Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:116/18.7BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:12/13/2019
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE DECISÃO ARBITRAL;
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário:I. Ocorre omissão de pronúncia prevista na segunda parte da alínea c), do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questão colocada pelas partes, não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento, nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento.
II. A omissão de pronúncia, constitui um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de actividade que afecta a validade da decisão.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACÓRDÃO


I.RELATÓRIO
A DIRECTORA-GERAL DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA inconformada com a decisão do Tribunal Arbitral proferida no processo arbitral nº 42/2018-T que julgou procedente o pedido de anulação do acto de liquidação adicional de IRC, referente ao exercício de 2014, deduzido pela sociedade «C.........., SA», vem, ao abrigo do preceituado no artigo 27.º do Decreto-Lei n°10/2011, de 20 de Janeiro do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (doravante, RJAT), interpor impugnação de tal decisão, finalizando o seu articulado inicial com a formulação das seguintes conclusões:

«A) A decisão arbitral ora impugnada ao ter deliberado “a) Julgar procedente o pedido arbitral no tocante à dedutibilidade à coleta da derrama municipal de crédito de imposto por dupla tributação internacional, sendo, nessa medida, anulada a liquidação impugnada, com todas as consequências legais;
b) Consequentemente, anular a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada pela requerente, cometeu omissão de pronúncia ao não se ter pronunciado sobre questão que devia ter conhecido, como seja, uma questão prévia/excepção e uma questão de inconstitucionalidade, caso fosse acolhida a interpretação defendida pela então requerente.
B) Na verdade, na sua resposta e alegações, a AT invocou, desde logo, uma questão prévia/ excepção que obstava ou ao conhecimento do mérito do pedido ou que determinava a suspensão da instância arbitral.
C) Ora, sobre esta questão de suspensão de instância ou mesmo de litispendência, o Tribunal arbitral não emitiu qualquer pronúncia.
D) Sendo certo que tal questão não ficou prejudicada pela solução dada à interpretação que o Tribunal arbitral fez da referida al. b) do nº 1 do art. 91º do CIRC, antes pelo contrário, impunha-se ao Tribunal Arbitral que conhecesse de tal questão prévia, uma vez que ela precede o conhecimento do mérito do pedido e podia mesmo determinar a suspensão da instância ou a absolvição da então requerida da instância, sem que, por isso, o Tribunal Arbitral tivesse que emitir decisão quanto ao mérito da causa.
Por outro lado:
E) Na sua resposta e nas suas alegações, a AT também invocou que a interpretação defendida pela requerente, de que a derrama municipal, à semelhança da derrama estadual, integra o cálculo da “fracção do IRC” prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 91.º do Código do IRC, independentemente de os rendimentos serem obtidos em países com os quais Portugal celebrou, ou não, CDT, viola o princípio da igualdade e da legalidade tributária no seu corolário da indisponibilidade do crédito tributário.
F) Ora, sobre esta questão de inconstitucionalidade, onde, como se viu, foram arguidas violações do princípio da igualdade e da legalidade, tendo em conta uma determinada interpretação da al. b) do nº 1 do art. 91º do CIRC que a então requerente defendia e que viria a ser acolhida pelo Acórdão arbitral ora impugnado, o Tribunal arbitral não emitiu qualquer pronúncia.
G) Sendo certo que tais questões de inconstitucionalidade não ficaram prejudicadas pela solução dada à interpretação que o Tribunal Arbitral fez da al. b) do nº 1 do art. 91º do CIRC, antes pelo contrário, impunha-se que o Tribunal Arbitral, feita a interpretação que defende, conhecesse da questão de inconstitucionalidade invocada pela então requerida.
H) Donde, existe omissão de pronúncia, por a decisão arbitral não ter conhecido e decidido sobre questões devidamente individualizadas e concretizadas pela AT, na sua resposta (arts. 12º a 18º quanto à questão prévia, e arts. 124º a 143º, quanto à questão de inconstitucionalidade) e nas suas alegações (arts.12º a 18º quanto à questão prévia e artigos 125º a 142º quanto à questão de inconstitucionalidade), sendo certo que se devia ter pronunciado sobre as mesmas, já que importavam à boa decisão da causa e não ficaram prejudicadas pela solução encontrada pelo Tribunal Arbitral quanto à interpretação que foi dada à al. b) do nº 1 do art. 91º do CIRC.
V) Do pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça:
Finalmente, tendo em conta que o valor do recurso é superior a 275.000,00€ vem a ora impugnante requerer que seja emitida pronúncia e que seja deferida a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do nº 7 do art. 6º do RCP, uma vez que, estamos em sede de impugnação de decisão arbitral, não há lugar à produção de prova testemunhal e se pede que o Tribunal analise e decida sobre questão que não se afigura revestir grande complexidade, não se justificando, pois, que a impugnante seja onerada com o pagamento de um remanescente tão elevado, cfr. art. 6º nº 7 do RCP.

Termos pelos quais e, como o douto suprimento de V. Ex.as, incorrendo a decisão arbitral ora impugnada no vício de omissão de pronúncia, deve a mesma ser anulada, com todas as legais consequências.»

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Admitida a Impugnação e notificada a Impugnada, «C.........., SA» optou por não apresentar resposta.
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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificado para o efeito, considerou não estarem em causa Direitos Fundamentais dos Cidadãos, interesses públicos especialmente relevantes ou algum dos bens e valores previstos no artigo 9º, nº 2 do CPTA, razão pela qual não emitiu pronúncia sobre o mérito do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DA IMPUGNAÇÃO
Face às conclusões extraídas pela impugnante da respectiva motivação, a única questão a decidir é a de saber se a decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 42/2018-T, padece do vício de omissão de pronúncia.

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III. FUNDAMENTAÇÃO
A. DOS FACTOS
Na decisão impugnada fixou-se a matéria de facto nos seguintes termos: (que, por nossa iniciativa, se reordena a partir da alínea h), inclusive, face ao manifesto lapso de escrita):
«a) Requerente foi alvo de uma inspeção incidente sobre o IRC, na sequência da Ordem de Serviço nº OI 2016......
b) No Relatório de Inspeção Tributária propôs-se duas correções ao lucro tributável, das quais resultou imposto a pagar no valor total de € 732.059,01, uma relativa à (não) dedução de crédito por dupla tributação internacional e outra relativa à (não) dedução de crédito fiscal extraordinário ao investimento.
c) A Requerente regularizou voluntariamente o imposto devido em razão desta última correção.
d) A Requerente reclamou graciosamente da parte da liquidação ora impugnada, tendo sido comunicado o indeferimento pelo oficio n.º ....., de 9/11/2017.
e) A Requerente é titular de um crédito por dupla tributação internacional, resultante do imposto incidente sobre lucros que obteve em Angola e que integram a matéria coletável do seu IRC, no exercício em causa.
g) Entre Portugal e Angola não foi celebrada uma CDT.
g) A questão que se suscita nos presentes autos foi apreciada e decidida no processo arbitral proc. n.º 340/2017 -T, do qual a Requerente foi também autora, estando então em causa uma liquidação adicional relativa ao exercício de 2013.
Os factos dados como provados estão documentalmente provados, havendo sobre ele consenso das partes.
Não foram dados como não provados quaisquer factos relevantes para a boa decisão da causa..»
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B. DO DIREITO
Como ponto prévio sublinharemos que o regime da arbitragem voluntária em direito tributário foi introduzido pelo Decreto-Lei n°10/2011, de 20 de Janeiro do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), sendo que os Tribunais arbitrais têm competência para apreciar um conjunto vasto de pretensões, as quais vêm taxativamente elencadas na enumeração constante do artigo 2º, nº.1, do citado diploma. Mais se dirá que o Tribunal arbitral tem a obrigação de decidir em conformidade com o direito constituído e não com recurso à equidade (cfr.artigo 2º, nº.2, do RJAT).
Os princípios processuais inerentes ao processo arbitral vêm referidos e elencados no artigo 16º, do RJAT, e, genericamente, são os mesmos princípios que se aplicam a um processo de partes, de que é exemplo o processo civil.
No que toca à possibilidade de recorrer de uma decisão proferida por um Tribunal arbitral pode, desde logo, referir-se que esta é muito limitada.
Assim, quando se tiver em vista controlar o mérito da decisão arbitral, isto é, o seu conteúdo decisório, o meio mais adequado para colocar em crise a decisão arbitral será o recurso.
Com efeito, em conformidade com o que se dispõe no artigo 25º, nº.1, do RJAT, é possível recorrer directamente para o Tribunal Constitucional da parte da decisão arbitral que ponha termo ao processo e que recuse a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, bem como nos casos em que aplique uma qualquer norma jurídica cuja inconstitucionalidade seja levantada no decurso do processo.
Por outro lado, admite-se ainda a possibilidade de recurso com fundamento em oposição de acórdãos, isto nos termos do que determinam os nºs.2 e 3, do artigo em apreço. Este recurso é endereçado à Secção Tributária do Supremo Tribunal Administrativo, sempre que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida estiver em oposição, relativamente à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido ou pelo Tribunal Central Administrativo ou Supremo Tribunal Administrativo. Neste caso, os trâmites do recurso a observar são os do regime dos recursos para uniformização de jurisprudência, aplicando-se o disposto no artigo 152º, do CPTA.
Note-se que, em termos práticos, só há uma via de recurso: ou directamente para o Tribunal Constitucional, com fundamento em (in)constitucionalidade, ou directamente para o Supremo Tribunal Administrativo, em caso de oposição de acórdãos.
Pelo contrário, quando se pretenda controlar a decisão arbitral em si, nos seus aspectos de competência, procedimentais e formais, o meio adequado será já a impugnação da decisão arbitral (cfr.artigos 27º e 28º, do RJAT).
Nos termos da lei, a regra é que é possível que a decisão do Tribunal arbitral seja anulada pelo Tribunal Central Administrativo competente. Esta impugnação - que em bom rigor se trata de um recurso - deve ser deduzida, sob pena de não admissão por intempestividade, no prazo de quinze dias contados da notificação da decisão arbitral, ou da notificação referida no artº.23, do diploma em apreço. Porém, neste último caso, a decisão arbitral terá que ter sido proferida por Tribunal colectivo, cuja constituição tenha sido requerida nos termos do artigo 6º, nº.2, al.b), do RJAT.
Já no que toca aos fundamentos da impugnação da decisão arbitral, vêm estes elencados no texto do artº.28, nº.1, do RJAT. São eles, taxativamente, os seguintes:
1-Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
2-Oposição dos fundamentos com a decisão;
3-Pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia;
4-Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artigo 16º, do diploma.
Ou seja, os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais arbitrais para os T. C. Administrativos, consistem na impugnação de tal decisão, consagrada no artigo 27º, com os fundamentos que se ancorem nos vícios de forma expressamente tipificados no artigo 28º, nº.1, e atrás elencados, correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos Tribunais tributários, nos termos do plasmado no artigo 125º, nº.1, do CPPT com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do artigo 615º, nº.1, do CPC.
Tal como resulta das conclusões da alegação da presente impugnação, a Impugnante, entende que a decisão impugnada não se pronuncia, como devia, sobre todas as questões que eram suscitadas na resposta, no que se refere à « suspensão da instância ou mesmo de litispendência» e «violação ao principio da igualdade e da legalidade».
.Aqui chegados, vejamos então se a decisão proferida no processo arbitral nº42/2018-T do CAAD enferma ou não do apontado vício, ou seja, se deixou se pronunciar sobre qualquer questão de que não pudesse deixar de conhecer, como pretende a Impugnante.
Nos termos do preceituado no artigo 615.º, nº.1, al.d), do Código Processo Civil (CPC), é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artigo 608º, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente).
Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de petitionem brevis, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125, nº.1, do CPPT, no penúltimo segmento da norma.
Mais se dirá que a sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Trata-se, em qualquer caso, nesta nulidade, de falta de pronúncia sobre questões e não de falta de realização de diligências instrutórias ou de falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas.
Mais, a nulidade de omissão de pronúncia impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr. artigo 608.º, nº.2, do CPC), a omissão de tal dever não constituirá nulidade da sentença, mas sim um erro de julgamento.
Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artigos 577.º e 578.º, do CPC), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artigo 133º, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac. T.C.A.Sul-2.ªSecção, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365).
Como já referimos e aqui reiteramos, entende a Impugnante que a Decisão Arbitral em crise é nula por omissão de pronúncia, porquanto deixou de se pronunciar sobre questões suscitadas no articulado de resposta ao pedido arbitral, a saber: «suspensão da instância ou mesmo de litispendência», bem como da violação dos Princípios da Igualdade e Legalidade.
Comecemos pelo primeiro argumento apresentado.
Compulsada a resposta ao pedido de pronúncia, verifica-se que a Impugnante, sob o título de «Questão Prévia», articulou o seguinte:
« 9.
Em 24-05-17, fazendo fé no carimbo aposto na margem superior direito do duplicado da petição inicial, apresentou a Requerente acção administrativa especial, Processo n.° 400/17.7BEPNF, que corre termos na 2a UO do TAF de Penafiel contra a decisão datada de 24-03-17, relativa ao enquadramento jurídico-tributário dos factos constantes do pedido de informação vinculativa apresentado em 01-03-17. (cfr. doc. 4)
10.
Na referida acção pretende a Requerente obter a anulação de tal decisão, bem como, obter o “reconhecimento do enquadramento jurídico-tributário dos factos constantes do referido pedido de informação vinculativa apresentado em 1 de março de 2017 (...) e, consequentemente, o direito da C..... a incluir na fração do IRC a derrama municipal, em relação aos rendimentos obtidos em territórios com os quais Portugal não celebrou Convenção para Evitar a Dupla Tributação, para efeitos da alínea b) do n.° 1 do artigo 91.° do Código do IRC”, (cfr. doc. 5)
11.
A Directora- Geral da AT foi citada para a referida acção administrativa especial em 5/06/17. (cfr. doc. 6)
12.

Verifica-se, pois, que o presente PPA vem repetir uma acção em tudo idêntica a outra que corre termos no TAF de Penafiel sob o n° 400/17.7BEPNF.


13.
Efetivamente, naquela acção, a Requerente pretende que lhe seja reconhecido o direito a incluir na fração do IRC a derrama municipal, em relação aos rendimentos obtidos em territórios com os quais Portugal não celebrou Convenção para Evitar a Dupla Tributação, para efeitos da alínea b) do n.° 1 do artigo 91.° do Código do IRC.

14.


Enquanto que no presente PPA a Requerente pretende obter a anulação do acto de liquidação que concretiza o entendimento da AT sobre a questão de facto e de direito que sustenta o indeferimento do pedido de informação vinculativa, pretendendo, igualmente, obter o mesmo efeito jurídico.

15.

Isto é, pretende que as liquidações de IRC sejam efetuadas de modo a que seja incluída na fração do IRC para efeitos da alínea b) do n° 1 do artigo 91.° do CIRC, a derrama municipal.


16.

Aliás, a causa de pedir é semelhante em ambas as acções, sendo expendida a mesma argumentação de direito quer na acção administrativa especial quer no presente pedido de constituição de Tribunal Arbitral.

17.

Assim, ainda que não exista litispendência, existe seguramente uma relação de manifesta prejudicialidade entre o presente PPA e a referida acção administrativa especial, uma vez que, em ambas as acções está em causa a análise, quanto aos mesmos sujeitos, da mesma causa de pedir o que implica que ambos os tribunais esteiam perante a circunstância de analisarem a mesma questão jurídica e de produzirem decisões que podem até vir a ser contraditórias.
18.
Entendemos, pois, que ocorre uma relação de prejudicialidade entre o presente PPA e a referida acção administrativa especial n.° 400/17.7BEPNF, o que justifica a suspensão da presente instância, nos termos do artigo 272.° do CPC até que seja proferida decisão, no âmbito daquela acção n° 400/17.7BEPNF.».
Face à argumentação expendida e supra transcrita, veio a Impugnante requerer, a final, a procedência da excepção invocada ou, caso assim não se entendesse, fosse « suspensa instância até que seja proferida decisão sobe tal questão no âmbito da acção administrativa especial n.º 400/17.7BEPNF (…)».
Ora, resulta claro da leitura da decisão impugnada que o Tribunal Arbitral não se pronunciou quanto à questão que estava expressamente densificada na resposta (artigos 9.º a 18.º) ao pedido de pronúncia arbitral e posteriormente inscrita nas respectivas alegações (artigos 9.º e 19.º) nem tão pouco a elencou nas questões decidendas.
Nas circunstâncias descritas, é patente que a decisão arbitral em apreço não abordou a "questão" da litispendência, e era obrigada a tal, pois que aquela "questão" (a litispendência constitui uma excepção dilatória cuja verificação obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância - artigos 576.º, n.º 2, e 577.º, alínea i), do CPC) era uma verdadeira questão, e não um simples argumento invocado pela Impugnante.
De igual modo, também não se pronunciou quanto ao pedido de suspensão da instância.
Com esta evidência, estamos perante um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de actividade que afecta a validade da decisão por força do artigo 615º, nº 1, alínea d) do CPC.
Nestes termos, procede a arguida nulidade na parte aqui apreciada.
Esta conclusão, prejudica a apreciação do conhecimento centrado em torno da alegada omissão de pronúncia, no que se refere à violação dos princípios da igualdade e da legalidade.
No que concerne ao pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, formulado ao abrigo do artigo 6.º, nº.7, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), no âmbito da instância arbitral, como este Tribunal Central Administrativo tem vindo a afirmar, o mesmo não logra aplicação no âmbito da instância arbitral, ao invés do que sucede na presente instância (vide, por todos, o Acórdão de 29.6.2016, proferido no âmbito do processo n.º 9420/16).
Significa isto que, perante este quadro, não tem suporte legal a pretensão formulada.
IV.CONCLUSÕES
I. Ocorre omissão de pronúncia prevista na segunda parte da alínea c), do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questão colocada pelas partes, não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento, nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento.
II. A omissão de pronúncia, constitui um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de actividade que afecta a validade da decisão.
V. DECISÃO
Pelo exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, julgar procedente a presente impugnação, declarar nula a decisão arbitral proferida no processo nº.40/2018-T, determinando-se, a baixa dos autos ao Centro de Arbitragem Administrativa.

Sem custas.
Lisboa, 13 de Dezembro de 2019

Ana Pinhol

Isabel Fernandes

Catarina Almeida e Sousa