Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:283/13.6BEFUN
Secção:CT
Data do Acordão:05/21/2020
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL;
INTERRUPÇÃO E SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO/RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS EM PROCESSO CÍVEL E INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO- CRIME
Sumário:
I – A prescrição da obrigação de pagamento de cotizações e contribuições para a Segurança Social interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida.

II – Só são diligências administrativas as realizadas no âmbito do procedimento de liquidação ou do processo de execução fiscal instaurados pelo Instituto de Segurança Social tendo em vista a liquidação e cobrança da dívida, de que seja dado conhecimento ao devedor.

III – Quando um credor titular de um direito real de garantia reclama o seu crédito em execução movida por um terceiro na qual foram penhorados bens sobre os quais incide o seu direito real de garantia ou o seu privilégio creditório, está apenas a exercer o direito que lhe assiste a ser pago do seu crédito à custa do produto da venda do bem (móvel ou imóvel), sobre o qual recai o seu direito real de garantia ou o seu privilégio creditório, caso o mesmo venha de facto a ser alienado no âmbito dessa execução alheia.

IV – A reclamação de créditos apresentada pelo Instituto de Segurança em processo de execução civil a correr termos na jurisdição comum não constitui uma diligência administrativa tendente à cobrança coerciva de impostos e, consequentemente, a apresentação dessa reclamação não projecta no prazo prescricional qualquer efeito interruptivo.

V - Só se, extinta essa execução movida por terceiro sem que tais bens tenham chegado a ser vendidos, o credor reclamante vier a requerer o prosseguimento da execução, assumindo então a veste de verdadeiro Exequente nessa execução, e prosseguindo esta sob seu impulso, é que o requerimento de reclamação de créditos apresentado pelo Instituto de Segurança Social poderá configurar a prática de um acto tendente à cobrança coerciva do seu crédito capaz de interromper a prescrição.

VI – As regras de prescrição e suspensão previstas na Lei Geral Tributária, na parte em que não contendam com o regime especial que actualmente se encontra previsto no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, são subsidiariamente aplicáveis às dívidas emergentes da falta de pagamento de contribuições à Segurança Social, sendo que, no que se reporta às causas de suspensão do prazo prescricional, incluindo a decorrente da instauração do processo instauração de inquérito-crime, a sua aplicabilidade resulta hoje clara da remissão contida no artigo 187.º, n.º 3 do referido Código.

VIII - Às leis que alteram as causas de suspensão ou de interrupção aplica-se a regra de aplicação no tempo consagrada no artigo 12.º, n.º 2, do Código Civil, do qual resulta que os efeitos, interruptivos e suspensivos, que certos factos têm sobre o decurso dos prazos de prescrição são determinados pela lei vigente no momento em que eles ocorrem.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:1. Relatório

1.1. M... COMPANY, LDA deduziu Oposição à Execução Fiscal n.º 2..., e execuções apensas, a correr termos na Secção de Processo Executivo do Instituto da Segurança Social da Madeira, I.P. – RAM, instauradas para cobrança de dívida, e respectivos juros de mora, relativa a contribuições dos meses de Fevereiro de 2002 a Dezembro de 2007, no montante global de € 1.005.658,79.

1.2. Notificada da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal que, reconhecendo a prescrição da dívida, julgou procedente a Oposição, o Instituto e Segurança Social da Madeira, IP - RAM interpôs o presente recurso jurisdicional, tendo em alegações formulado as seguintes conclusões (cuja numeração se corrige, a partir da conclusão N), por evidente lapso na sua identificação):

«A) A douta sentença de que ora se recorre errou ao não considerar como provada a interrupção da prescrição, pela reclamação de crédito com data de entrada na Vara Mista do Tribunal Judicial de Setúbal a 10/10/2003, no âmbito do processo n.º 355-B/2000 com sentença datada de 02/11/2012, dada como provada nos pontos 7 a 9 da referida sentença.

B) E tal erro toma-se mais evidente quando é a própria sentença que reconhece a sua ocorrência, em termos de matéria de facto provada, no entanto não retira as devidas consequências, ao não considerar como ato interruptivo do prazo prescricional, nos termos dos artigos 63º da Lei n.º 17 de 8 de Agosto, artigo 49° da Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro, que foi mantido pelo n.0 4 do artigo 60°, da Lei nº 4/2007 de 16 de Janeiro, atualmente vigente, bem como pelo artigo 187º do Código Contributivo, a par da citação.

C) Sucede que tal interpretação redundou na violação do teor das normas citadas.

D) Ressalvado o devido respeito, não se conforma a Segurança Social com esta decisão, dado que a reclamação é um acto que exprime, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito com o conhecimento do responsável pelo pagamento conducente à cobrança da dívida, sendo suscetível de constituir uma diligência administrativa.

E) No âmbito da Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto as contribuições para a Segurança Social prescreviam no prazo de 10 anos, salvaguardando os termos e causas em que tal prazo seria susceptível de ser suspenso ou interrompido, por aplicação da Lei Geral Tributária, ao que não estivesse especialmente regulado naquela norma específica, ou legislação especial.

F) Com a Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, veio o legislador consagrar um novo e especial regime prescricional para as obrigações contributivas face ao regime geral aplicável as obrigações tributárias no âmbito da Lei Geral Tributária.

G) A redação do artigo 63º da Lei 17/2000, mantida no artigo 49º da Lei n.º 32/2002, no artigo 60º, da Lei nº 4/2007 de 16 de Janeiro, bem como no artigo 187º do Código Contributivo atualmente vigentes, estipula que o prazo prescricional é de 5 anos e a prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com o conhecimento do responsável pelo pagamento conducente à liquidação ou cobrança da dívida.

H) A douta sentença não relevando tal factualidade para efeitos da interrupção do prazo de prescrição, desconsiderou não só o teor, como todo o sentido útil e pensamento legislativo subjacente à redação dada pelo legislador de que a prescrição se interrompe pela ocorrência de qualquer diligência de que o devedor tenha conhecimento conducente à liquidação ou cobrança da dívida.

I) E foi essa eficácia interruptiva cominada no artigo 63° da Lei 17/2000, mantida no artigo 49º da Lei n.º 32/2002, no artigo 60º, da Lei nº 4/2007 de 16 de Janeiro, bem como no artigo 187º do Código Contributivo, atualmente vigentes, que a douta sentença não levou manifestamente em consideração, fazendo uma errada interpretação das referidas normas, o que originou decisão em sentido contrário àquela que se impunha proferir.

J) Na verdade, apesar da lei de bases e o Código Contributivo fixar de forma taxativa os actos interruptivos da prescrição, o que poderá ser discutível são os efeitos duradouro ou instantâneo dos mesmos, visto que estas não esclarecem, nem a Lei Geral tributária o faz quanto à prescrição de dívidas da Segurança Social.

K) O artigo 326º do Código Civil estabelece que a "interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.º 1 e 3 do artigo seguinte que dispõe que " se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.

L) Os factos referidos no n.º 1 do artigo 49º da LGT no que se refere à interrupção da prescrição por dívidas tributárias têm caracter taxativo e efeito duradouro, assim não é quanto aos factos interruptivos da prescrição da Segurança Social.

M) E mesmo que assim não se entenda, o prazo de prescrição encontrava-se suspenso. por aplicação do n.º 3 do artigo 187º do Código contributivo e seguintes e da lei geral, dado estar em curso execuções que tem por objecto a posse e propriedade de bens penhorados.

N) Bem como errou na matéria dada como provada, constante dos pontos 13 e 14 da sentença face ao lapso manifesto, quando refere:

i) no ponto 14 que o ofício de citação mencionado no ponto antecedente foi devolvido pelos serviços postais, em 02 de agosto de 2013 com a menção de "mudou-se" deve referir 25 de janeiro de 2013.

ii) No ponto 15 que no dia 24 de janeiro de 2013 (...) deve referir 22 de abril de 2013.

O) E errou ao não dar como provada a reclamação de créditos 10/10/2003 (proc. n.º 401-A/2000 do 3º Juízo Cível do tribunal Judicial do Funchal) com sentença em que julgou procedente o incidente da reclamação a 17/02/2003 e o graduou em 1° Lugar;

P) E errou ao não julgar suspensa a contagem do prazo de prescrição, por aplicação do n.º 3 do artigo 187º do Código contributivo e seguintes e da lei geral, dado estarem em curso acções judiciais que tem por objecto a posse e propriedade de bens penhorados e por aplicação do n.º 5 do artigo 49º da Lei Geral por ter estado em curso processo crime no âmbito do qual foi deduzido o pedido de indemnização civil no proc. 313/02. 7TASCR a 11105/2005, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Santa Cruz com sentença transitada em julgado 25/05/201O.

Nestes termos e nos demais de direito:

1) Não pode a douta sentença manter-se na ordem jurídica, devendo a mesma ser revogada e substituída por outra que declare a dívida como exigível, designadamente os períodos contributivos de 02/2002 a 12/2007 à luz do disposto nos artigos 63º da Lei 17/2000, do artigo 49º da lei n.º 32/2002, no artigo 60º, da lei nº 4/2007 de 16 de janeiro, bem como no artigo 187º do código contributivo, atualmente vigentes.

2) Mais se requer a condenação da oponente das custas e demais encargos processuais.»

1.3. Proferido despacho de admissão do recurso e notificado deste despacho a Oponente, não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, quer quanto à impugnação da matéria de facto, defendendo a irrelevância da invocada reclamação de créditos apresentada em 10-10-2003, quer quanto invocado erro de julgamento de direito, subscrevendo integralmente nesta última parte os fundamentos que suportam a sentença recorrida.

1.5. Colhidos os “vistos” dos Juízes Desembargadores Adjuntos, submetem-se, agora, os autos à conferência para julgamento.

2. Objecto do recurso

2.1. Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (artigo 635. °, n.°2 do Código de Processo Civil), esse objecto, assim delimitado, pode ser, expressa ou tacitamente, restringido nas conclusões da alegação (n.°3 do mesmo artigo 635.º). Pelo que, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

2.2. Atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto pela Fazenda Pública, importa agora decidir as seguintes questões:
2.2.1. Distintamente do que julgou o Tribunal a quo, deve ficar a constar dos pontos 13. e 14. do probatório que o ofício de citação mencionado em 12. foi devolvido pelos serviços postais a 25 de janeiro de 2013 com a menção de "mudou-se” nele aposta (facto 13) e que o ofício de citação foi expedido a 22 de Abril de 2013 (facto 14), por tal se mostrar imposto pelo teor dos documentos que constam de fls. 4 a 18 e 20 a 21 do processo administrativo apenso?

2.2.2. Devia ter sido dado como provado que o Recorrente apresentou, a 10-10-2003, reclamação de créditos no processo n.º 401-A/2000, que correu termos no 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial do Funchal, onde foi proferida, a 17-2-2003, sentença que graduou o crédito reclamado em 1° lugar?

2.2.3. O Tribunal a quo errou ao não extrair dos factos vertidos nos pontos 7. a 9. do probatório e dos artigos 63.º da Lei n.º 17/2000, 49.º da Lei n.º 32/2002 e 187.º do Código Contributivo, que a dívida não está prescrita?

3. Fundamentação de facto

3.1. Em 1ª instância foram dados como assentes os seguintes factos:

1. De fevereiro de 2002 a maio de 2006, a Oponente entregou declarações de remunerações referentes a trabalhadores por conta de outrem, abrangidos pela taxa contributiva de 34,75%, e a membros dos órgãos estatutários (gerência), abrangidos pela taxa de 31,25% – cfr. docs. 01 a 04 juntos com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

2. A partir de junho de 2006 (e até dezembro de 2007), a sociedade Oponente entregou as declarações de remunerações referentes a membros dos órgãos estatutários – cfr. docs. 01 a 04 juntos com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

3. Em 12 de janeiro de 2007, foi expedido pelo Centro de Segurança Social da Madeira, por via postal registada com aviso de receção (registo CTT RO0...PT), ofício de notificação com o n.º 2267/1, dirigido à “M... & Co, Lda., Largo C..., 9000-000 Funchal”, para pagamento de dívida de contribuições à Segurança Social de 2000 a 2006, referente às declarações de remunerações apresentadas naqueles exercícios (entre as quais as mencionadas nos pontos 1. e 2.) – cfr. fls. 144, 145 e 148 do Processo de Execução Fiscal (PEF) apenso.

4. O aviso de receção referente ao registo CTT RO0...PT foi assinado pelo titular do Bilhete de Identidade n.º 5... e devolvido no dia 23 de janeiro de 2007 – cfr. fls. 148 do PEF apenso.

5. No dia 12 de janeiro de 2007, foi expedido pelo Centro de Segurança Social da Madeira, por via postal registada com aviso de receção (registo CTT RO2...PT), ofício de notificação com o n.º 2272/1, dirigido à “M... & Co, Lda., Largo C..., 9000-000 Funchal”, para pagamento de dívida de juros de mora respeitantes ao atraso de pagamento das contribuições à Segurança Social de 1997 a 2000 – cfr. fls. 146, 147 e 149 do PEF apenso.

6. O aviso de receção referente ao registo CTT RO2...PT foi assinado pelo titular do Bilhete de Identidade n.º 5... e devolvido no dia 23 de janeiro de 2007 – cfr. fls. 149 do PEF apenso.

7. A 10 de janeiro de 2012, o Centro de Segurança Social da Madeira, apresentou junto da Vara Mista do Tribunal Judicial de Setúbal, por apenso ao proc. de execução n.º 355-B/2000, em que figurava como executada a ora Oponente, incidente de reclamação de créditos, reclamando o pagamento de € 1.038.304,32, referentes a contribuições de fevereiro de 2002 a dezembro de 2007 advenientes dos valores em dívida apurados na sequência da apresentação das declarações de remunerações referidas nos pontos 1. e 2., e juros de mora vencidos até janeiro de 2012 – cfr. fls. 259 a 267 do PEF apenso.

8. Em 18 de junho de 2012, a ora Oponente impugnou os créditos reclamados pelo Centro de Segurança Social da Madeira, referenciados no ponto antecedente, com fundamento na respetiva prescrição – cfr. fls. 301 a 303 do PEF apenso.

9. Por sentença datada de 02 de novembro de 2012, foram os créditos reclamados pelo Centro de Segurança Social da Madeira reconhecidos e graduados em primeiro lugar, julgando-se, para o efeito, interrompida a prescrição com “as cartas registadas com aviso de recepção enviadas para a morada indicada pela executada como a da sua sede”, que “não se podem deixar de se considerar relevantes” e a mesma “notificada no dia 23 de Janeiro de 2007” – cfr. fls. 268 a 275 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

10. Foi instaurado na Secção de Processo Executivo do Instituto da Segurança Social da Madeira, I.P. – RAM o processo de execução fiscal n.º 2... e apensos, contra a Oponente, “M... Company, Lda.”, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de cotizações dos períodos 2000/03 a 2007/12 (certidões de dívida n.ºs 3697/2009 e 10832/2012), bem como de contribuições dos períodos 1995/11, 2000/04 a 2007/12 (certidões de dívida n.º 3698/2009 e 10833/2012) – cfr. fls. 01 e 04 a 11 do PEF apenso.

11. Os valores em dívida relativos aos períodos contributivos de 1995/11, e 2000/03 a 2002/01, referidos no ponto anterior, foram declarados prescritos pelo Centro de Segurança Social da Madeira – cfr. fls. 373 a 378 e 427 a 435 do PEF apenso.

12. Em 24 de janeiro de 2013, foi expedido ofício de citação para o processo de execução fiscal n.º 2... e apensos, por via postal registada com aviso de receção (com o registo CTT n.º RD0...PT), dirigido à “M... & Co, Ltd (Zona Franca da Madeira), Lg C..., 9000-000 Funchal” – cfr. fls. 02 a 19 do PEF apenso.

13. O ofício de citação mencionado no ponto antecedente foi devolvido pelos serviços postais, em 02 de agosto de 2013, com a menção “mudou-se– cfr. fls. 23 do PEF apenso.

14. No dia 24 de janeiro de 2013, foi expedido ofício de citação para o processo de execução fiscal n.º 2... e apensos, por via postal registada com aviso de receção (com o registo CTT RC…PT), dirigido ao “Sr. A..., gerente da empresa, M... & Co. Ltd, A..., 2640-415 Mafra”, que apresentava a seguinte forma:

15. O aviso de receção referente ao registo CTT RC…PT foi assinado em 02 de maio de 2013, pelo gerente A... – cfr. fls. 21 do PEF apenso.

16. A presente oposição foi apresentada junto do Instituto da Segurança Social da Madeira, I.P. – RAM, em 27 de maio de 2013 – cfr. fls. 02 dos autos (suporte digital).

17. No dia 13 de novembro de 2014, foi declarada a dissolução e o encerramento da liquidação da sociedade Oponente, o que foi levado a registo pela Ap. 1 de 11 de dezembro de 2014 – cfr. certidão permanente constante de fls. 282 a 285 dos autos (suporte digital).

3.2. Ficou ainda consignado no julgamento de facto que não existem quaisquer factos provados com relevo para o mérito dos autos e que “A decisão da matéria de facto, efetuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos e do processo de execução fiscal apenso, conforme o especificado nos vários pontos da factualidade dada como provada, que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do tribunal, em conjugação com a livre apreciação da prova.»

4. Fundamentação de direito

A única questão jurídica colocada na petição de Oposição era a de saber se a dívida exequenda, relativa a contribuições para a Segurança Social no período de 2/2002 a 12/2007, estava ou não prescrita.

O Tribunal a quo, após ter fixado os factos que julgou pertinentes para a questão controvertida, conclui que o prazo de 5 anos, que entendeu como sendo o prazo aplicável, já se completara quando ocorreu o primeiro facto interruptivo, isto é, com a citação da Executada. E, em conformidade, julgou prescrita a dívida exequenda.

Com esta decisão não se conformou o Recorrente.

Invocou, por um lado, que os factos relevados pelo Tribunal a quo estão errados no que respeita a datas, eventualmente por manifesto lapso de escrita, e que esses factos são insuficientes para o julgamento realizado, requereu, respectivamente, a sua rectificação e aditamento. Por outro, que as ilações extraídas e a subsunção jurídica realizada padecem de evidente erro na interpretação e aplicação do direito.

Vejamos, então, se lhe assiste razão.

4.1. Do erro de julgamento sobre a matéria de facto: conclusões N) e O) das conclusões de recurso

4.1.1. O primeiro erro de julgamento de facto apontado ao julgado – alínea N das conclusões de recurso jurisdicional - está dirigido aos pontos 14. e 15. do probatório.

Salientamos, antes de mais, que que há um manifesto lapso do Recorrente no que respeita à indicação dos pontos do probatório cuja redacção pretende ver alterados.

Na verdade, embora o Recorrente identifique como factos a alterar os vertidos no probatório sob os n.ºs 14. e 15., da transcrição, ainda que parcial, que deles faz na conclusão N) e da redacção que deixa proposta nas suas conclusões de recurso jurisdicional, conclui-se que são os pontos 13. e 14 do probatório, e não os pontos 14. e 15., os que efectivamente pretende ver reapreciados (sendo já com esta identificação que surgem na delimitação do objecto do recurso – ponto 2.1. deste acórdão)

Por outro lado, ainda que o Recorrente não indique expressamente quais os meios probatórios em que baseia a pretendida alteração, é perceptível que esta só pode ter por fundamento os documentos em que o Meritíssimo Juiz fundou a sua convicção e para os quais nesses pontos do probatório faz remissão expressa.

É, pois, com este âmbito que admitimos a impugnação da matéria de facto e que julgamos suficientemente verificados os pressupostos previstos no artigo 640.º do CPC.

4.1.2. Posto isto, apreciemos agora o mérito da pretensão.

4.1.2.1. Segundo o Recorrente, no ponto 13., onde consta que ofício de citação mencionado no ponto antecedente foi devolvido pelos serviços postais em 2 de Agosto de 2013, com a menção "mudou-se” deve referir-se 25 de Janeiro de 2013. No ponto 14. onde consta o dia 24 de Janeiro de 2013, deve ficar a constar 22 de Abril de 2013.

Vejamos.

No ponto 13. do probatório, com base no teor do documento de fls. 23, ficou a constar que provou que “o ofício de citação mencionado no ponto antecedente” foi devolvido pelos serviços postais, em 2 de Agosto de 2013, com a menção “mudou-se”.

O “o ofício mencionado no ponto antecedente” (12.), é o ofício de citação dirigido à Executada, “M... & Co, Ltd (Zona Franca da Madeira), Lg C..., 9000-000 Funchal”, enviado por carta registada com aviso de recepção, a que foi atribuído o n.º RD0...PT, com o teor que consta de fls. 2 a 19 do processo administrativo apenso.

Ora, como resulta claramente da análise do documento de fls. 23 (verso), aquele ofício foi realmente devolvido a 2 de Agosto de 2013, data que aí foi aposta pelos serviços postais de forma manuscrita e sob a forma de carimbo oficial.

Se o que o Recorrente efectivamente pretende– o que colocamos como hipótese atenta a forma confusa como a alteração peticionada na conclusão N) está conformada- é a alteração da data de expedição do ofício constante do ponto 12. do probatório, ou seja, a substituição da data de 24 de Janeiro de 2013 pelo dia 25 de Janeiro de 2013, também não lhe deve ser reconhecida razão, por não existir nos autos qualquer documento que suporte essa pretensão.

Pelo contrário, tanto quanto resulta do documento de fls. 2, foi exactamente a 24 de Janeiro de 2013 que o referido ofício foi expedido pelos serviços do Recorrente para citação (vide registo informático de saída), sendo irrelevante que nele tenha sido manualmente aposto a menção “cópia”, cujo significado não se alcança.

Não incorreu, pois, o Tribunal a quo, contrariamente ao que afirma o Recorrente, em qualquer erro na factualidade apurada.

Tal como não incorreu em erro no que respeita à data consignada no ponto 14.

Na verdade, nesse concreto ponto do probatório, com base nos documentos de fls. 4 a 18 e 20, foi dado como provado que no dia 24 de janeiro de 2013 foi expedido ofício - por carta registada com aviso de recepção a que foi atribuído o n.º RC9…PT - dirigida ao “Sr. A...”, na qualidade de gerente da Executada.

Desse documento consta informaticamente registado, tal como no anteriormente analisado, o seguinte: “ISSM,IP-RAM, S. 14018/1/2013, 2013-01-24.”

Diga-se, como o fizemos quanto ao facto antecedente, que nesse mesmo documento foi manualmente aposto “2ª via a 2013-04-22” (aqui a referência a uma outra via é mais completa e perceptível). Porém, não consta dos autos qualquer documento que o comprove, isto é, que comprove que esse documento expedido a 24 de Janeiro de 2013 corresponda apenas a uma 1ª via e que tenha sido devolvido pelo destinatário.

Donde, sem prejuízo de o recebimento de uma carta no dia 2 de Maio de 2013 ser mais compatível com um envio do referido ofício a 24 de Abril de 2013, o certo é que os documentos confirmam apenas um envio a 24 de Janeiro de 2013, data que, por sua vez, é também a mais coerente com a data da sua emissão, tal como documentalmente provada nos autos, ou seja, com o dia 22 de Janeiro de 2013.

Em suma, face ao teor dos documentos que constam de fls. 4 a 18 e 20, há que concluir que o ofício identificado no ponto 14. do probatório foi emitido a 22 de janeiro de 2013, enviado a 24 de Janeiro de 2013 e foi recebido pelo destinatário no dia 2 de Maio do mesmo ano.

Aliás, se bem atentarmos na informação que consta do processo (“INFORMAÇÃO DS PROCESSOS EXECUTIVOS” – fls. 58-59 dos autos), prestada pelos serviços do Recorrido antes da remessa dos autos para Tribunal, constatamos que aí ficou vertido o entendimento de que a citação postal teve registo de saída a 24 de janeiro de 2013 e que foi recepcionada a 2 de Maio de 2013, razão pela qual, salvo o devido respeito, nem se logra compreender qualquer razão que justifique que o Recorrente tenha vindo neste recurso suscitar este erro de julgamento de facto.

Improcede, pois, nesta parte, a pretensão de alteração do probatório

4.1.2.2. O segundo erro imputado ao julgamento de facto – invocado na conclusão M das alegações de recurso - prende-se com a não inclusão no probatório de um facto que o Recorrente alega ter invocado e a que atribui efeito interruptivo, a saber, que a 10 de Outubro de 2003 apresentou uma reclamação de créditos no âmbito do processo n.º 401-A/2000, que correu termos no 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial do Funchal, na qual foi proferida sentença a 17/02/2003, graduando o seu crédito em 1° lugar.

É verdade que o Recorrente alegou, nos artigos 26.º e 27.º da sua contestação, a verificação de um conjunto de factos que defendeu terem efeito interruptivo do prazo de prescrição, no qual se incluía a reclamação de créditos de 10 de Outubro de 2003 apresentada no processo 401-A/2000, cuja sentença transitou a 2 de Novembro de 2003.

Todavia, também nesta parte julgamos não ser de acolher a pretensão do Recorrente.

Explicitando porque assim o entendemos, começamos por realçar que, como se surpreende da leitura da sentença, o Meritíssimo Juiz avançou uma justificação para a subvalorização desse facto e de grande parte dos demais invocados nos artigos 26.º e 27.º da contestação: “cabendo realçar que as supostas causas de interrupção da prescrição verificadas em momento anterior às aduzidas notificações efectuadas a 23 de janeiro de 2007 (invocadas pelo Exequente nos artigos 26.º e 27.º da contestação), a verificarem-se, sempre se mostrariam irrelevantes, já que aproveitariam desta última causa interruptiva”.

Parece poder depreender-se do que deixámos transcrito, que o Tribunal a quo fez o seguinte juízo: estando provado que existiu uma interrupção do prazo de prescrição a 23 de Janeiro de 2007, determinada pelas notificações dadas como provadas nos pontos 3. a 6., e que a partir desta data se inicia a contagem de um novo prazo de prescrição, é irrelevante apurar se os factos interruptivos invocados com ocorrência anterior a esse se verificaram ou não, isto é, integrá-los no probatório, uma vez que, não tendo ainda naquela data (23-1-2007) decorrido o prazo de 5 anos, os efeitos desta última interrupção sempre se projectariam na contagem do mencionado prazo.

Ou seja, considerando que, qualquer que fosse o resultado do apuramento desses factos anteriores a 23-1-2007 (nestes se incluindo a referida reclamação datada do ano 2003), a solução jurídica, por força do efeito interruptivo da notificação concretizada naquela data (2007), se manteria inalterada, optou o Tribunal a quo por fazer constar dos factos apurados apenas o último facto com apetência interruptiva que julgava verificado até àquela última data.

Opção distinta, todavia, realizou no que respeita à invocada reclamação de créditos deduzida no processo n.º 355-B/2000, que correu termos nas Varas Mistas do Tribunal Judicial de Setúbal, atenta a data da sua apresentação - 10 de Janeiro de 2012 – e a data de prolação da sentença ali proferida - 2 de Novembro de 2012 -, que reconheceu e graduou o crédito reclamado pelo Recorrido em 1ª lugar.

Em suma, o Meritíssimo Juiz nem olvidou que o confronto entre as partes se centrava essencialmente na verificação ou não de qualquer facto interruptivo do prazo de prescrição, nem desprezou as várias soluções de direito que configurou como possíveis para a questão essencial que tinha para decidir, como se denota do facto de não ter subvalorizado a prova da alegada apresentação das reclamações de créditos a 10 de Janeiro de 2012 nem a susceptibilidade de esta se subsumir ao conceito de diligência administrativa, prevista no regime especial de prescrição das dívidas para com a Segurança Social como causa interruptiva, nem, por fim, a relevância fundamental que aquela concreta reclamação podia vir a assumir atenta a tese perfilhada pelo Recorrido.

Há, pois, que concluir, que o probatório evidencia um cuidadoso recorte dos factos alegados pelas partes com relevância para a decisão segundo as várias soluções plausíveis de direito, não sendo, por esta razão, merecedor do reparo que neste recurso lhe é dirigido, nem, consequentemente, existe fundamento para que procedamos à alteração pretendida que, assim, julgamos improcedente.

4.2. Estabilizada a matéria de facto, importa agora decidir o invocado erro de julgamento de direito, que, como ficou definido na delimitação do objecto do recurso, se reconduz à questão de saber se, face aos factos apurados, devia o Tribunal a quo ter concluído que a dívida em execução não está prescrita.

Nesse sentido, recordamos, antes de mais, que no processo de execução a que esta Oposição se dirige estão em causa dívidas emergentes de contribuições em falta para a Segurança Social do período de Fevereiro de 2002 a Dezembro de 2007 e acrescido, no montante global de € 1.005.658,79.

Considerando o período de tempo a que se reportam as dívidas em análise, importa enunciar os pressupostos de direito que nuclearmente suportarão a nossa decisão.

O primeiro é relativo à definição do prazo: o prazo de prescrição da obrigação de pagamento das contribuições para a segurança Social é o prazo de cinco anos – era esse o prazo no âmbito da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto (artigo 63.º), que posteriormente se manteve nas Leis n.º 32/2002, de 20 de Dezembro (artigo 49.º), n.º 4/2007, de 16 de Janeiro (artigo 60.º), n.º 32/2002 e, por fim, é esse o prazo de prescrição previsto no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, doravante designado apenas por Código dos Regimes Contributivos (artigo 187.º, n.º 1), aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro, regime que actualmente se encontra em vigor.

O segundo quanto ao momento em que se inicia a contagem desse prazo: até à data de entrada em vigor do novo Regime Contributivo, contava-se a partir da data em que a obrigação devia ser cumprida, isto é, a partir do dia 15 do mês subsequente àquele que as cotizações respeitavam, por assim o determinar os artigos 10.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 199/99, de 8 de junho e 6.º do Decreto-Regulamentar n.º 26/99, de 27 de Outubro) , com a entrada em vigor do referido Código, por imposição directa do seu artigo 43.º, deve ser contado a partir dos dias 10 a 20, também do mês seguinte àquele a que as contribuições respeitem.

O terceiro é relativo ao regime de interrupção e suspensão do prazo de prescrição: (i) por força do regime especial, sucessivamente consagrado nos artigos 63.º, n.º 3 da Lei 17/2000, 49.º, n.º 2 da Lei n.º 32/2002, 60.º, n.º 4 da Lei 4/2007 e 187.º, n.º 2 do Código dos Regimes Contributivos, o prazo de prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa realizada com o conhecimento do responsável pelo pagamento conducente à liquidação ou à cobrança da dívida; por força da aplicação subsidiária do regime geral consagrado da Lei Geral Tributária, interrompe-se e suspende-se nos termos previstos no artigo 49.º desta última Lei, com as devidas adaptações, o que significa que, embora tenham impacto no computo do prazo os factos elencados no n.º 1 do identificado preceito, há que distinguir rigorosamente as situações em que o facto tem natureza instantânea das situações em que tem natureza duradoura, valendo, no caso das dívida à segurança social, o entendimento de que a limitação imposta ao número de interrupções está circunscrita às situações em que ela emerge de um facto interruptivo com efeito duradouro; (1) (ii) a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo dos casos em que a interrupção resulte de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, por quanto a estes ter ficado legalmente estabelecido que não começa a correr novo prazo de prescrição enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo – artigos 326.º n.º 1 e 327.º n.º 1, ambos do Código Civil.

Considerando que a sentença recorrida e, muito especialmente, as conclusões do presente recurso permitem antever que assumirá extrema relevância no caso concreto o conceito de “diligência administrativa conducente à cobrança da dívida exequenda” - expressão através da qual o legislador consagrou uma das particularidades do regime especial de prescrição das dívidas à Segurança Social – importa desde já adiantar que a doutrina e a jurisprudência vêm incluindo nesse conceito todas as diligências levadas a efeito em processo administrativo de liquidação e em processo de execução fiscal conducentes à liquidação e cobrança da dívida de que seja dado conhecimento ao devedor.

Subjacente ao recorte doutrinal e jurisprudencial citado, que subscrevemos, está, se bem vemos, por um lado, a estrutura do regime de restituição e cobrança coerciva das contribuições ou prestações devidas à Segurança Social e, por outro, a natureza especial do regime em apreço.

Quanto ao primeiro, regista-se que desde a Lei n.º 17/2000 até ao actual Código de Regimes Contributivos - embora com nuances de redacção ou sistematização ligeiramente distinta, a que não deve ser atribuído especial relevo -, o legislador deixou sempre expresso que essa cobrança, impulsionada pelo Instituto de Segurança Social, se deve realizar no âmbito de um processo executivo.

Na verdade, essa delimitação processual administrativa surge expressa ou implicitamente consagrada nos artigos 63.º, n.º 1 da Lei n.º 17/2000 (“1 - A cobrança coerciva dos valores relativos às cotizações e às contribuições é efectuada através de processo executivo e de secção de processos da segurança social.”), 48.º n.º 1 da Lei n.º 32/2002 (“1 - A cobrança coerciva dos valores relativos às quotizações, às contribuições e às prestações indevidamente pagas é efectuada através de processo executivo e de secção de processos da segurança social.), 60.º, n.º 1 da Lei n.º 4/2007 (“1 - As quotizações e as contribuições não pagas, bem como outros montantes devidos, são objecto de cobrança coerciva nos termos legais.”, o que os conduz ao processo executivo instaurado e tramitado pelas secções de processos da segurança social) e artigo 186.º, n.º 3 do Código dos Regimes Contributivos (“3 - As dívidas à segurança social de qualquer natureza podem não ser objeto de participação para execução nas secções de processo da segurança social quando o seu valor acumulado não atinja os limites estabelecidos anualmente por despacho do membro do Governo responsável pela área da segurança social.”).

Quanto à natureza especial do regime contributivo, sabemos que está centrado em três aspectos fundamentais : menor prazo prescricional quando comparado com o regime geral (respectivamente 5 e 8 anos); elemento de fixação do dies a quo (momento em que a obrigação devia ter sido cumprida, nos termos supra expostos) e, para o que ora sobremaneira importa focarmo-nos, na enunciação dos factos interruptivos que, aqui, são quaisquer diligências administrativas realizadas com conhecimento do responsável pelo pagamento e conducentes à liquidação ou à cobrança e, desde a entrada em vigor do Código dos Regimes Contributivos, também a apresentação de requerimento de procedimento extrajudicial de conciliação – tudo conforme artigos e diplomas já citados.

Ora, a forma como o legislador enunciou ou caracterizou aquele primeiro facto interruptivo privativo do regime especial exige que só deve ser qualificada como diligência administrativa capaz de produzir efeito interruptivo a diligência praticada num procedimento administrativo de liquidação ou num processo de execução fiscal tendo em vista a liquidação ou a cobrança. Ou seja, exige que do conceito de diligência administrativa com apetência interruptiva sejam excluídas todas as diligências que, mesmo que realizadas pela Entidade Administrativa, não são praticadas dentro daquele circunstancialismo procedimental e processual, fora das suas vestes de Autoridade e/ou da qualidade de Exequente e/ou que não sejam directamente conducentes à liquidação ou cobrança do crédito.

Amparados nos ensinamentos da doutrina podemos dizer que «Diligências administrativas serão todas as que ocorram nos processos administrativos de liquidação e nos processos de execução fiscal, conducentes à liquidação e cobrança da dívida, de que venha a ser dado conhecimento ao titular». “Embora o processo de execução fiscal tenha natureza judicial na sua totalidade, nele são praticados pelas autoridades administrativas actos que não tenham natureza jurisdicional (art. 103.º, n.º 1, da LGT), actos esses que, embora praticados em processo de natureza judicial, são «diligências administrativas» e, por isso, desde que cheguem ao conhecimento do devedor têm efeito interruptivo. Aliás, parece não haver outras diligências administrativas conducentes à cobrança da dívida de que seja dado conhecimento ao devedor que não sejam as praticadas pela administração tributária nos processos de execução fiscal (a única diligência anterior à execução conducente à cobrança da dívida parece ser a extracção da certidão de dívida de que não é dado conhecimento ao devedor antes da execução, mas apenas através da citação no processo de execução fiscal).

Assim, terão efeito interruptivo não só os actos praticados no processo de liquidação de que seja dado conhecimento ao devedor (como as notificações para exercício do direito de audiência e da liquidação), mas também os actos praticados no processo de execução fiscal pela administração tributária de que é dado conhecimento ao devedor (como a citação, a penhora, a notificação do responsável subsidiário para se pronunciar sobre a possibilidade de reversão e a notificação do acto que a decide)” (2)

Em suma, para a doutrina, porque “só as diligências praticadas dentro de um procedimento ou processo, no sentido de um conjunto de actos previstos e concatenados com vista à prossecução de um resultado, se podem dizer que são “conducentes” a esse resultado, no caso à liquidação ou à cobrança.”, há que concluir que diligências administrativas com efeito interruptivo são apenas as “praticadas no processo administrativo quando estamos ainda na fase da liquidação e as praticadas no processo executivo quando estamos na fase de cobrança coerciva da dívida devidamente liquidada.”

É também este o entendimento que, de forma pacífica e recorrente, o Supremo Tribunal Administrativo vem firmando sobre o conceito em apreço: no âmbito do regime especial previsto pela Lei 17/2000 a instauração da execução não constitui circunstância interruptiva, sendo a prescrição interrompida por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida. Como vem sublinhando de forma unânime a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo (vide, por exemplo, os Acórdãos de 11.03.2009, recurso 1033/08 e de 02.12.09, recurso 951/09, ambos in www.dgsi.pt), diligências administrativas, para este efeito, serão todas as que ocorram nos processos administrativos de liquidação e nos processos de execução fiscal, conducentes à liquidação e cobrança da dívida, de que venha a ser dado conhecimento ao devedor (como a citação, a penhora, a notificação do responsável subsidiário para se pronunciar sobre a possibilidade de reversão e a notificação do acto que a decide).» (3)

4.2.2. Feito este enquadramento jurídico, com o qual, de resto, pelo menos no essencial, as partes estão de acordo, uma primeira conclusão podemos extrair face aos factos apurados nos pontos 1., 2., 10. e 11.: se nenhum facto interruptivo se tiver verificado, a obrigação das dívidas relativas às contribuições para a segurança social, cujo cumprimento estava imposto à Oponente/Executada desde, pelo menos, 15 de Março de 2002, bem como os respectivos juros, estão totalmente prescritas, prescrição que, relativamente à última obrigação contributiva, ocorreu, no máximo, a 20 de Janeiro de 2013.

No caso concreto, porém, como vimos já, foi precisamente na existência de causas interruptivas e suspensivas que o Recorrente fundou a sua contestação à Oposição e ao reconhecimento de prescrição nesta peticionado, sendo também nelas que suporta a censura que dirige ao julgado.

Relativamente aos factos com efeito interruptivo, centrando a nossa atenção nos factos dados como provados pela 1ª instância, atenta a improcedência a que votamos o erro de julgamento de facto, podemos dizer com segurança que no probatório apenas existem dois factos susceptíveis de assim serem qualificados e que são as notificações e a citação vertidas, respectivamente nos pontos 3. a 6. e 12 a 15. do probatório.

Efectivamente, constituindo as notificações expedidas a 12 de Janeiro de 2007 verdadeiras interpelações da Executada, realizadas no âmbito do procedimento administrativo, no sentido de que procedesse ao pagamento das dívida de contribuições à Segurança Social de 2000 a 2006 e para pagamento de dívida de juros de mora respeitantes ao atraso de pagamento das contribuições à Segurança Social de 1997 a 2000, interpelação de que a devedora tomou conhecimento com a sua recepção a 23 de janeiro de 2007, não subsiste qualquer dúvida quanto a estarmos perante “diligência administrativa realizada com o conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à cobrança da dívida”.

Foi também este o julgamento realizado pelo Tribunal a quo, que, partindo desta conclusão, e louvado ainda no seu julgamento de inexistência de qualquer outro facto interruptivo anterior à citação da Executada, nesta qualidade, para proceder ao pagamento integral da dívida, requerer o pagamento em prestações e/ou dação em pagamento, sob pena de os autos executivos prosseguirem com a penhora de bens, concretizada a 2 de Maio de 2013, veio a reconhecer a prescrição com fundamento em que, nesta última data há muito se completara o prazo de 5 anos iniciado após a verificação daquela primeira interrupção (23 de janeiro de 2007), nos termos do artigo 326.º, n.º 1 do Código Civil.

Não nos merece, pois, nesta parte, qualquer censura o julgamento.

4.2.2. Relativamente à questão da natureza interruptiva decorrente das reclamações de crédito apresentadas, defendida desde o inicio pelo Recorrente, revemo-nos integralmente no sentido da decisão, que, por isso, decidimos manter, ainda que com distinta fundamentação.

Para que bem se compreenda a nossa posição, é crucial recordarmos que o Tribunal a quo, no que respeita a este alegado facto interruptivo, depois de se ter auto questionado quanto à susceptibilidade da apresentação de uma reclamação de créditos em processo cível se subsumir ao conceito de “diligência administrativa conducente à liquidação e cobrança da dívida”, e, consequentemente, interromper a prescrição, e depois uma breve incursão pela doutrina que também já partilhamos, veio a concluir que “a dedução de incidente de reclamação de créditos no âmbito de execução comum não consubstancia qualquer “diligência administrativa”, constituindo, ao invés, a prática de ato de natureza jurisdicional (realizado fora do âmbito do procedimento tributário e do processo de execução fiscal). Ou seja, concluiu que a apresentação em juízo daquela reclamação não constitui, pelas apontadas razões, causa interruptiva da prescrição.

Discordamos dos fundamentos expostos.

A apresentação de uma reclamação de créditos no âmbito de um processo judicial de reclamação de créditos não é um acto de natureza jurisdicional. Actos jurisdicionais são os praticados por órgãos estaduais tendo em vista a decisão de questões jurídicas concretas por recurso a normas de direito preexistentes. São, para o que nos importa, os actos praticados pelos tribunais no exercício da função jurisdicional. A apresentação de uma reclamação de crédito em processo judicial é um mero acto processual, praticado por um terceiro que se arroga deter a qualidade de credor.

O que nós entendemos é que não pode reconhecer-se que a prática desse concreto acto processual constitua a prática de um acto tendente à cobrança coerciva de impostos e, consequentemente, que por força dele se interrompa o prazo de prescrição nos termos previstos no regime especial de prescrição aplicável às dividas emergentes de contribuições não pagas à Segurança Social.

Na verdade, quando um credor titular de um direito real de garantia reclama o seu crédito em execução movida por um terceiro na qual foram penhorados bens sobre os quais incide o seu direito real de garantia ou o seu privilégio creditório, está apenas a exercer o direito que lhe assiste a ser pago do seu crédito à custa do produto da venda do bem (móvel ou imóvel), sobre o qual recai o seu direito real de garantia ou o seu privilégio creditório, caso o mesmo venha de facto a ser alienado no âmbito dessa execução alheia. Só se, extinta essa execução movida por terceiro sem que tais bens tenham chegado a ser vendidos, o credor reclamante vier a requerer o prosseguimento da execução, assumindo então a veste de verdadeiro Exequente nessa execução, e prosseguindo esta sob seu impulso, é que o requerimento, no caso do Instituto de Segurança Social, poderá configurar a prática de um acto tendente à cobrança coerciva do seu crédito capaz de interromper a prescrição nos termos legalmente definidos no especial regime de prescrição que aplicamos.

Não sendo esse o caso, a “mera” apresentação da reclamação de créditos pelo Instituto de Segurança Social, por apenso à execução movida por um terceiro, não tem o significado duma diligência administrativa tendente à cobrança coerciva do crédito por si reclamado.

Esta é, em nosso entender, a interpretação que melhor se coaduna com o especial regime jurídico que cuidamos de aplicar - face ao modo como este legalmente se encontra definido e à densificação doutrinal e jurisprudencial que vem sendo realizada do conceito de diligência administrativa com força interruptiva do prazo de prescrição. E a que melhor se coaduna com a disciplina consagrada no Decreto Regulamentar n.º 1-A/2010, de 3 de Janeiro - atenta a nítida distinção que o legislador aí realiza ente a assunção da qualidade de mero credor reclamante com uma eventual assunção subsequente da qualidade de Exequente, admitindo, nesta última situação, a possibilidade do Instituto de Segurança Social Exequente autorizar o pagamento em prestações, suspendendo-se, nesse período de tempo ou enquanto esse plano estiver a ser cumprido, o prazo de prescrição - artigos 80.º e 81.º do Decreto Regulamentar n.º 1-A/2010 e artigo 189.º n.º 2 do Código dos Regimes Contributivos – e, por fim, que melhor se coaduna com a disciplina jurídica processual civil, isto é, com os direitos e deveres que aí são reconhecidos ao credor reclamante.

Diga-se, como última nota, para que não subsistam dúvidas quanto ao entendimento perfilhado, que não entendemos que invalide o nosso julgamento o facto de estar previsto no artigo 186.º do Código dos Regimes Contributivos que a dívida à segurança social é regularizada através do seu pagamento voluntário nos termos previsto no presente Código, no âmbito da execução cível ou no âmbito da execução fiscal”. Na verdade, não se deve confundir o âmbito processual em que a dívida pode ser regularizada, designadamente pelo pagamento realizado através do produto da venda de bens móveis ou imóveis sobre os quais incida o direito real de garantia ou privilégio creditório e a susceptibilidade de uma determinada intervenção processual ser qualificada como diligência administrativa com apetência legal interruptiva, qualidade que, nos termos já adiantados, a apresentação de uma reclamação de créditos num apenso de processo cível a correr termos na jurisdição comum não detém.

Confirmamos, assim, também nesta parte, mas com a presente fundamentação, a decisão do Tribunal a quo também nesta parte.

4.2.3. A última questão que temos que enfrentar é a de saber se, face aos factos provados, existem razões para julgar que a dívida exequenda não prescreveu por o prazo de suspensão estar suspenso por força da pendência de um processo crime em que o Instituto de Segurança Social deduziu pedido de indemnização cível.

Tendo em conta a forma como o Recorrido expôs nesta parte a sua pretensão recursória, urge, antes de mais, realçar que a alegada pendência de processo crime não resultou provada, nem existem nos autos documentos que permitam nesta instância de recurso dar como provada aquela alegação.

E embora estejamos conscientes que a inexistência de documento capaz de realizar essa prova ou o insucesso probatório não nos impediria de anular a sentença por défice instrutório ou realizar nesta instância as diligências que julgássemos pertinentes para, em prol da justiça e da verdade material, obter a certeza quanto à veracidade ou não desse facto, (tanto mais que, para além de invocada, a prescrição é, em sede de Oposição, de conhecimento oficioso), no caso concreto, tal labor seria inútil uma vez que, qualquer que fosse a conclusão a que chegássemos, a solução jurídica permaneceria a mesma.

Dito de outro modo: independentemente da prova positiva que viesse a ser realizada quanto à instauração e pendência de processo crime - e não quanto à dedução do pedido de indemnização cível, por este não constituir, nem à luz do regime especial nem à luz do regime geral, causa de suspensão do prazo prescricional – a nossa decisão não se alteraria porque esse facto não ter, no caso concreto, efeito suspensivo do curso do prazo de prescrição.

Esta afirmação não significa que este Tribunal Central repudie o entendimento de que se aplicam às dívidas de contribuições à segurança social as regras de prescrição contidas na Lei Geral Tributária, bem sabendo que, “no que não está especialmente regulado” aquela Lei não pode ser afastada , atenta a sua “vocação” “para regular a generalidade das relações jurídico-tributárias” nos termos impostos pelo seu artigo 1. º”. (4)

Ou que julguemos que existe uma qualquer outra razão que permita, no caso concreto, fundadamente, sustentar o afastamento da regra de suspensão do prazo de prescrição contida no n.º 5 do artigo 49.º da Lei Geral Tributária. Aliás, essa aplicação está expressamente consagrada no n.º 3 do artigo 187.º do Código dos Regimes Contributivos (“3 - O prazo de prescrição suspende-se nos termos previstos no presente Código e na lei geral.”).

Subjacente à nossa conclusão está, sim, por um lado, o facto de ser indiscutível que a suspensão do prazo de prescrição pela instauração do processo crime só constitui causa de suspensão desde a entrada em vigor da Lei n.º 66-A/2012, de 31 de Dezembro, isto é, desde 1 de Janeiro de 2013 (artigo 265.º da identificada Lei) e, por outro, a consciência de que às leis que alteram causas de suspensão ou de interrupção, como a doutrina e a jurisprudência reiteradamente vêm salientando, se aplica a regra de aplicação no tempo consagrada no artigo 12.º, n.º 2, do Código Civil:

Esta remissão para os princípios gerais de aplicação da lei no tempo previsto no Direito Civil, nomeadamente para o disposto no artº 12º, nº 2 do Código Civil resulta desde logo do artº 2º, al. d) da Lei Geral Tributária que determina a aplicação subsidiária do Código Civil às relações jurídico-tributárias.

Com efeito, a lei tributária, embora especifique as causas de interrupção e suspensão dos prazos de prescrição, não regula o regime de aplicação da lei no tempo sobre os efeitos (interruptivos e suspensivos) que certos factos têm sobre o decurso dos prazos de prescrição.

Assim há que buscar tal regulamentação ao código civil, enquanto depositário, no nosso ordenamento jurídico, dos princípios gerais de direito, nomeadamente quanto à aplicação da lei no tempo (Neste sentido Serena Cabrita Neto/Cláudia Reis Duarte, « O regime da contagem da prescrição no direito tributário - certeza e segurança jurídicas - in Estudos em memória do Prof. Doutor J. L. Saldanha Sanches / organizadores Paulo Otero, Fernando Araújo, João Taborda da Gama.- 1ª Edição, Coimbra Editora, 2011, Vol. V.), e também por força da aplicação subsidiaria decorrente do disposto no artº 2º, al. d) da Lei Geral Tributária (…).

Dispõe o artº 12º do Código Civil, como princípio geral sobre aplicação das leis no tempo, o seguinte:

«1 - A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular. 2 - Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.»

Decorre, pois, do nº 2 deste normativo que os efeitos (interruptivos e suspensivos) que certos factos têm sobre o decurso dos prazos de prescrição hão-de ser determinados pela lei vigente no momento em que eles ocorrem.

Como esclarece Jorge Lopes de Sousa (Ob. citada, págs. 101 e 102.), «deste n.° 2 resulta que, quando a lei dispõe sobre os efeitos de factos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos. O que, obviamente, tem como corolário que os factos ocorridos na vigência da lei antiga tenham o efeito que ela lhes atribui.

Assim, uma vez determinado o quantitativo do prazo de prescrição (ou o prazo da lei nova ou o que decorreu mais o que falta à face da lei antiga) é a lei nova a única competente para determinar os efeitos sobre o prazo de prescrição que têm os factos que ocorrerem na sua vigência.

Relativamente aos factos instantâneos ou factos duradouros que se prolongam apenas na vigência de uma lei, a aplicação desta regra não tem problemas apreciáveis: se o facto, instantâneo ou duradouro ocorreu na que vigência da lei antiga é ela que determina os seus efeitos; se o facto ocorreu na vigência da lei nova tem os efeitos que esta lhe atribui.

O problema surge relativamente a factos duradouros que se iniciam na vigência de uma lei e se prolongam até depois da entrada em vigor de uma nova lei.

Neste caso de factos duradouros, a regra a aplicar será a mesma do n.° 2 do art. 12 .° do CC, já que é ela que regula a aplicação no tempo das leis sobre os efeitos de factos (….)», ou seja, “ o fundamento jurídico da aplicação das novas causas suspensivas ou interruptivas da prescrição a relações jurídicas tributárias formadas anteriormente, que subsistam no momento em que as novas leis entram em vigor radica na primeira parte do nº 2 do artº 12º do Código Civil, do qual resulta que os efeitos (interruptivos e suspensivos) que certos factos têm sobre o decurso dos prazos de prescrição hão-de ser determinados pela lei vigente no momento em que eles ocorrem e não na 2ª parte do mesmo normativo, que estabelece que «quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.

E isto porque as normas que criam causas de suspensão ou interrupção da prescrição dispõem sobre a extinção da relação jurídica tributária e não sobre o seu conteúdo, pois não determinam o regime de qualquer dos elementos que a compõem, elencados na Lei Geral Tributária (art. 30º, nº 1), a saber, o crédito e a dívida tributários; o direito a prestações acessórias de qualquer natureza e o correspondente dever ou sujeição; o direito à dedução, reembolso ou restituição do imposto; o direito a juros compensatórios; o direito a juros indemnizatórios (Ver neste sentido Código de Procedimento e Processo Tributário anotado de Jorge Lopes de Sousa, 6ª edição, Áreas Editora, vol. III, pág. 270, nota 1.).(5).

No caso sub iudice, o invocado processo crime terá sido instaurado, no máximo, no ano de 2002, atenta a numeração atribuída ao processo - processo n.º 313/02.7 TASCR – conforme alegação do Recorrido no artigo 27.º da sua contestação e conclusão N) deste recurso.

Tendo por referência o regime consagrado no artigo 12.º, n.º 2, 1ª parte, do Código Civil, a jurisprudência do aresto do Supremo Tribunal Administrativo supra transcrito, que sem qualquer reserva acolhemos, e a data limite de instauração do processo crime invocado (2002), há, forçosamente, que concluir que não houve qualquer suspensão do prazo prescricional, por essa instauração, na data em que foi realizada, não constituir à luz do regime especial vigente (Lei 17/2000 ou Lei 32/2002, consoante o inquérito crime tenha sido instaurado antes ou depois de 17 de Novembro de 2002, data em que entrou em vigor o último dos diplomas legais citados – artigo 133.º) ou do regime geral (artigo 49.º da Lei Geral Tributária na redacção vigente na data daquela ocorrência) causa de suspensão.

Donde, independentemente da natureza duradoura que a essa causa de suspensão está associada, não lhe pode ser reconhecido o efeito suspensivo que apenas pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro lhe foi atribuído.

Improcede, pois, também nesta parte, o recurso jurisdicional apresentado.

V- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, negando provimento ao recurso jurisdicional, em confirmar na ordem jurídica, com os fundamentos expostos no ponto 4. deste acórdão, a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Registe e notifique.


Lisboa, 21 de Maio de 2020

(Anabela Russo)

(Vital Lopes)

(Luísa Soares)


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(1) Neste sentido, o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 20 de maio de 2015, proferido no processo n.º 1500/14, bem como os demais acórdãos aí citados, todos integralmente disponíveis para consulta em www.dgsi.pt.
(2) Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, 2.ª Edição, Áreas Editora, Lisboa, 2010, páginas 128 e 129.
(3) Acórdão de 21-04-2010, processo n.º 23/10, 11-03-2009, processo 50/09 e de 12-11-2008, processo 588/08.
(4) Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária: Notas Práticas, 2.ª ed., 2010, página 126.
(5) Acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 24 de Setembro de 2014, proferido no processo n.º 935/14, integralmente disponível para consulta em www.dgsi.pt