Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:799/13.4BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2021
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:OPOSIÇÃO,
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO,
GERÊNCIA,
PROCURAÇÃO
Sumário:I. A outorga de procuração pelo gestor nominal da sociedade executada originária a conferir a um terceiro poderes para exercer a administração da sociedade executada originária, de per se, não prova que o Oponente exerce de facto a administração ou gestão da sociedade executada originária através do seu procurador, mas tão-somente que o Oponente conferiu ao procurador os seus poderes representativos nominais;
II. Para que se possa considerar que o órgão de execução fiscal cumpriu com o ónus da prova que sobre si recai relativamente ao pressuposto legal de exercício da gerência de facto, revertendo a dívida contra o responsável subsidiário, cabe-lhe provar que o procurador do Oponente agiu de acordo com a vontade real do mandante (Oponente), e que este tinha conhecimento da vida da sociedade.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem da 2.ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA, vem recorrer da decisão proferida pelo Tribunal Tributário Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou procedente a oposição judicial que A..., deduziu à execução fiscal nº323920090... e apensos, contra si revertida depois de inicialmente instaurada pelo Serviço de Finanças de Lisboa-7 contra a sociedade “B..., Lda”, para cobrança coerciva de dívidas referentes a IVA, dos exercícios de 2008 e 2009, de IRS, dos anos de 2009, 2010 e 2011 e de IRC dos exercícios de 2008 e 2009, no valor total de 11.591,36€.

A Recorrente FAZENDA PÚBLICA apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES

I) Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou totalmente procedente a oposição deduzida pelo Oponente, A..., na qualidade de responsável subsidiário, com o contribuinte nº1..., no processo de execução fiscal nº323920090... e apensos, que foram instaurados contra a devedora originária B... Lda., com o contribuinte n.º 5..., e consubstanciam a cobrança coerciva do Imposto do Valor Acrescentado (IVA) relativo aos anos de 2009 e 2010, de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS) de 2009, 2010 e 2011, e de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas (IRC), relativo aos anos de 2008 e 2009, no valor de €11.591,36.

II) O pedido foi considerado procedente, com base na falta de fundamentação do ato administrativo, no entanto, face à fundamentação elencada na douta decisão sobre os factos dados como provados e considerando os pressupostos e elementos que a administração fiscal deve considerar no despacho de reversão, parece-nos que a douta decisão padece de erro de julgamento.

III) No que concerne à exigência de fundamentação dos atos administrativos, é formulada no artigo 268º, nº3, da CRP, que estabelece que “os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos”.

IV) Em matéria tributária, o dever de fundamentação dos atos decisórios de procedimentos tributários e dos atos tributários é concretizado, de forma genérica, no artigo 77º da LGT, nos termos do qual “a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária” e, a “fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”.

V) Com a devida vénia, o STA tem vindo a entender que a exigência legal e constitucional de fundamentação visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do ato e a sua impugnação contenciosa.

VI) Fora de situações especiais em que são exigidos acrescidos de fundamentação, o ato considera-se suficientemente fundamentado quando é atingido formalmente esse propósito, dando a conhecer os elementos que a lei exige que sejam indicados e, sendo atingido tal objetivo, qualquer irregularidade ou omissão deverá considerar-se sanada, aferindo-se tal efeito face ao ato efetivamente praticado, perante o qual terá que ser cotejada a sua adequação.

VII) A fundamentação formal visa possibilitar um conhecimento concreto das razões que determinaram a AT, a atuar como atuou, permitindo conhecer o seu itinerário cognoscitivo e valorativo, enquanto a fundamentação material ou substancial caracteriza-se pela enunciação de motivos aptos e legítimos a suportar a decisão de fundo, visando encontrar a base substancial que a legitima, por forma a demonstrar que se verificam os pressupostos legais dos quais depende a sua atuação.

VIII) A AT emanou decisão fundamentada no sentido de reverter as dívidas da execução fiscal em causa, contra o Oponente, com base no artigo 160º do CPPT, no artigo 23º, nº2 e 4 e, 24º, nº1, alínea b), ambos da LGT, na sequência da informação que sustenta o despacho de reversão, decorrendo da referida informação a confirmação do cumprimento dos pressupostos da reversão.

IX) Concluímos, portanto, que o despacho de reversão se mostra plenamente fundamentado.

X) A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos acima assinalados, não merecendo por isso ser confirmada.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o recurso e revogada a douta sentença recorrida, como é de Direito e Justiça.»

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Não foram apresentadas contra-alegações.

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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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A questão invocada pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir consiste em aferir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento na medida em que o despacho de reversão se encontra suficientemente fundamentado.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
«III. Fundamentação
1. De facto
Com interesse para a decisão, considero provados os seguintes factos:
A)– Corre termos, no Serviço de Finanças de Lisboa 7, o processo de execução fiscal n.º323920090... e apensos, instaurado a 12.12.2009, contra a Sociedade B... Ld.ª, para cobrança de dívidas de IVA dos anos de 2009 e 2010, IRS de 2009, 2010 e 2011 e IRC referente aos exercícios de 2008 e 2009, no valor total de €11.591,36 – cfr. certidão do PEF, apensa aos autos, nomeadamente fls. 2-3, 38, 143-208;

B) – A 15.03.2006, foi registada a designação de A... como gerente único da sociedade B... Ld.ª e a forma de obrigar esta sociedade com a assinatura de um gerente. – cfr. fls. 93-97 e 104-108 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

C)– A 04.05.2011, a sociedade B... Ld.ª, foi declarada insolvente, por sentença proferida, pelo Tribunal do Comércio de Lisboa, 1.º Juízo de Lisboa, no processo n.º485/11.0TYLSB. – cfr. fls. 25 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

D)– A 23.05.2011, deu entrada, no Tribunal de Comércio de Lisboa, 1.º Juízo, o ofício do Serviço de Finanças de Lisboa 7, em anexo ao qual foram remetidos 54 processos de execução fiscal, na quantia total de €22.527,95, a fim de serem avocados ao processo de insolvência identificado na alínea precedente. – cfr. fls. 6-23 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

E)– Em 14.09.2011, o processo de insolvência identificado em C) foi encerrado, por insuficiência da massa insolvente para satisfação das custas do processo e das restantes dívidas da massa. – cfr. fls. 27 e 50-52 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

F)– Constam do processo de execução fiscal identificado em A) impressões das consultas efectuadas, em 17.11.2011, ao Sistema Informático de Penhoras Automáticas e ao Cadastro Electrónico de Activos Penhoráveis, relativamente à existência de créditos, saldos bancários e outros bens da sociedade B... Ld.ª, constando, designadamente, dessas impressões a informação de que foi encontrada uma viatura da marca AUDI, matrícula 8..., ano 2001. – cfr. fls. 28-34 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

G)– Consta da informação emitida, a 17.02.2012, pelo Serviço de Finanças de Lisboa 7, no processo executivo identificado em A), que “Através de consulta ao sistema informático SIPA e CEAP, não foram encontrados bens penhoráveis”. – cfr. fls. 38 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

H)– A 17.02.2012, o Chefe de Finanças Adjunto, do Serviço de Finanças de Lisboa 7, proferiu o seguinte despacho:

“Face às diligências de fls. 2 a 36, determino a preparação do processo para efeitos de reversão da(s) execução(ões) contra A... (…) na qualidade de Responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada.

Face ao disposto nos normativos do nº4 do Artº23º e do Artº60º da Lei Geral Tributária, proceda-se à notificação do(s) interessado(s), para efeitos do exercício de audição prévia, fixando-se o prazo de 10 dias a contar da notificação (…).

(…)”
– cfr. fls. 39 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

I)– A 12.03.2012, deu entrada, no Serviço de Finanças de Lisboa 7, o requerimento de que se extrai o seguinte:
“A..., (…) notificado do projecto de reversão fiscal contra si operado, por dívidas respeitantes a IRS, IVA, e IRC no âmbito dos presentes autos, vem muito respeitosamente exercer o seu direito de
AUDIÇÃO PRÉVIA
(…)

10º
No caso em apreço a devedora originária foi declarada insolvente, mas apresentou à insolvência bens, nomeadamente:
a) Créditos comerciais perante a L... S.A. e F... – F... Ld.ª, no montante global de €6.413,30;
b) Veículo automóvel marca Audi, com a matrícula 8..., com valor estimado de €19.500,00;
c) Bens móveis diversos, elencados na lista de bens em anexo, no montante global de €3.500,00 (Cfr. Doc. 1)

(…).”
– cfr. fls. 43-64 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

J)– Consta, em anexo ao requerimento identificado na alínea anterior, o instrumento de que se extrai o seguinte:

“LISTA DE BENS
a) Veículo automóvel, de marca Audi, com a matrícula 8...;
b) Bens móveis:
i. Verba 1: uma secretária preta, em aglomerado de madeira, com dois módulos de canto, uma cadeira de secretária com braços preta e três cadeiras pretas de apoio, no valor global de €300,00 (Trezentos Euros);
ii. Verba 2: uma estante em madeira preta, com quatro portas em madeira e quatro portas de vidro, com três prateleiras; um módulo do mesmo conjunto com duas portas e uma prateleira; um bengaleiro em metal; um candeeiro preto, no valor global de €250,00 (Duzentos e Cinquenta Euros);
iii. Verba 3: multifunções de marca Epson, computador portátil acer, no valor global de €800,00 (Oitocentos Euros);
iv. Verba 4: computador composto de um monitor LG, teclado LG, multifunções de marca HP; secretária em aglomerado cinzento-escuro; cadeira em napa preta, sem braços, no valor global de €200,00 (Duzentos Euros);
v. Verba 5: um biombo em metal, vermelho com vidro cinzento-escuro, composto de duas peças, no valor de €100,00 (Cem Euros);
vi. Verba 6: uma secretária de computador, com tampo e duas prateleiras, com pés de roda, de cor clara, uma cadeira preta, com napa e dois braços, um extintor de marca Valle-Union, no valor global de €100,00 (Cem Euros);
vii. Verba 7: quatro cadeiras de metal em napa, com braços; duas secretárias em aglomerado cinzento-escuro, estante do mesmo conjunto; duas secretárias pequenas; secretária de computador; uma prateleira, no valor global de €250,00 (Duzentos e Cinquenta Euros);
viii. Verba 8: computador composto por monitor Lacie, teclado Logitech, disco externo Mac, central telefónica, computador Penthium, monitor Sony, teclado Logutech e multifunções de marca Epson Stylus, no valor global de €1.500,00 (Mil e Quinhentos Euros).”
– cfr. fls. 48 e 58 da certidão do PEF, apensa aos autos;

K)– A 25.10.2012, a Chefe de Finanças, do Serviço de Finanças de Lisboa 7, proferiu o seguinte despacho:
“Oficie-se o requerente no sentido de informar acerca do paradeiro dos bens identificados e para entregar os documentos referentes ao veículo de marca Audi com a matrícula 8... diligenciando-se nas respectivas penhoras. Deverá ainda, o requerente, identificar os alegados créditos bem as entidades devedoras, juntando provas para o efeito.”
– cfr. fls. 80 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

L)– A 05.02.2013, deu entrada no Serviço de Finanças de Lisboa 7, o requerimento dirigido ao processo de execução fiscal identificado em A), de que se extrai o seguinte:
A... (…) notificado em 31/10/2012 para prestar informações relativamente aos bens da propriedade da B..., Lda vem muito respeitosamente expor o seguinte:
1.Os bens constantes da Lista 1 estão confiados por ordem do Tribunal do Comércio de Lisboa no âmbito do Processo de Insolvência nº458/11.0TYLSB ao Administrador de Insolvência nomeado (…) tendo sido considerado que o valor comercial dos bens é reduzido;
2.O veículo de marca Audi com matrícula 8... encontra-se penhorado pelo Banco B... no âmbito do Processo Executivo por incumprimento de um contrato de leasing e o seu valor comercial é diminuto (€5.000 no máximo) dado que se encontra estacionado, avariado na via pública e em estado estado de degradação.
3.Os créditos em dívida alegados são devidos pela “L... Lda.” no montante de € 1.512,30 (Mil Quinhentos e Doze Euros e Trinta Cêntimos) e pela “F... – F... Lda.” no montante de €4897,20 (Quatro Mil Oitocentos e Noventa e Sete Euros e Vinte Cêntimos), conforme extracto do Balancete Geral de 2010 e que se junta como Documento nº1 e de dá por integralmente reproduzido.”
– cfr. fls. 131 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
M)– A 08.02.2013 foi emitida, no Serviço de Finanças de Lisboa 7, a informação de que se extrai o seguinte:

“PROCESSOS DE EXECUÇÃO FISCAL N.º 323920090... e aps.

B..., Ldª (…)

Quanto a A..., de acordo com o solicitado a fls 90, informa que os bens listados a fls 57, estão à ordem do TC de Lisboa no âmbito do processo de insolvência nº485/11.0TYLSB, tendo sido considerados com valor comercial reduzido e os créditos referidos, constam do balancete geral de 2010, a fls. 134.

Dos elementos disponíveis, nomeadamente dos registos efectuados na CRC de Lisboa a fls.106 a 108, verifica-se que na apensação nº17 de 15/3/2006, e por alteração do contrato social da empresa, foram nomeados A... e P..., tendo sido nomeado como único gerente desde essa data, A....

Face ao exposto e atendendo aos factos mencionados e sendo as dívidas em causa referentes a IVA do ano de 2009 e 2010, IRC do ano de 2008 e 2009 e IRS do ano de 2009, 2010 e 2011, parece de (…) prosseguir com a reversão contra A..., NIF 1..., nos termos da alínea b) do nº1 do artº24 da Lei geral Tributária, assim como proceder ao registo no SIPE dos créditos existentes e devidos pela “L..., SA” no montante de € 1.512,30 e pela “F... – F... Ldª” no montante de € 4897,00, de acordo com o Balancete Geral de 2010, enviado pelo signatário A....”

– cfr. fls. 133-134 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
N)– A 13.02.2013, a Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 7, proferiu o seguinte despacho, no processo de execução fiscal identificado em A):

“Vista a informação que antecede, verifica-se que: (…)

Já quanto a A... verifica-se que:

Conforme o próprio refere no ponto 4 do seu requerimento que deu entrada em 14.03.2012 neste serviço de finanças, a sua responsabilidade é subsidiária, devendo ser chamado ao pagamento, quando não houver outra forma do credor tributário obter o pagamento do originário devedor. E assim é efectivamente. O chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de algumas circunstâncias entre as quais a que se encontra contemplada na alínea a) do n.º2 do art.º153º do CPPT, isto é a verificação da inexistência de bens penhoráveis do devedor originário.

Considerando as alegações trazidas aos autos, conforme requerimentos entrados em 14.03.2012 e 05.02.2013, a devedora originária ainda possui bens susceptíveis de penhora, sendo identificados 2 créditos sobre as sociedades L... LDA e F... F... LDA.

Assim, deverão os autos prosseguir contra A... na qualidade de revertido, embora com suspensão da execução até à completa excussão do património do devedor principal.

Proceda-se assim à penhora dos créditos em causa.”
– cfr. verso de fls. 134 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
O)– Com data de 22.02.2013, encontra-se assinado o aviso de recepção que acompanhou o envio, por correio registado, do ofício da Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 7, dirigido ao Oponente, de que se extrai o seguinte:
“OBJECTO E FUNÇÃO DO MANDADO DE CITAÇÃO
Pelo presente fica citado(a) de que é EXECUTADO(A) POR REVERSÃO (…), na qualidade de Responsável Subsidiário para, no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, PAGAR a quantia exequenda de 11.591,36 EUR de que era devedor(a) o(a) executado(a) infra indicado, ficando ciente de que (…) se o pagamento se verificar no prazo acima referido não lhe serão exigidos juros de mora nem custas.
(…)
IDENTIFICAÇÃO DO EXECUTADO
B... LDA – EM LIQUIDAÇÃO
(…)
FUNDAMENTOS DA REVERSÃO
Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão (artº23º/nº2 da LGT):
Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período do exercício do cargo [art.24.º/nº1/b) da LGT].
EXTENSÃO DA REVERSÃO
Todo o património do responsável até ao montante da dívida tributária, os juros e demais encargos legais (nº1 do artigo 22º da LGT).
IDENTIFICAÇÃO DA DÍVIDA EM COBRANÇA COERCIVA*
N.º PROCESSO PRINCIPAL: 323920090... TOTAL DA QUANTIA EXEQUENDA:11.591,36 EUR
1) TOTAL DE ACRESCIDOS: 0,00
EUR TOTAL: 11.591,36 EUR”
– cfr. fls. 135-137 da certidão do PEF, apensa aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

Não se provaram outros factos, com interesse para a decisão da causa.

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A convicção que permitiu dar como provados os factos acima descritos formou-se com base na análise crítica dos documentos constantes da certidão do processo de execução fiscal (PEF), apensa aos autos, conforme discriminado em cada uma das alíneas do probatório.»
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Conforme resulta dos autos, a oposição foi julgada procedente considerando-se, em síntese que o despacho de reversão não se encontra formalmente fundamentado.

A Recorrente Fazenda Pública não se conforma com o decidido, entendendo que ao contrário do decidido o despacho de reversão encontra-se suficientemente fundamentado.

Apreciando.

Conforme se escreve no acórdão do STA de 23/10/2019, proc. n.º 01389/06.3BESNT:
“(…) A reversão, sendo um acto administrativo tributário, deve conter a sua fundamentação.
A exigência legal e constitucional de fundamentação do acto administrativo, decorrente dos arts. 268º da CRP e 125º do CPA, visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a Administração a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa.
A fundamentação do acto administrativo deverá assim obedecer a três requisitos essenciais: deverá ser clara, deverá ser suficiente e deverá também ser lógica.
Como vem afirmando a jurisprudência e a doutrina o acto encontra-se suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair qual o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática.
Ponto é que a fundamentação responda, às necessidades de esclarecimento do contribuinte informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto administrativo permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática.
No que concerne à fundamentação do despacho de reversão da execução fiscal, a lei é expressa a determinar, no n.º 4 do art.º 23.° da LGT, que: «A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação».
Como bem nota o Exmº Magistrado do Ministério Público no seu parecer, a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo tem abordado a temática da fundamentação do despacho de reversão em diversos acórdãos (Cfr., entre outros, os acórdãos de 31/10/2012, proc. 0580/12, de 23/01/2013, proc. 0954/13, de 18/02/2015, proc. 01860/13, de 08/04/2015, proc. 0345/14 e o acórdão do Pleno de 16/10/2013, proc. 0458/13).
Fazendo uma síntese da doutrina defendida nestes arestos assim se sublinhou no Acórdão 458/13 do Pleno «…são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT). Daí que a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT)».
E especificando o âmbito dessa fundamentação e reportando-se à jurisprudência deste tribunal, reiterou-se no Acórdão 354/14 que «Em relação à fundamentação de direito, a jurisprudência do STA (cfr., entre outros, o ac. de 27/5/2003, proc. nº 1835/02) tem vindo a considerar que tal fundamentação se considere suficiente, não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível, impondo-se a verificação de duas condições: que se possa afirmar, inequivocamente, perante os dados objectivos do procedimento, qual foi o quadro jurídico tido em conta pelo acto e que se possa concluir que esse quadro jurídico era perfeitamente conhecido ou cognoscível pelo destinatário, hipotizando-se que o seria por um destinatário normal na posição em concreto em que aquele se encontra».
Também do acórdão de 09/04/2014, proc. 0954/13, se subentende que nos casos em que não conste a indicação do quadro normativo à luz do qual se atribui a responsabilidade subsidiária, a mesma pode extrair-se do «… restante contexto fundamentador do despacho de reversão…», designadamente por indicação do «período em que o revertido exerceu a gerência da sociedade devedora originária – se no período da constituição das dívidas, se no período do pagamento ou entrega do tributo, se em ambos os períodos».

Aplicando a jurisprudência supra exposta ao caso dos autos temos então que o despacho de reversão se encontra suficientemente fundamentado, quer de facto, quer de direito.

Efetivamente, no despacho de reversão se faz referência expressa aos fundamentos de direito da reversão, nomeadamente ao art. 23.º, n.º 2, da LGT, e art. 24.º, n.º 1, alínea b) da LGT, o que tanto basta, face à jurisprudência do STA aplicável ao caso concreto dos autos, que se considere que o despacho de reversão se encontra suficientemente fundamentado.

No que à fundamentação formal de facto diz respeito, apesar de no despacho não se enunciarem factos, a verdade é que temos uma fundamentação de facto por remissão. Ou seja, o despacho de reversão remete para a informação de 08/02/2013, na qual consta claramente que foram considerados os registos efetuados na conservatória do registo comercial de Lisboa a fls. 106 a 108, e o facto de ter sido nomeado como único gerente desde 15/03/2006.

Ora, formalmente é essa a fundamentação do órgão de execução fiscal, ou seja, refere-se expressamente à gerência do Oponente, e não distinguindo a gerência de facto e de direito, importa considerar que o órgão de execução fiscal entendeu que essa gerência é tanto de facto e de direito, pois não fez qualquer restrição na sua fundamentação de modo a podermos entender o contrário.

Por outro lado, ainda quanto à fundamentação formal de facto, quer nessa informação de 08/02/2013, quer ainda no documento que seguiu com a citação encontra-se identificada a dívida revertida, nomeadamente, os impostos e anos respetivos. Mais se considera que os bens da executada originária se encontram confiados ao administrador de insolvência ao abrigo do processo de insolvência n.º 485/11.0TYLSB. Ademais, essa informação de 08/02/2013 para a qual remete o despacho de reversão, assentou em informação e despacho anteriores, constantes de fls. 79/80, pelo que também se encontra suficientemente fundamentado de facto.

Portanto, é percetível que os factos que subjazem à prolação do despacho são os que resultam da instrução anterior e que constam do processo executivo. Nessa medida, pese embora os factos não estejam discriminados no despacho, havendo aquela remissão há que se entender que o despacho se encontra formalmente fundamentado de facto.

Portanto, importa concluir que o despacho de reversão se encontra formalmente fundamentado, quer de facto, quer de direito, e nessa medida a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito, devendo ser revogada.

Sublinhe-se que o que a sentença em 1.ª instância conheceu foi a fundamentação formal do despacho de reversão, que cum grano salis se poderá inferir do alegado no ar. 20.º da p.i. Contudo, o Oponente invocou de igual modo, e sobretudo, a falta de verificação dos pressupostos da reversão que o Oponente invocou na p.i., e nessa medida, cumpre conhecer desse fundamento invocado ao abrigo do disposto no art. 665.º, n.º 2 do CPC, tendo as partes sido notificadas nos termos e para efeitos do n.º 3 deste preceito legal.

Efetivamente o Oponente entende que não foi excutido previamente o património da executada originária, e que o órgão de execução fiscal não provou que o Oponente exerceu a gerência de facto, nem provou a sua culpa.

Apreciando.

O primeiro pressuposto da reversão da execução instaurada ao devedor originário contra o responsável subsidiário “depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão” – cf. n.º 3, do art. 23.º da LGT.

Como se escreveu no acórdão do STA de 12/10/2016, proc. n.º 287/16A Lei não faz, pois, depender a reversão, da prévia excussão dos bens do devedor originário. Fá-la depender, isso sim, da inexistência ou da fundada insuficiência de tais bens, fundada insuficiência esta que, de acordo com a lei (cfr. a alínea b) do artigo 153.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário – CPPT), se apura de acordo com os elementos constantes do auto de penhora ou outros de que o órgão da execução fiscal disponha.”

Por outro lado, conforme tem sido reiteradamente entendido na jurisprudência, a declaração de insolvência da sociedade originária devedora quando conhecida no PEF é fundamento bastante para que considere haver fundada insuficiência do património daquela e justificar a reversão contra o responsável subsidiário pela dívida exequenda – cf. por todos, acórdão do TCAS de 16/12/2020, proc. n.º 159/15.2BELRS, e jurisprudência aí citada.

In casu, para além das diligências efetuadas pelo órgão de execução fiscal (cf. alíneas F) e G) da matéria de facto), a sociedade executada originária foi declarada insolvente (cf. alínea C) a E) da matéria de facto), tendo tais informações sido obtidas no processo de execução fiscal em momento anterior ao despacho de reversão, que como vimos, remetem para informações e processado anterior, pelo o que tanto basta para que se conclua que se verifica o pressuposto para a reversão previsto no n.º 3, do art. 23.º da LGT.

Prosseguindo.

Invocou ainda o Oponente na sua p.i. que não é suficiente a gerência de direito sendo necessário que a ela se alie à de facto, situação que a AT não alegou nem demonstrou.

Vejamos.

Resulta do n.º 1, do art. 24.º da LGT que um dos requisitos da responsabilidade subsidiária dos membros de corpos sociais e responsáveis técnicos é o exercício de facto de funções de administração ou gestão, sendo certo que importa ter presente que o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão do Pleno do CT do STA de 28/02/2007, proc. n.º 01132/06, reiterado posteriormente, pelo acórdão do STA de 10/12/2008, proc. n.º 0861/08, e pelo acórdão do Pleno do CT do STA de 21/11/2012, proc. n.º 0474/12) considerou, ainda no âmbito do regime do CPT, que competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, «deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efetivo exercício da gerência». Entendeu-se no que respeita ao exercício das funções de gerência que «sendo possível ao julgador extrair, do conjunto dos factos provados, esse efetivo exercício, tal só pode resultar da convicção formada a partir do exame crítico das provas, que não da aplicação mecânica de uma inexistente presunção legal». Com este acórdão, fica assim sem margens para dúvidas, afastado o entendimento segundo o qual, uma vez verificada a gerência nominal ou de direito, se presume a gerência de facto ou efetiva. Estas regras do ónus da prova aplicam-se, de igual modo, no âmbito do regime do art. 24.º da LGT.

In casu, ao abrigo do disposto no art. 660.º, n.º 1, do CPC, importa alterar a decisão sobre a matéria de facto assente, aditando-se o seguinte facto com base em documento junto ao PEF:
P) Em 08/02/2006 o Oponente, juntamente com “P...”, na qualidade de únicos sócios da sociedade executada originária, constituíram como bastante procurador da sociedade executada originária “A...” (cf. procuração de fls. 127 a 128 do PEF, cujo teor aqui se dá por reproduzido).

Prosseguindo.

Ora, conforme resulta dos factos dados como provados, em 15/03/2006 o Oponente, foi nomeado único gerente da sociedade executada originária, sendo que a sociedade se vincula com a assinatura do único gerente (cf. alínea B) dos factos provados).

Contudo, em 08/02/2006 o Oponente, juntamente com “P...”, na qualidade de únicos sócios da sociedade executada originária, constituíram bastante procurador da sociedade “A...” (cf. alínea P) do facto aditado oficiosamente).

Por outro lado, resulta do teor da informação de 08/02/2013 do serviço de finanças, com base na qual se fundou o despacho de reversão, que o TOC da sociedade executada originária identificou “A...”, que renunciou à gerência da sociedade executada originária em 31/01/2006, como “representante legal da executada nas Declarações Modelo 22 dos exercícios de 2005 a 2010, bem como nas declarações anuais de 2004 a 2011”.

Também resulta de tal informação que os serviços de finanças tinham conhecimento da procuração, uma vez que lhe é feita referência, e que a mesma se encontra junta ao PEF.

Finalmente, também se faz exarar em tal informação que foi entregue um requerimento por “A...”, a solicitar o levantamento da penhora de contas bancárias, bem como junta uma cópia de um cheque sacado sobre o Banco B... assinado pelo mandatário.

Ou seja, resulta dos elementos juntos ao PEF que era “A...” quem representava a sociedade executada originária, quer em momento anterior à designação do Oponente como gerente da sociedade executada originária, quer após essa nomeação. Ou seja, existe uma continuidade no tempo da prática de atos de gestão e administração por parte de “A...” que indiciam fortemente que este sempre esteve à frente dos destinos da sociedade executada originária, agindo por conta própria.

Já quanto ao Oponente, único sócio gerente nominal desde 15/03/2006, nada se apurou para além da sua nomeação como gerente nominal, e de ter outorgado procuração a constituir como bastante procurador da sociedade executada originária “A...”, mas repare-se a outorga foi conjuntamente com o outro sócio, e nessa qualidade.

Por outras palavras, se relativamente a “A...” existe no PEF documentação que indicia a prática efetiva de atos de gestão e representação da sociedade executada originária por conta própria, desde pelo menos 2004, já quanto ao Oponente não existe a mínima evidência de que este acompanhava os destinos da sociedade e que aquele agia de acordo com as suas instruções e conhecimento, pois era “A...” quem representava a sociedade executada originária em momento anterior à designação do Oponente, em 2006, como gerente da sociedade executada originária.

Na verdade, a outorga de procuração pelos dois sócios da sociedade executada originária a conferir poderes para exercer a administração da sociedade executada originária a “A...”, de per se, não prova o exercício de facto pelo Oponente da administração da sociedade executada originária, quando muito, poderá constituirá prova de que o Oponente conferiu àquele os seus poderes representativos nominais, o que de resto nem sequer será pacífico no caso específico dos autos, considerando os termos concretos em que a procuração foi outorgada, ou seja, considerando que os poderes de representação foram conferidos pelo Oponente na qualidade de sócio e não na qualidade de gerente nominal.

Portanto, in casu, face aos factos supra, e às regras do ónus da prova, impunha-se que o órgão de execução fiscal demonstrasse que o procurador “A...” agiu de acordo com a vontade real do mandante, ou seja, de acordo com a vontade do Oponente, e com conhecimento por parte deste da vida da sociedade, porque nas palavras de Jorge Lopes de Sousa “não se justificaria, nos casos em que é passada uma procuração a uma pessoa que não é administrador ou gerente para exercer a gerência em nome de outrem, uma dupla responsabilidade do mandante e do mandatário: ou este age em nome do mandante ou não, e se age em nome daquele, então não age em nome próprio.”

Ou seja, in casu, existindo indícios de que o mandatário desde sempre exerceu, em nome próprio, e de facto, a administração da sociedade executada originária, tornava-se imperativo que o órgão de execução fiscal demonstrasse que o mandatário agiu em nome do Oponente, de acordo com a vontade deste, o que não logrou fazer.

Como escreve Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário- anotado e comentado, Vol. III, 6.º Ed., Áreas Editora, 2011, p. 473-475:

O que importa para possibilitar a reversão contra o oponente, não é que, em termos jurídico-civilísticos ( z ), se deva entender que foi este que agiu quando agiu o seu procurador em seu nome, mas sim que exista efectivamente, em termos naturalísticos, uma relação entre ele e a vida da sociedade, que, pelo menos, possa garantir que, quando o procurador agiu no exercício da gerência, agiu de acordo com a vontade real do mandante e com conhecimento por parte deste da vida da sociedade.
Aliás, mesmo em termos civilísticos, a vinculação dos mandantes pela actuação dos mandatários não poderia deixar de estar sujeita às reservas gerais que a lei estabelece em relação à vinculação dos representados pelos actos dos seus representantes, por não haver qualquer suporte legal para estabelecer, nesta matéria, um regime mais oneroso para o representado do que o se estabelece, em geral, para qualquer relação jurídica. Ora, nos termos da lei civil, mesmo quando o mandatário é representante, por ter recebido poderes para agir em nome do mandante, os seus actos só produzem efeitos em relação à esfera jurídica deste se forem praticados dentro dos limites dos poderes que lhe foram conferidos ou sejam por este ratificados, expressa ou tacitamente (arts. 258.°, n.4 1, e 268 .°, n.4 1, aplicáveis por força do preceituado no art. 1178.°, n.4 1, e art. 1163.°, todos do CC) .
Assim, se não se demonstrar que o administrador ou gerente de direito tinha algum conhecimento da actividade levada a cabo pelo seu procurador e determinou ou, pelo menos, aceitou a sua actuação, deverá considerar-se impossível fazer operar a presunção de culpa funcional ínsita nos citados arts. 16.4 do CPCI, 13.°-, n.º 1, do CPT e 24.°, n.º 1, alínea b), da LGT. O art. 13.° do CPT, na redacção introduzida pela Lei n.° 52-C/96, de 27 de Dezembro, bem como o art. 24.° da LGT, ao responsabilizarem explicitamente, como se fossem administradores ou gerentes, as pessoas que de facto exerçam essas funções vêm, indirectamente, reconhecer a correcção o entendimento que atrás se referiu.
Na verdade, não se justificaria, nos casos em que é passada uma procuração a uma pessoa que não é administrador ou gerente para exercer a gerência em nome de outrem, uma dupla responsabilidade do mandante e do mandatário: ou este age em nome do mandante ou não, e se age em nome daquele, então não age em nome próprio. (…)”

Pelo exposto, a Oposição deve ser julgada procedente, verificando-se a ilegitimidade do Oponente, nos termos do disposto no art. 204.º, n.º 1, alínea b) do CPPT.

Sumário (art. 663.º, n.º 7 do CPC)

I. A outorga de procuração pelo gestor nominal da sociedade executada originária a conferir a um terceiro poderes para exercer a administração da sociedade executada originária, de per se, não prova que o Oponente exerce de facto a administração ou gestão da sociedade executada originária através do seu procurador, mas tão-somente que o Oponente conferiu ao procurador os seus poderes representativos nominais;
II. Para que se possa considerar que o órgão de execução fiscal cumpriu com o ónus da prova que sobre si recai relativamente ao pressuposto legal de exercício da gerência de facto, revertendo a dívida contra o responsável subsidiário, cabe-lhe provar que o procurador do Oponente agiu de acordo com a vontade real do mandante (Oponente), e que este tinha conhecimento da vida da sociedade.

II. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida, e em substituição julga-se procedente a Oposição, e consequentemente determina-se a extinção da execução relativamente ao Oponente.
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Custas pela Recorrente.

D.n.

Lisboa, 9 de junho de 2021.


A Juíza Desembargadora Relatora
Cristina Flora
A Juíza Desembargadora Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo art. 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Juízes Desembargadores Tânia Meireles da Cunha e António Patkoczy