Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09651/16
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2016
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO – ART. 277º, NºS. 1 E 3 DO CPPT - SUSPENSÃO NAS FÉRIAS JUDICIAIS
Sumário:I - O nº 3 do art. 277º do CPPT dispõe que “Caso o acto reclamado tenha sido proferido por entidade diversa do órgão de execução fiscal, o prazo referido no número anterior é de 30 dias.” Ora, o artigo anterior refere-se ao prazo para revogar o acto reclamado e não ao prazo para apresentação da reclamação que, como sabemos, vem previsto no nº1 da mesma norma. Assim, o prazo para apresentação da reclamação é de 10 dias após a notificação da decisão, nos termos previstos no nº 1, do art. 277º do CPPT.
II - O prazo para deduzir o pedido em escopo esteve suspenso nas férias judiciais, nos termos previstos no art. 138º do CPC, tendo recomeçado a sua contagem em 01.09.2014 (artigo 28º da Lei 62/2013, de 26 de Agosto). Mesmo tendo em conta a aplicação do disposto no art. 139º, nº 5, do CPC, forçoso será concluir que em 30.09.2014 [data invocada pelo recorrente para apresentação da petição] há muito se havia esgotado o prazo de 10 dias previsto no art. 277º, nº 1, do CPPT.
III - Deste modo, mesmo que se viesse a confirmar que a entrada da acção se verificou na data invocada pelo recorrente, ainda assim, sempre a presente reclamação seria intempestiva.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:RUI… veio recorrer da decisão de fls.19 a 22 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que rejeitou, por intempestiva, a reclamação que deduziu, ao abrigo do disposto nos artigos 276º e ss. do CPPT, contra a decisão que, com o fundamento em erro na forma do processo, indeferiu liminarmente a reclamação graciosa que apresentou no âmbito do processo de execução fiscal n°, originariamente instaurado contra a sociedade “D, Lda” e contra si revertido.
Nas suas alegações de recurso formula as seguintes conclusões:


1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou o direito de acção visado nos presentes autos caducado.

2. No entender do recorrente o tribunal a quo errou ao considerar que a petição do recorrente foi apresentada em 18.2.2016, porquanto;

3. A fls. 63 e 69 é constatável que o recorrente deu entrada da acção em apreço nos serviços de finanças de no dia 30.9.2014, por meio de fax enviado pelo mandatário do recorrente, e, posteriormente, em suporte físico.

4. Porém, tal peça processual Petição Reclamatória - após ler sido remetida pelo Serviço de Finanças de a juízo, foi recusada pela secretaria do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (Doc. n°1).

No entanto,

5. O recorrente, gozando do beneficio do prazo estabelecido nos termos do disposto no artº558°, al.f) do CPC;

6. Procedeu, tempestivamente, na sequência daquela recusa da PI à apresentação de nova devidamente instruída e disso fez constar, em questão prévia com a Petição ora junta nos presentes autos.

7. O direito de acção do recorrente não caducou por duas ordens de razão: A primeira PI deu entrada nos serviços de finanças competentes no dia 30.9.2014. devendo ser esta a data a partir do qual o acto se deve dar como praticado pelo recorrente; Em segundo lugar tendo a decisão sido proferida por órgão administrativo distinto daquele a quem a reclamação graciosa havia sido apresentada, confere o direito ao recorrente a apresentar a Petição em escopo no prazo de 30 dias e não de 10 dias conforme consta, inclusive, da decisão ora impugnada (cfr. art.277°, n°3 do CPPT).

8. Vide ainda V. Exas. que, tendo a decisão administrativa sido notificada ao mandatário do recorrente no período de férias judiciais (2014), o prazo para deduzir o pedido em escopo encontrava-se suspenso entre 15.7.2014 até 1.9.2014.

9. Logo tendo o recorrente apresentado a PI em 30.9.2014. não se encontrava precludido o direito de acção do recorrente.

Nestes termos e nos melhores de direito, com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso proceder, por provado, e, consequentemente;
A) Ser a decisão recorrida revogada sendo substituída por outra que considere a acção visada nos presentes autos proposta no prazo legal;
B) Seja a declarar e ordenar o tribunal recorrido a praticar os demais actos processuais.
- Com o que se fará a tão costumada Justiça!»

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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Ministério Público, junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso (cfr. fls.53/57 dos autos).

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Com dispensa de vistos dado o carácter urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1. De Facto

A decisão recorrida é do seguinte teor:


« (…) Rui, com o número de identificação fiscal e residência na Urbanização …, lote 33, r/c direito, em …, revertido no processo de execução fiscal n°…, vem, no seguimento do indeferimento liminar da Impugnação Judicial n°…/15.6BELLE, apresentar a presente Reclamação, ao abrigo dos artigos 276° e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, contra o acto que lhe indeferiu a Reclamação Graciosa na qual pedia a declaração da sua ilegitimidade na execução, a inexistência/nulidade da dívida exequenda e a extinção do processo de execução fiscal.

Alega, em síntese, que o órgão da execução fiscal errou na interpretação jurídica realizada, uma vez que a Reclamação Graciosa não visa somente a anulação total ou parcial dos actos de liquidação de tributos, mas antes versa sobre os actos tributários, sejam estes a liquidação ou outros.

Aquela Reclamação Graciosa - cfr. fls. 1-11 do apenso - foi indeferida pelo Director de Finanças de … em 28 de Julho de 2014 -fls. 33 do apenso - com fundamento em o meio processual adequado para atacar a reversão contra o responsável subsidiário ser a Oposição à Execução Fiscal.

Contra esta decisão, o Reclamante interpôs Recurso Hierárquico - cfr. fls. 39 do apenso -, o qual foi indeferido em 27 de Novembro de 2014 pelo Subdirector-Geral da área de Justiça Tributária e Aduaneira - cfr. fls. 42 do apenso – e notificado com a informação de que poderia, "querendo, interpor impugnação judicial, no prazo de 90 dias, conforme disposto na alínea b) do artigo 102° do CPPT, nos termos do art°204" do mesmo código" (sic).

No dia 12 de Março de 2015, o Reclamante propôs Impugnação Judicial - que correu termos sob o n°…/15.6BELLE (cfr. SITAF) - contra o indeferimento expresso do Recurso Hierárquico, formulando os mesmos pedidos que havia apresentado na Reclamação Graciosa: "a) Ser declarada a ilegitimidade processual da devedora originária e do ora reclamante nos autos de execução em epígrafe; b) Declarar-se a inexistência/nulidade da dívida exequenda: c) Declarar-se a extinção do processo de execução fiscal em apreço em relação ao executado reclamante".

Em 19 de Março de 2015, a Impugnação foi liminarmente indeferida por "o despacho que decide a reversão em processo de execução fiscal não se engloba[r] em qualquer das alíneas referidas no transcrito art.97° do CPPT, pelo que é de concluir que o processo de impugnação judicial não é o meio processual adequado para apreciar a sua legalidade. (...) Por isso, é a oposição à execução fiscal o meio processual adequado para o revertido impugnar a legalidade do despacho que ordena a reversão com fundamento em ilegitimidade. (...) O processo deverá ser convolado na forma de processo adequada, conforme determina o nº3 do art.97° da LGT e nº4 do art.98° do CPPT. (...) Acontece que, no caso dos autos, esse aproveitamento da petição não é possível por falta do pressuposto de idoneidade do pedido (...). Assim sendo, atentos os elementos até ao momento carreados nos autos, não se encontrando preenchido o pressuposto da idoneidade do pedido para a convolação, a mesma não é possível. Face ao exposto indefere-se liminarmente a presente impugnação."


II.

O objecto da presente Reclamação é a "decisão de indeferimento proferida no âmbito de Reclamação Graciosa aduzida no processo de execução em epígrafe referenciado" - cfr. o artigo 2° da Petição Inicial - que, como se disse, se fundamentou em o meio processual adequado para atacar a reversão contra o responsável subsidiário ser a Oposição à Execução Fiscal.

"Entende o Reclamante que o órgão [da execução] errou na interpretação jurídica realizada, porquanto a reclamação graciosa visa a anulação total ou parcial dos actos tributários por iniciativa do contribuinte, incluindo os substitutos e responsáveis (art.68° n°1 do CPPT)", sendo "que o «acto tributário» é um acto emanado pela administração tributária, no desempenho da «actividade tributária», e que faz produzir efeitos jurídicos na pessoa do contribuinte", pelo que "a reclamação graciosa aduzida pelo reclamante nos autos em epígrafe é o meio próprio para se aferir das razões de facto e de direito enunciadas por aquele na reclamação graciosa cuja decisão de indeferimento ora se reclama" - artigos 6° a 12° da Petição Inicial.

Todavia, em sede de controlo liminar, antes de se apreciar a natureza do acto reclamado e a sua legalidade, impõe-se verificar se o Reclamante é titular do direito que se arroga.

No ponto, o Reclamante alega que "Por força do despacho judicial anexo, vem o ora peticionante apresentar nova petição sem perda do benefício do prazo, nos termos e para os efeitos previstos no teor do doc.nº1 que se anexa" - cfr. artigo 1° do articulado inicial.

Este anexo não diz respeito a um despacho judicial mas, antes, à decisão de " recusa da Petição Inicial pela secretaria", por omitir o valor da causa e o pagamento da taxa de justiça - cfr. fls. 10-11 dos autos.


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Vejamos, então:

Nos termos do artigo 277.°, n°1, primeira parte, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, "A Reclamação será apresentada no prazo de 10 dias após a notificação da decisão".

Ora, a decisão da Reclamação Graciosa foi notificada em 2014 - cfr. fls. 37 do apenso - e a primeira Petição de Reclamação foi apresentada em 18 de Fevereiro de 2016 - cfr. fls. 11 dos autos -, muito depois de completado, pois, aquele prazo de 10 dias.

Pelo que o direito à Reclamação caducou há mais de um ano (…).

Termos em que se rejeita a Reclamação (…)”»

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II.2. De Direito


Atentas as conclusões das alegações delimitadoras do objecto do recurso e ressalvando-se as questões que sejam de conhecimento oficioso (cfr. art. 639º do CPC), temos que o recorrente se insurge, fundamentalmente, contra o decidido no entendimento de que a presente reclamação judicial foi deduzida em tempo.


Como resulta da materialidade que deixamos exposta e da questão enunciada como pertinentemente suscitada nas alegações do recurso apresentado, a questão fundamental a decidir é a de saber se a reclamação é tempestiva.




O recorrente vem interpor o presente recurso da sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou o direito de acção visado nos presentes autos caducado. No entender do recorrente o tribunal a quo errou ao considerar que a petição do recorrente foi apresentada em 18.2.2016, porquanto; A fls. 63 e 69 é constatável que o recorrente deu entrada da acção em apreço nos serviços de finanças de no dia 30.9.2014, por meio de fax enviado pelo mandatário do recorrente, e, posteriormente, em suporte físico. Porém, tal peça processual Petição Reclamatória - após ler sido remetida pelo Serviço de Finanças de a juízo, foi recusada pela secretaria do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (Doc. n°1). [conclusões nºs 1 a 4].

Alega o recorrente que deu entrada à acção em apreço no dia 30.9.2014, conforme se constata a fls. 63 e 69.

Ora, os presentes autos, na presente data, não têm as referidas folhas. Assim, como o processo instrutor apenso também não chega a essa numeração de folhas terminando a fls. 46.

Pelo que, contrariamente ao alegado, não existe nos autos qualquer prova da entrada da acção na data alegada pelo recorrente, nem o mesmo fez prova do que alega juntando documento que o comprovasse.

Aqui chegados, poder-se-ia dizer que, nos termos do previsto no art. 13º do CPPT, importava fazer diligências no sentido do apuramento da verdade.

Mas, adiantamos desde já, seriam diligências inúteis e, portanto, proibidas por lei.

Vejamos o que invoca o recorrente. Que o direito de acção do recorrente não caducou por duas ordens de razão: A primeira PI deu entrada nos serviços de finanças competentes no dia 30.9.2014. devendo ser esta a data a partir do qual o acto se deve dar como praticado pelo recorrente; Em segundo lugar tendo a decisão sido proferida por órgão administrativo distinto daquele a quem a reclamação graciosa havia sido apresentada, confere o direito ao recorrente a apresentar a Petição em escopo no prazo de 30 dias e não de 10 dias conforme consta, inclusive, da decisão ora impugnada (cfr. art.277°, n°3 do CPPT). Vide ainda que, tendo a decisão administrativa sido notificada ao mandatário do recorrente no período de férias judiciais (2014), o prazo para deduzir o pedido em escopo encontrava-se suspenso entre 15.7.2014 até 1.9.2014. Logo tendo o recorrente apresentado a PI em 30.9.2014. não se encontrava precludido o direito de acção do recorrente [conclusões nºs. 7 a 9].

Invoca, pois, o recorrente que tendo a decisão sido proferida por órgão administrativo distinto daquele a quem a reclamação graciosa havia sido apresentada, confere o direito ao recorrente a apresentar a Petição em escopo no prazo de 30 dias e não de 10 dias conforme consta, inclusive, da decisão ora impugnada (cfr. art.277°, n°3 do CPPT).

Mas não tem razão.

O nº 3 do art. 277º do CPPT dispõe que “Caso o acto reclamado tenha sido proferido por entidade diversa do órgão de execução fiscal, o prazo referido no número anterior é de 30 dias.” Ora, o artigo anterior refere-se ao prazo para revogar o acto reclamado e não ao prazo para apresentação da reclamação que, como sabemos, vem prevista no nº1 da mesma norma.(1)

Assim, tal como foi decidido no Tribunal a quo o prazo para apresentação da reclamação é de 10 dias após a notificação da decisão, nos termos previstos no nº 1, do art. 277º do CPPT.

Ora, a decisão da Reclamação Graciosa foi notificada em 30/07/2014 - cfr. fls. 37 do apenso.

Pelo que como alega o recorrente o prazo para deduzir o pedido em escopo esteve suspenso nas férias judiciais, nos termos previstos no art. 138º do CPC, tendo recomeçado a sua contagem em 01.09.2014 (artigo 28º da Lei 62/2013, de 26 de Agosto).

Ora contando 10 dias a partir de 01.09.2014, e mesmo tendo em conta a aplicação do disposto no art. 139º, nº 5 do CPC, forçoso será concluir que em 30.09.2014 [data invocada pelo recorrente para apresentação da petição] há muito se havia esgotado o prazo de 10 dias previsto no art. 277º, nº 1 do CPPT.

Deste modo, mesmo que se viesse a verificar que a entrada da acção se verificou em 30.09.2014, como invoca o recorrente, ainda assim, sempre a presente reclamação seria intempestiva.

Termos, em que improcedem as conclusões de recurso, mantendo-se a decisão recorrida.



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III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Registe e Notifique.


Lisboa, 9 de Junho de 2016




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[Lurdes Toscano]





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[Ana Pinhol]





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[Jorge Cortês]


(1)Veja-se anotação ao art. 277º in CPPT, Anotado e Comentado, Jorge Lopes de Sousa, 6º Edição.