Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2478/14.6BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:09/30/2020
Relator:ANA PINHOL
Descritores:REVERSÃO;
GERÊNCIA NOMINAL SINGULAR;
ÓNUS DA PROVA.
Sumário:I. A reversão operada ao abrigo da apontada alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT, preceito que pressupõe que o gerente de facto o tenha sido no momento em que se verifica o termo do prazo legal de pagamento ou entrega das dívidas tributárias, sendo que, nesta hipótese, e se assim for, caberá ao revertido provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO



I.RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a oposição à execução fiscal nº ………….. e apensos, deduzida por J..............., contra si revertida para cobrança de dívidas provenientes de IRS e IRC, referentes aos exercícios de 2008 a 2010, no valor global de €16.797,21, instaurados contra a sociedade «J..............., Lda.».

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«A) In casu, com elevado respeito pelo respeitoso areópago a quo, na humilde perspectiva jurídico-factual da aqui Recorrente, deveria ter sido dada uma maior acuidade ao escopo do vertido nos arts. 24.º/n. º1, al. b), art. 23.º, n.º 1 a 3, 7 e art. 74.º da LGT; art. 153.º, n.º 1 e 2, al. b) e 204.ºdo CPPT; art. 342.º do CCivil ex vi art. 2.º, al. d) da LGT

B) assim como, deveria ter sido melhor valorado e considerado pelo respeitoso Areópago a quo, o acervo documental constante dos autos, maxime a certidão do registo comercial da devedora originária,

C) E também, a factualidade dada como assente na alínea A), do probatório, conjugadamente com as declarações prestadas pela testemunha (pai do oponente), cujo essencial consta vertido na motivação do douto aresto recorrido, constante de fls. 14, ab initio do mesmo.

D) Tudo, devidamente condimentado com o Princípio da Legalidade, o Princípio da Justiça, a mais elementares regras da lógica das coisas e da experiência comum, conjugadamente com a Jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, para que,

E) Se pudesse aquilatar pela IMPROCEDÊNCIA DA OPOSIÇÃO aduzida pela Recorrida, maxime, para que melhor se pudesse inferir pela inexistência de uma qualquer ilegitimidade do Oponente no âmbito da execução fiscal sub judice.

F) Aliás, tudo assim, conforme melhor é explanado e plasmado do item 18º ao 60.º das Alegações de Recurso que supra se aduziram e das quais as presentes Conclusões são parte integrante.

G) Consequentemente, salvaguardado o elevado respeito, o respeitoso Areópago a quo, preconizou erro de julgamento (ao não ter considerado e valorizado correctamente as ilações a retirar do registo comercial da devedora originária, do facto dado como assente na al. a) do probatório e das declarações prestadas pela testemunha, cujo essencial está plasmado e transcrito na motivação do segmento fáctico do douto aresto a quo).

H) O sobredito “erro de julgamento” foi como que causa adequada para que fosse preconizada uma errada interpretação e aplicação do direito ao caso vertente.

NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, e com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido total provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a sentença proferida com as devidas consequências legais.

CONCOMITANTEMENTE,

Apela-se desde já à vossa sensibilidade e profundo saber, pois, se aplicar o Direito é um rotineiro acto da administração pública, fazer justiça é um acto místico de transcendente significado, o qual, poderá desde já, de uma forma digna ser preconizado por V. as Ex.as, assim se fazendo a mais sã, serena, objectiva e acostumada JUSTIÇA!»




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O recorrido, devidamente notificado para o efeito, optou por não apresentar contra-alegações.

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A Exma. Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.


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Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Atentas as conclusões das alegações da recorrente a questão a resolver reconduz-se, nuclearmente, a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir que a oponente não exerceu a gerência de facto no período a que se reportam as dívidas.


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III. FUNDAMENTAÇÃO

A. DOS FACTOS

Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:

«A) Consta do registo Comercial da sociedade J..............., Lda, os seguintes registos e averbamentos, com interesse para a decisão da causa:

Ap 01/19920527 Contrato de Sociedade e Designação de Membro(s) de Órgão(s) Social(ais)

Firma: J..............., Lda

Natureza Jurídica: Sociedade por quotas

(…)

Capital social: 50.000,00 Euros

Sócios e quotas

Quota: 25.000,00 Euros

Titular: J...............

(…).

Quota: 25.000,00 Euros

Titular: M............... (…).

Forma de Obrigar/Órgãos Sociais

Foram de obrigar: com a assinatura de um gerente

Estrutura da gerência: exercida pelos sócios.

Gerência:

J...............

Cargo: Gerente

M...............s

Cargo: Gerente

(…).

Ap 2/20070904: Cessação de Funções de Membro(s) de Órgão(s) Social(ais)

Gerência:

M...............s

Causa: Renúncia

Data: 2007.08.08

Ap 3/20070904 – Designação de Membro(s) de Órgão(s) Social(ais)

Órgão designado

Gerência

J...............

(…).

Deliberação: 2007-08-08

Ap 54/20100816 – Provisório por natureza – Sentença de declaração de insolvência e nomeação de administrador judicial em processo de insolvência (…).

B) Contra a sociedade identificada em A) foram instaurados os seguintes processo de execução fiscal:



Nº processoPeríodo tributárioData limite pagamentoTributoValor
2008-01-01/2008-12-312008-11-20IRS940,00
2008-01-01/2008-12-312008-12-20IRS1.032,00
2008-01-01/2008-12-312009-01-20IRS1.749,00
2008-01-01/2008-12-312009-01-20IRS50,67
2009-01-01/2009-12-312009-02-20IRS886,00
2009-01-01/2009-12-312009-03-20IRS706,00
2009-01-01/2009-12-312009-04-20IRS760,00
2009-01-01/2009-12-312009-05-20IRS900,00
2009-01-01/2009-12-312009-06-20IRS1.069,00
2009-01-01/2009-12-312009-07-20IRS889,00
2009-01-01/2009-12-312009-08-20IRS630,00
2008-01-01/2008-12-312009-09-02IRS2.235,70
2008-01-01/2008-12-312009-09-02IRS44,71
2009-01-01/2009-12-312009-09-20IRS1.017,00
2009-01-01/2009-12-312009-10-20IRS895,00
2009-01-01/2009-12-312009-11-20IRS772,00
2009-01-01/2009-12-312009-12-20IRS621,00
2009-01-01/2009-12-312009-01-20IRS1.165,00



C) Em 19-02-2014 foi proferido despacho para audição (reversão) contra J............... (ora oponente), junto a fls 10, do pa, onde consta, nomeadamente:

Face às diligências de fls _____________, determino a preparação para efeitos de reversão da(s) execução(ões) contra J............... (…).

Face ao disposto nos normativos do nº 4 do artº 23º e do artº 60º da LGT, proceda-se `notificação do(s) interessado(s), para efeito do direito de audição prévia, fixando-se o prazo de 15 dias a contar da notificação, podendo aquela ser exercida por escrito.

D) Foi enviada notificação para audição prévia (reversão) do oponente, junta a fls 12, do pa, onde consta, nomeadamente:

Objecto e função da notificação

Pela presente fica ciente de que, por despacho de 19/2/2014, determinei a preparação do processo para efeitos de reversão da(s) execução(ões) fiscal(ais) infra indicada(s) contra V. Exª, na qualidade de Responsável Subsidiário.

Face ao disposto nos normativos nº 4 do artº 23º e artº 60º da LGT, fica notificado(a) para, no prazo de 15 dias a contar da presente notificação, exercer o direito de audição prévia para efeitos de avaliação da prossecução ou não da reversão contra V. Exª.

(…).

E) Em 16-04-2014 foi proferido despacho de reversão contra o oponente, junto a fls 13, do pa, onde consta, nomeadamente:

DESPACHO

Face às diligências de fls _________, e estando concretizada a audição do(s) responsável(veis) subsidiário(s) prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra J............... (…), na qualidade de Responsável Subsidiário, pela dívida abaixo descriminada.

Atenta a fundamentação infra, a qual tem de constar da citação, proceda-se à citação do(s) executado(s) por reversão, nos termos do artº 160º do CPPT, para, no prazo de 30 (trinta) dias, a quantia que contra si reverteu sem juros de mora nem custas (nº 5 do artº 23º do CPPT).

FUNDAMENTOS DA REVERSÃO

Dos Administradores, directores ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período do exercício do cargo (artº 24º/nº 1/b LGT).

1) Insuficiência de bens da devedora originária (artigos 23º/1 a 3 e 7 da LGT e 153º/1/2/b do CPPT, decorrente da situação líquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face da insolvência declarada pelo Tribunal.

(…).

F) Na sequência da citação de fls 35, do pa, de 28-04-2014 o oponente arguiu junto do Chefe do Serviço de Finanças a nulidade da citação, nos termos de fls 30 a 34, do pa, cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais e, nomeadamente invoca que a mesma omite as formalidades espaciais dos artºs 22º e 23º da LGT;

G) Por despacho de 30-05-2014 foi ordenado que o oponente fosse citado porquanto a citação foi enviada sem informação relativa à dívida ou à liquidação e, portanto padecendo de vícios;

H) Em 27-08-2014 o oponente foi citado nos termos de fls 41, dos autos:


«imagens no original»


I) A convicção do tribunal formou-se no teor dos documentos identificados em cada ponto dos factos provados e na inquirição da testemunha, da qual resultou em síntese: J..............., referiu que a empresa era sua, que até ao acidente, em 2007, em que ficou sem a perna pelo terço era quem administrava a empresa e após aquela acidente a empresa ficou na mão dos empregados por haver trabalhos em mão. Afirma que os negócios foram feitos consigo não com o seu filho que foi substituir a mãe que não tinha condições de continuar.»


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B. DO DIREITO

A execução fiscal, por dependência da qual foi deduzida a presente oposição, respeita a dívidas de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) e Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), relativas aos anos de 2008 e 2010, no valor global de €16.797,21, instaurada contra a sociedade «J..............., Lda.».

Para julgar improcedente a oposição à execução fiscal entendeu a Meritíssima Juiz do Tribunal de primeira instância que a Administração Tributária não carreou para os autos factos para suficientes de modo a demonstrar que o Oponente (doravante recorrido) exerceu nos anos a que se reportam as dívidas exequendas a gerência de facto na devedora originária.

Não se conformando com esta decisão, veio a Fazenda Pública (doravante recorrente) interpor recurso para este Tribunal Central Administrativo, alegando, em síntese útil, que a sentença padece de erro de julgamento de facto e de direito por considerar que não resulta demonstrado o pressuposto relativo ao exercício da gerência pelo recorrido.

Nesta linha de argumentação, a questão a decidir a delineada em II), reclama, começar por realizar o enquadramento jurídico (ainda que breve) sobre os normativos legais aplicáveis à responsabilidade dos administradores e gerentes à data dos factos em juízo.

Vejamos, então.

Como se sabe, o regime da responsabilidade subsidiária aplicável é o vigente no momento em que se verifica o facto gerador da responsabilidade (artigo 12.º do Código Civil), assim porque a dívida exequenda se constituiu exercício de 2008 e 2010, é de aplicar o regime previsto no artigo 24.º da LGT.

Este artigo 24.º, n.º 1 da LGT estabelece o seguinte:

«1. Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:

a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;

b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento. (…).».

Na aplicação deste regime, constitui jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo que, em qualquer uma das suas alíneas a possibilidade de reversão não se basta com a gerência de direito, exigindo-se o exercício de facto da gerência (neste sentido, entre muitos outros, vide o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02.03.2011, proferido no processo n.º 944/10, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

No que respeita ao ónus da prova, como bem salienta a sentença recorrida, louvando-se do entendimento da nossa jurisprudência, aliás pacífica e uniforme, é à Fazenda Pública, como titular do direito de reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário, que compete fazer a prova da gerência como pressuposto da obrigação de responsabilidade subsidiária.

Vale aqui, o sustentado, no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Pleno da Secção do Contencioso Tributário) de 28.2.2007, proferido no processo n.º 1132/06, onde se escreve que a prova da gerência de direito não permite presumir, nem legal nem judicialmente, a gerência de facto, impondo-se ao exequente fazer a respectiva alegação e subsequente prova, sob pena de contra si ser valorada a falta sobre o efectivo exercício da gerência.

O mesmo entendimento está ínsito no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Pleno da Secção do Contencioso Tributário) de 21.11.2012, proferido no processo n.º 0474/12 e que se transcreve (parcialmente), atento o interesse para a decisão da presente causa: «(…) Este efectivo exercício pode o juiz inferi-lo do conjunto da prova, usando as regras da experiência, fazendo juízos de probabilidade, etc. Mas não pode retirá-lo, mecanicamente, do facto de o revertido ter sido designado gerente, na falta de presunção legal.

A regra do artigo 346.° do Código Civil, segundo a qual «à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos», sendo então «a questão decidida contra a parte onerada com a prova», não tem o significado que parece atribuir-lhe o acórdão recorrido. Aplicada ao caso, tem este alcance: se a Fazenda Pública produzir prova sobre a gerência e o revertido lograr provar factos que suscitem dúvida sobre o facto, este deve dar-se por não provado. Mas a regra não se aplica se a Fazenda não produzir qualquer prova.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Vejamos, pois, se ao caso em análise, pacificamente subsumível ao regime inscrito no artigo 24.º, n.º1, al.b) da LGT, a factualidade assente no probatório é suficiente para afirmar a prática de actos de gerência efetiva pelo recorrido, no período a que se reportam as dívidas exequendas.

Analisada a matéria de facto provada, constata-se, que contrariamente ao considerado pelo Tribunal «a quo» no período a que se reportam as dívidas exequendas era o recorrido o único gerente de direito da devedora originária.

Bem sabemos, tal como tem a jurisprudência repetidamente afirmado, a inscrição no registo comercial da nomeação de alguém como gerente apenas resulta a presunção legal (cfr. artigo 11º do Código do Registo Comercial) de que é gerente de direito, não de que exerce efectivas funções de gerência.

Com efeito, a chamada gerência de facto de uma sociedade comercial consiste no efectivo exercício das funções que lhe são inerentes e que passam, nomeadamente, pelas relações com os fornecedores, com os clientes, com as instituições de crédito e com os trabalhadores, tudo em nome, no interesse e em representação dessa sociedade. E, para que se verifique a gerência de facto é indispensável que o gerente use, efectivamente, dos respectivos poderes, que seja um órgão actuante da sociedade, tomando as deliberações consentidas pelo facto, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros ( neste sentido, vide: Rúben Anjos de Carvalho - Francisco Rodrigues Pardal, Código de Processo das Contribuições e Impostos, Anotado e Comentado, 2ª Edição, Coimbra, 1969, pág. 139).

Posto isto e revertendo ao caso em apreço, constatamos que os factos provados não permitem extrair a conclusão a que chegou o Tribunal de 1ª Instância e, que foi a de considerar que no período a que se reportam as dívidas a devedora originária passou a vincular-se com a assinatura conjunta dos dois gerentes.

E isto porque, extrai-se da Certidão da Conservatória do Registo Comercial (Ap 3/20070904), que o recorrido era o único gerente de direito nomeado, e portanto, o único que pode obrigar legalmente a devedora originária.

Assim, há que admitir, que a intervenção do recorrido se impunha necessária à normal actividade da dita sociedade circunstância que constitui um indício no sentido de que o recorrido geria a vida societária da devedora originária.

Acresce que, ficou provado que executada originária após o ano de 2007, ficou « [n]a mão dos empregados por haver trabalhos em mão» aliado ao facto de parte das dívidas exequendas se reportarem a IRS (Retenção na Fonte) é demonstrativo que a sociedade exerceu actividade no período em causa.

Não ignoramos que ficou demonstrado nos autos que os negócios da sociedade eram realizados pelo pai do recorrido, mas tal conduta por si só, não permite extrair a conclusão que tenha actuado na qualidade de órgão da sociedade.

Parece-nos claro, que a sociedade nunca poderia funcionar sem a participação activa do recorrido, designadamente, através da sua assinatura em contratos de natureza bancária e com fornecedores e ainda nas relações com a Segurança Social e a Autoridade Tributária. E, se pôde, cabia ao recorrido explicar como, o que não logrou fazer.

Consequentemente, perante a materialidade fáctica apurada nos autos, tem de concordar-se com a recorrente quando alega que o Tribunal «a quo» fez incorrecto julgamento de facto.

Na verdade, em nosso entender, a prova produzida, permite validar suficientemente o juízo que o órgão de execução fiscal fez para sustentar a reversão, de que o recorrido exercia de facto a gerência, quer no período em que as dívidas se constituíram, quer no período em que se venceram.

Desde modo, não pode, pois, o recorrido ver afastada a responsabilidade subsidiária pelas dívidas exequendas com fundamento no não exercício da gerência de facto.

Importa, agora, aferir se estão reunidos os demais pressupostos para a responsabilização do oponente nos termos do artigo 24.º, n.º 1 da LGT.

As dívidas exequendas foram revertidas contra o recorrido com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, uma vez que o facto constitutivo e a cobrança se verificarem no período de exercício do cargo, e portanto, cabe-lhe provar que a falta de pagamento da dívida revertida não lhe é imputável, pois presume-se a sua culpa.

Como nos dá nota, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 15.10.2014, proferido no processo n.º 0167/13 « (…) o que está em causa é a culpa do oponente pela falta de pagamento da dívida (art. 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT) e não a culpa do oponente pela insuficiência do património da executada originária (art.º. 24.º, nº 1, alínea a), da LGT). Estando em causa a alínea b) do n.º 1 do art. 24.° da LGT, presume-se a culpa do oponente pela falta de pagamento da dívida revertida, pelo que compete ao oponente alegar e provar que a falta de pagamento da dívida revertida não lhe é imputável.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

É portanto, sobre o administrador ou gerente revertido que recai o ónus de alegar e demonstrar que não foi por culpa sua que não foi efectuado o pagamento das dívidas exequendas.

E porque nada ficou provado, no sentido de demonstrar a ausência de culpa pela insuficiência de património social, para responder pelas dívidas exequendas, antes a fazendo decorrer do alegado não exercício da gerência de facto, porque esta se tem como assente, a questão da culpa tem que ser decidida em sentido desfavorável contra si.

Procede, por conseguinte o recurso.

IV.CONCLUSÕES

I.A reversão operada ao abrigo da apontada alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT, preceito que pressupõe que o gerente de facto o tenha sido no momento em que se verifica o termo do prazo legal de pagamento ou entrega das dívidas tributárias, sendo que, nesta hipótese, e se assim for, caberá ao revertido provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento.

V.DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes que integram a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, julgando improcedente a presente oposição.

Custas a cargo do Recorrido.


Lisboa, 30 de Setembro de 2020

[Ana Pinhol]

[Isabel Fernandes]

[Benjamim Barbosa]