveis pelas finanças e pela Administração Pública, pode proceder ao recrutamento de trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo determinado ou determinável ou sem relação jurídica de emprego público previamente estabelecida." (o sublinhado foi inserido pela signatária), ou seja, face ao número de postos de trabalho vagos e aos que previsivelmente iriam vagar, a DGCI concluiu que não era possível o recrutamento para ocupação dos postos de trabalho necessários com recurso apenas aos trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado e/ou determinado previamente estabelecida.
E, nesses termos, foi necessário solicitar autorização a título excepcional para a aplicabilidade do nº 6 do artigo 6° da LVCR, de modo a ocupar alguns desses postos de trabalho com trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, mas também com trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo determinado ou determinável ou sem relação jurídica de emprego. Tal autorização veio a ser concedida através dos Despachos a° 1214/2009/SEAP de 14 de Setembro do Secretário de Estado da Administração Pública e nº 686/2009/MEF, de 23 de Setembro, do Ministro de Estado e das Finanças, os quais são de mera concordância com a Informação n° 155/DSGRH/2009, de 10 de Setembro, da DGAEP, onde consta o Parecer da Sra. Directora-Geral da DGAEP, datado de 11.09.2009, junto à p.i sob documento n° 26, do seguinte teor: "Concordo, considerados os termos e fundamentos do pedido apresentado pela DGCI, tendo em vista o recrutamento para 350 postos de trabalho da carreira de inspecção tributária, pronunciando-me no sentido favorável ao parecer previsto no nº 6 do artigo 6° da LVCR, sem prejuízo se serem respeitados e cumpridos os requisitos do nº4 em conjugação com o nº 6 do mesmo preceito legal."
Após a publicação da lista de classificação final dos candidatos aprovados, através do Aviso divulgado pela DSGRH no dia 6 de Dezembro de 2011, foi divulgado que, em conformidade com Despacho n° 2007/2011, de 21 de Novembro, de Sua Excelência o Secretário de Estado da Administração Pública, apenas os candidatos integrados no SME teriam prioridade na colocação, por aplicação do disposto no n° 6 do art.° 6.° da Lei n° 12-A/2008, em vigor à data dos factos, sendo que os restantes candidatos seriam colocados de acordo com a sua ordenação, sem distinção entre os que já detinham contrato por tempo indeterminado ou não.
Entende o A. que "da análise do disposto no nº 4 do artigo 6°, a pretensão do legislador é clara ao fixar universos ou classes de prioridades no preenchimento dos diversos postos de trabalho colocados em concurso. Deste modo, mesmo que o procedimento concursal assuma uma natureza externa, os trabalhadores integrados em carreira e titulares de uma relação jurídica por tempo indeterminado, incluindo os que se encontrem em situação de mobilidade especial, têm, uma vez aberto o concurso para constituição de uma relação jurídica por tempo indeterminado, uma prioridade absoluta, na medida em que, desde que obtenham aprovação, deverão ser eles a preencher, em primeiro lugar, todos os lugares postos a concurso." Porém, sem razão. Desde logo, o n° 4 do referido art.° 6.° não consagra qualquer regra quanto à colocação de candidatos aprovados em concurso, apenas vinculando a Administração a recorrer aos concursos internos cujos destinatários são os detentores de vínculo, no preenchimento das vagas dos quadros. Ou seja, só pode abrir concursos externos quando preveja que os detentores de vínculo, incluindo aqueles que estejam integrados no SME, não sejam suficientes para o preenchimento das vagas necessárias e postas a concurso. E nada mais do que isso.
Ou seja, aberto um concurso externo, como foi o caso, apenas os candidatos integrados no SME têm prioridade na colocação (solução entretanto revogada pela Lei n.0 35/2014), sendo que os demais candidatos estão em pé de igualdade na colocação. Interpretar de outra forma, é não aplicar o segmento final do n° 6 do art.° 6.° da Lei n° 12-A/2008, o qual não habilita qualquer distinção entre os restantes candidatos aprovados, tal como bem entendeu o R. Não se desconhece o entendimento diferente deste, perfilhado no douto acórdão do Venerando TCA-Sul de 23.10.2014, proc. 10642/13, disponível in www.dgsi.pt e junto aos autos, ao qual não aderimos, pelas razões expostas.
Na verdade, só se o R. não tivesse colocado 350 candidatos aprovados, não obstante ter tal número de vagas, é que ficaria prejudicado o direito à vaga por quem obteve aprovação. Mas tal não sucedeu, uma vez que o último chamado ocupava o a° 414 na lista de ordenação final.
É quanto basta para concluir que improcede o vício de violação de lei que vem assacado aos atos impugnados.
Fica, assim prejudicado, o conhecimento do pedido condenatório, por estar dependente da procedência do pedido impugnatório.”
Concordamos com esta solução jurídica pois é veraz que, na sua literalidade que volta a citar mais uma vez mas de modo enfático, o nº 4 do art.° 6° nº4 da Lei 12-A/2008, de 27.02.,estabelece que "o recrutamento para constituição de relações jurídicas de emprego público por tempo indeterminado nas modalidades previstas no nº1 do artigo 9.º inicia-se .sempre de entre trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida."
Porém, e como se adverte na sentença, salienta a EPGA e decorre dos termos em que foi definido e anunciado, o concurso levado a efeito, foi realizado ao abrigo do art° 6° n° 6 do mesmo diploma que estipula (também enfatizamos mediante sublinhado, bold e itálico) que "em caso de impossibilidade de ocupação de iodos ou de alguns postos de trabalho por aplicação do disposto nos números anteriores, o órgão ou serviço, precedendo parecer favorável dos membros do Governo responsáveis pelas finanças e pela Administração Pública, pode proceder ao recrutamento de trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo determinado ou determinável ou sem relação jurídica de emprego público previamente estabelecida".
Por assim ser, como assertivamente refere a EPGA em louvação da sentença que igual distinção e precisão marcou, a questão sub judice é uma questão que tem de ser avaliada previamente à abertura do concurso, por isso se refere que o concurso deve ser precedido de parecer favorável dos membros do Governo responsáveis pelas Finanças e pela Administração Pública.
Donde que o concurso, realizado nos referidos termos, veio a ser previamente autorizado pelos Ministros da Tutela pelos despachos n°s 1214/2009/SEAP e 686/2009/MEF, deles se vendo com extrema clareza e rigor que não estabeleceram qualquer prioridade para os candidatos titulares de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, tendo no entanto que ser respeitada a prioridade legal para os trabalhadores do sistema de mobilidade especial (SME). sendo os restantes candidatos colocados de acordo com a sua graduação.
Neste contexto, são esclarecedoras as considerações tecidas pela recorrida nas suas contra-alegações no sentido de que in casu, o recrutamento revestiu a modalidade de concurso, estabelecendo nesse âmbito o artigo 54°, n° 1, da Lei n° 12-A/2008, que "O recrutamento efectua-se pela ordem decrescente da ordenação final dos candidatos colocados em situação de mobilidade especial e, esgotados estes, dos restantes candidatos".
E, como já se viu, não se encontrando os associados do Recorrente, na situação de mobilidade especial (SME), eles não gozavam de qualquer prioridade no recrutamento relativamente aos candidatos sem relação jurídica de emprego público previamente estabelecida que ficaram classificados em lugares que davam acesso às vagas postas a concurso.
Relevante é, ainda, a análise operada pela recorrida para demonstrar que o entendimento sustentado pelo Recorrente está inquinado, por carecer de total apoio legal, da alteração legislativa, que passou a vigorar a partir de 1 de Janeiro de 2012: “Na realidade, a Lei n° 64-B/2011, de 30.12 (respetivo artigo 39°), que aprovou o Orçamento do Estado para o ano de 2012, inaplicável ao concurso dos autos, por ser posterior à abertura do mesmo (por força do princípio "tempus regit actum"), relativamente aos procedimentos concursais estabeleceu o princípio da prioridade no recrutamento relativamente aos candidatos aprovados com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida.
A Lei n° 12-A/2008, de 27 de fevereiro, alterada pelas Leis n°s 64-A/2008, de 31 de dezembro, 3-B/2010, de 28 de abril, 34/2010, de 2 de setembro, 55-A/2010, de 31 dezembro, 64-B/2011, de 30 de dezembro, 66/2012, de 31 de dezembro, e 66-B/2012, de 31 de dezembro, e pelo Decreto- Lei n° 47/2013, de 5 de abril, na matéria em causa, foi revogada pela Lei n° 35/2014, de 20 de junho (respetivo artigo 42°), a qual aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
Neste momento, ao invés do que alega o Recorrente, "o recrutamento efetua-se pela ordem decrescente da ordenação final dos candidatos colocados em situação de requalificação e, esgotados estes, dos restantes candidatos" (artigo 37°, n° 3, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas).”
Por assim ser, nenhum reparo é objectivável à sentença ao perfilhar o entendimento de que o citado n° 4 do art° 6° não consagra qualquer regra de prioridade apenas impõe que o recrutamento para constituição de relações jurídicas de emprego público por tempo indeterminado se inicie sempre de entre trabalhadores com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida. Dito de outro modo: daqueles incisos legais apenas emerge que só pode recorrer-se a um concurso externo quando os detentores de vínculo incluindo os do SME não sejam suficientes para o preenchimento das vagas postas a concurso.
Atento o quadro fáctico traçado na sentença e que não foi posto em causa e, depois, o seu discurso jurídico, nela é absolutamente correcta a valoração segundo a qual, aberto um concurso externo, apenas os trabalhadores do SME têm prioridade no preenchimento das vagas e que o concurso externo só deve ser aberto depois de colocados os trabalhadores do SME.
Ora, tudo isso foi respeitado na sentença que, por não ocorrer o vício de violação de lei.do acto impugnado, não merece qualquer censura pois analisou correctamente os factos e fez boa aplicação do direito aplicável, julgando depois e em coerência, improcedente a acção.
Improcede, pois, in totum, as conclusões recursórias, devendo manter-se a sentença na ordem jurídica.

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3. –DECISÃO

Nesta conformidade, acorda-se, em conferência, os Juízes do 2º Juízo, 1ª Secção, do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente.

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Lisboa,02-03-2017

(José Gomes Correia) _____________________________________
(António Vasconcelos) _____________________________________
(Pedro Marchão)
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