Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 908/10.5BELRS |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 10/31/2019 |
Relator: | MÁRIO REBELO |
Descritores: | INATIVIDADE DA DEVEDORA |
Sumário: | 1. Se a sociedade apenas cessou a atividade em 5/12/2008, o Impugnante, pretendendo afastar a liquidação relativa a anos anteriores, deveria ter demonstrado que não teve nos exercícios em causa qualquer atividade nem gerou rendimentos. 2. Tratando-se de facto extintivo do direito à liquidação, estava o Impugnante onerado com a prova desse facto, como resulta do art.º 74º/1 LGT em sintonia com o disposto no art. 342º/2 do Código Civil. 3. Não provando a inatividade da devedora originária, a falta de prova deverá ser valorada contra aquele a quem aproveita. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:
RECORRENTE: Autoridade Tributária e Aduaneira I. Face aos factos firmados não poderia o respeitoso tribunal a quo, decidir como fez, pois face aos elementos disponibilizados pela administração fiscal nas diversas informações prestadas nos autos, e à falta de contestação ou impugnação por parte do impugnante, parece-nos que o facto da sociedade ter apresentado o modelo 22 relativamente aos anos de 2005 e 2006 não é um facto controvertido, pelo que a conclusão a retirar deveria ser outra. II. Resulta dos autos nomeadamente da informação realizada pelo serviço de finanças de Lisboa 4, no âmbito da reversão do impugnante, que relativamente ao IRC da devedora originária, a mesma, entregou as declarações do Modelo 22 de 2001 a 2006, consta também nessa informação que a empresa foi encerrada em 05-12- 2008. III. Termina a informação com a seguinte formulação: “Quanto às dívidas provenientes do IRC, consultado o registo das declarações, verifica-se que a declarações de rendimentos foram apresentadas pelo sujeito passivo. É de referir que as declarações referentes aos anos de 2004 e seguintes, não produziram o efeito pretendido, uma vez que a firma em causa se encontrava no regime simplificado, como já referido, sendo o regime o apuramento do lucro tributável feito por métodos indirectos, com o montante mínimo igual ao valor anual do salário mínimo nacional mais elevado, como prevê o disposto no n.º 1 e 4 do artigo 53.º CIRC.” IV. “Face ao exposto, as liquidações efectuadas pelos Serviços de Cobrança (IRC de 2001, 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006) são devidas e exigíveis, pelo que sou de parecer que as alegações do requerido neste tipo de dívidas não poderão ter acolhimento.” V. Igualmente na informação da Divisão da Justiça Contenciosa, para a qual foi remetida a contestação, consta no ponto 33.º, o seguinte: “Deste modo, nas liquidações dos exercícios de 2004 a 2006, efectuadas também com base nas declarações entregues pelo próprio, foi tributado ao abrigo desse regime simplificado, que tem sempre presumido como montante mínimo o valor anual do salário mínimo nacional mais elevado (365,60€X14=5.118,40€ em 2004;374,70X14=5.245,80€ em 2005 e 385,90X14=5.402,60€ em 2006).” VI. Diz o impugnante em requerimento de resposta à contestação da Fazenda Pública, que entrou para a sociedade em 19/12/2001 (portanto após o referido trespasse de 13/07/2000, que é motivador da ausência de atividade), por lhe ter sido pedido pelo sócio-gerente Dr. A…….. . VII. Ora precisamente a pessoa que consta como representante legal da sociedade, com o contribuinte n.º 168865… e que subscreveu todas as declarações de IRC, juntamente com o TOC (com o contribuinte n.º 135828…), apresentadas pela sociedade em 2006 e 2007, relativas aos períodos contabilísticos de 2005 e 2006 e objeto dos presentes autos. VIII. No sistema de declarações de IRC, a sociedade P….. B….. Lda. entregou as declarações de modelo 22, através de internet, constando a data de submissão em 31 de Maio de 2006 e de 2007, portanto os valores colocados nessas declarações fictícios ou não, são da responsabilidade total do sujeito passivo e carreados para a esfera fiscal, pela própria sociedade, através do seu representante legal e do TOC (facto que não era controvertido, surgindo agora a necessidade, nesta fase da junção dos documentos demonstrativos da verdade material cfr. Doc. 1, 2 e 3). IX. As liquidações foram realizadas pelo próprio sujeito passivo, nos termos do n.º 1 do artigo 89.º do CIRC e de acordo com o constante no artigo 120.º do CIRC, pelo que não poderão ser consideradas ilegais. X. Não sendo correto fixar como matéria de facto assente, que a A.T. procedeu às liquidações de IRC (ponto M.) porquanto foram entregues pelo próprio sujeito passivo. XI. Facto que é coerente em todas as informações prestadas no processo de impugnação por parte da administração fiscal, não existindo neste âmbito qualquer divergência. XII. O impugnante também afirma na sua petição que a sociedade exerceu aquela atividade até meados de 2000, no entanto, como se verifica nos autos, nomeadamente na declaração de IRC, a título de exemplo, relativa ao ano de 2002, frui a sociedade de um lucro tributável no valor de €1.707,72. XIII. Neste seguimento é nossa convicção que a decisão da douta sentença não se poderá manter, quando a realidade é apenas uma: a de que foi a sociedade devedora originária que apresentou as declarações de IRC que vieram a originar as liquidações impugnadas. XIV. Note-se que o segmento decisório que motiva a anulação das liquidações controvertidas é precisamente o não exercício do objecto social, que não ficou devidamente demonstrado e provado pelo impugnante. XV. Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo, lavrou em erro de interpretação e aplicação do direito e dos factos, nos termos supra explanados, assim como não considerou nem valorizou como se impunha os elementos carreados para os autos. XVI. Com o devido respeito, que é muito, decidindo como decidiu, o Tribunal a quo não apreciou acertadamente todos os elementos reproduzidos nos autos e que fazem parte do processo, fazendo, por isso, errada aplicação do enquadramento factual com as normas legais. TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DEVE A DOUTA SENTENÇA, ORA RECORRIDA, SER REVOGADA, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA! CONTRA ALEGAÇÕES. Não houve. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida. II QUESTÕES A APRECIAR. O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao julgar parcialmente procedente a impugnação e determinar a anulação das liquidações de IRC de 2004 a 2006. III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO. A sentença fixou os seguintes factos provados: A) A sociedade por quotas denominada P….. B…., Lda encontrava-se colectada para o exercício de outro comércio a retalho de produtos alimentares, em estabelecimentos especializados, CAE 47…, desde 09-03- 1989, tendo cessado a actividade em 05-12-2008 N) Em virtude das liquidações não terem sido pagas foi instaurado o processo de execução fiscal nº 3301200101033… e apensos, para cobrança das seguintes dívidas: “Texto Integral com Imagem”
O) No processo de execução fiscal identificado no ponto anterior foi lavrado despacho de reversão da dívida exequenda contra A…… (ou impugnante), nos termos de fls 19 dos autos, que aqui se dá por inteiramente reproduzido; IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO. A…….., na qualidade de sócio gerente da sociedade “P….. B….., Lda” deduziu impugnação judicial contra a liquidação oficiosa de IRC referente aos anos de 2000 a 2006 alegando em síntese ter exercido a actividade até meados de 2000, mas que, por escritura de 13 de julho do mesmo ano trespassou o estabelecimento comercial onde exercia a sua actividade à “C…. da S…. – O…. N…. da S…., S.A.”, o qual englobou todos os elementos que o integravam. E a partir do trespasse nunca mais a dita sociedade exerceu qualquer actividade, tendo sido dissolvida administrativamente em 5 de dezembro de 2008. Por isso, nos anos a que respeita o imposto não exerceu qualquer actividade, nem auferiu quaisquer proveitos nem obteve lucros sujeitos a IRC. Além disso, o imposto referente a 2000 2001 está prescrito. Contestou o Exmo. Representante da Fazenda Pública remetendo para os fundamentos constantes da informação elaborada pela secção de justiça Contenciosa da Direção de Finanças. Em articulado que apelidou de informação após receção de “...cópia da contestação apresentada pelo representante da Fazenda Pública” o Impugnante acrescentou, em síntese, ter entrado para a sociedade em 19 de dezembro de 2001, após cessação da actividade da sociedade, a solicitação do sócio gerente naquela data, Dr. A……, a fim de o cedente da quota poder resolver problemas familiares que tinha pendentes, sendo certo que o Impugnante nunca recebeu quaisquer proveitos daquela sociedade a título de salários ou dividendos. Por sentença de 13/5/2018, proferida no TAF de Lisboa, o MMº juiz declarou a inutilidade superveniente da lide em relação ao pedido de anulação das liquidações de 2000, por ter sido já anulada pela AT, manteve as liquidações relativas a 2001 a 2003 e anulou as liquidações referentes aos anos de 2004 a 2006, por serem ilegais. O Exmo. Representante da Fazenda Pública discorda. Baseia-se na informação do Serviço de Finanças segundo a qual a devedora originária entregou as declarações Mod. 22 nos anos de 2001 a 2006, e que a empresa só foi encerrada em 5/12/2008. E também que não é correto dar como assente que a AT procedeu às liquidações de IRC (ponto M) porquanto foram as declarações entregues pelo próprio sujeito passivo que estão na origem das liquidações impugnadas. Juntou com as alegações cópia de print do sistema de consulta de declarações entregues pelo sujeito passivo e comprovativos de entrega das declarações modelo 22 relativas aos anos de 2005 e 2006, via internet. A junção dos documentos, destina-se, diz, ao apuramento da verdade material, nos termos do art.º 13º do CPPT. Mas a requerida junção dos documentos não pode ser admitida. Nos termos do artigo 108º/3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e do artigo 423º/1 do CPC, a regra é a de os documentos serem apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes. Ou seja, com a petição inicial, caso visem fazer prova dos fundamentos da acção, podendo, contudo, ser apresentados até 20 dias antes da data que se realize a audiência final. No contencioso tributário a junção pode ser feita até ao encerramento da discussão da causa em 1ª instância, que ocorrerá com o termo do prazo para alegações, sujeito ao pagamento de multa, caso a parte não prove que os não pôde oferecer com o articulado. cfr. artº 423º/2 do CPC. Decorrido tal prazo, só serão admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária, em virtude de ocorrência posterior. (cfr. art. 423.º/3 do CPC.) Após o encerramento da discussão só são admitidos, no recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento (art.º 425º CPC) Ou, como dispõe o nº 1 do artigo 651.º do mesmo diploma ” as partes só podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º do CPC ou no caso da junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1.ª instância.” Resulta assim claro que em sede de recurso a junção de documentos assume carácter excecional, só devendo ser consentida nos casos especialmente previstos na lei (artº 651º/1, CPC). A sentença recorrida foi proferida em 13/5/2018, mas todos os documentos têm datas de 2006 e 2007. Por conseguinte, o Recorrente não estava impedido de os apresentar até à data da sentença em primeira instância, podendo os mesmos influenciar a decisão recorrida. Tão pouco alega a sua superveniência, nem pode invocá-la porque não se trata de superveniência objectiva nem subjectiva, pretendendo somente que este TCA proceda a novo julgamento da matéria de facto. Assim sendo, o pedido de junção dos documentos, em sede de recurso, não cumpre os requisitos previstos nos art.º 651.º do CPC, pelo que não se admite a sua junção. E assim, consideramos estabilizada a matéria de facto fixada em primeira instância, o que nos permite avançar para a questão de direito que nos é submetida. O Impugnante deduziu impugnação judicial contra as liquidação oficiosas de IRC relativas aos anos de 2000 a 2006 porquanto, segundo alegou, a sociedade devedora originária esteve inativa desde 2000, não gerando quaisquer proveitos sujeitos a tributação. Juntou cópia da escritura de cessão de posição de arrendatário e alteração de arrendamento, celebrada em 13 de julho de 2000, nos termos da qual os gerentes em representação da sociedade “P….. B…..” cederam a posição de arrendatário à sociedade comercial anónima “C…. da S…. – O…. N…. da S…., S.A.”. A junção da escritura não prova mais do que o que nela consta, ou seja que houve cessação da posição contratual de arrendatária. Não prova, de modo algum, que a sociedade esteve inativa nos anos cujas liquidações se impugnam. E tanto assim é que a AT juntou aos autos cópias de declarações Mod. 22 de IRC relativas aos exercícios de 2000 a 2002, apresentadas pelo representante legal da devedora originária, com apuramento de imposto a pagar. (factos provados C) a H). Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAS em revogar a sentença recorrida, na parte impugnada, e julgar improcedente a impugnação quanto às liquidações relativas a 2001 a 2006. Mantendo-se por conseguinte, a inutilidade superveniente da lide em relação á liquidação de 2000, em virtude de ter sido já anulada. Custas pelo Recorrido em ambas as instâncias, desonerando-se apenas do pagamento da taxa de justiça neste TCA por não ter contra alegado. Em primeira instância, a AT suporta as custas relativas à extinção da instância por inutilidade superveniente da lide referente à liquidação de 2000. Lisboa, 31 de outubro de 2019. (Mário Rebelo) (Patrícia Manuel Pires)(José Vital Brito Lopes) |