Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1262/11.3BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:04/29/2021
Relator:HÉLIA GAMEIRO SILVA
Descritores:OPOSIÇÃO / REVERSÃO
PRESCRIÇÃO DA DIVIDA EXEQUENDA
CITAÇÃO DO RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO – ARTIGO 48.º N.º 3 LGT
DESPACHO DE REVERSÃO
FALTA DE NOTIFICAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO DE AUDIÇÃO
Sumário:I A citação de cada um dos devedores, principal ou subsidiário, ocorrida no âmbito do processo de execução fiscal, constitui uma causa interruptiva própria e singular e só pode ocorrer uma vez relativamente a cada um deles, no entanto, as causas de interrupção da prescrição ocorridas relativamente ao devedor principal, podem ser oponíveis ao devedor subsidiário.
II Porém, se o devedor subsidiário for citado após o quinto ano subsequente ao da liquidação, o prazo de prescrição corre ininterruptamente, não se suspendendo por qualquer causa relativa ao devedor principal, sendo irrelevante em relação ao responsável subsidiário as causas de interrupção que, eventualmente, se verifiquem em relação ao devedor originário.
III O chamamento do revertido à ação executiva encontra-se regulado na Lei Geral Tributária (LGT) no regime da responsabilidade subsidiária (artigos 23.º e 24.º) devendo ser precedido de audição prévia do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão da reversão, por força do estatuído no artigo 23.º n.º 4 do diploma citado.
IV A exigência de audiência prévia nesta sede, tem carater de obrigatoriedade, pelo que, a sua falta, constitui um vício de forma do procedimento tributário suscetível de conduzir à anulação da decisão que vier a ser tomada conforme se previa no art.135.º, do Código de Procedimento Administrativo, em vigor à data dos factos.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

E..., melhor identificado nos autos, veio, enquanto responsável subsidiário, deduzir OPOSIÇÃO à execução fiscal n.º 15202006... e aps. (15202007... e 152020070...), instaurada contra a sociedade B... – C..., para cobrança coerciva de dívidas de IRC do exercício de 2002 e IVA dos 1.º e 2.º trimestre de 2002, 2.º, 3.º e 4.º trimestres de 2003 e 2.º, 3.º e 4.º trimestres de 2004, no valor total de € 177 100,46.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por decisão de 13 de março de 2019, julgou improcedente a oposição.

Inconformado, E..., veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formula as seguintes conclusões:
«1. Na matéria de facto, nos factos provados, o tribunal deu como provados os factos que constam das als. C) a N) e R) a T).

2. Sucede que estes factos não constam do despacho de reversão e não foram alegados em sede de contestação, nem em nenhum articulado da Fazenda Publica nem do MP.

3. A tomada em consideração de factos não alegados de que o tribunal não podia conhecer oficiosamente constitui uma violação do princípio do dispositivo (art. 264º do CPC) que resulta da proibição do juiz de se servir de factos não alegados pelas partes (art. 264º, n. º1 e 664 do CPC).

4. A consideração de factos não alegados pelas partes, sem a possibilidade de qualquer contraditório, constitui uma verdadeira decisão surpresa violadora do disposto no art. 3º, n. º3 do CPC o que acarreta a sua nulidade 195º, n.º1 do CPC porque influiu na decisão da causa.

5. Os factos judiciais, referidos no nº 2 do art. 412º do CPC, não carecem de alegação, mas não dispensam a prova.

6. Ora, no caso dos autos, não tendo a Sra. Juiz junto aos autos documento comprovativo do por si mencionado na fundamentação relativamente ao facto F), G), I) e J), estes não podem considerar-se provados.

7. Mais, quanto a estes factos provados (F, G, I e J) também não foi respeitado o princípio do contraditório (art.3º do CPC), vício que se invoca e deve conduzir à revogação da sentença.

8. Os factos indicados na al. C) supostamente ocorreram em 03/04/2016, não tendo qualquer relação com os autos porque os factos tributários dos autos são de 2002, 2003 e 2004.

9. Os factos indicados nas als. D), M) e N) dizem respeito ao IRC de 2001, estando por isso fora do âmbito da presente ação.

10. Os factos indicados na al. E) imputados ao Oponente nada dizem respeito ao âmbito da presente ação executiva, o que é revelado pelo número do processo executivo e pela data em que supostamente ocorreu, 2006.

11. Os factos indicados na al. L) imputados ao Oponente nada dizem respeito ao âmbito da presente ação executiva, o que é revelado pelo número do processo executivo e pela data em que supostamente ocorreu, 2007.

12. Há um erro de julgamento sobre a relevância destes factos, o que constitui também nulidade da sentença - artigo 125.º, n.º 1, do C.P.P.T.

13. Ainda para mais não existe qualquer justificação, nem sequer minimamente, das razões dessa relevância.

14. O tribunal deu como provado que a AT remeteu uma notificação ao Oponente para este exercer o seu direito de participação.

15. O tribunal deu como provado que a carta foi devolvida por endereço incorreto ou insuficiente.

16. Não obstante o tribunal de 1ª instância assevera o seguinte "é plausível que o Oponente possa ter, frustrado voluntariamente essa notificação".

17. Esta conclusão é falsa e sem qualquer fundamentação.

18. A AT não juntou o registo dos CTT, nem o aviso de receção. Isto só por si deveria ser suficiente para dar como provado que o Opoente não foi notificado para exercer o seu direito de participação.

19. A não receção não é uma presunção, ela está provada documentalmente.

20. Mais, documentalmente está também demonstrado o motivo da não receção - endereço incorreto ou insuficiente.

21. Uma coisa é certa, a carta não chegou ao seu destino porque os CTT informaram que o endereço está incorreto ou insuficiente.

22. A notificação não foi feita por culpa da AT ou dos CTT, não tendo o recorrido em nada contribuído para tal omissão.

23. Cabe à Administração Tributária o ónus de comprovar que efetuou a notificação em observância dos requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais aplicáveis. (art. 74º, n. º1 da LGT).

24. E aqui falece toda a argumentação do Tribunal de 1ª instância porque, face ao documento dos CTT, a notificação regular não ocorreu.

25. No mínimo, por aplicação do disposto no art. 39º, n.º 5 do CPPT impunha-se a repetição da notificação, o que não ocorreu.

26. Ainda, no que diz respeito a este fundamento nem se apele à aplicação da teoria do aproveitamento do ato, como se o não cumprimento da audição prévia, no caso em concreto, fosse inútil.

27. Em primeiro lugar, o dever de audição prévia é um direito constitucional (art. 267º, n.1 da CRP), cujas limitações estão expressamente previstas no art. 60º, n.º2 da LGT. A dispensa de audição prévia não está prevista na norma atrás citada. Por conseguinte, a admissão da sua não realização é violadora do art. 267º, n. º1 da CRP, do art. 60º, n. º2 da LGT e do art. 23º, n. º4 da LGT.

28. Em segundo lugar o processo de execução fiscal tem natureza judicial (art. 103º, n.º 1 da LGT). Deste modo, não se pode aqui aplicar a teoria do aproveitamento dos atos administrativos.

29. Em terceiro lugar, o princípio do aproveitamento do ato administrativo apenas é admissível quando a intervenção do interessado no procedimento tributário for inequivocamente insuscetível de influenciar a decisão final, o que acontece em geral nos casos em que se esteja perante uma situação legal evidente ou se trate de atividade administrativa vinculada, não se vislumbrando a mínima possibilidade de a audição poder ter influência sobre o conteúdo da decisão.

30. No caso em concreto não está em causa uma atividade vinculada nem uma solução legal evidente, pelo que não é de aplicar o princípio do aproveitamento do ato.

31. Entende o Tribunal a quo que a caducidade só pode ser invocada pelo devedor originário.

32. Salvo o devido respeito, esta interpretação jurídica não tem qualquer substrato com o disposto no art. 204º, al. e) do CPPT.

33. Mais, o legislador na al. e) do art. 204º do CPPT não distinguiu que este fundamento só pode ser invocado pelo devedor originário.

34. O oponente foi citado da presente execução em Abril de 2011.

35. O direito de liquidar os tributos caduca se as liquidações não forem notificadas no prazo de quatro anos. (art. 45º, n. º1 da LGT).

36. Estas notificações devem ser feitas com aviso de receção (art. 38º, n. º1 do CPPT). A AT não juntou os avisos e receção.

37. A AT não juntou aos autos nenhum elemento probatório que revele que as liquidações de IVA e de IRC foram validamente notificadas ao devedor originário ou aos subsidiários.

38. O ónus da prova de que as liquidações foram efetuadas e notificadas dentro do prazo de caducidade à devedora originária era da AT (art. 74º, n. º1 da LGT).

39. Não tendo a AT demonstrado esse facto, deve ser valorado em seu desfavor.

40. Quanto à prescrição, o oponente foi citado da presente execução em Abril de 2011.

41. A AT não juntou aos autos as citações do devedor originário.

42. As dívidas tributárias prescrevem num prazo de oito anos (art. 48º, n. º1 da LGT).

43. A possível interrupção, que só se admite por mero dever de defesa, da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação for efetuada no quinto ano posterior ao da liquidação (art 48º, nn,º da LGT).

44, A situação em julgamento trata-se de tributos de 2002, 2003 e 2004 tendo a presente citação sido efetuada em Abril de 2011,

45, Não tendo a citação sido feita ao oponente, no prazo de oito anos, a prescrição para as dívidas tributárias de 2002 já ocorreu, devendo por isso ser reconhecida,

46, Na decisão de reversão a AT limita-se a referir em "fundamentos da reversão" um entendimento geral e abstrato, fundado na Lei Geral Tributária, sem o cuidado de subsumir os factos no caso sub judice às normas que invoca,

47, Não tendo a AT especificado o fundamento da reversão, afigura-se-nos que a decisão padece de falta de fundamentação (art 23º, n,º 2, 77º, n, º1 da LGT e art 268º, nº 3 da CRP),

48, Importa referir que o despacho de reversão é completamente omisso quanto à extensão temporal da responsabilidade da Oponente,

49, Deste modo, mesmo com a argumentação da sentença recorrida, por esta via deveria o deveria o despacho de reversão ser anulado por falta de fundamentação (art 23º, n,º2, 77º, n, º1 da LGT e art 268º, n, º3 da CRP),

50. A douta sentença padece de um erro porque olvida que um dos pressupostos da reversão é a prática de atos de gestão ou administração (gerência de facto) - art 24º, n, º1 da LGT

51. Da decisão de reversão não consta qualquer facto revelador da gerência de facto da Oponente,

52. Pelo que, dependendo a reversão da gerência efetiva, não existindo qualquer indício disso, nem tendo a AT invocado qualquer facto revelador disso, a decisão de reversão padece de falta de fundamentação (art 268º, n, º3 da CRP)

53. Acresce que, face à prova realizada nos autos, não era lícito operar-se a presunção judicial, baseada nas regras da experiência (cfr artº,351, do CCivil), de exercício de facto da gerência pela oponente/ recorrida.

54. Os documentos juntos aos autos sobre factos tributários distintos dos em apreciação não permitem extrair qualquer conclusão sobre 2002, 2003 e 2004.

55. A sentença, nesta parte, deve ser alterada e não admitida a gerência de facto da Oponente.

56. Da decisão de reversão não consta qualquer facto revelador da gerência de facto da Oponente, Pelo que, dependendo a reversão da gerência efetiva, não existindo qualquer indício disso, nem tendo a AT invocado qualquer facto revelador disso, a decisão de reversão padece de falta de fundamentação (art. 268º, n, º3 da CRP).

57. Mais, em sede judicial a AT tentou fundamentar a sua decisão (art. 12º da contestação).

58. A AT nada alegou (art. 574º, n, º1 do CPC), limitando-se a juntar alguns documentos.

59. Contudo, a decisão de reversão nada refere quanto a estes supostos factos ou documentos.

60. Assim, esta tentativa configura uma fundamentação posterior que a douta sentença admitiu.

61. O despacho de reversão, embora proferido num processo de natureza judicial, tem a natureza de ato administrativo (cfr artº,148º, do CPA), pelo que são de considerar em relação a ele as exigências legais próprias deste tipo de atos, designadamente, no que concerne à fundamentação (cfr artºs,268, nº,3, da CR, Portuguesa, e 23, nº4, e 77, da LGT).

62. A deficiente fundamentação não pode ser efetuada à posterior, antes se impondo a sua concretização no próprio ato de reversão, de forma a que o seu destinatário possa perceber e defender-se de cada um dos respetivos segmentos que lhe são desfavoráveis, sendo para isso imprescindível que lhe seja dada a conhecer a factualidade subjacente ao ato praticado.

63. Ora, a p.i. foi elaborada em função dos vícios do ato. A prova foi indicada na p.i. em função do ato impugnado.

64. A Oponente não tem um meio judicial que lhe permita defender-se, em toda a plenitude, desta fundamentação subsequente, que nunca antes foi invocada.

65. Admitir a fundamentação subsequente do ato em sede de contestação, configura uma violação do princípio da igualdade.

66. O princípio da igualdade seria violado porque a Oponente limitou o âmbito da ação aos fundamentos do ato reversão invocados pela AT e imputou-lhe os vícios decorrentes dessa fundamentação.

67. Admitir que AT possa apresentar uma fundamentação subsequente, coloca as partes em juízo em desigualdade no que diz respeito à possibilidade de alegar, fundamentar e provar os fatos e vícios que julgue pertinentes.

68. Admitir esta fundamentação subsequente, como pretende a AT, configura uma violação dos direitos de defesa da Oponente (art. 2º e art. 268º, n.º4 da CRP), do princípio do contraditório (art. 2º, da CRP, art. 3º do CPC ex vi art. 2º, al e) do CPPT) do princípio da igualdade (art. 13º da CRP, art. 6º da CEDH, art. 3ºA do CPC e art. 98º da LGT) e do próprio dever de fundamentação (art. 268º, n.º3 da CRP).

Nestes termos, por todo o exposto, deve o presente recurso ser provido e, em consequência, ser anulada a sentença proferida, substituindo-se a mesma por douto acórdão acolhedor da argumentação supra expendida anulando o despacho de reversão, com o que farão V. Exas., Exmos. Senhores Juízes Desembargadores, a esperada e costumada J USTIÇA!»



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A Recorrida, Fazenda Publica, devidamente notificado para o efeito, não apresentou contra-alegações.

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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal, nos termos do artigo 289.º n. º1 do CPPT, veio oferecer o seu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Com dispensa de vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Subsecção do Contencioso Tributário para decisão.

Objeto Do Recurso

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo Recorrente a partir das alegações que definem, o objeto dos recursos que vêm submetidos e consequentemente o âmbito de intervenção do Tribunal “ad quem”, com ressalva para as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua apreciação (cfr. artigos 639.º, do CPC e 282.º, do CPPT).

Termos em que a questão sob recurso que importa aqui decidir, consiste em aferir se a sentença recorrida enferma dos vícios que lhe vem assacados, nomeadamente:

a) Violação do princípio do dispositivo e do contraditório, ao ter dado como provados factos não alegados pelas partes e nalguns casos não contraditados – concl. 1 a 4;

b) Erro de julgamento quanto à relevância desses factos e quanto àqueles a que se reportam à notificação para o exercício do direito de audição previa ao despacho de reversão – concl. 5 a 30;

c) Caducidade do direto à liquidação – concl. 31 a 39;

d) Prescrição da divida exequenda – concl. 40 a final;


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2 – FUNDAMENTAÇÃO

A sentença recorrida considerou os seguintes factos provados:

«A) Em 22/02/2006, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Loures 1, contra a sociedade B... – C... Lda., pessoa coletiva n.º 5..., o processo de execução fiscal n.º 15202006..., para cobrança coerciva de dívida de IRC dos exercícios de 2001 e 2002 – cfr. fls. 24 a 26 dos autos;

B) Em data anterior a 03/04/2006, a sociedade B... – C... Lda. foi citada no PEF referido em A) – cfr. fls. 6 da cópia certificada do PEF 15022006... apensa;

C) Em 03/04/2006, e no âmbito do PEF referido em A), foi apresentado no Serviço de Finanças de Loures 1, o requerimento de fls. 72 e 73 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em nome da sociedade B... – C... Lda., subscrito pelo ora Oponente, sob a designação “A Gerência”;

D) A sociedade B... – C... Lda. apresentou reclamação graciosa da liquidação de IRC/2001 n.º 2005-8310…, nos termos da petição ora a fls. 7 a 14 da cópia certificada do PEF 15022006... apensa, a qual foi subscrita pelo ora Oponente, sob a designação “A Contribuinte”;

E) Em 27/12/2006, foi apresentado no Serviço de Finanças de Loures 1, em nome da sociedade B... – C... Lda., subscrito pelo ora Oponente, sob a designação “A Contribuinte”, o requerimento de fls. 18 da cópia certificada do PEF 15022006... apensa, relativo à carta registada devolvida com o nº de registo RP 3092…3 PX, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e no qual se encontra manuscrita a indicação “Recebi a carta registada no dia 29-01-07 assinatura do ora Oponente”;

F) Em 18/04/2007 foi remetida a este Tribunal, impugnação judicial deduzida pela sociedade B... – C... Lda., a qual foi instaurada sob o n.º 258/07.4 BELRS, à qual foi apensa a impugnação 340/07.8 BELRS, e se encontra a tramitar – cfr. consulta SITAF;

G) O ora Oponente, na qualidade de sócio-gerente da sociedade B... – C... Lda., subscreveu, a procuração para a impugnação referida em F) datada de 12/04/2006 – cfr. consulta SITAF;

H) Os atos tributários impugnados na impugnação referida em F) estão compreendidos no PEF 15202007... – cfr. fls. 23 dos autos;

I) Em 24/07/2007 foi remetida a este Tribunal impugnação judicial deduzida pela sociedade B... – C... Lda., a qual foi instaurada sob o n.º 1256/08.6 BELRS, e julgada improcedente por Acórdão do TCAS de 02/10/2012 – cfr. consulta SITAF;

J) O ora Oponente, na qualidade de sócio-gerente da sociedade B... – C... Lda., subscreveu, a procuração para a impugnação referida em I) datada de 07/06/2007 – cfr. consulta SITAF;

K) Os atos tributários impugnados na impugnação referida em I) estão compreendidos no PEF 152020070... – cfr. fls. 23 dos autos;

L) Em 11/07/2007, a sociedade B... – C... Lda., em requerimento subscrito pelo ora Oponente, sob a designação “A Gerência”, e no âmbito do PEF 15202007..., informou que “impugnou judicialmente as liquidações ora em execução (…) – cfr. fls. 18 da cópia certificada do PEF 15202007... apensa;

M) Em 13/11/2007, foi deduzida impugnação judicial da liquidação de IRC 2001, a qual foi instaurada neste Tribunal com o n.º 830/07 – cfr. fls. 22 e 23 da cópia certificada do PEF 15022006... apensa;

N) Os atos tributários impugnados na impugnação referida em M) estão compreendidos no PEF 15202006... – cfr. fls. 23 dos autos;

O) A sociedade B... – C... Lda., foi constituída em 24/09/1996, entre os sócios E..., ora Oponente, e A... – cfr. fls. 34 do da cópia certificada do PEF 15202006... apensa (certidão do registo comercial);

P) Desde a sua constituição, e até 2011, foram designados gerentes da sociedade B... – C... Lda., os sócios referidos em O) – cfr. fls. 34 e 35 da cópia certificada do PEF 15202006... apensa;

Q) A sociedade B... – C... Lda., obrigava-se pela assinatura de um gerente - cfr. fls. 35 da cópia certificada do PEF 15202006... apensa;

R) Encontra-se aposta a assinatura do Oponente em faturas emitidas pela sociedade B... – C... Lda. entre 21/02/2001 e 23/11/2001, bem como de outubro e novembro de 2004 – cfr. fls. 153 a 158 e 170 e 171 dos autos;

S) O Oponente assinou pelo menos quatro cheques da sociedade B... – C... Lda, entre 14/02/2001 e 06/08/2002 – cfr. fls. 159 a 162 dos autos;

T) O Oponente outorgou contratos de adjudicação de subempreitadas, como gerente da sociedade B... – C... Lda., em 31/03/2003 e 20/11/2003 – cfr. fls. 163, 164, 166 a 169 dos autos;

U) Em 13/01/2011, e após as diligências de fls. 25 a 29 da cópia certificada do PEF 15202006... apensa, constatou o Serviço de Finanças de Loures 1 que «Não foram localizados bens em nome da executada, que garantam as dívidas existentes» e que «O executado se encontra cessado desde 2008.08.26» - cfr. fls. 33 da cópia certificada do PEF 15202006... apensa;

V) Em 01/03/2011 foram apensados ao PEF referido em A), os PEF 15202007... e 152020070..., instaurados para cobrança coerciva de dívidas de IVA dos períodos de 2002, 2003 e 2004 – cfr. fls. 27 a 53 dos autos;

W) Através do ofício n.º 1780 do Serviço de Finanças de Loures 1, datado de 18/03/2011, e sob o registo postal RM582340435 PT, foi remetida ao ora Oponente, para a morada PQ R...– ST ANT CAVALEIROS, 2670-000 SANTO ANTÓNIO CAVALEIROS, notificação para efeito de audição prévia da reversão no PEF 15202006... – cfr. fls. 53 da cópia certificada do PEF 15202006... apensa;

X) O ofício referido em W) foi devolvido ao remetente pelo motivo “Endereço incorreto ou insuficiente, Devolvido” – cfr. fls. 57 da cópia certificada do PEF 15202006... apensa;

Y) Em 11/04/2011, foi proferido despacho de reversão da dívida em cobrança coerciva no PEF 15202006... e aps, contra a ora Oponente, com o seguinte teor: «Face às diligencias de fls. (ilegível) e estando concretizada a audição do(s) responsável(veis) subsidiário(s), prossiga- se com a reversão da execução fiscal contra E... contribuinte n.º 1..., morador em PQ R... – ST ANT CAVALEIROS – 2670-000 SANTO ANTÓNIO CAVALEIROS na qualidade de responsável subsidiário (…)» - cfr. fls. 63 da cópia certificada do PEF 15202006... apensa;

Z) Como fundamentos da reversão referida em Y) foi indicado o seguinte: «Dos administradores, diretores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entidades fiscalmente equiparadas, por ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa coletiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o facto constitutivo da dívida se verificou no período de exercício do cargo [art.24º/nº1/a) LGT].

ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa coletiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o prazo legal de pagamento/entrega terminou depois do exercício do cargo [art.24º/nº1/a) LGT].

não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da divida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art. 24º/nº1/b) LGT]

Não foram localizados bens da executada, Desconhece-se se a executada se encontra a laborar no local, encontra-se cessada em sede de IVA desde 2008.08.26, conforme Auto de Diligências. Gerente conforme Certidão Permanente.» - cfr. fls. 63 da cópia certificada do PEF 15202006... apensa;

AA) Através do ofício n.º 2701, de 15/04/2011, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em 26/04/2011 foi o Oponente citado no PEF 15202006... e aps. – cfr. fls. 66 e cópia de AR assinado a fls. 67 da cópia certificada do PEF 15202006... apensa;

BB) Através do ofício n.º 2703, de 15/04/2011, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi o Oponente citado no PEF 152020060… e aps. – cfr. fls. 18 e 19 dos autos;

CC) Em 18/05/2011, foi deduzida a presente Oposição – cfr. fls. 3 dos autos.


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2.2 Factos não Provados

Dos factos alegados, com relevância para a decisão da causa, nenhum importa registar como não provado.


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2.3 A decisão da matéria de facto provada resultou da análise crítica de toda a prova produzida nos autos, nas informações oficiais e documentos constantes dos autos e do processo de execução fiscal, não impugnados, bem como das consultas ao SITAF, conforme remissão feita a propósito de cada alínea do probatório.»
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De direito

Em sede de aplicação do direito a sentença recorrida julgou improcedente a oposição deduzida por E... por considerar que se encontravam reunidos os pressupostos da reversão e por não se verificar que tivesse sido afastada a presunção de culpa do revertido, no facto de o património da sociedade se ter tornado insuficiente para pagar as dívidas tributárias que contra o mesmo reverteram.

Discordando de tal decisão, o revertido, vem apresentar recurso com os argumentos que deixamos autonomizados na delimitação do objeto do recurso e que passaremos a apreciar encetando por aqueles que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato tributário aqui consubstanciado na quantia exequenda, conforme nos impõe o artigo 124.º do CPPT.

De facto, a norma citada, impõe ao decisor a ordem de conhecimento dos vícios na sentença, dispondo (1) que o tribunal deve apreciar prioritariamente aos vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado e, depois, os que sejam causa de anulação daquele (2) que o juiz deve dar preferência ao conhecimento dos vícios que assegurem mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos e que, de entre os vícios que sejam causa de anulação do ato, deve começar por dar preferência à ordem estabelecida pelo impugnante, sem prejuízo de atender, igualmente, aos vícios arguidos pelo Ministério Público.

Seguindo esta ordem, compete antes de mais conhecer da prescrição da divida exequenda por se tratar de uma questão de conhecimento oficioso nos termos previstos no artigo 175.º do CPPT.

Diz-se ali que a prescrição deve ser conhecida “oficiosamente pelo juiz se o órgão da execução fiscal que anteriormente tenha intervido o não tiver feito.”

Vejamos então:

Da prescrição da divida exequenda

Defende o recorrente que as dividas se encontram prescritas já que a citação (do devedor subsidiário) na presente execução ocorreu em abril de 2011, não tendo a AT juntado aos autos as citações do devedor originário.

Acrescenta que: “[A]a possível interrupção, que só se admite por mero dever de defesa, da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação for efetuada no quinto ano posterior ao da liquidação (art 48º, nn, º da LGT)”.

Conclui dizendo que “[N]não tendo a citação sido feita ao oponente, no prazo de oito anos, a prescrição para as dívidas tributárias de 2002 já ocorreu, devendo por isso ser reconhecida,

Por seu lado a sentença recorrida alinhou, nesta arte o seguinte discurso fundamentador:
Quanto ao prazo de prescrição das dívidas exequendas, o qual, nos termos do artigo 48.º da LGT é de 8 anos, tomando por referência a dívida mais antiga (IRC de 2002) resulta evidente, face ao disposto no artigo 49.º da LGT (Interrupção e suspensão da prescrição) que o mesmo não se completou.
Como resulta do probatório, a devedora originária foi citada no PEF e as impugnações judiciais das dívidas exequendas deduzidas em 2007 ainda correm termos.
Termos em que improcede o fundamento da prescrição das dívidas revertidas.”

Vejamos então.

Antes de mais, importa recordar que nos autos estão em causa dividas de IRC do exercício de 2002 e de IVA dos anos de 2002, 2003 e 2004.


Quanto à matéria da prescrição das dividas tributárias, dispõe o artigo 48.º do Lei Geral Tributária (LGT), na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de dezembro, que:
“ 1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário…”.

A redação transcrita entrou em vigor na ordem jurídica em 01/01/2005 (OE 2005), mas tem aplicação à situação em apreço, quer por força do disposto no art.º 297.º, n.º 2, do Código Civil, quer por via do art.º 12.º, do mesmo compendio normativo, conforme se tem pronunciado abundantemente o STA (1).

Assim e tendo presente o “dies a quo”, da nova redação do n.º 1 do artigo 48.º da LGT, consideramos que no que respeita às dividas de:
® IRC 2002, o prazo iniciou-se em 01/01/2003
® IVA 2002/3/4, o prazo iniciou-se em 01/01/2003/4/5 respetivamente,
completando-se, em qualquer das situações, caso de não existam causas de suspensão ou interrupção, oito anos depois.

Vejamos, porém, o que nos apraz dizer quanto às causas se suspensão ou interrupção do prazo prescricional, para tal, apelamos antes de prosseguir, ao disposto no artigo 49.º da LGT, que na redação em vigor à data dos factos estatuía o seguinte:

“1 – A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.
2 - A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou de reclamação, impugnação ou recurso”.

Com as alterações decorrentes da entrada em vigor da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro (OE2007), esta disposição legal foi alterada e da mesma passou a constar a seguinte redação:

1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.
2 – (Revogado)
3 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.
4 - O prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida”.

O que significa que com a entrada em vigor da Lei do orçamento de Estado para 2007, a LGT deixou de consagrar a possibilidade de sobreposição de vários efeitos interruptivos do computo do prazo prescricional da prestação tributária, o mesmo é dizer que as causas que tinham como efeito eliminar os efeitos do tempo anteriormente decorrido e obstar à verificação do prazo de prescrição na pendencia do processo, deixaram de atuar sucessivamente, passando a ter lugar uma única vez e a ser considerado apenas o facto que ocorrer em primeiro lugar.

Acompanhamos, com a devida vénia, os ensinamentos do Sr Conselheiro Jorge Lopes de Sousa (2), quando nos diz que:

“Até 1-1-2007, qualquer das causas de interrupção da prescrição tinha, por si própria, os efeitos de eliminar todo o tempo anteriormente decorrido e obstar ao decurso do prazo da prescrição enquanto estivesse pendente o processo em que ela se tinha produzido.

Por isso, mesmo que, quando ocorreu a segunda causa de interrupção da prescrição, o período anterior à primeira estivesse eliminado e não tivesse decorrido qualquer período para a prescrição, por o processo que determinou a primeira interrupção estar pendente e não ter parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, a segunda causa de interrupção mantém a sua própria potencialidade para produzir os mesmos efeitos em relação ao período anterior (eliminação) e durante o seu próprio processo (obstando ao decurso do prazo)”.

Aqui chegados e não perdendo de vista que a situação que nos ocupa, se reporta à responsabilidade subsidiária por dividas de outrem, importa ter presente o n.º 3 do artigo 48.º da LGT que vem, para efeitos de interrupção da prescrição, estabelecer regras quanto aos efeitos da citação efetuada na pessoa do devedor principal ou originário e a sua implicação quanto ao responsável subsidiário, ao estatuir que: “[A]a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efetuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação.”

Daqui se retira que se o devedor subsidiário for citado após o quinto ano subsequente ao da liquidação, o prazo de prescrição corre ininterruptamente, não se suspendendo por qualquer causa relativa ao devedor principal, sendo o efeito desta norma apenas o de “… tornar irrelevante em relação ao responsável subsidiário as causas de interrupção que se verifiquem em relação ao devedor originário.”- conforme explicitou o ac. do STA proferido em 18/01/2017 no processo n.º 0895/14, que por facilidade aqui iremos acompanhar.

Diz-se ali que a questão dos efeitos da citação do devedor originário face ao revertido para efeitos de interrupção da prescrição foi já objeto de analise jurisprudencial por parte daquele Supremo Tribunal que por várias vezes se pronunciou no seguinte sentido “… a citação de cada um dos devedores, principal ou subsidiário, ocorrida no âmbito do processo de execução fiscal, constitui uma causa interruptiva própria e singular e só pode ocorrer uma vez relativamente a cada um deles, no entanto, as causas de interrupção da prescrição ocorridas relativamente ao devedor principal são oponíveis ao devedor subsidiário, cfr. artigo 48º, n.º 2, a não ser que a citação deste (devedor subsidiário) ocorra mais de 5 anos após a liquidação do imposto - cf. neste sentido acórdãos de 26.08.2015, recurso 1012/15, de 15/01/2014, recurso n.º 1670/13 e de 06/03/2014, recurso nº 601/13.
De facto, como vimos, no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5° ano, se ele for citado até ao fim do 8° ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (e também em relação ao devedor originário, por força da regra do n° 2 do art.º 48°).
O efeito daquele nº 3 do art.º 48° é apenas de tornar irrelevante em relação ao responsável subsidiário as causas de interrupção que se verifiquem em relação ao devedor originário.
E como sublinha Jorge de Sousa (ob. citada, pag. 119), «esta interpretação é a que melhor se adequa à teleologia global do artigo 48º da LGT, permitindo, aliás, a conjugação do estatuído nos seus nºs 2 e 3. Ou seja, não fica afastada a necessidade de aferir se a citação do responsável subsidiário ocorre antes do termo do prazo de prescrição, aferindo esta (prescrição) também em função da causa interruptiva que é a própria citação do responsável subsidiário.”. – fim de citação
O negrito é nosso

No caso sub judice resulta do probatório [pontos AA) e BB)] que o devedor subsidiário foi citado no âmbito dos processos executivos n.º 15202006... e aps., e 1520200601097334 e aps., em 15/04/2011, data em que já havia decorrido 8 anos após o inicio do prazo de prescrição relativamente às dividas de 2002, que, como dissemos, se iniciou em 01/01/2003, termos em que a divida exequenda se encontra, prescrita quanto a IRC e IVA dos aexercicio de 2002, o que aqui se declara.

Mantendo-se exigíveis as demais, face à suspensão provocada pela citação do revertido, sendo neste caso, esta a única causa de interrupção a considerar, atendendo ao n.º 3 do art.º 49.º, da LGT, já que se tornaram irrelevantes a(s) causa(s) eventualmente ocorridas na pessoa do devedor originário.

Donde se retira que deverá ser concedido parcial provimento ao recurso, nesta parte, com a consequente determinação de anulação das dividas em que se verificou a prescrição, ao que se provirá na parte do disposito deste acórdão.


»«

Avancemos na análise, e centrando-nos agora na questão autonomizada em b) da delimitação do objeto do recurso, nomeadamente, no invocado erro de julgamento quanto à relevância dos factos em que assenta a notificação para o exercício do direito de audição previa antes da prolação do despacho de reversão.


Recordamos em traços gerais que o instituto da reversão ocorre no âmbito do processo de execução fiscal e constitui, como é sabido, um regime exclusivo deste, com tradução na modificação subjetiva da instância concretizada pelo respetivo despacho [de reversão] através do chamamento à execução de outrem que não o devedor principal, a fim de ocupar ali, o lugar deste [devedor principal], tendo por objetivo a cobrança, no mesmo processo executivo, de dívidas de impostos exigidas ao devedor originário, ou seja através de um despacho proferido por uma entidade administrativa que nos processo exerce as funções de órgão de execução, (artigo 149.º do CPPT) (3), o devedor é substituído e passa um terceiro a ser o responsável pelo pagamento da divida.

Trata-se de um mecanismo processual justificado pela natureza da dívida e dos interesses coletivos em jogo, o que não justifica qualquer tipo de arbitrariedade sobre o revertido, pelo contrário, trata-se de um ato balizado e que apenas pode ocorrer na dependência da verificação dos respetivos requisitos legais (art.º 23.º e 24.º da LGT e 153.º n.º 2 do CPPT).

O chamamento do revertido à ação executiva encontra-se regulado na Lei Geral Tributária (LGT) no regime da responsabilidade subsidiária (artigos 23.º e 24.º) devendo ser precedido de audição prévia do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão da reversão, por força do estatuído no artigo 23.º n.º 4 do diploma citado, sendo que quanto à declaração fundamentada dos pressupostos e extensão da reversão a norma impõe ainda que sejam incluídos na citação.

A exigência de audiência prévia nesta sede, tem carater de obrigatoriedade, pelo que, a sua falta, constitui um vício de forma do procedimento tributário suscetível de conduzir à anulação da decisão que vier a ser tomada conforme se previa no art.135.º, do Código de Procedimento Administrativo, em vigor à data dos factos (4).

É desta forma que se entende o especial cuidado que deve revestir o chamamento do revertido à execução, já que, verificados que sejam os requisitos legais, este, vai responder, na primeira pessoa, por dividas de outrem.

A este respeito escreveu-se no acórdão do STA proferido em 09/01/82019 com o n.º 01790/14.9BELRS0670/18 o seguinte:
“(…)
5.1. De acordo com o disposto no nº 1 do art. 23º da LGT, a responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal, sendo o despacho que a ordena (despacho de reversão) o acto que dá início ao procedimento para efectivação da responsabilidade subsidiária.
(…)”

Fica assim clara a importância atribuída ao direito de audição em sede de reversão no processo de execução fiscal face ao intuito de, com ele, se dar a conhecer ao revertido o projeto de decisão de contra si reverter a execução, devendo este através da fundamentação do ato de reversão, ficar a conhecer as razões de facto e de direito que subjazem à decisão do órgão de execução fiscal ficando, deste modo, em condições de a poder impugnar por erro nos pressupostos ou qualquer outro vício.

Distintamente, a citação ocorre na fase processual posterior à prolação do despacho de reversão e constitui o meio capaz de levar ao conhecimento do executado que contra ele corre uma ação executiva (artigo 35.º e 189.º e seguintes do CPPT e 219.º do CPC), neste caso com origem no despacho de reversão (artigo 23.º n.º 1 da LGT) e destina-se a chamar o revertido, à execução, agora na qualidade de executado. Sendo que a falta ou irregularidade da citação, sempre que possa prejudicar a defesa do interessado constitui nulidade insanável em processo de execução fiscal e por conseguinte suscetível de culminar, também ela, na ilegitimidade do executado.

Retomando agora a situação que nos ocupa damos conta que a sentença recorrida julgou, quanto a este segmento, improcedente a oposição, por considerar que o OEF promoveu a audição do Oponente, previamente à reversão.
Para assim concluir a sentença recorrida assumiu que a reverão deve ser precedida “…, de audição do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação.
Resulta provado que o OEF promoveu a audição do Oponente, previamente à reversão. Todavia, a notificação enviada foi devolvida ao remetente com o motivo “Endereço incorreto ou insuficiente”.
Ora, tal motivo não se revela fidedigno, uma vez que a correspondência foi expedida para a morada com a qual o Oponente se identifica na PI da presente Oposição e na qual recebeu outra correspondência, designadamente a citação que efetivou a reversão.
Conjugado com o facto de ter já conhecimento da execução fiscal na esfera da devedora originária, e que a mesma já não responderia patrimonialmente pelas dívidas em causa, já que se encontrava cessada desde 2008, é plausível pressupor que o Oponente possa ter, frustrado voluntariamente, esta notificação. Por outro lado, não sendo conhecida da Administração fiscal ou invocada qualquer outra morada que correspondesse ao domicílio fiscal do Oponente, não se impunha ao órgão de execução fiscal ter repetido tal notificação.”- fim de citação.

Por seu lado o recorrente vem dizer que a AT” … não juntou o registo dos CTT, nem o aviso de receção. Isto só por si deveria ser suficiente para dar como provado que o Opoente não foi notificado para exercer o seu direito de participação.”, e tem razão.

Na verdade, como se expressa no salvatério, a “não receção” de uma notificação postal enviada pelos CTT, não é aferida por presunção, ela está provada documentalmente, sendo que no caso concreto até sabemos que o motivo “endereço incorreto ou insuficiente”.

Acolhemos, nesta parte, por facilidade e oportunidade o acórdão deste tribunal proferido em 28/02/2019 no processo n.º 2406/14BESNT, cujo coletivo integramos, e é o seguinte:

“(…)

A audição prévia do responsável subsidiário é a concretização do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito consagrado no artigo 267.º, n.º4 da Lei Fundamental Portuguesa e sua notificação é direito igualmente resultante do imperativo constitucional consagrado no artigo 268º., n.º3 da mesma Lei.

Estabelece o artigo 23.º, n.º4 da LGT que «a reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação». Por seu turno, estabelece o artigo 60.º, nº 4, do mesmo compêndio, que tal notificação para o exercício do direito de participação deve ser concretizada por correio postal registado – «o direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela administração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte».

O Supremo Tribunal Administrativo tem deixado claro que «I - É a administração tributária que tem o ónus de demonstrar que efectuou a notificação de forma correcta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais. II - Na ausência dessa demonstração e não se comprovando que a oponente tomou conhecimento dos actos notificandos – liquidações que deram origem à dívida exequenda – é de julgar procedente a oposição à execução fiscal deduzida com fundamento em inexigibilidade por falta de notificação.» (Entre outros, acórdão de 27.05.2015, proferido no processo n.º 078/14, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

No que respeita ao procedimento de notificação por carta registada ( por ser aquele que aqui importa), regulado nos artigos 35.º a 39.º do CPPT e no artigo 28.º do Regulamento do Serviço Público de Correios (RSPC), aprovado pelo DL n.º 176/88 de 18/5, refere o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16.5.2012, proferido no processo n.º 01181/11, que «(…) compreende os seguintes actos: (i) a emissão de uma carta, que incorpora a notificação do acto tributário, com a respectiva fundamentação (ii) o registo nos serviços postais, através da apresentação da carta em mão, mediante recibo; (iii) e a entrega no domicílio fiscal do respectivo destinatário, comprovada por recibo.

Em princípio, do ponto de vista formal, estes actos colocam a informação ao alcance do sujeito passivo, fazendo depender o respectivo conhecimento exclusivamente da sua vontade.

O «recibo de aceitação» e o «recibo de entrega» da carta registada pelos serviços postais, previstos nos n.ºs 2 e 4 do artigo 28.º do Regulamento do Serviço Público de Correios são documentos idóneos para provar que a carta foi remetida e colocada ao alcance do destinatário. Para a administração tributária é suficiente exibir o recibo da apresentação em mão da carta expedida sob registo, pois, não tendo sido devolvida a carta, o n.º 1 do artigo 39.º do CPPT presume que a notificação se efectuou no 3.º dia posterior ao registo. Porque a comunicação é efectuada através dos serviços postais, que podem levar algum tempo a colocar a carta em condições do destinatário ter possibilidade de conhecer a sua existência, através de uma regra de experiência (id quod plerumque accidit), a lei presume que a comunicação postal demora três dias posteriores ao registo, que se transfere para o 1.º dia útil, se o último dia não for dia útil.

Deste modo, o registo da carta faz presumir que o seu destinatário provavelmente a receberá, ou terá condições de a receber, três dias após a data registo. Trata-se pois de uma presunção legal destinada a facilitar à administração tributária a prova de que a notificação foi introduzida na esfera de cognoscibilidade do notificando. Mas a «presunção» que tem por base o registo postal, não existe se o registo não for feito.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).” – fim de citação

Enunciado o enquadramento jurídico da questão, torna-se para nós, óbvio que não podemos acompanhar a posição sufragada na sentença recorrida.

Com efeito, a lei impõe à AT, que a reversão da divida tributária contra o responsável subsidiário seja antecedida de audição do responsável subsidiário, face ao que não pode o interprete concluir pela suficiência da “promoção” ou remessa de qualquer missiva “para a morada com a qual o Oponente se identifica na PI da presente Oposição e na qual recebeu outra correspondência”, nem considerar, como o fez a sentença recorrida, que a devolução da mesma ao remetente com a indicação de “Endereço incorreto ou insuficiente”, constitui um motivo que “não se revela fidedigno” para considerar o revertido não notificado.

Ora, como dissemos, a audição prévia do responsável subsidiário e a respetiva notificação para o seu exercício, correspondem à concretização do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito, com atributos de direito constitucional consagrado e, sendo como vimos que é, a administração tributária que tem o ónus de demonstrar que efetuou a notificação de forma correta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais, forçoso se torna concluir, que in caso, não logrou demonstrar que cumpriu esse ónus, incorrendo no vicio de falta de notificação para o exercício do direito de audição que lhe vem assacado.

A falta de notificação para o exercício do direito de audição gera a invalidade do despacho de reversão proferido (invalidade, que se traduz na anulabilidade do despacho) e, assim não tendo decidido, a sentença recorrida não poderá, nesta parte, ser mantida.

A revogação da decisão com fundamento em vício formal do despacho de reversão terá que ter como consequência não só a anulação do ato de reversão, como também a absolvição do oponente da instância executiva, deixando, deste modo prejudicados os demais vícios invocados, face à falta de legitimidade processual do recorrente.

Procede assim as conclusões recursivas que vimos de analisar.

Aqui chegados, resta-nos decidir no sentido da procedência parcial do recurso e da revogação parcial da decisão recorrida, nos termos em que a seguir se procederá.

3 - DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência, os juízes da 1.ª subsecção de Contencioso Tributário deste Tribunal Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso e em consequência:
- revogar a sentença recorrida, quanto à prescrição da divida exequenda de IVA e IRC do exercício de 2002, declarando-se prescritas as dividas e extinta a execução fiscal, nessa parte;
- a anular do despacho de reversão, por falta de notificação para o exercício do direito de audição, com a respetiva absolvição do recorrente na ação executiva.

Custas pela recorrida em primeira instância.

Lisboa, 29 de abril de 2021
­­­­

[A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Senhoras Desembargadoras Ana Cristina Carvalho e Ana Pinhol]


Hélia Gameiro Silva

(Assinado digitalmente)





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(1) Vide neste sentido a título exemplificativo, os acórdãos daquele tribunal proferido em: 26/11/2008 no Processo n.º 0598/08; em 20/05/2009 no Processo n.º 0293/09; em 25/06/2009 no Processo n.º 01109/08; em 30/06/2010 no Processo nº 0201/10; em 17/03/2011 no Processo n.º 0177/11 e em 26/06/2013 no Processo n.º 0489/13.
(2) In “Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária”, 2.ª edição, 2010, aumentada e melhorada - Áreas Editora, pag. 78 e 79.
(3) Aqui entendido, não como o serviço onde deva ocorrer a execução, mas a entidade que o dirige, conforme explica Jorge Lopes de sousa in CPPT Anotado e Comentado – 6.ª Edição 2011 Vol. III, nota 6, pag. 45.
(4) Consagrado no artigo 163.º do novo CPA