Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03076/09
Secção:Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/10/2009
Relator:Eugénio Sequeira
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. IMI. TERRENOS PARA CONSTRUÇÃO. PRÉDIOS. NÃO SUJEIÇÃO
Sumário:1.Os terrenos para construção urbana encontravam-se fora do campo de sujeição à contribuição autárquica e depois a imposto municipal sobre imóveis, por cinco anos, desde que inscritos no activo circulante da empresa e fossem destinados a neles serem construídos edifícios para venda, devendo a empresa, em 90 dias, efectuar a comunicação a que se referia o n.º5 do art.º 10.º do CCA;
2.Tendo sido edificados em tais terrenos os respectivos prédios, em termos fiscais, aqueles deixaram de existir para passarem a existir estes, pelo que a não sujeição a contribuição por parte destes se conta desde a data da conclusão das obras respectivas, tal como declarado na declaração modelo 129 entregue;
3.Para o sujeito passivo beneficiar, agora, da não sujeição a contribuição quanto aos prédios edificados, deveria comunicar ao serviço de finanças da situação dos prédios, no mesmo prazo de 90 dias, a contar da mesma conclusão das obras, a sua inscrição como activo circulante e que os destinava a venda.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. T ... SA, identificada nos autos, dizendo-se inconformado com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


1. Nos termos do disposto no artigo 10º n.º 1 alínea e) do CA, o que releva para aferir do início da tributação é a data da passagem para o activo da empresa dos bens adquiridos e nos termos do artigo 10º n.º 1 alínea f) do CCA, a data relevante para aplicação do mesmo é a passagem para as existências da empresa dos bens adquiridos, pelo que a data da passagem para o activo da empresa ou a data em que passa a constar nas existências os bens adquiridos é que releva e não a data da construção dos mesmos;
2. Tais factos assumem uma relevância fulcral pois são precisamente as datas relevantes para a aplicação da legislação mas não foram abordados na sentença recorrida:
3. Se a sentença recorrida pretendia verificar da aplicabilidade de qualquer outra isenção ou do início da tributação teria que justificar essa apreciação mas não o fez;
4. A fundamentação apresentada é imperceptível e não sustenta a decisão, pelo que é a sentença nula nos termos do disposto no artigo 668º n.º 1 alínea b) do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT.
5. A sentença recorrida não teve, ainda, em conta o facto de a comunicação exigida pelo artigo 10º n.º 5 do CCA não ser necessariamente uma comunicação formal e a comunicação sobre a afectação dos bens à actividade da empresa foi efectuada informalmente ao serviço de finanças;
6. Tal foi alegado pela Recorrente e foram indicadas testemunhas que detêm conhecimento dessa situação mas a sentença recorrida não apreciou essa alegação nem inquiriu as testemunhas arroladas;
7. A não apreciação do facto de ter sido dado conhecimento - informal - da aquisição, construção dos prédios e afectação dos mesmos à actividade da empresa, gera uma nulidade da sentença nos termos do disposto no artigo 668º n.º 1 alínea d) do Código de Processo Civil (adiante CPC), aplicável ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT;
8. No que concerne à ausência de inquirição de testemunhas, tal omissão constitui uma clara violação do princípio da cooperação, previsto no artigo 266º do CPC, aplicável ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT, devendo os autos baixar ao Tribunal a quo para ser realizada a competente prova testemunhal;
9. No caso em apreço, estando perante lotes de terreno adquiridos com o intuito de construção e revenda por uma empresa cujo objecto abrange a actividade de construção de edifícios, de acordo com o disposto no artigo 10º n.º 1 alínea e) do CCA, a contribuição só seria devida a partir do quinto ano seguinte, inclusive, àquele em que o terreno para construção tenha passado a figurar no activo da empresa;
10. Tendo os lotes de terreno sido adquiridos em 2001 e nessa data passaram a fazer parte do activo da empresa, a cobrança de Imposto suspende-se a partir de 2002 até 2005, pelo que somente em 2006 seria devido Imposto, no caso Contribuição Autárquica;
11. Nos termos do artigo 10° n.º 5 do CCA, para o efeito de aplicação da alínea e), é necessário efectuar a comunicação, ao Serviço de Finanças da área onde se situam os prédios, da afectação dos bens ao fim, no caso, de construção e revenda;
12. O Código da Contribuição Autárquica apenas previa que fosse efectuada uma comunicação, não dispondo sobre qual a forma para efectuar essa comunicação e a Recorrente, por diversas vezes, dirigiu-se ao Serviço de Finanças de Cascais - 1 para tratar de vários assuntos relacionados com a sua actividade, tendo o mencionado Serviço de Finanças pleno conhecimento da aquisição dos lotes de terreno pela Recorrente e início de construção de moradias.
13. Conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo - Cfr. Acórdão n.º 267/06, datado de 07/06/2006 - "A "comunicação" a que se refere o artigo 10.º, n.º 5, do Código da Contribuição Autárquica não envolve a apresentação, à administração fiscal, de qualquer "requerimento" específico, bastando-se a exigência legal em que à mesma seja dado conhecimento do respectivo facto: afectação à venda."
14. A Recorrente, sendo uma empresa colectada na actividade de "compra e venda e revenda de Imóveis adquiridos para esse fim", para beneficiar da isenção de SISA nas transacções efectuadas, necessitava necessariamente de informar o Fisco das vendas realizadas durante cada exercício;
15. Nestes termos, a Recorrente considera que comunicou tudo o que havia a comunicar e que a Administração Fiscal tinha pleno conhecimento da aquisição dos lotes de terreno em questão, mesmo não tendo a mesma preenchido qualquer formulário relativamente à aquisição dos lotes;
16. E mesmo que assim não se entenda, a Recorrente, em 2002, apresentou, relativamente aos mencionados lotes em questão, a declaração modelo 129, inscrevendo os prédios urbanos na matriz, pelo que a Administração Fiscal obteve conhecimento, através de um meio formal, da compra dos lotes de terreno, pelo que ficaram preenchidos os requisitos do artigo 10º n.º 1 alínea e) do CCA;
17. Considera a Recorrente que, embora a comunicação fosse tardia, deve aplicar-se o disposto no artigo 10º n.º 6 do CCA, sendo devido imposto relativamente ao ano de 2001, mas iniciando-se a tributação em 2006;
18. Nestes termos, considera a Recorrente que a liquidação de imposto, referente ao ano de 2003, é completamente despropositada e ilegal, pelo que deve ser anulada;
19. Na data da inscrição na matriz dos prédios em questão, os terrenos já tinham sofrido alterações, estando a ser construídas várias moradias mas ainda não existiam licenças de utilização relativamente aos mencionados imóveis, pelo que os mesmos ainda não podiam ser revendidos;
20. Na altura em que a Recorrente apresenta a declaração modelo 129, presumia-se que o prédio estava acabado - Cfr. artigo 11° n.º 1 alínea b) do CCA - mas tal presunção era independente da existência ou não de licenças de utilização camarárias mas não pode presumir-se que, a partir da entrega da declaração modelo 129 deveria ser aplicado o artigo 10º n.º 1 al. f) do CCA porque, a redacção do mencionado artigo indicava como momento crucial para a aplicação do mesmo o registo contabilístico dos prédios como existências da empresa;
21. O legislador quis claramente encontrar um momento em que manifestamente o produto estivesse em condições de ser revendido ou vendido;
22. Contabilisticamente, o prédio deve ser registado nas existências da empresa quando puder ser considerado mercadoria vendível, ou seja, quando a empresa legalmente pode proceder à venda do imóvel;
23. Até estar concluída a construção, o que constava nas existências da empresa eram lotes de terreno e não moradias ou fracções autónomas;
24. Para além de finalizada a construção, existem determinados requisitos legais que condicionam a compra e venda de imóveis - no caso moradias - nomeadamente a licença de habitação;
25. De acordo com o disposto no Decreto-Lei n.º 281/99, de 26 de Julho, não podem ser celebradas escrituras públicas que envolvam a transmissão da propriedade de prédios urbanos ou fracções autónomas, sem que se faça perante o notário prova suficiente da inscrição na matriz predial e da existência da correspondente licença de habitação;
26. A Recorrente para efectuar legalmente a venda das moradias somente o poderia efectuar após a obtenção do respectivo alvará de licença de utilização;
27. Há que atentar às datas da emissão das licenças de utilização para podermos averiguar da correcta aplicação do artigo 10º n.º 1 alínea f) do C.C.A. e, no que concerne aos prédios localizados na freguesia de Cascais, com a matriz predial urbana artigo 12863, letras A a O, a respectiva licença de utilização foi emitida em 13 de Setembro de 2002;
28. Aplicar-se-á o disposto no artigo 10º n.º 1 alínea f) do C.C.A., sendo devida contribuição autárquica apenas em 2005, ou seja, muito depois de 2003, ano da liquidação impugnada;
29. Embora seja obrigatória, a comunicação referida pelo n.º 5 do art.10º do CCA, a mesma não é constitutiva, consubstanciando apenas uma obrigação acessória, pelo que não pode sustentar-se uma não aplicação do benefício da suspensão de tributação por apresentação extemporânea da comunicação e independentemente de todo o exposto, certo é que a Administração Fiscal detinha pleno conhecimento do andamento das construções nos lotes de terreno.

Nestes termos e nos demais de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência ser considerada nula a sentença recorrida.
Mesmo que assim não se entenda, deve considerar-se preenchidos os requisitos do artigo 10º alínea e) ou f) do CCA e ser a liquidação considerada ilegal.


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por a sentença recorrida não padecer dos invocados vícios formais e também não sofrer de erro de julgamento, já que a comunicação a que se refere o art.º 10.º n.º5 do CCA tem de ser formal, que a mesma não fez, pelo que não pode alcançar o invocado benefício de não sujeição ao imposto.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se a sentença recorrida padece dos vícios formais de omissão de pronúncia e de falta de fundamentação conducentes à declaração da sua nulidade; E não padecendo, se no ano de 2003, os prédios tributados em IMI, se encontravam não sujeitos ao mesmo imposto.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A) A impugnante é uma sociedade comercial que tem como objecto social a gestão e administração de imobiliária, promoção, compra e venda e revenda de imóveis adquiridos para esse fim, realização de empreitadas, projectos urbanísticos e execução de obras. (Doc. a fls. 23 a 28 dos autos)
B) No âmbito da sua actividade, a impugnante por escritura pública lavrada a 25 de Janeiro de 2001, adquiriu, mediante compra três lotes de terreno para construção, respectivamente; Lote de terreno com a área de 4.840m2, sito nas Pedreiras, freguesia de Alcabideche concelho de Cascais,
descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Cascais, sob o número dois mil trezentos e vinte nove, daquela freguesia, omisso na matriz; Lote de terreno com a área de cinco mil novecentos e oitenta metros quadrados e trinta decímetros quadrados, situado na Rua de Santana, no sítio do Adão ou Almosquia, limites de Cobre, descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial de Cascais, sob o numero cinco mil trezentos e vinte e oito, daquela freguesia e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 11.256 e Lote de
terreno com a área de mil e quatrocentos metros quadrados, situado na Rua de Santana, freguesia e concelho de Cascais,
descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial de Cascais, sob o número seis mil e setenta e nove, daquela freguesia, e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 10.285. (Doc. a fls. 30 a 33 dos autos)
C) Em 2002, foram alteradas as respectivas matrizes por meio da apresentação das declarações de modelo 129.
D) Em 8 de Agosto de 2002, a impugnante apresentou a declaração de modelo 129 relativa ao prédio sito na rua Santana, freguesia de Cascais, com data de conclusão de obras no dia 7 de Fevereiro de 2002 substituindo a apresentação 53/2002. (Doc. a fls. 34 a 38)
E) Em 10 de Maio de 2004, a impugnante apresentou participação a que se refere o n.º5 do art. 10° do CA, referente às fracções autónomas designadas pelas letras "A", "B", "C", "D", "E", "F", "G", "H", "I", “J", “L" e “M" do prédio inscrito sob o artigo 14634 da freguesia de Alcabideche constando que as obras foram concluídas em 17.07.2002. (Doc a fls. 56 a 67 dos autos.)
F) Em 10 de Maio de 2004, a impugnante apresentou participação a que se refere o n.º5 do art. 10° do CA, referente às fracções autónomas designadas pelas letras "M", “N" e “O" do prédio inscrito sob o artigo 12683 da freguesia de Cascais na qual consta averbado que as obras foram concluídas em 07.02.2002. (Fls. 67 a 71 e 80 a 82 do p.a. em apenso)
G) Em 13 de Setembro de 2002, a Câmara Municipal de Cascais emitiu o Alvará de Licença de Utilização n.º 617 relativo ao prédio sito na Rua Santana - Cobre, freguesia de Cascais, (Doc. a fls. 111 do p.a. em apenso)

Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados nos documentos para os quais remete o probatório pela fé que merecem não tendo sido impugnados e versando sobre factos em que há consenso.

FACTOS RÃO PROVADOS
Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam na factualidade supra descrita.

MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos e apenso constam, tudo referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.


4. Na matéria das suas conclusões 1. a 8. veio a ora recorrente imputar à sentença recorrida os vícios formais de omissão de pronúncia e de falta de fundamentação, a existir, conducente à declaração da sua nulidade – conforme cujo pedido expresso veio a formular a final, em primeiro lugar - porque os mesmos a ocorrerem gerarem, na realidade, a nulidade desta, nos termos do disposto nos art.ºs 668.º n.º1 alíneas d) e b), 660.º n.º2 e 713.º n.º2 do Código de Processo Civil (CPC), 143.º e 144.º do Código de Processo Tributário (CPT), e hoje dos art.ºs 124.º e 125.º do CPT, importa por isso conhecer em primeiro lugar, destas invocadas nulidades.

Aquela primeira nulidade só ocorre, nos termos daquelas normas citadas em primeiro lugar, quando o Juiz deixe de pronunciar-se em absoluto de questão que deva conhecer, que por isso tenha sido submetida à sua apreciação e da qual não conheça, nem o seu conhecimento tenha sido considerado prejudicado pela solução dada a outra(s), como constitui jurisprudência abundante (1).

Como sabiamente invocava o Professor Alberto dos Reis - Código de Processo Civil Anotado, volume V, (Reimpressão), pág. 142 e segs - «Esta nulidade está em correspondência directa com o 1.º período da 2.ª alínea do art.º 660.º. Impõe-se aí ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras....
São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão».

Consubstancia, no caso, a recorrente, tal omissão de pronúncia, segundo se consegue apreender da matéria das suas conclusões dos pontos 5. a 8. das alegações do recurso, por a M. Juiz do Tribunal "a quo", ... não ter apreciado essa alegação e nem ter inquirido as testemunhas arroladas tendo em vista a prova do facto de ter sido dado conhecimento formal à AT sobre a afectação dos bens à actividade da empresa ... sendo apenas nestas dimensões que a mesma aponta como tendo sido omitido o seu conhecimento na sentença recorrida e que por si tenha sido articulada na respectiva petição inicial de impugnação judicial em causa, sendo, na verdade, que o juiz deve conhecer na sentença, ...as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, nos termos do disposto no art.º 660.º n.º2 do CPC.

Como é sabido, por questões a que se reporta a norma do art.º 668.º n.º1 d) do CPC, não abrangem os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir (2), como se pronuncia entre outros, o acórdão deste Tribunal de 27.9.2005, recurso n.º 738/05, tendo como relator o do presente.

No caso, pretende a ora recorrente que a comunicação à AT a que se refere a norma do art.º 10.º n.º 5 do CCA, se basta com uma simples declaração informal, sendo qualquer meio apto para transmitir essa informação, bem podendo ser verbal, que a mesma não deixou de fazer – cfr. art.ºs 26.º e segs da sua petição inicial de impugnação judicial – questão que não foi apreciada pela sentença recorrida a qual, desta forma, incorreu no predito vício de omissão de pronúncia conducente à declaração da sua nulidade.

Lendo e analisando a sentença recorrida, dela se pode ver que a M. Juiz do Tribunal “a quo”, para alcançar a solução que veio a dar ao caso, não omitiu, nesta matéria, qualquer questão que lhe tivesse sido colocada pelas partes, mas sim veio a entender de forma diversa da impugnante e ora recorrente, ao menos de forma implícita, que tal comunicação não poderia ser informal, mas sim formal, e os seus reflexos futuros na abrangência da respectiva não sujeição a tributação.

É o que resulta dos seguintes trechos da mesma sentença:
«Aqui chegados, constata-se da leitura dos citados preceitos, que a concessão de isenção depende da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:
Que a empresa adquirente do prédio tenha por objecto a aquisição de prédios para venda.
Que o prédio passe a figurar nas existências da empresa.
Que o prédio seja adquirido para ser vendido.
Que a isenção seja requerida no prazo de 90 dias contados da data da aquisição do prédio.
...
Decorre ainda do probatório, em 2004 a impugnante requereu a isenção ao abrigo da al. e) do n.º1 do art.º 10º do CCA, quando os prédios já se encontravam construídos (alíneas E) e F) do probatório).
Ora, estando em causa edifícios depois de construídos, a contribuição seria devida a partir do terceiro ano seguinte àquele em que os prédios passaram a figurar nas existências da empresa destinando-se a venda.
Assim sendo, em face da inobservância do n.º5 do art.º 10º do CCA a contribuição mostra-se devida por todo o tempo já decorrido, iniciando-se a suspensão da tributação a partir do ano seguinte ao da comunicação, cessando, todavia, no ano em que findaria caso tivesse sido apresentada em tempo. (n.º6 do art. 10º do CCA e n.º5 do art. 9º do CIMI).
...
Ou seja, no juízo formulado pela M. Juiz do Tribunal “a quo”, relevante para o cumprimento da comunicação referida no art.º 10.º, n.º5 do CCA, então vigente, seria apenas a comunicação formal como a que a ora recorrente veio a efectuar em 10.5.2004, como consta da matéria provada nas alíneas E) e F) do probatório, que não qualquer uma outra, designadamente a verbal, pelo que tal juízo encerra ou nele se encontra contido o seu contrário, desta forma não podendo ter ocorrido o invocado vício formal de omissão de pronúncia, sendo certo que se tal juízo se encontra certo ou não, já não pode consubstanciar omissão de pronúncia mas sim eventual erro de julgamento, até porque, como é sabido, o juiz não tem que se pronunciar sobre todas as razões, raciocínios ou argumentos que enformam a sua causa de pedir e pedido, conquanto que tenha decidido as questões colocadas, como no caso não deixou de acontecer.

Por outro lado, a invocada omissão de pronúncia apenas pode ocorrer quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões colocadas pelas partes ao tribunal (art.º 660.º, n.º2 do CPC), que não sobre a falta de realização de diligências instrutórias ou falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas (3) , que é o que a recorrente invoca também para integrar tal omissão de pronúncia, pelo que também por aqui nunca poderia ter ocorrido a invocada omissão de pronúncia.


Quanto à apontada falta de fundamentação da sentença recorrida – cfr. matéria das suas quatro primeiras conclusões do recurso – por a mesma não ter fundamentado expressamente a relevância ou não da passagem para as existências dos bens em causa também como momento relevante para aferir do início da sujeição a tributação, tendo mesmo contraposto as duas teses em confronto, da impugnante, por um lado, e da AT e do MP, pelo outro, como se pode ver da mesma sentença a fls 100 dos autos, onde invocou as normas sobre o início da tributação em causa e fundamentou sobre a não sujeição de contribuição, tendo pois sido questão que a mesma sentença não deixou de considerar como suporte da solução alcançada, pelo que a sentença com a decisão que ela encerra se encontra perfeitamente ancorada, quer na factualidade relevante que deu por provada, quer no direito que entendeu aplicável, como o esteio donde emerge, não podendo padecer do invocado vício formal.

A falta de fundamentação da sentença, causa da sua nulidade, constante nas normas dos art.ºs 668.º n.º1 b) do CPC e 125.º n.º1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), apenas tem lugar quando lhe faltem os seus fundamentos de facto e de direito da concreta solução alcançada, não quando a mesma não fundamente aspectos, razões ou raciocínios expendidos pela recorrente que, no seu contexto, se apresentem irrelevantes para essa mesma solução, como eram outros aspectos trazidos à liça pela ora recorrente.

Por outro lado, tal falta de fundamentação da sentença conducente à declaração da sua nulidade só pode ocorrer quando a mesma seja total ou absoluta; não quando a mesma seja deficiente, errada ou obscura, que pode afectar o seu valor doutrinal mas não produz nulidade, como já ensinava o Prof. José Alberto dos Reis (4)... Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto...

E no mesmo caminho trilha a jurisprudência dos nossos tribunais superiores como se pode ver em, entre muitos outros, pelo acórdão do STJ de 22.4.2204, Proc. 04B1072 e acórdão do STA de 29.6.2005, recurso n.º 117/05.


Improcedem assim os invocados vícios assacados à sentença recorrida, de omissão de pronúncia e de falta de fundamentação.


4.1. Para julgar improcedente a impugnação judicial deduzida considerou a M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que só com a entrega das declarações modelo 129, em 2002, em que declarava que as obras tinham sido concluídas em 7.2.2002, nos lotes de terreno para construção urbana em causa, os mesmo deixaram de ser lotes para construção para passarem a ser prédios, sendo que a impugnante apenas em 2004 veio requerer a isenção de contribuição relativa aos mesmos, ao abrigo do disposto no art.º 10.º, n.º1, alínea e) do CCA, pelo que só operou a isenção para o ano seguinte – 2005 – e sendo devida relativamente aos anos anteriores – 2003 e 2004 – não sendo por isso ilegal a contribuição impugnada.

Para a recorrente de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, para além dos invocados vícios formais assacados à sentença recorrida e já acima conhecidos, continua a pugnar que os lotes de terreno para construção, adquiridos em 2001, beneficiam da isenção de contribuição por cinco anos, tendo comunicado, por diversas vezes, verbalmente, no respectivo Serviço de Finanças, ou, caso assim se não entenda, em 2002, apresentou a declaração modelo 129 para inscrição dos prédios urbanos na matriz, pelo que desde esta data preencheu os requisitos previstos no art.º 10.º, n.º1, e) do CCA, para beneficiar dessa isenção de contribuição que assim só seria devida desde 2006, mas nunca a relativa a 2003, em causa.

Vejamos então.
Nos termos do disposto no art.º 11.º, n.º1 do CCA, então ainda em vigor à data da aquisição dos lotes de terreno para construção, os prédios urbanos presumem-se concluídos na mais antiga das seguintes datas – em que for apresentada a declaração para inscrição na matriz – sua alínea b), no caso, ou seja em 2002, data em que a ora recorrente apresentou no respectivo Serviço de Finanças, tais declarações modelo 129, como consta na matéria provada nas alíneas C) e D) do probatório fixado na sentença recorrida e melhor se colhe dos autos, pelo que a partir de então tais prédios (fracções autónomas) passaram a ficar sujeitas a tributação, nos termos do disposto no art.º 10.º n.º1 a) do mesmo Código, em substituição dos lotes de terreno para construção onde os mesmos foram implantados, que desde esta data deixaram de existir, para, em seu lugar, passarem a existir os referidos prédios urbanos.

Assim, em contrário, do pretendido pela ora recorrente, na matéria das suas conclusões 9. a 15., a eventual mera comunicação verbal ao respectivo Serviço de Finanças da aquisição destes lotes de terreno, nenhum efeito pode ter para efeitos da isenção de contribuição atento o princípio do pedido formal contido em requerimento, conforme o previsto no art.º 65.º, n.º1 do CPPT, e pelo período de cinco anos ao abrigo do disposto no art.º 10.º, n.º1, alínea e) do mesmo CCA, e muito menos podendo servir para justificar uma não sujeição da mesma contribuição pelo período de cinco anos, quando, tais lotes deixaram de existir em 2002, dando lugar a prédios urbanos, como acima se viu e foi sobre estes que incidiu a contribuição relativa a 2003, ora em causa, que não sobre aqueles.

Na matéria das restantes conclusões do recurso – 16.º e segs – pretende a ora recorrente que tal entrega do modelo 129, em 2002, relativamente aos prédios urbanos em causa, sirva também para cumprir a comunicação a que se refere a norma do art.º 10.º, nº5, do CCA, para efeitos de beneficiar da isenção do então já IMI, ao abrigo do disposto no art.º 9.º, n.º1, alínea e) do CIMI, correspondente à anterior norma do art.º 10.º, n.º1, alínea f) do CCA.

Dispunha a norma do art.º 10.º, n.º5 do CCA, então vigente:
Para efeitos do disposto nas alíneas e) e f) do n.º1 e no n.º4, deverão os sujeitos passivos comunicar à repartição de finanças da área da situação dos prédios, no prazo de 90 dias contados da verificação do facto determinante da sua aplicação, a afectação dos prédios àqueles fins, redacção que hoje se encontra na norma do art.º 9.º, n.º4 do CIMI.

Ou seja, no caso, devia a ora recorrente ter comunicado no prazo de 90 dias a contar da data da conclusão das obras - 7.2.2002 – ao serviço de finanças da área da situação dos prédios, que os mesmo tinham passado a figurar no seu activo circulante e que tinha por objecto a respectiva venda, para assim beneficiar da predita não sujeição à contribuição.

A norma do citado art.º 10.º n.º5 do CCA e hoje do art.º 9.º, n.º4 do CIMI, não dispõem sobre a forma como tal comunicação ao serviço de finanças deve ser efectuada, pelo que deverá ter aplicação a norma do art.º 65.º do CPPT, que é a aplicável no procedimento tributário, para reconhecimento dos benefícios fiscais, em geral, em que exige a formulação de requerimento especificamente dirigido a esse fim e a prova da verificação dos pressupostos desse reconhecimento.

Requerimento específico para esse fim que a ora recorrente apenas em 2004, veio a formular, como não se encontra em causa nos autos, pelo que a liquidação relativa a 2003, por ser anterior, não pode deixar de se encontrar fora do âmbito dessa não sujeição a tal tributação, como bem se entendeu na sentença recorrida, que assim não pode deixar de se manter.

Mas mesmo que se admitisse que tal requerimento para não sujeição à contribuição pudesse ser substituído por qualquer uma outra comunicação escrita dirigida ao mesmo serviço de finanças, no âmbito do princípio geral da desburocratização da Administração, como aconteceu no caso versado no acórdão do STA de 7.6.2006, recurso n.º 267/06, e que a ora recorrente pretende que a sua doutrina seja aqui aplicada (acórdão também citado pelo Exmo RMP, junto deste Tribunal, no seu parecer, ainda que por referência, certamente por lapso, ao ano de 2007), sempre este outro meio de comunicação teria de conter os elementos necessários para tal não sujeição, como seja que tais prédios passaram a figurar no seu activo circulante e que se destinavam à venda, para desta forma informar a AT das razões da não sujeição à contribuição em causa.

Ora, no caso, da declaração modelo 129 para inscrição de prédios urbanos na matriz, cuja cópia consta de fls 34/38 dos autos, nenhuns daqueles elementos pressupostos daquela invocada não sujeição constam nos dizeres da mesma, pelo que nunca será de colocar a hipótese de esta servir para substituir tal “comunicação” específica, exigível nos termos do n.º5 do art.º 10.º do CCA e hoje do art.º 9.º, n.º4 do CIMI, sabido que a entrega desta declaração modelo 129 antes tem por fim a inscrição dos prédios na matriz, como dispõe a norma do art.º 14.º n.º1 do mesmo CCA.


Improcedem assim, todas as conclusões do recurso sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.


Custas pela recorrente.


Lisboa, 10 de Novembro de 2009

Eugénio Sequeira
Magda Geraldes
José Correia

(1) Cfr. entre outros, os acórdãos do STA de 2.10.1996 (ambos), recursos n.ºs 20472 e 20491.
(2)Cfr. neste sentido, para além do acórdão deste TCAS de 12.10.2004, recurso n.º 5815/01, entre muitos outros, os acórdãos do STJ de 2.10.2003 (ambos), recursos n.ºs 2585/03, Rec. Rev., 2.ª Secção e n.º 480/03, Rec. Agravo, 7.ª Secção.
(3)Cfr. neste sentido Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 2.ª edição, revista e aumentada, 2000, Vislis, pág. 572, nota 10.
(4)Código de Processo Civil, anotado, Vol. V, Reimpressão, Coimbra 1981, pág. 140, ao cimo.