Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07614/14
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:06/18/2015
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRC; INDISPENSABILIDADE DO CUSTO.
Sumário:
1) O critério da indispensabilidade visa impedir a consideração fiscal de gastos que não se inscrevem no âmbito da actividade da empresa, que foram incorridos não para a sua prossecução mas para outros interesses alheios. Por isso, a A.Fiscal pode excluir gastos não directamente afastados pela lei quando haja motivos que convençam de que eles foram incorridos na prossecução de outro interesse que não o empresarial, ou, ao menos, com nítido excesso, desviante, face às necessidades e capacidades objectivas da empresa.

2) Tendo em conta o objecto social da empresa – transformação e venda de ferro -, a aquisição de participações em empresa de objecto social distinto – industrias de madeira -, em situação de falência técnica e a sua venda em momento posterior, com base na projectada realização de um projecto urbanístico, o qual não mereceu qualquer autorização ou apoio por parte das entidades competentes e proprietárias dos terrenos em causa, não permite reconstruir o nexo de causalidade entre os custos incorridos e os proveitos da sociedade impugnante. Donde decorre que o nexo de indispensabilidade do custo não se mostra comprovado nos autos.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I- Relatório

A Fazenda Pública interpõe recurso jurisdicional contra a sentença proferida a fls. 646/668, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por “………………., SA” contra as liquidações adicionais de IRC relativas aos exercícios de 1997, 1998 e 1999.
A recorrente proferiu alegações a fls. 722/748, e após notificação para o efeito, formulou as conclusões seguintes:
I) Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou procedente a impugnação à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, por ter considerado que a aquisição da participação social da ………… pela impugnante consubstanciava um custo dedutível, nos termos do art.º 23.º do CIRC.
II) A questão decidenda consiste em saber se face aos factos dados como provados, da prova testemunhal produzida, bem como do Acórdão do TCAS que se pronunciou sobre o mérito há ou não erro de julgamento quanto à aquisição e alienação da ……… como menos valia dedutível, nos termos do art.º 23.º do CIRC.
III) Ora, dos factos dados como provados subsumiu-se o direito, tendo o Tribunal a quo considerado que a menos valias gerada pela alienação das participações sociais da ………, em 1997, era um custo, nos termos do art.º 23.º do CIRC, para a impugnante, tendo feito uma errada aplicação da lei.
IV) Na verdade, a Fazenda não concorda com a douta sentença porquanto houve erro de julgamento pois dos factos dados como provados não se subsume o direito vertido na douta sentença, devendo aquela ser substituída por outra.
V) E, não concorda a Fazenda porquanto a impugnante, em 1990 celebrou um contrato promessa de compra e venda de participações sociais com a sociedade …….; tendo sido outorgada, em 1992, a escritura de venda, pelo preço de 270.000 contos, em que o capital social da …….. passou de 1.740 contos para 5.000 contos, fruto da transformação em sociedade anónima, pelo que àquele capital social corresponde 5.000 acções com o valor nominal de 1.000$00, cada uma.
VI) Em 1997, a impugnante alienou a sociedade ……… por 39.968 contos à sociedade
"………………………SA", sociedade integrada no grupo ……, gerando uma menos valia de 229.816 contos, deduzida ao resultado tributável apurado nesse exercício.

VII) Em face do exposto, os serviços de inspecção questionaram a impugnante da discrepância entre o valor de aquisição e o de realização, tendo a impugnante alegado que a sociedade …… tinha as suas instalações em terrenos arrendados - cujo proprietário era a Câmara Municipal de Lisboa -, por um valor baixo, estando interessada em adquirir aqueles terrenos, pelo que comprou todo o capital social da ………, tendo ficado com o direito de arrendamento ao invés de realizar diligências junto dos proprietários daquele, pois pagaria um valor muito elevado. Assim, o interesse económico nos terrenos residia na possibilidade de poder concentrar propriedade de dimensão suficiente para propor um projecto de urbanização às entidades competentes, o qual foi gorado pelo Plano Director Municipal que não permitia que naquela zona se procedesse a qualquer nova edificação mas somente a reconversão e melhoramentos das existentes, pelo que decidiram alienar a ……. à …………….
VIII) Os serviços de inspecção solicitaram os contratos de compra e venda, os meios de
pagamento e o registo das acções em instituições bancárias, constatando que o valor de aquisição inicial foi de 270.000 contos, sendo que 220.000 contos estavam registados na contabilidade, no Diário de Caixa, como pagamentos efectuadas em numerário, sendo impossível efectuar a circularização dos cheques com os registos contabilísticos, tendo o TOC mencionado que desconhecia os motivos do procedimento, estranhando que se tenha pago por caixa verba tão alta.

IX) Os serviços de inspecção notificaram a Câmara Municipal de Lisboa, no sentido de obter informação sobre a possibilidade de nos terrenos em causa se poder implementar algum projecto imobiliário, se os mesmos se encontrariam à venda e se foi apresentado algum projecto nesse sentido, sendo a resposta negativa.
X) Acresce que a sociedade ……… estava relacionada com madeiras e a impugnante com a transformação / venda de ferro.
XI) A Fazenda terá de mencionar que, em 2007 o Tribunal Tributário de Lisboa julgou a presente impugnação, objecto do presente recurso, improcedente, a qual foi deduzida contra as liquidações de IRC e juros compensatórios relativas aos exercícios de 1997, 1998 e 1999.
XII) Em consequência do mencionado no ponto anterior, a impugnante interpôs recurso para o TCAS, mas antes já interpusera recurso do despacho judicial que dispensou a inquirição de testemunhas arroladas, tendo o TCAS negado provimento aos recursos.
XIII) A impugnante interpôs recurso, por oposição de Acórdãos para o Pleno da Secção de Contencioso do STA, tendo sido admitido e concedido provimento ao recurso, apenas no que tange ao despacho interlocutório, determinando-se a inquirição das testemunhas arroladas.
XIV) Mas, apesar do douto Acórdão ter determinado a inquirição das testemunhas arroladas, já o TCAS se tinha pronunciado sobre a questão objecto do presente recurso, tendo negado provimento ao recurso uma vez que a menos valia gerada não poderia ser considerada custo por não ser indispensável à actividade da impugnante.
XV) Aqui chegados, coloca-se a questão de saber se a inquirição de testemunhas foi de tal modo relevante para determinar decisão diversa, quanto ao mérito, daquela proferida no Tribunal Tributário de Lisboa e confirmada com diferente fundamento do Ac. do TCAS de 26/05/2009, proferido no proc. n.º 02999/09, sendo a resposta, desde já, negativa.
XVI) Na verdade, da prova testemunhal infere-se que:
Da 1.ª testemunha que a motivação da impugnante na aquisição do capital social da ……… SA consistia na possibilidade de vir a desenvolver um projecto imobiliário numa zona virada para o Rio Tejo e que a impugnante e a ……. eram empresas antigas, estando praticamente inactivas e, a possibilidade de desenvolverem um projecto imobiliário numa zona com bastante interesse surge como uma oportunidade de negócio, sendo este de risco em que se poderia perder ou ganhar muito dinheiro;
A 2.ª testemunha corroborou o que a l.ª haviam mencionado;
Quanto à 3.ª a sua razão de ciência era de ouvir dizer, sendo assessora do presidente da Câmara Municipal de Lisboa tomou conhecimento do projecto da impugnante em 1995, tendo conhecido aquela em 1996, numa reunião onde se manifestou pelo desinteresse do projecto Lamas, não tendo o presidente da Câmara Municipal de Lisboa interesse em levá-lo avante, não sendo do ponto de vista urbanístico desejado.
XVII) Com o devido respeito e salvo melhor opinião, a prova testemunhal não relevou nada de novo que já não constasse na p.i. e que se subsumia da prova documental junto aos autos, não conseguindo demonstrar que, atendendo ao objecto social da impugnante, transformação / venda de ferro, os custos ocorridos com vendas de participações sociais, menos valias se mostram necessárias para o exercício da actividade social da empresa e, como tal, não podem ser consideradas como custos.
XVIII) Por outro lado, não podemos descurar o facto que a aquisição da sociedade …… foi com base em expectativas de a impugnante poder vir a adquirir os terrenos arrendados pela ……. se a Câmara Municipal de Lisboa os decidisse vender, o que não aconteceu.
XIX) Mas, e o que disseram as testemunhas de relevante para o caso em apreço? Pouco, os depoimentos foram vagos e de ouvir dizer, pois nenhuma conseguiu explicar se a Câmara Municipal de Lisboa, proprietária dos terrenos em causa, viabilizaria qualquer projecto urbanístico ou outro para a zona e se estaria disponível para vender os terrenos.
XX) Aliás, Eduardo ……….. mencionou que ficou com a impressão de que com a Câmara era difícil concretizar o negócio e que esta aprovasse o projecto.
XXI) Por outro lado, o PDM foi aprovado e publicado em DR em 1994, pelo que não se
percebe que expectativa poderia a impugnante ter antes e depois dessa data.

XXII) Salvo o devido respeito, resulta da prova testemunhal produzida que a impugnante necessitava proceder a uma reestruturação financeira, que passava por renegociar a dívida com a banca e, nesse contexto precisava criar uma certa ficção de que o grupo tinha activos e era economicamente viável, razão pela qual terá efectuado, teoricamente, o negócio das acções subjacente, tendo valorizado aquelas 53 vezes, de 1.000$00 para 54.000$00, tendo-as alienado por 8.000$00.
XXIII) Assim sendo, a Fazenda chamando à colação o douto Acórdão, tendo seguido de perto a sua fundamentação e tal como sumário ficou consagrado que "(...) VII) -nos termos do art. 23º do CIRC, só se consideram custos do exercício, os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos ou para a manutenção da fonte produtora. // VIII) O artº 17º nº l do CIRC estabelece que uma das componentes do lucro tributável é o resultado líquido do
exercício expresso na contabilidade, sendo este resultado uma síntese de elementos positivos (proveitos ou ganhos) e elementos negativos (custos ou perdas). // IX) -É para definir o grupo dos elementos negativos que o artº 23º do CIRC enuncia, a título exemplificativo, as situações que os podem integrar consagrando um critério geral definidor face ao qual se considerarão como custos ou perdas aqueles que devidamente comprovados, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto e para a manutenção da respectiva fonte produtora. // X) -É no conceito de indispensabilidade ínsito no artº 23º do CIRC que radica a questão essencial da consideração fiscal dos custos empresariais e que assenta a distinção fundamental entre o custo efectivamente incorrido no interesse colectivo da empresa e o que pode resultar apenas do interesse individual do sócio, de um grupo de sócios ou do seu conjunto e que não pode, por isso, ser considerado custo. // XI) -Este, é uma despesa com um fim empresarial o que não quer dizer que tenha desde logo um fim imediata e directamente lucrativo, mas que tem, na sua origem e na sua causa, um fim empresarial, concedendo a lei à AT poderes bastantes para recusar a aceitação como custo fiscal de despesas que se não possam considerar compatíveis com as finalidades a prosseguir pela empresa. // XII) -Assim, a relevância fiscal de um custo depende da prova da sua necessidade, adequação, normalidade ou da produção do resultado (ligação a um negócio lucrativo), sendo que a falta dessas características poderá gerar a dúvida sobre se a causacão é ou não empresarial." - vide Ac. do TCAS de 26/05/2009 proferido no proc. n.º 02999/09.

XXIV) Aplicando mutatis mutantis o aresto supra ao caso em apreço, constatamos que o mesmo se aplica na íntegra pois a impugnante já havia recorrido da sentença do Tribunal a quo tendo o TCAS se pronunciado no aresto supra quanto à mesma questão, pelo que apesar de ter havido prova testemunhal não se vislumbra de que modo aquela possa afectar a decisão proferida no Acórdão.
XXV) Neste desiderato, a douta sentença posta em crise deverá ser revogada e em substituição da mesma deverá ser prolatada uma outra que determine a manutenção das correcções, com todas as devidas consequências legais.

A fls. 788/825, a recorrida proferiu contra-alegações, pugnando pela manutenção do julgado.
Formula as conclusões seguintes:
I) Através da impugnação judicial objecto do presente recurso, pretendia a Recorrida (então Impugnante) questionar a legalidade das liquidações de IRC relativas aos exercícios de 1997, 1998 e 1999, efectuadas pela AT.
II) Liquidações essas que assentaram na desconsideração fiscal da menos-valia realizada pela Impugnante em 1997, no montante de €229.816.000$00 (€ 1.146.317,38), com a venda de 4.996 acções que detinha, desde 1990, sobre a Sociedade ……….
III) A questão deddenda consistia, assim, em saber se a desconsideração jurídica, por parte da AT, da menos-valia resultante da operação realizada (venda das participações sociais da sociedade ………..) se encontrava em conformidade com o disposto no artigo 23.° do CIRC e nos princípios jurídico-constitucionais aplicáveis, ou seja, e dito de outra forma, saber se o valor da menos-valia resultante da mencionada operação deveria ou não ser considerado como custo fiscal.
IV) Após realização das diligências de prova - nomeadamente da inquirição de testemunhas, conforme foi ordenado, após recurso, pelo Supremo Tribunal Administrativo — veio o Tribunal a quo considerar que, atenta a factualidade
provada e o direito aplicável
(in casu o preceituado no artigo 23.° do CIRC), o custo em causa (a referida menos-valia) constituía justamente um custo fiscal, julgando, consequentemente, totalmente procedente a presente impugnação judicial.
V) Com efeito, começando por identificar — através da citação de ………………. e ………………….. - quais os requisitos que determinam que, nos termos do artigo 23.° do referido diploma legal, os custos devem ser aceites como custo fiscal ("comprovação" e "indispensabilidade"), e que, nos presentes autos "não de questiona a veraddade (existência e montante) da despesa contabilizada mas a sua relevando", centrou assim a em pleito no segundo dos requisitos, a "indispensabilidade".
VI) A este respeito, suportando-se na doutrina mais firmada em matéria de dedutibilidade de custos fiscais - TOMÁS CASTRO TAVARES e ANTÓNIO MOURA PORTUGAL -, assim como em jurisprudência de tribunais superiores (Tribunal Central Administrativo e Supremo Tribunal Administrativo), a sentença recorrida centrou-se nos seguintes fundamentos:
A indispensabilidade é um conceito indeterminado no qual, por força do
princípio da liberdade de gestão
(decorrente da liberdade constitucional de
iniciativa privada),
não confere à AT qualquer margem de livre apreciação quanto à oportunidade / razoabilidade do custo;
O requisito de indispensabilidade ínsito no artigo 23.° do CIRC deverá ser aferido numa perspectiva económico-empresarial mais lata do que o seu
mero
objecto social mas subsumíveis no escopo / fim último da sociedade: a obtenção do lucro;
São custos indispensáveis os encargos contraídos no interesse da empresa,
pelo que o
"conceito de indispensabilidade deve ser encontrado por recurso à integração
directa da despesa no escopo ou fim de interesse societário"
ou, nas palavras de
TOMÁS CASTRO TAVARES, sufragadas pelo Venerando STA -
in
processo 021515, de 23.09.1998 — "em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo ".

VII) Nesses termos, dando como provada a "intenção clara da Impugnante e do grupo societário em que esta está inserida no desenvolvimento de um projecto imobiliário na zona da Boavista, nos terrenos quer da Impugnante, quer da …………………., SA, quer da ………………., Lda", e que "a aquisição das participações sociais da ………., S.A., pela Impugnante corresponde a um custo contraído no interesse desta e do grupo a que pertencia".
VIII) Considerou então o Tribunal a quo, à luz do conceito deindispensabilidade supra referido, que, "[p]ese embora, o caracter ruinoso do negócio [gorado com a não aprovação do projecto imobiliário apresentado pela ……. à Câmara Municipal de Lisboa] a actuação da Impugnante foi no sentido da obtenção de proveitos com o projectado empreendimento imobiliário ", a menos-valia aqui em causa "assume-se como uma despesa com fim empresarial".
IX) Prosseguindo, refere ainda o Tribunal a quo que “tais custos assumem-se como indispensáveis porque relacionados com os interesses da Impugnante e do grupo societário a que pertence, não se encontram registados abusivamente na contabilidade e não foi questionada a
sua existência real e efectiva".

X) E concluiu afirmando que "o custo em causa nos autos [relembre-se, a menos-valia decorrente da venda da participação da sociedade ……], apesar de ruinoso, preenche o requisito da indispensabilidade, contraído no interesse da Impugnante, porque
conectado com a obtenção do lucro ".

XI) Nestes termos e com estes fundamentos — e rejeitando a tese defendida pela RFP — julgou então o Tribunal a quo procedente a presente impugnação judicial.
XII) Decisão esta que, com o devido respeito — evidenciando, face às decisões anteriormente proferidas no âmbito deste mesmo processo (anuladas pelo STA por força do acórdão proferido em sede de oposição de acórdãos), independência e firmeza na sua convicção —, respeitou, na óptica da Recorrida, aquela que é a interpretação mais correcta do artigo 23.° do CIRC.
XIII) Inconformada, veio contudo a RFP interpor recurso da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, com alegado erro de julgamento, na medida em que "dos factos dados como provados não se subsume o direito vertido na douta sentença".
XIV) Ora, antes de mais importa frisar que as alegações apresentadas pela RFP, além de incompletas (falta a página 4) e não apresentarem verdadeiras conclusões, contêm manifestas incorrecções e inverdades, designadamente na parte dos factos, referenciando aqui o alegado facto (não verdadeiro) de a Sociedade …………… estar integrada no Grupo …… (referido na pág. 2 das alegações de recurso).
XV) Prosseguindo, embora inicie as suas alegações por (aparentemente — e com um escopo, quanto a nós, claro...) pôr em causa quer a matéria de facto dada como provada quer a matéria dada como não provada, a verdade é que, conforme facilmente se constata das alegações apresentadas, o que a Recorrente efectivamente pretende é pôr em causa a interpretação feita pelo Tribunal a quo sobre o conceito (correcto) de indispensabilidade, procurando sustentar a interpretação a explanada no acórdão anteriormente proferido nos presentes autos que havia sido proferido sem que tivesse havido lugar a produção de prova testemunhal (Recurso n.° 2999/09, de 26.05.2009).
XVI) Nesses termos, limitando-se a transcrever (literalmente) a totalidade do libelo constante do citado acórdão, conclui as suas alegações dizendo: "aqui chegados, coloca-se a questão de saber se a inquirição de testemunhas foi de tal modo relevante para determinar decisão diversa, quanto ao mérito, daquela proferida no Tribunal Tributário de Lisboa e confirmada com diferente fundamento pelo TCAS".
XVII) Considerando a RPF que "a resposta terá de ser negativa porquanto a prova testemunhal não relevou nada de novo que já não constasse da p.i. e que se sub sumia da prova documental junto aos autos, não se conseguindo demonstrar que, atendo ao objecto sodal da impugnante, transformação / venda de ferro, os custos ocorridos com vendas de partidpações sociais, menos valias se mostram necessárias para o exercido da actividade sodal da empresa e, como tal, não podem ser considerados como custos."
XVIII) Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, julga a aqui Recorrida que a douta sentença proferida não padece de qualquer erro de julgamento, muito antes pelo contrário, e isto porquanto, face aos factos e ao direito aplicável, muito bem andou o Tribunal ao considerar a menos-valia em causa como um custo fiscal.
SENÃO VEJAMOS,
XIX) Na óptica da Recorrente um custo só será indispensável se tiver subjacente uma operação com racionalidade económica aferida em função do objecto social da Empresa: dito de outra forma, na opinião da RFP o custo é indispensável, apenas e só, quando é possível efectuar uma evidente ponderação económica (a dita razoabilidadè) em função do seu objecto social, pelo que não havendo conexão desta com o custo não poderá haver, na óptica da RFP, razoabilidade económica, não sendo preenchido, consequentemente, o requisito da indispensabilidade do custo.
XX) ORA, e sempre com o devido respeito, não nos parece que esta interpretação tenha a mínima correspondência com o sentido que o legislador quis atribuir à norma e que hoje, com a reforma do CIRC, não nos parece que ofereça qualquer dúvida.
XXI) Primeiro porque na realidade, como é hoje assente quer na doutrina quer na jurisprudência, o artigo 23.° do CIRC não legitima um qualquer poder discricionário por parte da AT nem pretende atribuir a esta a possibilidade de se intrometer na gestão dos aspectos comerciais da sociedade: não se pode avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios de oportunidade e de mérito, ou seja, em função de uma análise da mutabilidade económica.
XXII) Tal interpretação levaria, como alerta TOMÁS CASTRO TAVARES, a resultados absurdos, pois "no limite, nunca de aceitaria a dedutibilidade dos custos conexos com negados que se viessem a revelar ruinosos para a empresa".
XXIII) Segundo porque a indispensabilidade do custo não pode ser aferida em função do objecto social da Empresa mas tão só em função do escopo l fim da sociedade, ou seja, do lucro.
XXIV) Esta interpretação impõe-se, além do mais, não só por razões de igualdade, proporcionalidade e reciprocidade relativamente ao tratamento fiscal das mais-valias - se em causa estivesse não uma menos-valia mas sim uma mais-valia, resultante da venda da participação da ........, dúvidas certamente não se suscitariam em considerar esse ganho como rendimento, mesmo que inicialmente o negócio não evidenciasse, face ao objecto social da Empresa, qualquer razoabilidade económica.
XXV) Mas também por força dos princípios constitucionais da tributação pelo
rendimento real e da capacidade contributiva, pois, por exigência constitucional,
a
tributação das empresas incide, fundamentalmente, sobre o lucro real, o que significa ter em consideração tanto a universalidade das formas positivas de riqueza, incluindo as que se produzem independentemente da vontade do sujeito passivo, como a totalidade dos custos e perdas que se experimentaram na obtenção dos acréscimos patrimoniais, independentemente da razoabilidade económica ou até da sua relação com o objecto social.
XXVI) Termos em que, um custo é indispensável se tiver sido realizado com vista ao escopo lucrativo, ainda que se traduza num mau ou até mesmo num ruinoso negócio.
XXVII) Com efeito, chamando de novo à colação os proveitosos ensinamentos de TOMAS CASTRO TAVARES os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo. […] a dedutibilidade fiscal do custo depende, apenas, de uma relação causal e justificada com a actividade produtiva da empresa.» (in Obra citada, pág.s 136-137).
XXVIII) Entendimento este sufragado não só pelo tribunal a quo mas também, de forma linear, pela jurisprudência dos tribunais superiores, sendo aqui de citar, designadamente, os seguintes arestos:
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 26 de Janeiro de
2005, proferido no âmbito do recurso n.°0937/04 (e publicado em www.dgsi.pt), nos termos do qual "deve ser considerada como custo, nos termos do
disposto no arf'23°, n" 1, al. b) do CIRC e como tal dedutível ao lucro tributável (…) na
medida em que não há qualquer disposição legal que impeça (...) de exercer tal actividade[outra que não a prevista no objecto social] e a mesma não é incompatível com o
seu escopo principal [lucro]".

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 11 de Janeiro de 2007, no âmbito do recurso n.°00070/01 (e publicado em www.dgsi.pt), menciona, de forma clara, que "para que esses custos relevem fiscalmente têm de estar afectos à exploração, no sentido de que deve existir uma relação causal entre os custos e os proveitos da empresa, em termos de adequação económica do acto à finalidade da obtenção maximalista de resultados", continuando, nessa mesma linha de pensamento, que "O critério da indispensabilidade visa impedir a consideração fiscal de gastos (...) que foram incorridos (...) para outros interesses alheios. Por isso, a A. fiscal pode excluir gastos não directamente afastados pela lei quando haja motivos que convençam de que eles foram incorridos na prossecução de outro interesse que não o empresarial".
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 17 de Julho de
2007, no âmbito do recurso n.°01107/06 (e publicado em www.dgsi.pt),
explica que da "noção legal de custo fornecida pelo art. 23° do CIRC não resulta que
a AT possa pôr em causa o princípio da liberdade da gestão, sindicando a bondade e
oportunidade das decisões económicas da gestão da empresa e considerando que apenas podem ser assumidos fiscalmente aqueles de que decorram, directamente, proveitos para a empresa ou que se revelem convenientes para a empresa. A indispensabilidade a que se refere o art. 23° do CIRC como condição para que um custo seja dedutível não se refere à necessidade (a despesa como uma condição sine qua non dos proveitos), mm sequer à conveniência (a despesa como conveniente para a organização empresarial), sob pena de intolerável intromissão da AT na autonomia e na liberdade de gestão do contribuinte, mas exige, tão-só, uma relação de causalidade económica, no sentido de que basta que o custo seja realizado no interesse da empresa, em ordem, directa ou indirectamente, à obtenção de lucros".

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 20 de Junho de 2006, no âmbito do recurso n.° 00365/02 (e publicado em www.dgsi.pt), invocado pelo Tribunal a quo, nos qual, é mencionado que «...[A] 'indispensabilidade" dos custos é um conceito indeterminado em que, portanto, o poder da administração é rigorosamente vinculado, inexistindo qualquer margem de livre apre dação, por parte da mesma, não havendo que formular juízos de oportunidade mas do tipo cognoscitivo.
"A noção legal de indispensabilidade recorta-se, portanto, sobre uma perspectiva económico-empresarial, por preenchimento, directo ou indirecto, da motivação última de contribuição para a obtenção do lucro. Os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo. (...)"
Através da noção legal de indispensabilidade assim decantada, compatibiliza-se, por um lado, a liberdade de gestão das empresas e, por outro, a salvaguarda dos interesses tributários do Estado, na medida em que a mesma permite a preclusão da dedutibilidade fiscal dos custos inerentes a operações não inseríveis no interesse societário, sobretudo porque não visam o lucro".
XXIX) Estando assim determinado e delimitado o conceito de indispensabilidade e atenta a prova produzida nos presentes autos, não há forma de negar que a menos-valia aqui em causa não poderia senão efectivamente ter constituído um custo fiscal.
XXX) Com efeito, tendo ficado demonstrado - como bem realça o Tribunal a quo — que a aquisição da participação na ……… assentou numa clara e evidente iniciativa empresarial, destinada à obtenção de proveitos com o projectado empreendimento imobiliário, ou seja, o lucro, é por demais evidente que "o custo em causa nos autos, apesar de ruinoso, preenche o requisito da
indispensabilidade" na medida em que foi "contraído no interesse da Impugnante, porque conectado com a obtenção do lucro".

XXXI) Em face de tudo quanto o exposto, não nos parece que a sentença proferida pelo Tribunal a quo padeça de qualquer erro de julgamento, já que na mesma se faz uma correcta interpretação quer do artigo 23.° do CIRC quer da subsunção dos factos ao direito, pelo que deve a mesma ser mantida por esse Venerando Tribunal.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da concessão de provimento ao recurso jurisdicional (cfr. fls. 854/855).
Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão.
X
II- Fundamentação.
2.1.De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:
A) A Administração Fiscal procedeu a inspecção à actividade da Impugnante e elaborou o relatório de fls. 52 e segs. que aqui se dá por integralmente reproduzido e donde resulta com interesse para a decisão:
«DESCRIÇÃO SUCINTA DAS CONCLUSÕES DA ACÇÃO INSPECTIVA
Da acção inspectiva efectuada ao exercício de 1997, em sede de IRC foi efectuada uma correcção no montante de 229.816.000$00, relacionada com a não aceitação da menos-valia fiscal, para efeitos de determinação do resultado tributável, derivada da venda de activo financeiro (acções).
II- OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA
A - ORDEM DE SERVIÇO PERÍODO EM QUE DECORREU A ACÇÃO
Em conformidade com a Ordem de Serviço n.º …………., de 01/02/2000, com despacho para inspecção externa de 2000/02/04, efectuou-se uma visita à firma ………………………, LDA, NIPC …………., com sede na Rua…………., ……- 1200 Lisboa, tendo em vista averiguar a situação tributária em sede de IRC, nomeadamente a rubrica de "Menos - Valias Fiscais" no exercício de 1997.
B MOTIVOS E INCIDÊNCIA TEMPORAL
A análise da situação tributária deste contribuinte foi iniciada internamente com pedido de esclarecimento efectuado em 09/03/2000, mas, havendo necessidade de deslocação à empresa, dado o facto de terem surgido duvidas na análise dos esclarecimentos solicitados, nomeadamente em relação à rubrica das "Menos -Valias Fiscais" foi esta acção interna transformada em externa iniciado em 2000/09/21, que, motivos diversos e estando a terminar o prazo para a sua conclusão, foi solicitado o prolongamento da mesma, ao abrigo do art.º 36.º do R.C.P.I.T., o que foi sancionado superiormente, pelo que foi aberta a correspondente ordem de serviço.

/// - DESCRIÇÃO DOS FACTOS
MENOS-VALIAS FISCAIS
Em 1990, com escritura de venda efectuada em 1992, a empresa ……………., LDA adquire, por 270 000 contos, todo o capital social da firma …………………., LDA, que era de 1.740 contos, tendo sido entretanto a empresa transformada em sociedade anónima e o capital social aumentado para 5.000 contos correspondente a 5.000 acções de valor nominal de 1.000$00, cada.

Em 1997, decidiram alienar este activo financeiro por 39.968 contos (constando somente no Mapa 31 a alienação de 4 996 acções) a uma empresa imobiliária denominada ……………………….., SA, não existindo relações directas entre ambas, mas indirectas por via de participações cruzadas, gerando, assim, uma menos - valia fiscal no montante de 229 816 contos, deduzida ao resultado tributável (positivo) apurado neste exercício.
Segundo explicações orais, obtidas no decorrer desta inspecção e posteriormente solicitadas por escrito, dos responsáveis da empresa para esta grande diferença de verbas, a sua razão de ser é explicada da seguinte maneira:
A firma ………., LDA tinha as suas instalações em terrenos arrendados, cujo
proprietário é a Câmara Municipal de Lisboa, por um valor baixo, junto ao Rio Tejo, na zona de Alcântara. A empresa ……………….., S A, estava interessada nestes
terrenos pelo que pensou em adquiri-los. No entanto se o fizesse directamente junto dos proprietários teria que pagar provavelmente um valor muito elevado, pelo que a maneira que encontrou foi comprar todo o capital social da empresa ……., LDA, e, assim, ficar com o direito ao arrendamento e, posteriormente, vir a tomar posse
definitiva destes terrenos.

• O interesse económico da posse destes terrenos residia na possibilidade de
poder "... concentrar propriedade com dimensão para propor um projecto de
urbanização às entidades competentes ".

•Estas pretensões saíram, no entanto, goradas porque o Plano Director
Municipal não permite que nessa zona se proceda a qualquer nova edificação mas somente a reconversão e melhoramento das existentes.

• Perante esta situação decidiram "...alienar um activo não afecto à exploração... que com o passar dos anos se estava a tornar um negócio ruinoso...".
No sentido de averiguar destas situações, procedeu-se, junto da firma à análise dos elementos julgados necessários, nomeadamente:
•Contractos de compra/venda
•Meios de pagamento
•Registo das acções em instituição bancária


Desta análise observou-se que do valor de aquisição inicial no montante de 270 000 contos, 220 000 contos estão registados na contabilidade no Diário de Caixa como pagamentos efectuados em numerário.
Dado este elevado montante procurou-se saber as razões de tal procedimento tendo o responsável actual da contabilidade dito que desconhecia os motivos, estranhando, no entanto, que se tenha pago por Caixa verba tão alta.
Analisados, também, os movimentos de Caixa constatou-se que nela deram entrada, por contrapartida do Diário de Bancos, através da emissão de cheques ao portador, verbas necessárias para cobrir esta saída, assim como a entrada em Bancos, por transferência de outra conta bancária de verba suficiente para justificar a saída.
Solicitados ao contribuinte cópia dos cheques para verificar quem os foi descontar ao banco, no sentido da confirmação se de facto os registos contabilísticos efectuados no Diário de Caixa são reais, foram-nos entregues fotocópias dos mesmos pedidos pelo contribuinte ao Banco. Da sua análise observou-se que neles não constava qualquer assinatura, pelo que foi de todo impossível extrair qualquer conclusão sobre a realidade destes registos contabilísticos.
Por outro lado, tendo em vista viabilizar as afirmações do contribuinte, solicitou-se à Câmara Municipal de Lisboa, proprietária dos terrenos, informação da possibilidade de nos terrenos em causa se poder implementar algum projecto imobiliário e se alguma vez foi apresentado qualquer projecto nesse sentido.
Em resposta esta Câmara afirma pela negativa.
Também se procurou obter por escrito junto dos antigos sócios da ………., Lda, elementos mais esclarecedores relacionados com os meios de pagamento utilizados aquando da compra.
Das respostas obtidas nada de concreto foi adiantado. Apenas o que ficou esclarecido foi o facto de um único sócio ter recebido a totalidade da verba e após efectuado o saneamento do balanço, procedeu à distribuição do remanescente pelos outros sócios em função das suas quotas.
A firma ………, Lda, neste momento encontra-se com reduzida actividade. Em deslocação à sua sede, não foi possível recolher mais elementos sobre estes factos uma vez que os documentos contabilísticos do exercício de 1990, se encontrarem em parte incerta.
A actividade exercida pela firma ………………….., Lda. está relacionada exclusivamente com a transformação/venda de ferro, pelo que suporta custos e obtém proveitos correlacionados com esta actividade.
Segundo regras fiscais existentes e expressas no art. º 23. º do CIRC, para que os custos sejam dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável, terá que ser comprovada a sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, ou seja terá. que existir uma relação causa e efeito entre os custos suportados e os proveitos obtidos.
O art. º 42. º do CIRC, define como menos — valias as perdas que sofrem os elementos do activo imobilizado, em resultado da sua transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, bens que o POC classifica como aqueles que são detidos com continuidade, ou seja que não se destinam a ser vendidos durante a actividade normal da empresa. Extrai-se, desta definição fiscal de menos - valia que nela se podem incluir tanto os meios de produção propriamente dito bem como as aplicações financeiras de carácter permanente, registadas na rubrica de Investimentos Financeiros.
No entanto, em relação a estes últimos, apesar da sua permanência na empresa por vários anos, não são necessários para assegurar o desenvolvimento da actividade normal mas apenas a proporcionar rendimentos periódicos e/ou a poder eventualmente exercer influência na gestão de outras empresas, pelo que as menos— valias obtidas só poderão ser aceites para efeitos de determinação do lucro tributável se for comprovada a sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, tal como se encontra expressamente definido no art. º 23. º do CIRC, que terá de ser suportada no interesse económico válido que motivou tal operação.

Acontece que, da análise desta transacção, tal interesse não se vislumbra, dado que foram adquiridas por 54 000$00, valor exageradamente elevado, acções que estavam valorizadas a l 000$00, de uma empresa tecnicamente falida, uma vez que o seu património à data da aquisição era praticamente nulo, com a justificação de que "... era de extrema importância económica concentrar propriedade com dimensão para propor um projecto de urbanização às entidades competentes", o que não se compreende uma vez que os terrenos onde afirma ………, Lda, exerce a sua actividade são arrendados e nunca houve a intenção segundo a proprietária dos mesmos, de proceder à sua venda e a possibilidade de as "entidades competentes " autorizarem a implementação de qualquer urbanização.

Acresce, ainda referir que não se entende, tendo em conta os valores envolvidos na compra destes activos financeiros e para salvaguardar potenciais perdas futuras derivadas das flutuações de valor a que estão sujeitos estes títulos, porque não se seguiu o principio contabilístico da prudência que recomenda que estas perdas sejam cobertas pela constituição de provisão, mas não dedutíveis fiscalmente por não estarem previstas no artº 33. º do CIRC.

Como conclusão de tudo o que antes se explanou é nossa convicção de que esta menos — valia obtida na transmissão onerosa das acções da firma……….., S A, (adquiridas por um valor de 54 000300, quando o seu valor nominal era de l 000$00) não pode ser considerada como uma perda tida como indispensável para a manutenção da fonte produtora e ser, assim, aceite como dedutível para efeitos fiscais, à luz do disposto no art.º 23.º do CIRC, devido à evidente ausência de racionalidade económica desta operação.

IV— INRA CÇÕES /PENALIZACÕES
A dedução indevida à matéria tributável da menos—valia fiscal apurada na alienação de activos financeiros infringiu o disposto no art. º 23. º do CIRC, por não ser um custo comprovadamente indispensável para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, estando tal infracção prevista no n.º 4 do art. º 34. º do RJIFNA que a penaliza.
V- DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO
Com data de Correio de 22/02/01, foi enviada, para este contribuinte, notificação das conclusões da acção inspectiva, para que no prazo de 10 dias, se assim o entendesse, exercesse o direito de audição previsto no art. º 60. º da L. G. T. e art.º 60.º do R.C.P.I.T.
Em resposta, no dia 07/03/01, foi recebida neste Serviço de Inspecção carta emanada deste contribuinte na qual vem exercer o direito de audição sobre o projecto de relatório que lhe foi enviado.
Na análise desta carta observa-se que não são acrescentados novos e concretos elementos que contrariem a posição da Administração Fiscal sobre a correcção efectuada, limitando-se o contribuinte a invocar os argumentos que anteriormente nos foram transmitidos quer verbalmente quer por escrito, pelo que se mantém a posição antes assumida de, à luz do disposto no art. º 23. º do CIRCI não aceitar a dedutibilidade desta menos - valia fiscal por não estar comprovada a necessidade da sua existência para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, pelo que nesta data se dá por findo o processo.
De referir, ainda, para corroborar a manutenção desta correcção, que foram consultados os processos de IRC dos exercícios de 1990, 1991 e 1992 não se encontrando quer nos relatórios de gestão quer nos pareceres do ROC quaisquer referencias ao manifesto interesse económico desta transacção.
Lisboa - Inspecção Tributária, 09 de Março de 2001»
B) Sobre o relatório a que se refere a alínea anterior recaíram o parecer e o
despacho de concordância de fls. 44, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

C) Posteriormente, a impugnante foi sujeita a uma outra acção de inspecção, relativa aos exercícios de 1998 e 1999, na qual, se considerou que, derivado da correcção efectuada ao exercício de 1997, foi alterado o resultado fiscal declarado, pelo que os prejuízos existentes até este ano foram absorvidos por esta correcção, pelo que os reportes efectuados para os exercícios de 1998 e 1999 deixaram de ter razão de existir, remetendo para a demonstração do quadro de fls. 48 dos autos - cfr. no ponto III do relatório de inspecção, junto a fls. 44 a 49 dos presentes autos, o que se dá por integralmente reproduzido.
D) Conclui, então, a Administração Fiscal, que a dedução dos prejuízos, por parte do contribuinte, nos exercícios de 1998 e 1999 foi indevida, por inexistente, pelo que a matéria colectável declarada será corrigida, passando, relativamente ao exercício de 1998, de uma matéria colectável declarada nula para uma matéria colectável corrigida de 120.345.301$00 (€ 600.279,83) e, relativamente ao exercício de 1999, de uma matéria colectável declarada de 50.578.836$00 (€ 252.286,17) para uma matéria colectável corrigida de 108.403.908$00 (€ 540.716,41).
E) Em 07/06/2011, foi elaborada a liquidação adicional de IRC referente ao ano de 1997, cfr. fls.
F) O prazo para pagamento voluntário terminou em 06/08/2001.
G) Em 16/06/2011, foi elaborada a liquidação adicional de IRC referente ao ano de 1998, cfr. fls. 29.
H) O prazo para pagamento voluntário terminou em 13/08/2001.
I) Em 16/06/2001, foi elaborada a liquidação adicional de IRC referente ao ano de 1999, cfr. fls. 30.
J) O prazo para pagamento voluntário terminou em 13/08/2001.
K) A petição inicial foi apresentada em 05/11/2001, cfr. carimbo aposto a fls. 1.
L) A …………………….. integra um grupo económico encabeçada pela …………………………, S.A. e composta ainda, entre outras, por ……………………, LIDA.
M) A ……………………………, S.A., detinha uma participação na …………………., SA, superior a 90%; por seu turno a ………………….., LIDA era dominada pela …………………. e pela …………………….., LDA que por sua vez era dominada pela …………………………………, S.A. cfr. fls. 62 e segs..
N) A ………………………………., S.A., era locatária de um terreno na Zona de Alcântara, junto ao Tejo, contíguo a uma propriedade da impugnante e a outra de ……………………………, LIDA, Cfr. fls. 90 e 91.
O) Em 1990, a ……………………………., S.A. solicitou à Câmara Municipal de Lisboa a aprovação de uma determinada capacidade volumétrica para os terrenos, quer da Impugnante, quer da …………………………, S.A., quer da ………………………., LIDA, limitados a norte pela Rua ………………., a sul pela Avenida …………………, a nascente pela Rua …………………… e a poente pela Avenida …………….., na freguesia de …………….., cfr. fls. 93 e segs.
P) O pedido a que se refere a alínea anterior — que veio a obter o número de processo 2808/OB/90 junto da Câmara Municipal de Lisboa.
Q) Em 1991, a Câmara Municipal de Lisboa, considerando o estudo que deu origem ao processo 2808/OB/90 formulado pela ……., decidiu iniciar a elaboração de um Plano de Pormenor para a zona em causa, a cargo do Departamento de Engenharia do Instituto Superior Técnico, cfr. fls. 137 a 139.
R) Em Setembro de 1993, os serviços camarários indeferiram e arquivaram o referido projecto de volumes, com base no argumento de que a Edilidade tinha entretanto iniciado a feitura de um plano de pormenor para a zona, cfr. fls. 140.
S) Em Junho de 1994, a Câmara estava ainda a ultimar tal plano de pormenor de reconversão urbanística do aterro da Boavista — Av. 24 de Julho, cfr. fls. 141.
T) O Plano Director Municipal de Lisboa, aprovado por deliberação da Assembleia Municipal de 26 de Maio de 1994 e na Resolução do Conselho de Ministros n.º 94/94 (publicado no Diário da República l Série, de 29 de Setembro de 1994) não permitiu que nessa zona se procedesse a qualquer nova edificação mas somente a reconversão e melhoramento das existentes.
U) A Impugnante foi ao longo dos anos "injectando", a título de suprimentos, verbas que superaram os 50 mil contos na ………………………………., S.A., cfr. fls. 144.
V) A impugnante, juntamente com outras sociedades do mesmo grupo económico celebraram um contrato de viabilização financeira com os seus bancos credores, cfr. fls. 145 e segs.
W) Em 31/10/1997, a Impugnante vendeu as 4.996 acções da ……. que detinha, pelo valor de Esc. 39.968 contos — 8.000$00 por acção, cfr. fls. 174.
X
Em sede de fundamentação da matéria de facto consignou-se: «Todos os factos têm por base probatória, os documentos referidos em cada ponto, o processo administrativo, o acordo das partes e os depoimentos das testemunhas inquiridas.

A l.a testemunha, em síntese, referiu: // À data dos factos o Depoente integrava a direcção financeira da …………………….., S.A (…….., S.A.), que detinha o domínio da Impugnante e, por isso, tinha conhecimento das motivações e da estratégia de todo o grupo e assistia às reuniões de todo o grupo. A Impugnante fez a aquisição de participações sociais da sociedade ………………………, S.A. (……., S.A.) em 1990 por cerca de 270 mil contos. Foi celebrado inicialmente um contrato promessa e cerca de dois anos depois foi celebrado o contrato definitivo. A …….., S.A. tinha um capital social de 5 mil contos. As instalações onde funcionava a …….., S.A. eram contíguas a outros terrenos pertencentes à sociedade …………………….., LDA. (……, LDA.), que era controlada pela Impugnante. Com a aquisição dos terrenos onde funcionava a ……….., S.A. permitia à Impugnante desenvolver um projecto imobiliário. Encarou-se a possibilidade de desenvolver um projecto imobiliário que poderia trazer vantagens para as empresas do grupo, nomeadamente para a Impugnante. Por referência ao documento de fls. 90. os terrenos contíguos pertenciam à Impugnante e à ………., LDA. e que, por sua vez eram contíguos à ………, S.A. Os terrenos onde está a sede da Impugnante pertenciam à ……., S.A. e os terrenos da …….., LDA. foram adquiridos pela Impugnante. A Motivação da Impugnante na aquisição do capital social da ………., S.A. consistia na possibilidade de vir a desenvolver um projecto imobiliário numa zona virada para o Rio Tejo. A Impugnante e a ……., S.A. eram empresas antigas que eram servidas pelo porto de Lisboa e que estavam praticamente inactivas e a possibilidade de desenvolverem um projecto imobiliário numa zona com bastante interesse surge como oportunidade de negócio. Os terrenos da …….., S.A. pertenciam ao Município de Lisboa, no entanto aquela sociedade tinha sempre preferência na aquisição dos citados terrenos. Pensou-se que poderia ser a melhor forma de vir a adquirir os terrenos uma vez que passou a ser o arrendatário no momento em que comprou a sociedade. Tem ideia de a …….., S.A. ter efectuada à Câmara Municipal de Lisboa (CML) um pedido de informação sobre a volumetria para a zona em questão. Recorda-se que ocorreram muitas reuniões com a CML, tendo em vista a aprovação de um projecto imobiliário para a zona onde se situa os terrenos. Nunca se obteve a aprovação de qualquer projecto imobiliária. Na altura quer a Impugnante quer a ……., S.A. estavam a passar uma situação financeira difícil. Foram iniciadas negociações com os bancos visando uma reestruturação financeira e por pressão dos bancos a Impugnante foi obrigada a alienar alguns dos seus activos tendo em vista reestruturação financeira que culminou com a celebração de um contrato de reestruturação financeira em 1994. Por referência ao contrato de fls. 140 e segs. referiu que foi efectuada uma dação em pagamento e em 1997 foi vendida a participação na …….., S.A.. A falta de deferimento do projecto de empreendimento imobiliário levou ao seu esgotamento, gorando-se o projecto. A pressão dos bancos e a necessidade de liquidez levou a que a Impugnante tivesse de vender as participações sociais na …….., S.A.. A valorização das acções resultou da expectativa de vir a desenvolver o projecto imobiliário. A instância da Ilustre Representante da Fazenda Pública esclareceu: que a valorização das acções da …….., S.A. decorreu da possibilidade de a Impugnante vir a adquirir à CML os terrenos onde se situavam as instalações da …….., S.A. que complementavam a existência de outros terrenos e que permitiria numa zona central, privilegiada, virada para o Rio, desenvolver um projecto imobiliário. A …….., S.A. como arrendatária tinha sempre o direito de preferência na aquisição dos terrenos. Era um negócio de risco em se poderia perder ou ganhar muito dinheiro.

A 2a testemunha Eduardo Costa
Conhece a sociedade …….., S.A. e acompanhou a operação de compra e venda desta sociedade. Por volta de 1990 surgiu a intenção de realizar um projecto imobiliário nos terrenos onde funcionava a …….., S.A. juntamente com os terrenos da Impugnante e com outros terrenos adquiridos a outra sociedade, que perfaziam uma área considerável numa zona com um potencial muito grande. Estava próxima do centro da cidade, bem servida de transportes, com uma frente de Rio. Este projecto começou a ser desenvolvido com a compra dos terrenos onde funcionava a Impugnante que eram detidos pela ………, S.A.. A ………, S.A. era vizinha da Impugnante e funcionava em terrenos contíguos aos da Impugnante e cuja actividade se encontrava em declínio. Os terrenos onde funcionava a ………, S.A. pertenciam à CML e estavam arrendados por contratos muito antigos com rendas muito baixas. A motivação da compra da …….., S.A. e paralelamente da ………, LDA. foi a perspectiva de desenvolver um projecto imobiliário de muito interesse e de forte valorização, com uma frente de Rio junto à avenida 24 de Julho. A Impugnante se tivesse negociado a aquisição dos terrenos com a CML ficaria depois com o problema da …….., S.A. por resolver. Ao adquirir a ……., S.A. e detendo o seu capital e a sua gestão, possuía uma posição mais fone para proceder a negociações com a CML no sentido de vir posteriormente a fazer a aquisição desses terrenos. Foram iniciados contactos com a CML que se prolongaram durante algum tempo no sentido de adquirir os terrenos. Em 1990 a …….., S.A. fez uma solicitação à CML para a aprovação de um projecto imobiliário para este conjunto de terrenos para a zona onde estavam incluídos os terrenos da ……., S.A.. O valor da compra desta sociedade foi próximo dos 270.000 contos na perspectiva de vir a concretizar um projecto imobiliário que seria muito rentável e interessante. Se o projecto fossa aprovado a Impugnante iria ter muito lucro. A ….., S.A. não pertencia ao grupo da ……, S.A. e da Impugnante. A CML sempre teve muitas dúvidas sobre o que pretendiam para a zona. O Grupo entrou em dificuldades económicas, celebrou um acordo de reestruturação do seu passivo e teve de vender todos os activos que não estavam ligados à sua actividade principal, na qual se incluía a ……, S.A.. O acordo de reestruturação foi celebrado em 1994 e por imposição dos credores foi limitada a actividade do grupo ao se núcleo principal, sendo vendida a ………, S.A. por um valor significativamente inferior ao da compra em situação difícil e sob pressão. Se o projecto tivesse sido concretizado o lucro daí resultante poderia ser utilizado para pagar as dívidas da Impugnante. A instância da Ilustre Representante da Fazenda Pública esclareceu: que desenvolveu a sua actividade na Impugnante era responsável por todas as operações relacionadas com compras, com vendas, gestão de armazéns, gestão de stocks, etc. Não tinha intervenção na parte financeira. Previamente à aquisição da ………, S.A. foram feitos contactos prévios com a CML no sentido de apurar o que estava estabelecido para a utilização dos terrenos.

A 3.a testemunha, em síntese, referiu:
Não tem conhecimento efectivo o projecto imobiliário da Impugnante. Devido às funções eu prestava no gabinete da presidência da CML tomou conhecimento do projecto da Impugnante em 1995. Na altura havia para a zona o plano "Lamas" que abrangia desde a Avenida …………. alguns quarteirões ata à avenida ………... Nos anos noventa havia grande interesse imobiliário naquela zona, pois, vieram investidores estrangeiros que mostraram grande apetência por aqueles terrenos, gerando grande procura mós terrenos que se dizia que iam ser alvo de reconversão. Alguns proprietários apresentaram projectos para o local que foram inseridos num plano mais vasto que é o plano Lamas. Conheceu a Impugnante porque foi chamada a participar numa reunião, em 1996 segundo pensa, onde estavam outros proprietários da zona do Aterro da Boavista, como na altura era designada, onde o então Presidente da CML manifestou o seu desinteresse pelo plano Lamas e que não tinha interesse em levá-lo avante. Foi dito que o projecto Lamas não era, do ponto de vista urbanístico, desejado. Para a zona apenas foi aprovado um estudo urbanístico e qualquer projecto imobiliário para a zona ficou condicionado à aprovação de um plano de pormenor. O plano Lamas tinha uma edificabilidade de 2.5. Ainda hoje, segundo pensa, não há plano de pormenor para aquela zona. Ainda hoje continuam frustradas as expectativas de edificabilidade naquela zona. A instância da Ilustre Representante da Fazenda Pública esclareceu: que foi assessora do presidente da CML, esteve ligada à requalificação do Marfim Moniz, à Praça da Figueira, a Braço de Prata. Todos os planos são de iniciativa municipal que depois podem ser contratualizados com alguns particulares. Quando chegou à CML verificou que existiam três pastas com o plano Lamas e na reunião de 1996 ficou patente que o plano na iria avante. Os terrenos continuam com capacidade construtiva e continua a não estar aprovado um plano de pormenor para a zona.

factos não provados: // Para a decisão da causa, sem prejuízo das conclusões ou alegações de matéria de direito produzidas, de relevante, nada mais se provou».
X
2.2. De Direito
2.2.1. Nos presentes autos, vem interposto recurso jurisdicional da sentença proferida a fls. 646/668, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por “……………., SA” contra as liquidações adicionais de IRC relativas aos exercícios de 1997, 1998 e 1999.
2.2.2. Para julgar procedente a impugnação, a sentença estruturou, em síntese, a argumentação seguinte:
«A primeira conclusão que podemos retirar é a de que tanto a Impugnante como o grupo societário em que a mesma se integra demonstraram interesse e desenvolveram diligências no sentido da implementação de um projecto imobiliário. // Neste contexto, a aquisição das participações sociais da ……….., S.A. pela Impugnante corresponde a um custo contraído no interesse desta e do grupo a que pertencia. Pois, em seu entender, na qualidade de arrendatária dos terrenos onde laborava a ……….., S.A., seria detentora de uma posição reforçada no sentido da aquisição dos referidos terrenos, maxime, pelo exercício do direito de preferência. //Este custo, deste ponto de vista, assume-se como uma despesa com fim empresarial e como refere Saldanha Sanches, in "Manual de Direito Fiscal", 3.a edição, Coimbra; Coimbra Editores, pág. 384., "o custo ser uma despesa com um fim empresarial, o que não quer dizer uma despesa que tenha um fim imediato e directamente lucrativo, o que é indispensável é que tenha, na sua origem e na sua causa o interesse específico da empresa." // Porém, o Plano Director Municipal de Lisboa, aprovado por deliberação da Assembleia Municipal de 26 de Maio de 1994 e a Resolução do Conselho de Ministros n.° 94/94 (publicado no Diário da República l Série, de 29 de Setembro de 1994) veio deitar por terra as aspirações da Impugnante e do grupo a que pertencia, pois, não permitiu que na zona onde se situam os referidos terrenos, se procedesse a qualquer nova edificação mas somente a reconversão e melhoramento das existentes. // Por outro lado, a situação de sufoco financeiro da Impugnante e do grupo societário a que pertence, demonstrada pela concretização, em 30/11/1994, um contrato de viabilização financeira com os respectivos bancos credores, levou a que procedesse à alienação das participações sociais que detinha relativamente à ………, S.A.. // Assim, Em 31/10/1997, vendeu as 4.996 acções da ………. que detinha, pelo valor de Esc. 39.968 contos — 8.000$00 por acção, realizando uma menos-valia fiscal no montante de 229 816 contos. // Este negócio mostrou-se terrivelmente ruinoso. // Ainda assim, na linha de pensamento de Tomás Tavares, in "A Dedutibilidade dos Custos em sede de IRC", Fisco n.° 101/102, Ano XIII, Janeiro, pág. 41 consideramos que "os custos fiscais indispensáveis são todos os decaimentos suportados pela empresa no interesse da organização. São todos os encargos que se insiram na capacidade dos entes morais, ligados nessa medida, à prossecução do respectivo fim lucrativo. Numa palavra, os custos indispensáveis são todos os custos verdadeiros e reais, ainda que ligados a negócios ruinosos." // Pese, embora, o carácter ruinoso do negócio, a actuação da Impugnante foi no sentido da obtenção de proveitos com o projectado empreendimento imobiliário. // Tais custos assumem-se como indispensáveis porque relacionados com os interesses da Impugnante e do grupo societário a que pertence, não se encontram registados abusivamente na contabilidade e não foi questionada a sua existência real e efectiva».
2.2.3. Do alegado erro de julgamento em que incorreu a sentença recorrida ao dar como demonstrado o pressuposto da indispensabilidade do custo associado à menos-valia em causa.
A presente intenção recursória centra-se sobre o erro de julgamento em que terá incorrido a sentença recorrida ao acolher a pretensão da impugnante de que a menos-valia associada à venda da participação social na sociedade ………, SA, constitui custo dedutível na esfera da impugnante.
Vejamos.
«Estabelece o artigo 23.º do CIRC que «[c]onsideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: (…) i) Menos-valias realizadas».
Sobre a matéria constitui jurisprudência assente a de que: «(…) um custo será aceite fiscalmente caso, num juízo reportado ao momento em que foi efectuado, seja adequado à estrutura produtiva da empresa e à obtenção de lucros, ainda que se venha a revelar uma operação económica infrutífera ou economicamente ruinosa, e a AT apenas pode desconsiderar como custos fiscais os que não se inscrevem no âmbito da actividade do contribuinte e foram contraídos, não no interesse deste, mas para a prossecução de objectivos alheios (quando for de concluir, à face das regras da experiência comum que não tinha potencialidade para gerar proveitos)» [Acórdão do STA, de 24.09.2014, P. 0779/12].
Explicitando a orientação da jurisprudência, de referir que «[p]ara que esses custos relevem fiscalmente têm de estar afectos à exploração, no sentido de que deve existir uma relação causal entre os custos e os proveitos da empresa, em termos de adequação económica do acto à finalidade da obtenção maximalista de resultados. // O critério da indispensabilidade visa impedir a consideração fiscal de gastos que não se inscrevem no âmbito da actividade da empresa, que foram incorridos não para a sua prossecução mas para outros interesses alheios. Por isso, a A.Fiscal pode excluir gastos não directamente afastados pela lei quando haja motivos que convençam de que eles foram incorridos na prossecução de outro interesse que não o empresarial, ou, ao menos, com nítido excesso, desviante, face às necessidades e capacidades objectivas da empresa» (1). Mais se refere que: «[d]emonstrada suficientemente pela AT a desconexão fáctica e económica dos gastos com a organização da empresa, compete ao sujeito passivo apresentar uma explicação acerca da “congruência económica” desses gastos» (2).
No caso exame, não sofre dúvida que «que relativamente à menos-valia em causa, apurou-se em 1990, com escritura de venda efectuada em 1992, a empresa ……………., Lda. adquire, por 270000 contos, todo o capital social da firma ………………, Lda., quer era de 1.740 contos, tendo sido entretanto a empresa transformada em sociedade anónima e o capital aumentado para 5000 contos, correspondentes a 5000 acções de valor nominal de 1.000$00. // Em 1997, decidiram alienar este activo financeiro por 39.968 contos a uma empresa imobiliária denominada …………………….., SA, não existindo relações directas entre ambas, mas indirectas, por via de participações cruzadas, gerando assim, uma menos-valia fiscal no montante de 229.816 contos, deduzida ao resultado tributável (apurado) neste exercício. // Desta análise observou-se que do valor de aquisição inicial no montante de 270000 contos, 200.000 contos estão registados na contabilidade no Diário de Caixa, como pagamentos efectuados em numerário. // Mais se apurou que a actividade exercida pela firma ……………., Lda., está relacionada exclusivamente com a transformação/venda de ferro, pelo que suporta custos e obtém proveitos correlacionados com esta actividade. // Ora, da análise desta transacção, também se nos afigura que tal interesse não se vislumbra, dado que foram adquiridas por 54.000$00, acções que estavam valorizadas a 1.000$00, de uma empresa tecnicamente falida, uma vez que o seu património à data da aquisição era praticamente nulo com a justificação de que “…era de extrema importância económica concentrar propriedade com dimensão para propor um projecto de urbanização às entidades competentes”, o que não se compreende uma vez que os terrenos onde a firma ………, Lda. exerce a sua actividade são arrendados e nunca houve a intenção segundo a proprietária dos mesmos, de proceder à sua venda e a possibilidade de as entidades competentes autorizarem a implementação de qualquer urbanização» (3).
É que, recorde-se, «[o] custo é uma despesa com um fim empresarial, o que não que dizer que tenha um fim imediata e directamente lucrativo, mas sim, que tem, na sua origem e na sua causa, um fim empresarial. E a lei concede à Administração poderes bastantes para recusar a aceitação como custos fiscais de despesas que se não possam considerar compatíveis com as finalidades a prosseguir pela empresa. // (…) Do ponto de vista da aceitação da perda como custo fiscalmente atendível, fica (…) assumido que o requisito da indispensabilidade dos custos para a formação de proveitos deve ser aferido por critérios de racionalidade económica face aos objectivos estatutários e atendendo, por isso, à razoabilidade e à fundamentação das decisões de gestão no momento e nas circunstâncias em que são tomadas e não (…) à adequação da decisão a um qualquer dever de boa ou prudente ou, ainda menos eficiente administração da empresa, conceitos estes que não podem ser objecto de um juízo público»(4).
Dos elementos coligidos nos autos resulta o seguinte:
«No caso concreto, a AT apurou os elementos seguintes:
- A actividade exercida pela impugnante está relacionada exclusivamente com a transformação/venda de ferro.
- Do valor de aquisição inicial das acções, no montante de 270000 contos, 220000 contos estão registados na contabilidade no Diário de Caixa, como pagamentos efectuados em numerário.
- A firma “………” era à data da aquisição das acções, uma empresa tecnicamente falida, sendo o seu património praticamente nulo.
- E era apenas arrendatária dos terrenos que a impugnante pretendia ver englobados no mesmo projecto imobiliário.
- A proprietária desses terrenos era a Câmara Municipal de Lisboa.
- Que nunca teve a intenção de proceder à sua venda» (5). A verdade é que o projecto urbanístico foi apresentado pela sociedade impugnante, mas não logrou obter aprovação da Câmara Municipal de Lisboa (6). Dos elementos coligidos nos autos (7), os quais não foram revertidos pela prova testemunhal obtida, forçoso se torna concluir que «as menos-valias obtidas na transmissão onerosa das acções da firma ……., SA, (adquiridas por um valor de 54.000$00), quando o seu valor nominal era de 1000$00) não pode ser considerada como uma perda tida como indispensável para a manutenção da fonte produtora e ser assim, aceite como dedutível para efeitos fiscais, à luz do disposto no artigo 23.º do CIRC, devido à evidente ausência de racionalidade económica da operação» (8). É que, tendo em conta o objecto social da empresa – transformação e venda de ferro -, a aquisição de participações em empresa de objecto social distinto – industrias de madeira -, em situação de falência técnica e a sua venda em momento posterior, com base na projectada realização de um projecto urbanístico, o qual não mereceu qualquer autorização ou apoio por parte das entidades competentes e proprietárias dos terrenos em causa, não permite reconstruir o nexo de causalidade entre os custos incorridos e os proveitos da sociedade impugnante. Donde decorre que o nexo de indispensabilidade do custo não se mostra comprovado nos autos.
Mais se refere que o presente entendimento não enferma de quaisquer vícios de inconstitucionalidade, o qual, não é concretizado pela recorrida.
Ao julgar em sentido discrepante, a sentença recorrida não se pode manter, devendo ser revogada. À míngua de outros fundamentos da impugnação, impõe-se substituir a mesma por decisão que julgue a impugnação improcedente.
Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.
Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a impugnação.
Custas pela recorrida, em ambas as instâncias.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)


(1º. Adjunto) (vencida )


(2º. Adjunto)

Declaração de voto:
Voto vencida pois entendo ser de confirmar a sentença recorrida. Com efeito, face aos fundamentos invocados pelo Impugnante ainda em sede de acção de inspecção para justificar a indispensabilidade do custo, às regras do ónus da prova, e ainda, face à prova produzida, a correcção não se poderia manter, pelo menos, com fundamento na fundada dúvida prevista no art. 100.º da LGT.

Por conseguinte, não concederia provimento ao recurso, e confirmaria a sentença recorrida.

Cristina Flora


(1) TCAN, de 11.01.2007, P. 00070/01 – PORTO.
(2) TCAN, de 16.10.2014, P. 00438/06.0BEBRG.
(3) Acórdão do TCAS, proferido, em 26.06.99, a fls. 367/406 e alínea a), do probatório.
(4) J. L. Saldanha Sanches, Os limites do planeamento fiscal, Substância e forma no direito fiscal português, comunitário e internacional, Coimbra Editora, 2007, pp 215/216.
(5) Parecer do ilustre Magistrado do Ministério Público, de fls. 231/233.
(6) Alíneas O) a a T), do probatório.
(7) Alínea a), do probatório.
(8) Acórdão do TCAS, proferido, em 26.06.99, a fls. 367/406.