Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1007/18.7BELSB-S1
Secção:CA
Data do Acordão:12/06/2018
Relator:SOFIA DAVID
Descritores:MEDIDAS PROVISÓRIAS PREVISTAS
ART.º 103.º-B DO CPTA
ABUSO DE DIREITO
CRITÉRIO PERICULUM IN MORA
CRITÉRIO DA PONDERAÇÃO DE INTERESSES
Sumário:I – A adopção das medidas provisórias previstas no art.º 103.º-B do CPTA, reclama a aplicação conjugada de dois critérios: o do periculum in mora e o da ponderação de interesses. Conforme o preceituado no citado artigo, tais medidas serão tomadas quando se verifique (1) uma situação de facto consumado ou a impossibilidade da retoma do procedimento pré-contratual para determinar quem nele seria escolhido como adjudicatário; (2) e se os danos que resultarem da adopção da medida não forem superiores aos que podem resultar da sua não adopção, sem que a lesão possa ser evitada e atenuada com a adopção de outras medidas. De fora fica, pois, o critério do fumus boni iuris.
II- Atendendo ao art.º 2.º, n.º 5, da Directiva Recursos, para a atribuição das medidas provisórias do art.º 103.º-B do CPTA, há que aferir do critério periculum in mora, ali fazendo incluir o critério da ponderação de interesses;
III – Resultando dos autos que o júri classificou a proposta da Recorrente em 1.º lugar, propondo a sua adjudicação, não existem danos a proteger;
IV- A alegação da Recorrente relativa ao seu interesse na procedência de uma medida provisória de suspensão do procedimento e de retoma do mesmo com a concessão de novo prazo para a apresentação das propostas, para que possa apresentar uma nova proposta com um preço mais alto – que já consideraria a exclusão da Contra-interessada, que apresentou o melhor preço a seguir ao seu – configurará uma situação de abuso de direito, portanto, ilegítima;
IV – No caso sub judice, apreciado o critério da ponderação de interesses, parece evidente que os interesses da A. e Recorrente – de ver afastada do concurso a Contra-interessada – não serão superiores aos que resultam para essa Contra-interessada – de manter-se no concurso – ou para a Entidade Adjudicante – de ver o concurso prosseguir com todos os concorrentes.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I - RELATÓRIO

P… – Empresa de Segurança, SA (P…), interpôs recurso da sentença do TAC de Lisboa que julgou improcedente o pedido para ser adoptada como medida provisória, nos termos do art.º 103.º-B do CPTA, a suspensão do procedimento relativo ao Concurso Limitado por Prévia Qualificação, com publicitação internacional n.º 156A18, para prestação de serviços de segurança e vigilância das instalações ao Instituto Português de Oncologia de Coimbra Francisco Gentil, EPE (IPOC) e a retoma do referido procedimento com a concessão de novo prazo para a apresentação das propostas.

Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões: ”A. A decisão recorrida determina a improcedência do requerimento de adopção de medidas provisórias com fundamento em dois argumentos: em primeiro lugar, porque “ainda que a prestação de serviços em causa não venha a ser adjudicada à Autora, sempre poderá a mesma impugnar o ato de adjudicação, com base em qualquer irregularidade cometida durante o procedimento (cfr. n.º 3 do artigo 51.º do CPTA), podendo sempre, em caso de a decisão lhe ser favorável, o procedimento retomar o seu normal curso, desde a fase de apresentação das propostas”; em segundo lugar, “perante os interesses em presença, e considerando que a Autora se encontra, para já, graduada em primeiro lugar após a ponderação dos vários critérios, relevam, sobretudo, os danos evidentes que decorreriam da suspensão do procedimento, nomeadamente, com o atraso na celebração do contrato através do procedimento normal e concorrencial”.
B. No que diz respeito ao primeiro dos argumentos invocados pela decisão recorrida – “ainda que a prestação de serviços em causa não venha a ser adjudicada à Autora, sempre poderá a mesma impugnar o ato de adjudicação, com base em qualquer irregularidade cometida durante o procedimento (cfr. n.º 3 do artigo 51.º do CPTA), podendo sempre, em caso de a decisão lhe ser favorável, o procedimento retomar o seu normal curso, desde a fase de apresentação das propostas” –, o mesmo, salvo o devido respeito, não pode proceder sob pena de inutilização de todo e qualquer pedido de adopção de medidas provisórias.
C. A Autora sabe que sempre, e em qualquer situação, pode, ao abrigo do princípio da tutela jurisdicional efectiva, impugnar qualquer decisão que considere ilegal (desde que cumpridos os pressupostos processuais). Contudo, a questão verdadeiramente relevante é distinta e resume-se a determinar se, a não adopção das medidas provisórias requeridas, provoca a constituição de uma situação de facto consumado.
D. Caso o procedimento venha a prosseguir e sejam avaliadas as propostas, criar-se-á uma situação de facto consumado – quer com a apresentação de propostas, cujo conteúdo é fortemente influenciado pelo número de concorrentes qualificados (em especial, pela contra-interessada que, como é do conhecimento generalizado do mercado, apresenta frequentemente preços abaixo do custo), quer com a prática de uma decisão de adjudicação e celebração do contrato.
E. Essa situação de facto consumado consubstanciar-se-á, no limite e a final, com uma de duas situações: a celebração do contrato com uma entidade que não deveria ter sido qualificada (e que passará a ter uma expectativa legítima de execução do contrato) ou a celebração de um contrato com um preço que apenas foi apresentado tendo em conta uma circunstância de facto (três entidades qualificadas, em especial a contra-interessada) que não se deveria ter verificado.
F. Em concreto, refira-se que o preço apresentado pela Autora foi fortemente determinado pela qualificação da candidatura, cuja exclusão se discute na presente acção, apresentada pela contra-interessada que tem por hábito propor preços abaixo do custo de mercado.
G. Mas a situação de facto consumado criada não termina com a celebração desse contrato.
H. De facto, tendo em conta que a Autora presta actualmente serviços de vigilância nas instalações da Ré, a celebração de um contrato com outra entidade implicará ou que os trabalhadores (ou pelo menos alguns deles) se desvincularão da Autora com as consequências indemnizatórias e de carreira para os vigilantes; ou que a Autora se verá obrigada a reduzir custos em função do preço que propôs.
I. Ambos as situações serão irreversíveis pelo que se verifica o pressuposto previsto no artigo 103.º-B, n.º 1, do CPTA, para o decretamento da medida provisória de suspensão do procedimento e que o mesmo seja retomado com a concessão de novo prazo para apresentação de propostas.
J. Finalmente, note-se que o decretamento das medidas provisórias não acarretará qualquer dano pelo que não se verifica o motivo de recusa de concessão da mesma previsto no n.º 3, do artigo 103.º-B, do CPTA.
K. Note-se, ainda, que ao contrário do que parece resultar da decisão recorrida, o fundamento da acção na qual foi deduzido o incidente ora em análise, é o de que a contrainteressada não respeita igualmente os requisitos mínimos de qualificação estipulados na cláusula 10.ª, n.º 1, al. a) (requisito mínimo previsto no CCP), e no n.º 3 (média de liquidez geral), do Programa do Concurso, e não que apresenta preços baixos.
L. Relativamente ao segundo dos argumentos invocados pela decisão recorrida – “perante os interesses em presença, e considerando que a Autora se encontra, para já, graduada em primeiro lugar após a ponderação dos vários critérios, relevam, sobretudo, os danos evidentes que decorreriam da suspensão do procedimento, nomeadamente, com o atraso na celebração do contrato através do procedimento normal e concorrencial” –, o mesmo, salvo o devido respeito, não pode proceder.
M. Desde logo porque a circunstância de a Autora se encontrar graduada em primeiro lugar, nesta fase, não implica necessariamente que a sua proposta venha a ser adjudicada e, ainda que venha, não implica que o contrato seja consigo celebrado (designadamente em virtude de impugnações do procedimento que venham a ocorrer).
N. Por outro lado, não se compreende a afirmação de que a ponderação dos danos em confronto seja determinado pelos alegados “danos evidentes que decorreriam da suspensão do procedimento, nomeadamente, com o atraso na celebração do contrato através do procedimento normal e concorrencial”. Uma vez mais, a considerar-se procedente tal fundamento, isso significaria que todo e qualquer efeito suspensivo do procedimento (quer por aplicação do artigo 103.º-A, do CPTA, que por efeito de toda e qualquer medida provisória requerida) teria de improceder pois, na sua génese, essas medidas têm sempre como consequência a suspensão do procedimento e o atraso na “celebração do contrato através do procedimento normal e concorrencial”.
O. Em face do exposto, a decisão recorrida, ao determinar a improcedência do pedido de decretamento de medidas provisórias, interpretou e aplicou incorretamente o artigo 103.º-B, do CPTA, devendo este ser interpretado e aplicado no sentido de determinar a adopção dessas medidas nos casos em que está em causa um procedimento de qualificação e em que se visa que as propostas apenas sejam apresentadas por quem, de facto, apresente condições para se qualificar.
P. No que diz respeito ao fumus boni iuris, e caso se considere necessária a sua demonstração no pedido de decretamento de medidas provisórias – o que se admite, sem conceder, por mera cautela de patrocínio –, a Autora, tal como fez aquando da dedução do incidente de decretamento de medidas provisórias, remete para o alegado na Petição Inicial que aqui considera integralmente reproduzido.“

O Recorrido nas contra-alegações formulou as seguintes conclusões: ” A) Alega a Recorrente que actualmente presta serviços de vigilância nas instalações da Recorrida e que a celebração de um contrato com outra entidade implicará que os trabalhadores ou pelo menos algum deles se desvinculem com consequências indemnizatórias;
B) Todavia sempre a Recorrente poderá impugnar o acto de adjudicação, ao qual a lei atribui efeito suspensivo automático;
C) Nessa eventual impugnação do acto de adjudicação, a ora Recorrente pode alegar irregularidades cometidas ao longo do procedimento concursal, que a serem procedentes em acção de contencioso pré-contratual obrigarão a que o procedimento concursal seja retomado desde a fase de apresentação das propostas;
D) Quanto à alegação de que a contra-interessada S... tem uma prática reiterada de preços baixos e que em função deste facto a Recorrente também propôs um preço baixo, não pode ser motivo de análise jurisdicional para aplicação da medida provisória, pois se a Recorrente apresentou um preço que agora considera baixo a entidade adjudicante é alheia ao mesmo, não podendo a análise jurídica do procedimento concursal passar por esta perspectiva agora apresentada pela Recorrente de que apresentou um preço baixo.
E) A Recorrente encontra-se graduada em primeiro lugar alegando que tal não implica necessariamente que a sua proposta venha a ser adjudicada por eventual impugnação do acto de adjudicação;
F) Ora, este argumento não é correcto, pois se continuar graduada após o relatório final e lhe for adjudicado, a entidade adjudicante celebrará contrato com a P..., se houver impugnação do acto de adjudicação pela contra-interessada, esta mais não faz do que socorrer-se dos mecanismos legais ao seu dispor, assim como a ora Recorrente, caso não lhe seja adjudicada a prestação de serviços, também poderá impugnar através de acção de contencioso pré- contratual.
G) Pensamos contudo que bastará atendermos ao texto do nº 1 do artigo 103º-B do CPTA para verificarmos que a Recorrente não tem razão, na medida em que, a adopção das medidas provisórias apenas poderão ser decretadas como preventivas do risco de, no momento em que a sentença venha a ser produzida, se tenha constituído uma situação de facto consumado ou já não ser possível retomar o procedimento pré-contratual para determinar quem ele seria escolhido como adjudicatário.
H) O Recorrente poderá caso não lhe seja adjudicado o procedimento concursal, impugnar o acto de adjudicação com efeito suspensivo automático, pelo que, em nada está prejudicado, neste momento a sua posição no referido concurso.”
O DMMP não apresentou a pronúncia.
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo à conferência.

II – FUNDAMENTAÇÃO
II.1 – OS FACTOS
Em aplicação do art.º 663º, n.º 6, do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art.º 1.º e 140.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), por não ter sido impugnada, remete-se a matéria de facto para os termos em que foi decidida pela 1.ª instância.

II.2 - O DIREITO
As questões a decidir neste processo, tal como vêm delimitadas pelas alegações e contra-alegações de recurso e respectivas conclusões, são:
- aferir do erro decisório porque a não adopção das providências requeridas irá implicar uma situação de facto consumado, com a adjudicação, a consequente celebração do contrato e com a impossibilidade de se retomar o procedimento concursal e porque a indicada celebração do contrato implicará danos para a ora Recorrente, relativos ao termo dos serviços que ora presta ao IPOC, com a obrigação de indemnizar os trabalhadores que terminem contratos e com a redução de custos para a A. e Recorrente, exigidos face aos preços que propôs.

A adopção das medidas provisórias previstas no art.º 103.º-B, n.ºs 1 e 3, do CPTA, reclama a aplicação conjugada de dois critérios: o do periculum in mora e do da ponderação de interesses. Assim, conforme o preceituado no citado artigo, tais medidas serão tomadas quando se verifique (1) uma situação de facto consumado ou a impossibilidade da retoma do procedimento pré-contratual para determinar quem nele seria escolhido como adjudicatário; (2) e se os danos que resultarem da adopção da medida não forem superiores aos que podem resultar da sua não adopção, sem que a lesão possa ser evitada e atenuada com a adopção de outras medidas.
De fora fica, pois, o critério do fumus boni iuris.
Nas palavras de Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha “A primeira dessas situações ocorre quando os factos concretos alegados pelo requerente permitam perspetivar a impossibilidade da reposição da legalidade, no plano dos factos, no caso de o processo vir a ser julgado procedente. Será esse o caso, desde logo, quando exista a perspetiva de que, quando a sentença for proferida, as prestações contratuais que constituíam o objeto do contrato já se encontrarão integralmente realizadas ou o contrato já se encontrará próximo da sua integral execução. Nesse caso, os custos financeiros que resultam da retroação da anulação do contrato, em resultado da invalidade de atos procedimentais, traduzidos na restituição das contraprestações efetuadas pelo adjudicatário e nos encargos com o lançamento de um novo procedimento, tornam inviável a restauração natural. Mas também poderá ser essa a situação quando exista a perspetiva de que, quando a sentença for proferida, o contrato se encontrará apenas parcialmente executado, mas decorreriam consequências fortemente negativas para a satisfação das necessidades coletivas em caso de invalidação do contrato e paralisação das respetivas prestações contratuais.
(…) O n.º 1 do presente artigo caracteriza o periculum in mora, nos termos enunciados, como um requisito positivo cujo preenchimento é necessário para o efeito de justificar o recurso à tutela cautelar. Cabe ao requerente alegar que a medida provisória é necessária para evitar que ele fique definitivamente arredado da possibilidade de obter a adjudicação do contrato, quer através da constituição de uma situação de facto consumadoo, quer através da impossibilidade de retomar o procedimento. E só se for reconhecida a existência do risco de impossibilidade de reposição da legalidade, nos termos enunciados no n.º I, é que cabe ao juiz, num segundo momento, averiguar se os danos que resultariam da adoção da medida provisória e que se projetam na esfera jurídica dos requeridos, são superiores aos danos que podem resultar para o requerente da não adoção da medida, nos termos do n.º 3.
Os indicados Autores criticam, depois, a solução legislativa, por afrontar o art.º 2.º, n.º 5, da Directiva Recursos e propõem uma interpretação correctiva do art.º 103.º-B, n.º 1, do CPTA, dizendo que tal artigo “carece de ser interpretado em conformidade com a Diretiva, havendo de ser, por isso, entendido corno não exigindo o periculum in mora como um requisito autónomo da concessão das medidas provisórias” e que “importante é que não se deixe de ter em conta a explicitação, a que o legislador procedeu na parte final do preceito, de que as situações de risco aí previstas são passiveis de constituir danos relevantes na esfera do requerente, que, como tal não podem deixar de ser considerados no âmbito da ponderação a realizar nos termos do n.º3” (in ALMEIDA, Mário Aroso de; CADILHA, Carlos Alberto Fernandes - Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos. 4.a ed. Coimbra: Almedina, 2017. ISBN 978-972-40-6910-4, pp. 850-853).
Seguindo a doutrina preconizada por Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, com a qual concordamos, consideramos, pois, que para a atribuição das medidas do art.º 103.º-B do CPTA, há que aferir do critério periculum in mora, ali fazendo incluir o critério da ponderação de interesses.
Assim, face aos factos que são trazidos a juízo pelo requerente da providência haverá que ponderar dos danos que este tenha e verificar se os mesmos são superiores aos interesses das contrapartes, da Entidade Adjudicante e dos Contra-interessados. Da mesma forma, haverá que verificar da necessidade da medida que vem requerida e se os danos que se invocam não podem ser evitados ou atenuados pela adopção de outras medidas menos gravosas.
O ora Recorrente vem requerer a suspensão do procedimento e a posterior retoma do mesmo, com a concessão de novo prazo para a apresentação das propostas, invocando uma situação de facto consumado, decorrente da posterior adjudicação e celebração do contrato. Diz o Recorrente, que se o procedimento prosseguir com a adjudicação e a celebração do contrato irá ter danos, pois a adjudicação da sua proposta pode ser impugnada judicialmente e porque, actualmente, já presta serviços para o IPOC. Alega, ainda, o Recorrente que ocorrendo tal possibilidade, ou ocorrendo a possibilidade da Contra-interessada se manter no concurso, irá ter custos, com o termo de contratos com trabalhadores ou com a obrigação de apresentar um preço mais baixo, para poder competir com a proposta da Contra-interessada.
Frente a estas alegações resulta claro que inexiste, no caso sub judice, uma situação de facto consumado, ou de impossibilidade de retoma do procedimento pré-contratual para determinar quem nele seria escolhido como adjudicatário.
No presente procedimento não ocorreu ainda a adjudicação, não havendo, por isso, o risco de se iniciar, de imediato, a execução do contrato e se tornar irreversível a reconstituição da situação conforme a legalidade.
Acresce, conforme facto 5, que no Relatório Preliminar o júri classificou a proposta da P..., A. e ora Recorrente, em 1.º lugar, propondo a sua adjudicação. Ou seja, será a própria Recorrente quem vencerá o concurso.
No que concerne aos danos da Recorrente advenientes da Contra-interessada se manter no concurso, por via do acto impugnado, que a qualificou – ao invés de se excluir a sua proposta, como clama a A. e Recorrente – e tal manutenção forçar a A. e Recorrente a ter que apresentar um preço mais baixo, trata-se de um dano meramente hipotético, pois ainda que o procedimento venha a ser retomado por força da sentença a proferir, determinando-se a exclusão da concorrente S..., daí não deriva necessariamente que não se possa aproveitar o procedimento concursal nas suas fases seguintes, com a manutenção das propostas já apresentadas pelos restantes concorrentes, designadamente da proposta já apresentada pela A. e Recorrente.
Mais se indique, que a alegação da Recorrente relativa ao seu interesse na procedência de uma medida provisória de suspensão do procedimento e de retoma do mesmo com a concessão de novo prazo para a apresentação das propostas, para que possa apresentar uma nova proposta com um preço mais alto – que já consideraria a exclusão da Contra-interessada S..., que apresentou o melhor preço a seguir ao seu – configurará uma situação de abuso de direito, porque com o uso da tutela jurisdicional pretenderá alcançar algo ilegítimo, porque ofende os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fim económico e social do seu direito (cf. art.º 334.º do CC). Basicamente pretenderá a A. e Recorrente, por via da tutela que lhe é concedida pelo art.º 103.º-A do CPTA e do restante contencioso pré-contratual, ludibriar as regras do Código de Contratos Públicos e o princípio da concorrência, e manter-se a ganhar o presente concurso, mas através de uma nova proposta, que viesse a apresentar e que ostentasse um preço mais baixo, agora que já sabia dos preços que foram apresentados pelos demais concorrentes e estando seguro que a concorrente S... - o 2.º melhor preço apresentado – ficaria excluída.
Igualmente, apreciado o critério da ponderação de interesses, parece evidente que os interesses da A. e Recorrente – de ver afastada do concurso a Contra-interessada – não serão superiores aos que resultam para essa Contra-interessada – de manter-se no concurso – ou para a Entidade Adjudicante – de ver o concurso prosseguir com todos os concorrentes.
Em suma, há que manter a decisão recorrida porque a mesma está certa.
Fazendo nossa a fundamentação dessa decisão, porque inteiramente correcta, para a mesma remetemos quando refere nomeadamente o seguinte: “Ora, está em causa o ato de qualificação dos candidatos, sem que ainda se tenha procedido à adjudicação, resultando do relatório preliminar, emitido após apresentação das propostas, que foi proposto, pelo Réu, a adjudicação do contrato de prestação de serviços à Autora.
Assim e ainda que a prestação de serviços em causa não venha a ser adjudicada à Autora, sempre poderá a mesma impugnar o ato de adjudicação, com base em qualquer irregularidade cometida durante o procedimento (cfr. n.º 3 do artigo 51.º do CPTA), podendo sempre, em caso de a decisão lhe ser favorável, o procedimento retomar o seu normal curso, desde a fase de apresentação das propostas.
O alegado quanto à reiterada prática de preços baixos pela Contrainteressada e à influência de tal facto no valor da proposta apresentado pela Autora, não releva para a análise do requerido, por se tratar de um factor que decorre da prática concorrencial e que é ponderado relativamente a todos os eventuais candidatos.
Para além do referido, acresce que, perante os interesses em presença, e considerando que a Autora se encontra, para já, graduada em primeiro lugar após a ponderação dos vários critérios, relevam, sobretudo, os danos evidentes que decorreriam da suspensão do procedimento, nomeadamente, com o atraso na celebração do contrato através do procedimento normal e concorrencial.”

III- DISPOSITIVO
Pelo exposto, acordam:
- em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a decisão recorrida;
- custas pelo Recorrente (cf. art.ºs. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, do RCP e 189.º, n.º 2, do CPTA).

Lisboa, 6 de Dezembro de 2018.
(Sofia David)
(Conceição Silvestre)
(José Correia)