Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07267/13
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:03/27/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:NULIDADE DA SENTENÇA DEVIDO A FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE FACTO E DE DIREITO.
ARTº.100, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO. PRINCÍPIO “IN DUBIO CONTRA FISCUM”.
ARTº.15, DO DEC.LEI 13/71, DE 23/1, COM A REDACÇÃO DO ARTº.1, DO DEC.LEI 25/2004, DE 24/1.
AUTORIZAÇÃO OU LICENCIAMENTO DE ESTABELECIMENTOS OU AMPLIAÇÃO DE POSTOS DE COMBUSTÍVEL.
NOÇÃO DE TAXA. A TAXA SITUA-SE APENAS NO DOMÍNIO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DIVISÍVEIS.
CONCEITO DE BOMBA ABASTECEDORA DE COMBUSTÍVEL.
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA.
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PROPORCIONALIDADE.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO ENQUANTO FUNDAMENTO DE PROCESSO DE IMPUGNAÇÃO.
REGIME DE CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO APLICÁVEL ÀS TAXAS.
CÔMPUTO DO PRAZO DE CADUCIDADE A PARTIR DO MOMENTO EM QUE O DIREITO PODE SER EXERCIDO (CFR.ARTº.329, DO C.CIVIL).
Sumário:1. Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação. No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário.
2. O artº.100, nº.1, do C.P.P.Tributário, constitui uma afloração do princípio “in dubio contra fiscum”, vigente no momento da decisão sobre facto incerto na aplicação da lei e com alcance análogo ao do princípio “in dubio pro reo” no que respeita à apreciação da prova em processo penal. Tal princípio leva a que o interesse substancial da justiça domine o actual processo tributário em detrimento do mero interesse formal ou financeiro do Estado. Este princípio consubstancia uma aplicação no processo de impugnação judicial da regra geral sobre o ónus da prova no procedimento tributário enunciada no artº.74, nº.1, da L.G.T., em que se estabelece que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Cânone este também aplicável ao processo judicial tributário. Saber se, perante a prova produzida, há dúvidas sobre a existência ou quantificação de um facto tributário é uma questão essencialmente de facto. Assim, se o Tribunal decidiu dar como provada a existência ou inexistência de um facto tributário não haverá lugar à aplicação desta norma. Só em situações em que não houver a certeza se existe ou não o facto deverá fazer-se aplicação desta regra sobre o ónus da prova, decidindo a questão contra quem tem tal ónus.
3. A "EP-Estradas de Portugal, S.A." continua a deter as atribuições previstas no artº.15, do dec.lei 13/71, de 23/1 (com a redacção do artº.1, do dec.lei 25/2004, de 24/1), de autorização ou licenciamento de estabelecimentos ou ampliação de postos de combustível, instalados na sua área de jurisdição, bem como a liquidar e a cobrar as correspondentes taxas por esses factos devidas.
4. A taxa situa-se apenas no domínio dos serviços públicos divisíveis. Na verdade, existem actividades públicas ditas indivisíveis, dado que o benefício para os particulares das mesmas resultante tem carácter genérico (v.g.defesa nacional; actividade legislativa; actividade diplomática). Porém, existem muitas outras actividades e serviços públicos de que os particulares podem extrair vantagens individualmente consideradas, pelo que, nesses casos, há a possibilidade de realizar a respectiva cobertura financeira, total ou parcialmente, mediante a criação de taxas (v.g.propinas da instrução pública; custas da justiça; portagens pagas nas vias de comunicação).
5. Actualmente, a taxa pode definir-se como uma prestação coactiva, devida a entidades públicas, com vista à compensação de prestações efectivamente provocadas ou aproveitadas pelos sujeitos passivos. Em contraste com o imposto de características unilaterais, a taxa caracteriza-se pela sua natureza cumutativa ou bilateral, devendo o seu valor concreto ser fixado de acordo com o princípio da equivalência jurídica. A natureza do facto constitutivo que baseia o aparecimento da taxa pode consistir na prestação de uma actividade pública, na utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares (cfr.artº.4, nºs.1 e 2, da L.G.Tributária; artºs.3 e 4, do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, aprovado pela Lei 53-E/2006, de 29/12; artº.15, nº.2, da L.F.L. aprovada pela Lei 2/2007, de 15/1).
6. A tributação por cada um dos equipamentos (bomba abastecedora de combustível) que permitem o abastecimento de combustíveis, ao tempo em que a norma constante do artº.15, do dec.lei 13/71, de 23/1, foi criada, tende a equivaler hoje ao número de mangueiras existentes em cada local de abastecimento de combustíveis, em que cada mangueira, em regra, contém um diverso tipo de combustível, como é do conhecimento geral.
7. O princípio da proporcionalidade, é explicitado como princípio material informador e conformador da actividade administrativa, no artº.266, nº.2, da C.R.Portuguesa, assim implicando a juridicidade de toda a actividade da Administração (cfr.artº.5, nº.2, do C.P.A.). No âmbito do procedimento tributário, a consagração de tal princípio resulta do artº.55, da L.G.Tributária, tendo expresso desenvolvimento no artº.46, do C.P.P.Tributário. De acordo com o mesmo, na actuação administrativa terá de existir uma proporção adequada entre os meios empregues e o fim que se pretende atingir, obrigando a Administração Tributária a abster-se da imposição aos contribuintes de obrigações que sejam desnecessárias ou inadequadas à satisfação dos fins que aquela visa prosseguir ou que vão além do que seja necessário e adequado impor aos mesmos contribuintes.
8. O tributo previsto no artº.15, nº.1, al.k), do dec.lei 13/71, de 23/1, constitui uma taxa e não sofre de inconstitucionalidade orgânica devido a violação do princípio da legalidade tributária consagrado no nº.2, do artº.103, da C.R.Portuguesa, tal como de inconstitucionalidade material por violação do princípio da proporção entre a taxa e o benefício auferido pelo interessado que a paga.
9. Pode definir-se a caducidade como o instituto através do qual os direitos que, por força da lei ou de convenção das partes, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo seu não exercício durante o mesmo período. O instituto da caducidade tem por fundamentos vectores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere.
10. No que diz respeito ao direito tributário, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, matéria que não é de conhecimento oficioso, encontra actualmente consagração genérica no artº.45, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12, norma que vem consagrar um prazo de caducidade de quatro anos (cfr.anterior artº.33, nº.1, do C.P.Tributário, o qual consagrava o prazo de cinco anos). Face à redacção do aludido artº.45, da L. G. Tributária, é claro que, quer o exercício do direito à liquidação, quer a notificação do seu conteúdo ao contribuinte, e não apenas aquele primeiro acto, têm que ocorrer dentro do mencionado prazo de quatro anos contados do facto tributário, sob pena de operar a caducidade de tal direito. O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos.
11. A possibilidade de exame da caducidade do direito à liquidação pode verificar-se no âmbito do processo de impugnação, desde que estejamos perante situação que se reconduz à estruturação de liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo. Mais se dirá que a conjuntura de caducidade sob exame por contender com a legalidade, que não com a exigibilidade da dívida, deve visualizar-se como fundamento típico do processo de impugnação judicial e não do processo de oposição à execução fiscal.
12. No que, especificamente, diz respeito ao regime de caducidade do direito à liquidação aplicável às taxas, deve referir-se que o prazo geral de caducidade consagrado no artº.45, nº.1, da L.G.T., também se lhes destina, visto que aplicável a todos os tributos, na acepção do artº.3, do mesmo diploma legal. Mas somente aos impostos, que não às taxas, é aplicável o termo inicial da contagem desse prazo que se encontra consagrado no artº.45, nº.4, da L.G.T.
13. O prazo de caducidade de quatro anos previsto no citado artº.45, nº.1, da L.G.T., deve ter, no caso concreto, o seu termo inicial indexado à data do concreto conhecimento, por parte da entidade recorrida, do não cumprimento das regras de licenciamento previstas no dec.lei 13/71, de 23/1, tudo, de resto, de acordo com o princípio geral de cômputo do prazo de caducidade a partir do momento em que o direito pode ser exercido (cfr.artº.329, do C.Civil).


O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
“... - ... , S.A.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Beja, exarada a fls.294 a 310 do processo, através da qual julgou totalmente improcedente a impugnação visando acto de liquidação de taxa, efectuado pela sociedade recorrida "EP - Estradas de Portugal, S.A.", devida pela emissão da licença de ampliação do posto de abastecimento de combustíveis sito na EN 256, km 20,000, margem esquerda, Reguengos de Monsaraz, prevista no dec.lei 13/71, de 23/1, com nova redacção dada pelo dec.lei 25/2004, de 24/1, e no valor total de € 1.362,30.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.333 a 369 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-A sentença recorrida reflecte a ausência de análise crítica sobre todos os elementos de prova constantes nos autos, os quais são essenciais para provar a existência e os termos do pretenso facto tributário, sendo, nessa medida, nula por não especificação dos fundamentos de facto, nos termos dos artigos 123, nº.2, e 125, do CPPT;
2-Com efeito, como resulta da análise dos pontos 2 a 11 da matéria dada por provada na sentença recorrida, em 21 de Outubro de 2009, a entidade impugnada fiscalizou Posto de Abastecimento de Combustíveis localizado em Reguengo de Monsaraz, à margem da EN 256, ao Km 20,000, lado esquerdo, e concluiu que 8 das 9 mangueiras existentes estariam licenciadas em 1987, pelo que, notificou a recorrente para pagamento de € 1362,30 correspondente à legalização de 1 mangueira;
3-Da sentença recorrida não resulta a indicação do meio concreto de prova constante dos presentes autos, através do qual deu como provada uma alegada ampliação do Posto de Abastecimento em questão, nos termos e para os efeitos do artigo 115, nº.2, do CPPT, artigo 76, nº.1, da LGT, e artigo 362 e seg. do Código Civil;
4-O tributo em causa nos autos apenas se justifica pela verificação de dois factos, o licenciamento "ex novo" de um posto de abastecimento de combustíveis ou a ampliação do mesmo, conforme dispõe a alínea l), do nº.1, do artigo 15, do Decreto-lei 13/71, cabendo à entidade impugnada em sede da impugnação judicial apresentada pela recorrente, o ónus da prova da verificação dos pressupostos da tributação, nos termos do artigo 74, nº.1, da LGT;
5-O Tribunal "a quo" não deve ater-se apenas às informações produzidas pela entidade impugnada e presumir uma alegada ampliação do posto de abastecimento de combustíveis em questão, sem verificar a existência dos pressupostos da liquidação, em prol da descoberta da verdade material, nos termos dos artigos 111, nº.2, e 115, nº.2, do CPPT;
6-Como resulta da matéria dada como provada, a entidade impugnada no procedimento de liquidação em causa não considerou as realidades licenciadas posteriores a 1987, as quais constam dos Diplomas de Licença nº.9 e 34/2003, dados como reproduzidos nos nºs.11 e 12 da matéria dada como provada na sentença recorrida;
7-Assim, face à fundada dúvida sobre a existência e quantificação da alegada ampliação do posto de abastecimento em causa, deveria o Tribunal "a quo" ter declarado a presente acção procedente, ao abrigo do disposto nos artigos 74, da LGT, e 100, do CPPT;
7-A taxa de € 1.362,30 liquidada pela entidade impugnada carece, pois, de qualquer fundamento fáctico-legal;
8-Sobre a questão da incompetência absoluta geradora da nulidade assacada na impugnação, a sentença recorrida cingiu-se a seguir o Acórdão proferido pela 2a Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, no âmbito do processo n° 09389/12/11, datado de 7 de Fevereiro de 2013 e o douto parecer da Digna Procuradora da Republica de fls., cujo teor é inaplicável aos presentes autos pois apenas sustenta a sucessão das competências da Junta Autónoma de Estradas no IEP -Instituto de Estradas de Portugal, IP;
9-Nessa medida, a douta sentença recorrida entende, erradamente, que a criação do InlR- Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias, IP, operada pelo Decreto-Lei n° 148/2007 de 27 de Abril, não teria tido qualquer impacto nas atribuições e competências da Entidade Impugnada - transformada em Novembro de 2007 - erro que influí claramente na decisão de mérito nos presentes autos;
10-O erro em que incorre a sentença recorrida reside, precisamente, na tábua rasa que faz da circunstância de que a criação do InIR, operada pelo Decreto-Lei 148/2007, ocorreu previamente à transformação da EP - E.P.E. na entidade recorrida;
11-A EP - Estradas de Portugal, E.P.E., foi transformada em sociedade anónima pelo Decreto-Lei 374/2007, de 7 de Novembro - a entidade recorrida - e esta, embora tenha conservado os direitos e obrigações, legais e contratuais que integravam a esfera jurídica daquela, no momento dessa transformação já não se incluíam aí as atribuições e competências respeitantes aos licenciamentos em questão;
12-Com efeito, na data dessa transformação e na data da entrada em vigor das Bases da Concessão - 1 de Janeiro de 2008 - as atribuições e competências para o licenciamento de infra-estruturas ao longo das estradas nacionais já haviam sido transferidas para o InIR - em 1 de Maio de 2007 - por força dos Artigos 3, nº.3, al.e), e 23, nºs.1 e 2, do Decreto-Lei 148/2007;
13-Como resulta expressamente do preâmbulo do Decreto-Lei 380/2007, a supervisão das infra-estruturas rodoviárias - atribuída ao InIR - implica o exercício de competências que envolvam o respeito por todos os aspectos de segurança das mesmas;
14-Considerando as normas que reflectem o novo paradigma do relacionamento do Estado com o sector das infra-estruturas rodoviárias, é possível efectuar um paralelismo entre as normas dos institutos públicos IEP e InIR, designadamente, entre os Artigos 2, n°1; 6°, nºs.1 e 3, als. a) a i) do Decreto-Lei n° 227/2002, e do Artigo 4°, n°1, als. b), j) e l) e n°2, al. j) e n); 16°, al. c) dos Estatutos do IEP, e, respectivamente, os Artigos 1°, n°1; 3°, n°1 e n°3, als. a), c) e e); n° 4, als. a) a d); 12°, al. d); 17°, al. a); e 23°, nos1 e 2 do Decreto-Lei n° 148/2007;
15-Em reforço do sustentado, se no âmbito da sua concessão a entidade impugnada não detém qualquer competência para o licenciamento das áreas de serviço que compõem o estabelecimento da concessão, como estatui a Base 33, n° 7 das Bases da Concessão Rodoviária aprovadas pelo Decreto-Lei n° 380/2007, esta não pode deter competências previstas no Decreto-Lei n° 13/71, neste âmbito;
16-Não existe uma norma de sucessão ou de competências originárias que atribuam à entidade recorrida para o exercício das competências estabelecidas no Decreto-Lei 13/71, no que respeita a proibições, a licenciamentos, a autorizações e a aprovações em zona de protecção à estrada definida no seu artigo 3;
17-Nesta ordem de razões, o acto impugnado em 1a instância é nulo, pois padece do vício de incompetência absoluta, ou seja, a entidade impugnada praticou-o sem que tenha atribuições para tal, nos termos conjugados dos artigos 1 e 2, al.c), da LGT, com os artigos 2, al.d), e 99, al.b), do CPPT, e os artigos 2, nº.3, e 133, nº.2, al.b), do CPA, ao contrário do decidido na sentença recorrida;
18-Para a regra contida no artigo 9, nº.3, do C. Civil, e no artigo 11, nº.1, da LGT, ter alguma validade devemos entender que o legislador soube exprimir correctamente o seu pensamento, quando redigiu o artigo 15, nº.1, al.k), do Decreto-Lei 13/71, e quando o alterou pelo Decreto-Lei 25/2004, para a actual al.l), integrando e mantendo na sua "fattispecie" o conceito de bomba abastecedora de combustíveis e não de mangueira;
19-A bomba abastecedora de combustível é o critério de cálculo da incidência da taxa e não o facto tributário "per si" e, nessa medida, a sentença recorrida viola o princípio da legalidade tributária, sendo anulável, nos termos dos artigos 1 e 2, al.c), e 8, nº.1, da LGT, com o artigo 2, al.d), do CPPT, e os artigos 2, nº.3, e 135, do CPA;
20-Cada bomba existente respeita a duas posições de abastecimento, sendo esse o factor que determina a organização espacial do posto e não o número de mangueiras, o que é confirmado pelo teor das normas técnicas constantes do Despacho SEOP nº.37-XII/92, em concreto, das normas 6.1.2 e 7.3.9.;
21-A mangueira é um elemento integrante da bomba abastecedora como consta e, nessa medida, os acrescentos de elementos integrantes dos postos de abastecimento nem vêm, sequer, previstos no artigo 15, daquele diploma e, pelo contrário, vêm excepcionados no citado artigo 10, nº.2, deste Decreto-Lei 13/71;
22-A douta sentença recorrida viola, ainda, o artigo 45, nº.1, da LGT, ao apreciar erradamente o vício de caducidade do direito de liquidação da entidade impugnada, que é sustentado nos elementos de prova documental e testemunhal dos presentes autos e que são suficientes para se concluir que a existência das aludidas 9 mangueiras remonta, pelo menos, a 16 de Agosto de 2004;
23-O acto de liquidação impugnado nos presentes autos visa exclusivamente a obtenção de receita fiscal fazendo apelo à utilização de juízos discricionários, ao liquidar uma taxa com base em interpretações sobre a alegada realidade licenciada e sobre o conceito de bomba abastecedora;
24-Sintomático desta conclusão é o facto de os autos não permitirem identificar na íntegra (i) a qual(is) a(s) mangueira(s) objecto do acto de liquidação, (ii) a(s) sua(s) posição(ões) na organização espacial do posto, (iii) o modo como afecta(m) a visibilidade do trânsito ou da estrada (iv) como a(s) mesma(s) consubstancia(m) uma ampliação do posto de abastecimento, ou (v) sequer o combustível que abastece(m);
25-Independentemente do número de mangueiras, apenas uma viatura é abastecida de cada vez, tendo as mangueiras a ver com o tipo de produto e não com a frequência ou número de viaturas a abastecer;
26-A liquidação das taxas pelo número de mangueiras que se verifica no caso impõe a conclusão de que há, no caso, violação dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da justiça consagrados, no artigo 266, nº.2, da CRP, e com expressa referência, no plano da lei ordinária, no artigo 55, da LGT, e nos artigos 5 e 6, do CPA;
27-Por tudo o exposto a sentença "a quo" violou, por errada interpretação e aplicação, as normas jurídicas constantes dos artigos 1, 2, 3, 10, nºs.1, al.c), e 2, 11, 12 e 15, nº.1, al.l), do Decreto-Lei 13/71; os artigos 3, nºs.3, al.e), e 4, e 23, nº.1, do Decreto-Lei 148/2007; os artigos 2, 4, 8 e 10, nºs.1 e 2, al.c), do Decreto-Lei 374/2007, de 7 de Novembro; a Base 33, nº.7, das Bases de Concessão Rodoviária aprovadas pelo Decreto-Lei 380/2007, de 13 de Novembro, e aplicou uma norma inconstitucional, devendo como tal ser anulada;
28-Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências que desde já se invoca, deve ser dado provimento ao recurso e anulada a douta sentença recorrida, com todas as consequências legais, com o que será feita Justiça!
X
Contra-alegou o recorrido (cfr.fls.371 a 377 dos autos), o qual pugna pela confirmação do julgado, sustentando nas Conclusões:
1-A sentença proferida nos autos é justa porque, analisando objectivamente os factos, fez correcta aplicação do direito - essencialmente o Decreto-Lei 13/71, de 23/1, e a Constituição da República;
2-O número de mangueiras de um PAC têm a ver com o tipo e a variedade de produtos que podem ser abastecidos pelo que, quanto mais tipos de produtos tiver, mais procura e benefício terá porque abarcará todo o tipo de veículos e de necessidades de abastecimento de combustíveis;
3-A existência das mangueiras e do PAC tem influência directa no acesso ao posto de abastecimento e nas saídas do posto, de e para a estrada, estando directamente correlacionadas com a perigosidade face à segurança rodoviária que se deseja no que respeita às estradas nacionais, no caso a Estrada Nacional nº.256;
4-Não existe inconstitucionalidade do artigo 15, nº.1, al.I), do Decreto-Lei 25/2004, de 24/1-porquanto há que entender que a base tributária, de incidência objectiva, reside no número de mangueiras e não nas bombas abastecedoras;
5-É irrelevante o facto de as bombas permitirem um só abastecimento simultâneo, ou 2, 3, 4 abastecimentos de viaturas ao mesmo tempo, já que a frequência e a procura de abastecimento é tanto maior quanto maior for a diversidade de oferta de produtos e o número de mecanismos aptos ao abastecimento;
6-A procura do estabelecimento de combustíveis implica maiores entradas e saídas de, e para a, estrada nacional que confina com o mencionado posto de combustíveis, dados objectivos e já jurisprudencialmente fixados;
7-Resulta das Bases da Concessão e do Decreto-Lei 374/07, de 7/11, dos Estatutos da EP, SA, da interpretação do espírito do legislador, que plasmou no preâmbulo do DL 347/07, de 7/11, a vontade geral de atribuição de poderes de autoridade de estradas na EP - Estradas de Portugal, SA;
8-Os poderes conferidos à EP - Estradas de Portugal, SA, ao contrário do que pretende a impugnante, não são reduzidos, são os relativos a todas as estradas previstas no Plano Rodoviário Nacional (PRN2000);
9-Os poderes de autoridade estão igualmente definidos, no que respeita à zona da estrada, na legislação especial que é o Decreto-Lei 13/71, de 23/1, actualizado pelo Decreto-Lei 25/2004, de 24/1;
10-Por fim, que não menos importante, a jurisprudência do nosso Supremo Tribunal Administrativo é perfeitamente esclarecedora quando reconhece à EP - Estradas de Portugal, SA o inegável direito de cobrar taxa por mangueiras instaladas em postos de combustíveis;
11-O STA identifica até, mais especificamente, que o tributo devido à EP, SA incide sobre as mangueiras abastecedoras (em PACs) no sentido em que é entendido ser o dispositivo destinado a transferir combustível de um reservatório para um depósito de veículo automóvel e não se refere a legislação aplicável à unidade de abastecimento, vulgo, a bomba;
12-Entre outros, todos no mesmo sentido, ditam tal decisão os Acórdãos do STA de 17 de Junho de 2009, proferido no processo 263/09, e o de 16 de Setembro de 2009, proferido no processo 327/09 - com cópias nos autos;
13-Também ao nível da primeira instância Tributária vem, sistematicamente, sendo negado provimento à arguição de nulidade da aplicação de taxa por mangueira abastecedora de combustível, sendo julgada a taxa como proporcional e constitucional;
14-Realmente só nos primeiros tempos, em 1971, era normal a existência de uma só mangueira por bomba, mas tal situação evoluiu, a legislação e o Direito também;
15-A taxa por mangueira de combustível é justa e proporcional, estando o valor unitário fixado por lei habilitante;
16-No mais, dá-se por reproduzida a matéria constante da contestação e das alegações do artigo 120, do CPPT, apresentadas nos autos pela EP-Estradas de Portugal, SA;
17-Nestes termos e nos mais de Direito se requer a V. Exas que seja julgado totalmente improcedente o presente recurso instaurado pela impugnante ... - ... , SA, confirmando-se, a douta sentença proferida pelo T.A.F. de Beja, aliás de acordo com o que vem sendo decidido pelo nosso Supremo Tribunal Administrativo.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se negar provimento ao recurso e se manter a sentença recorrida (cfr.fls.391 e 392 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.394 do processo), vem o processo à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.298 a 303 dos autos - numeração nossa):
1-A impugnante tem como objecto social principal a refinação de petróleo bruto e seus derivados, transporte, distribuição e comercialização de petróleo bruto e gás natural, pesquisa e exploração de petróleo bruto e gás natural, quaisquer outras actividades industriais, comerciais, de investigação ou de prestação de serviços conexos (cfr.artº.6 da p.i.; cópia de certidão do registo comercial junta a fls.36 a 50 dos presentes autos);
2-A impugnante explora o posto de abastecimento de combustível sito na EN 256, km 20,000, margem esquerda, Reguengos de Monsaraz;
3-Em 2009/10/21, este posto de abastecimento foi fiscalizado pela "EP - Estradas de Portugal, S.A." (cfr.ficha de recolha de dados da fiscalização junta a fls.1 a 4 do processo administrativo apenso);
4-E, em 2009/11/10, pelos técnicos Joaquim Dionísio Martinho Livramento e José Francisco Falcato Conceição, foi elaborada a informação nº.17/2009/DREVR constante de fls.5 a 7 do processo administrativo apenso junto que aqui se dá por integralmente reproduzida e da qual se transcreve:
a. (...);
b. O posto é composto por um edifício de apoio com loja, escritório, estação de serviço, lavagem auto, 2 ilhas de abastecimento, com 3 bombas abastecedoras e 9 unidades de abastecimento instaladas, de onde resulta um acréscimo de 1 unidade de abastecimento que não [foi] objecto de licenciamento, por parte deste Serviço;
c. (...);
d. Proposta de actuação:
e. Assim, em face do exposto, sugere-se que seja notificado o titular da licença para:
i.Proceder ao pagamento do [montante] de € 1 362,30 (...), devida nos termos da alínea I) do n° 1 do artigo 15° do decreto-lei n° 13/71, de 23 de Janeiro, com as actualizações introduzidas pelo Decreto-lei n° 25/2004, de 24 de Janeiro, relativa à legalização de 1 mangueira não licenciada;
ii.(…);

5-Sobre esta informação, em 2009/11/06, o Director Regional de Évora exarou despacho, constante de fls. 5 do PA e que aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual se transcreve:
a. (...);
b. Para prosseguimento do processo com notificação ao PAC em causa;
c. (...);

6-Por carta registada com aviso de recepção assinado em 2009/11/11, a impugnante foi convidada a exercer o direito de audição prévia (cfr.documentos juntos a fls.9 a 12 do processo administrativo apenso);
7-Que exerceu por escrito em 2009/11/27 (cfr.documento junto a fls.13 a 15 do processo administrativo apenso);
8-Por carta registada com aviso de recepção assinado em 2010/01/25, foi enviado o ofício, constante de fls.19 a 22 do processo administrativo apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual se transcreve:

a) Em resposta à exposição apresentada no âmbito do exercício de audiência prévia que deu entrada nesta Delegação Regional em 26 de Novembro de 2009, vimos esclarecer o seguinte:
i. No que respeita à cobrança da taxa relativa às mangueiras instaladas no posto em apreço, a mesma é exigida ao abrigo da alínea I) do artigo 15° do Decreto-lei n° 13/71, de 23 de Janeiro, actualizada pelo Decreto-lei n° 25/2004, de 24 de Janeiro, de acordo com o critério de mangueiras instaladas e não no número de bombas abastecedoras, tal como confirmado no acórdão do STA de 17 de Julho de 2009, referente ao processo n° 263/09 (...);
ii. (…)
iii. Face ao exposto, mantemos a nossa decisão com base nos fundamentos expostos no nosso ofício n° 533/2009/DREVR, de 2009.11.10, em virtude da acção de fiscalização efectuada pela Delegação Regional de Évora, no passado dia 21 de Outubro de 2009, tendo sido detectadas várias deficiências a nível geral do posto (...) a existência de 9 mangueiras, verificando-se que se encontravam licenciadas apenas 8 mangueiras em 1987, pelo que se notifica a Galp - Petróleos de Portugal, ... , SA (...), do seguinte:
iv. No prazo de dez dias úteis efectuar o pagamento de € 1.362,30 (...), correspondente ao aumento de 1 mangueira abastecedora, de acordo com a alínea I) do artigo 15° do Decreto-lei n° 13/71, de 23 de Janeiro, actualizada pelo Decreto-lei n° 25/2004, de 24 de Janeiro, acrescido de € 3,00 de imposto de selo ao abrigo do ponto 12.5.1 da Tabela Geral de Imposto de Selo anexa ao Código de Imposto de Selo, aprovado pelo Decreto-Lei n° 287/2003, de 12 de Novembro, o que perfaz o [montante] de € 1 365,30, sob pena de se emitir certidão de dívida para instauração de processo de execução fiscal ao abrigo do número 2 do artigo 13° do Decreto-lei n° 374/2007, de 7 de Novembro;
v. (...);

9-Em 2010/05/05, neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, deu entrada a presente impugnação (cfr.carimbo de entrada aposto a fls.2 dos presentes autos);
10-Em 1970/05/04, a Direcção de Estradas do Distrito de Évora emitiu o Diploma de Licença nº.53/70, constante de fls.30 a 33 do processo administrativo apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzida;
11-Em 1995/04/27, a Direcção de Estradas do Distrito de Évora, emitiu o Diploma de Licença nº.9, constante de fls.38 a 41 do processo administrativo apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzida;
12-Em 2003/12/11, a Direcção de Estradas de Évora do IEP -Instituto das Estradas de Portugal, emitiu o Diploma de Licença nº.34/2003, constante de fls.218 a 222 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido, concedendo a ... - ... , SA, licença para alterações no posto de abastecimento de combustíveis, localizado na EN 256, ao km 20 L.D.
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Com interesse para a boa decisão da causa não se provaram outros factos…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes do processo e no depoimento das testemunhas que os confirmaram.
1a Testemunha: ... , gestor de cliente da Impugnante; devido ao exercício das suas funções conhece bem os dois postos de abastecimento de combustíveis situados quer no lado esquerdo quer no lado direito da estrada, situando-se os dois no mesmo quilómetro; no posto da margem direita existem 12 mangueiras e uma bomba de gasóleo agrícola, do lado esquerdo duas bombas multiproduto com oito mangueiras uma outra bomba simples de gasóleo agrícola; houve uma modificação, as bombas eram duplas e em 2008 foram colocadas as bombas multiproduto com 3 mangueiras, e renovada a licença em conformidade com as alterações; quer num lado quer no outro o número máximo de veículos que podem abastecer são 4; no posto de abastecimento do lado direito tem 13 pistolas, do lado esquerdo 9.
2a Testemunha: ... , engenheiro, trabalhador da Impugnante; descreveu os postos de abastecimento em causa; as bombas foram sendo actualizadas conforme a evolução dos produtos: antigamente só havia gasolina super, normal e gasóleo e hoje em dia há outros produtos: gasolina 95, etc.; independente dos produtos disponíveis em cada ilha abastecedora só podem abastecer 2 carros de cada vez de cada lado; a bomba da Galp que mais vende é a do Estoril, que dispõe já de bombas abastecedoras com 5 mangueiras; independentemente do número de produtos disponíveis em cada bomba só pode abastecer um carro de cada vez; no posto do lado esquerdo as bombas estão mais perto e há maior dificuldade de abastecerem dois carros de cada vez de cada lado da ilha; existem 9 mangueiras, uma das quais de gasóleo agrícola; do lado direito existem 12 mangueiras.
3a Testemunha: ... , engenheiro, trabalha para a impugnada; confirmou que as taxas aplicadas têm a ver com unidade de abastecimento, não interessando quantas viaturas podem abastecer de cada vez; quando as bombas são multiprodutos têm mais movimento e por conseguinte colocam maiores riscos à segurança rodoviária.
4a Testemunha: ... . Trabalhadora da impugnada: descreveu os procedimentos internos de liquidação e cobrança…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida, em síntese, julgou totalmente improcedente a impugnação que originou o presente processo, mais julgando válida e legal a liquidação do tributo notificado à sociedade impugnante no valor total de € 1.362,30 e objecto destes autos (cfr.nº.8 do probatório).
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do julgado, alegando, em primeiro lugar e como supra se alude, que a sentença recorrida reflecte a ausência de análise crítica sobre todos os elementos de prova constantes nos autos, os quais são essenciais para provar a existência e os termos do pretenso facto tributário, sendo, nessa medida, nula por não especificação dos fundamentos de facto, nos termos dos artºs.123, nº.2, e 125, do C.P.P.T. Que da sentença recorrida não resulta a indicação do meio concreto de prova constante dos presentes autos, através do qual deu como provada uma alegada ampliação do posto de abastecimento em questão, nos termos e para os efeitos do artº.115, nº.2, do C.P.P.T., artº.76, nº.1, da L.G.T., e artº.362 e seg. do Código Civil (cfr.conclusões 1 e 3 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo entendemos, a nulidade da sentença devido a falta de especificação dos fundamentos de facto da decisão.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.139 a 141; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.687 a 689; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36).
No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.357 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.871/10; ac.S.T.A-2ª.Secção, 13/10/2010, rec.218/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6406/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13).
Voltando ao caso concreto, conforme se retira do exame da decisão recorrida constante de fls.294 a 310 do presente processo e das referências supra exaradas à fundamentação da decisão de facto constante da mesma, deve julgar-se manifestamente improcedente a alegação do recorrente, visto que o vício que consubstancia esta nulidade, conforme supra mencionado, consiste na falta de fundamentação absoluta, não bastando que a justificação da decisão (tanto na vertente factual como no aspecto do enquadramento jurídico) se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. O mesmo se diga quanto ao meio concreto de prova constante dos presentes autos, através do qual se deu como provada uma alegada ampliação do posto de abastecimento em questão, relativamente ao qual se remete o recorrente para a indicação dos meios probatórios constantes dos nºs.4 e 8 da factualidade provada e supra consignada.
Concluindo, improcede o presente esteio do recurso incidente sobre a alegada falta de especificação dos fundamentos de facto da decisão recorrida.
Argui o apelante, igualmente e conforme acima se refere, que o tributo em causa nos autos apenas se justifica pela verificação de dois factos, o licenciamento "ex novo" de um posto de abastecimento de combustíveis ou a ampliação do mesmo, conforme dispõe a alínea l), do nº.1, do artº.15, do dec.lei 13/71, de 23/1, cabendo à entidade impugnada em sede da impugnação judicial apresentada pela recorrente, o ónus da prova da verificação dos pressupostos da tributação, nos termos do artigo 74, nº.1, da L.G.T. Que o Tribunal "a quo" não deve ater-se apenas às informações produzidas pela entidade impugnada e presumir uma alegada ampliação do posto de abastecimento de combustíveis em questão, sem verificar a existência dos pressupostos da liquidação, em prol da descoberta da verdade material, nos termos dos artºs.111, nº.2, e 115, nº.2, do C.P.P.T. Que como resulta da matéria dada como provada, a entidade impugnada no procedimento de liquidação em causa não considerou as realidades licenciadas posteriores a 1987, as quais constam dos Diplomas de Licença nº.9 e 34/2003, dados como reproduzidos nos nºs.11 e 12 da matéria dada como provada na sentença recorrida. Que face à fundada dúvida sobre a existência e quantificação da alegada ampliação do posto de abastecimento em causa, deveria o Tribunal "a quo" ter declarado a presente acção procedente, ao abrigo do disposto nos artºs.74, da L.G.T., e 100, do C.P.P.T. (cfr.conclusões 4 a 7 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
No exame do presente esteio do recurso, desde logo, se deve recordar que o apelante não impugna a factualidade provada constante da sentença recorrida no âmbito do salvatério que deduz para este Tribunal (cfr.artº.640, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), nos termos previstos na lei.
Avancemos.
Chama, antes de mais, o apelante à colação as ditas realidades licenciadas posteriores a 1987, as quais constam dos Diplomas de Licença nº.9 e 34/2003, dados como reproduzidos nos nºs.11 e 12 da matéria dada como provada na sentença recorrida, as quais não terão sido levadas em consideração pela entidade recorrida. Ora, do exame dos documentos em causa (Diploma de Licença nº.9, emitido pela Direcção de Estradas do Distrito de Évora em 27/4/1995; Diploma de Licença nº.34/2003, emitido pela Direcção de Estradas de Évora do IEP-Instituto das Estradas de Portugal em 11/12/2003), deve concluir-se que nenhum deles se refere ao licenciamento/ampliação do posto de abastecimento de combustíveis e, especificamente, ao licenciamento de uma nova mangueira/bomba abastecedora. A primeira licença mencionada tem por objecto obras visando o aumento da capacidade de armazenamento de combustíveis dos depósitos existentes (cfr.documento junto a fls.38 a 41 do processo administrativo apenso). Já a segunda licença tem por objecto obras de remodelação geral do posto de abastecimento de combustíveis, nomeadamente ao nível dos acessos e da sinalização viária existente (cfr.documento constante de fls.218 a 222 dos presentes autos). Atento o exposto, é natural que a entidade recorrida não tenha levado em consideração tais licenciamentos, sem qualquer relevo no caso "sub judice", tal como o próprio Tribunal "a quo".
O apelante igualmente defende a violação do princípio "in dubio contra fiscum" consagrado no actual artº.100, nº.1, do C.P.P.T.
Para obter a anulação do acto tributário objecto do presente processo (cfr.nºs.1 e 3 do probatório) chama o impugnante/recorrente à colação o disposto no citado artº.100, nº.1, do C.P.P.Tributário (cfr.anterior artº.121, nº.1, do C.P.Tributário). O preceito referido constitui uma afloração do princípio “in dubio contra fiscum”, vigente no momento da decisão sobre facto incerto na aplicação da lei e com alcance análogo ao do princípio “in dubio pro reo” no que respeita à apreciação da prova em processo penal. Tal princípio leva a que o interesse substancial da justiça domine o actual processo tributário em detrimento do mero interesse formal ou financeiro do Estado (cfr.Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág.158; Soares Martínez, Direito Fiscal, 8ª. edição, 1996, pág.133 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.267; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 29/11/95, rec.19247, Apêndice ao D.R., 14/11/97, pág.2800 e seg.; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 13/12/95, B.M.J. 452, pág.315 e seg.).
Esta regra consubstancia uma aplicação no processo de impugnação judicial da regra geral sobre o ónus da prova no procedimento tributário enunciada no artº.74, nº.1, da L.G.T., em que se estabelece que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Cânone este também aplicável ao processo judicial tributário.
Saber se, perante a prova produzida, há dúvidas sobre a existência ou quantificação de um facto tributário é uma questão essencialmente de facto. Assim, se o Tribunal decidiu dar como provada a existência ou inexistência de um facto tributário não haverá lugar à aplicação desta norma. Só em situações em que não houver a certeza se existe ou não o facto deverá fazer-se aplicação desta regra sobre o ónus da prova, decidindo a questão contra quem tem tal ónus (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 14/1/2004, rec.1480/03; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/3/2012, proc.1103/06; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.134).
No caso concreto, de acordo com a matéria de facto provada, o impugnante/recorrente não conseguiu fazer prova que gere dúvida, de qualquer espécie, sobre a existência do facto tributário (cfr.nºs.4 e 8 da matéria de facto provada). Como a dúvida sobre a existência do facto tributário tem que resultar de prova produzida, ou seja, é uma questão que só se coloca após a produção de prova, não se pode aplicar, no caso “sub judice”, o mencionado princípio “in dubio contra fiscum”.
Sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente também este esteio do recurso.
Mais aduz o recorrente, em síntese, que as atribuições e competências para o licenciamento de infra-estruturas ao longo das estradas nacionais foram transferidas para o InIR. Que o acto impugnado é nulo, pois padece do vício de incompetência absoluta, ou seja, a entidade impugnada praticou-o sem que tenha atribuições para tal, nos termos conjugados dos artºs.1 e 2, al.c), da L.G.T., com os artºs.2, al.d), e 99, al.b), do C.P.P.T., e os artºs.2, nº.3, e 133, nº.2, al.b), do C.P.A., ao contrário do decidido na sentença recorrida (cfr.conclusões 8 a 17 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, segundo cremos, assacar à decisão recorrida mais um vício de erro de julgamento de direito.
Deslindemos se a sentença recorrida comporta tal vício.
Antes de mais, se dirá que é hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.9, do C.Civil; artº.11, da L.G.Tributária; José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, Editorial Verbo, 4ª. edição, 1987, pág.335 e seg.; J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1989, pág.181 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de C.T.Fiscal, nº.174, 1996, pág.363 e seg.).
A taxa em causa nos presentes autos foi criada pelo dec.lei 13/71, de 23/1, tendo sido actualizada por diversos diplomas legais posteriores, então da área de jurisdição da Junta Autónoma de Estradas e no seu artº.15, estão consagrados os montantes a pagar por autorização ou licença, previstos nos actos elencados nas suas alíneas a) a k), sendo que nesta última alínea se previa a taxa pelo estabelecimento ou ampliação de postos de combustíveis, por cada bomba abastecedora de combustível: Esc. 12.000$00. A tal Junta, que havia sido criada em 1927, veio a suceder a "EP-Estradas de Portugal, E.P.E." (cfr.dec.lei 239/2004, de 21/12), tendo a ora "EP-Estradas de Portugal, S.A.", por força do disposto, entre outros, no artº.2, do dec.lei 374/2007, de 7/11, vindo a suceder na universalidade dos direitos e obrigações daquela primeira. Por outro lado, o InIR foi criado pelo dec.lei 148/2007, de 27/4, veio a suceder a esta última, mas só nas matérias relativas à supervisão das infra-estruturas rodoviárias, como desde logo ressalta do preâmbulo do dec.lei 132/2008, de 21/6, e do artº.23, nº.1, do mesmo dec.lei 148/2007, de 27/4, continuando a EP com as restantes competências, não inseridas nestas matérias não atribuídas ao InIR. Neste sentido veja-se o artº.13, nº.1, al.c), do dec.lei 374/2007, de 7/11, norma que prevê que constituem suas receitas, o produto das taxas cobradas, pelo que se entende que a mesma continua a deter as atribuições previstas no citado artº.15, do dec.lei 13/71, de 23/1 (com a redacção do artº.1, do dec.lei 25/2004, de 24/1), de autorização ou licenciamento de estabelecimentos ou ampliação de postos de combustível, instalados na sua área de jurisdição, bem como a liquidar e a cobrar as correspondentes taxas por esses factos, pelo que não padece a taxa impugnada do vício de incompetência que o recorrente lhe imputa e a sentença do Tribunal "a quo" que também assim entendeu, deve ser confirmada, ainda que com a presente fundamentação (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc.5766/12).
Em conclusão, o acto tributário impugnado não padece do vício de incompetência, assim não violando o disposto nos artºs.1 e 2, al.c), da L.G.T., com os artºs.2, al.d), e 99, al.b), do C.P.P.T., e os artºs.2, nº.3, e 133, nº.2, al.b), do C.P.A., e mais devendo improceder o presente alicerce do recurso.
Alega, ainda, o recorrente que o legislador soube exprimir correctamente o seu pensamento, quando redigiu o artº.15, nº.1, al.k), do dec.lei 13/71, e quando o alterou pelo dec.lei 25/2004, para a actual al.l), integrando e mantendo na sua "fattispecie" o conceito de bomba abastecedora de combustíveis e não de mangueira. Que a bomba abastecedora de combustível é o critério de cálculo da incidência da taxa e não o facto tributário "per si" e, nessa medida, a sentença recorrida viola o principio da legalidade tributária, sendo anulável, nos termos dos artºs.1 e 2, al.c), e 8, nº.1, da L.G.T., com o artº.2, al.d), do C.P.P.T., e os artºs.2, nº.3, e 135, do C.P.A. (cfr.conclusões 18 a 21 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal pecha.
Actualmente, a taxa pode definir-se como uma prestação coactiva, devida a entidades públicas, com vista à compensação de prestações efectivamente provocadas ou aproveitadas pelos sujeitos passivos. Em contraste com o imposto de características unilaterais, a taxa caracteriza-se pela sua natureza cumutativa ou bilateral, devendo o seu valor concreto ser fixado de acordo com o princípio da equivalência jurídica. A natureza do facto constitutivo que baseia o aparecimento da taxa pode consistir na prestação de uma actividade pública, na utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares (cfr.artº.4, nºs.1 e 2, da L.G.Tributária; artºs.3 e 4, do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, aprovado pela Lei 53-E/2006, de 29/12; artº.15, nº.2, da L.F.L. aprovada pela Lei 2/2007, de 15/1; Sérgio Vasques, Regime das Taxas Locais, Introdução e Comentário, Cadernos do I.D.E.F.F., nº.8, 2009, pág.83 e seg.; Suzana Tavares da Silva, As Taxas e a Coerência do Sistema Tributário, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2013, pág.37 e seg.).
Recorde-se, também, que a distinção entre imposto e taxa assume especial relevo perante os princípios gerais de direito tributário material, designadamente face ao princípio da legalidade, concebido como reserva absoluta de lei formal, isto é, lei da Assembleia da República (cfr.artº.103, nº.2, da Constituição da República, na redacção introduzida pela Lei Constitucional 1/97, de 20/9), princípio este que, segundo a doutrina, abrange somente o imposto mas não já as taxas que podem ser criadas, nomeadamente, por decreto-lei do Governo, sem prévia autorização legislativa (cfr.Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, Editora Rei dos Livros, 1996, I, pág.76; Soares Martínez, Direito Fiscal, 8ª. edição, Livraria Almedina, 1996, pág.37; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 3ª. edição, 2007, pág.31).
Revertendo ao caso dos autos, como nos dá conta a sentença recorrida, esta foi uma questão já tratada por diversos arestos de Tribunais Superiores, em sentido uniforme, de que actualmente, o conceito de bomba de combustível esteja indissociavelmente ligado à mangueira, pois só por seu intermédio se preenche o conceito legal em causa, e o espírito da norma, que é, precisamente, o abastecimento de combustível. Não há combustível sem bomba, tal como não há abastecimento sem mangueira. Assim, o legislador ao recorrer à expressão “por cada bomba abastecedora de combustível” quis tributar individualmente cada um dos equipamentos que permitem o abastecimento de combustíveis, equipamentos esses quantificáveis através do número de mangueiras, pelo que não tendo sido avançados novos argumentos tendentes a reexaminar tal questão, e também se não vendo que outros possam existir, igualmente se adere a tal posição e se nega provimento ao recurso quanto a este esteio, incidente sobre a alegada violação do princípio da legalidade tributária (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/6/2009, rec.263/09; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/9/2009, rec.327/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc.5766/12).
Alega, identicamente, o recorrente que a decisão recorrida viola, ainda, o artº.45, nº.1, da L.G.T., ao apreciar erradamente o vício de caducidade do direito de liquidação da entidade impugnada, que é sustentado nos elementos de prova documental e testemunhal dos presentes autos e que são suficientes para se concluir que a existência das aludidas 9 mangueiras remonta, pelo menos, a 16 de Agosto de 2004 (cfr.conclusão 22 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Pode definir-se a caducidade como o instituto através do qual os direitos que, por força da lei ou de convenção das partes, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo seu não exercício durante o mesmo período. O instituto da caducidade tem por fundamentos vectores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere. A necessária brevidade da relação jurídica que comporta um direito caducável determina que o não exercício do mesmo no prazo legal ou convencionalmente definido acarreta a sua extinção. Refira-se, ainda, que a caducidade, determinando a extinção do direito e da correspondente vinculação sem mais, não gera o consequente aparecimento de uma obrigação natural, contrariamente ao que acontece com o instituto da prescrição. Por último, a caducidade deve consubstanciar-se como uma excepção peremptória passível de apreciação oficiosa pelo Tribunal (cfr.artºs.328, 331 e 333, todos do C.Civil; artº.496, do C.P.Civil; Luis A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, A.A.F.D.L., 1983, pág. 567 e seg.; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª.edição, Coimbra Editora, 1989, pág.372 e seg.; Aníbal de Castro, A Caducidade na doutrina, na lei e na jurisprudência, 3ª.edição, 1984, pág.29 e seg.).
No que diz respeito ao direito tributário, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, matéria que não é de conhecimento oficioso, encontra actualmente consagração genérica no artº.45, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12, norma que vem consagrar um prazo de caducidade de quatro anos (cfr.anterior artº.33, nº.1, do C.P.Tributário, o qual consagrava o prazo de cinco anos). Face à redacção do aludido artº.45, da L. G. Tributária, é claro que, quer o exercício do direito à liquidação, quer a notificação do seu conteúdo ao contribuinte, e não apenas aquele primeiro acto, têm que ocorrer dentro do mencionado prazo de quatro anos contados do facto tributário, sob pena de operar a caducidade de tal direito. O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/10/2012, proc.5792/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.7031/13; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Editora Encontro da Escrita, 4ª. Edição, 2012, pág.359 e seg.; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª.edição, Coimbra Editora, 2007, pág.259 e seg.; Joaquim Casimiro Gonçalves, A caducidade face ao direito tributário, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, 1999, pág.225 e seg.).
A possibilidade de exame da caducidade do direito à liquidação pode verificar-se no âmbito do processo de impugnação, desde que estejamos perante situação que se reconduz à alegada estruturação de liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação sendo efectuada fora do prazo. O fundamento de caducidade sob exame por contender com a legalidade, que não com a exigibilidade da dívida, deve visualizar-se como fundamento típico do processo de impugnação judicial e não do processo de oposição à execução fiscal (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção,12/10/2005,rec.633/05; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2012, proc.5594/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.7031/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P. Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.109).
No que, especificamente, diz respeito ao regime de caducidade do direito à liquidação aplicável às taxas, deve referir-se que o prazo geral de caducidade consagrado no artº.45, nº.1, da L.G.T., também se lhes destina, visto que aplicável a todos os tributos, na acepção do artº.3, do mesmo diploma legal. Mas somente aos impostos, que não às taxas, é aplicável o termo inicial da contagem desse prazo que se encontra consagrado no artº.45, nº.4, da L.G.T. (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Editora Encontro da Escrita, 4ª. Edição, 2012, pág.362 e seg.; Joaquim Casimiro Gonçalves, A caducidade face ao direito tributário, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, 1999, pág.246).
Relativamente às taxas autárquicas, o artº.14, do R.G.T.A.L. (Lei 53-E/2006, de 29/12), estabelece que o direito de liquidar as taxas caduca se a liquidação não for validamente notificada ao sujeito passivo no prazo de quatro anos a contar da data em que o facto tributário ocorreu, não se distinguindo entre taxas periódicas e de obrigação única (cfr. Sérgio Vasques, Regime das Taxas Locais, Introdução e Comentário, Cadernos do I.D.E.F.F., nº.8, 2009, pág.171 e seg.).
Quanto às restantes taxas, como é o caso da taxa de licenciamento objecto dos presentes autos, deve aplicar-se o regime geral constante do artº.45, da L.G.T., nomeadamente o seu nº.1, já supra mencionado (cfr.Sérgio Vasques, O Sector Industrial e as Taxas de Licenciamento da Estradas de Portugal, in Taxas e Contribuições Sectoriais, Sérgio Vasques e Outros, Almedina, 2013, pág.239).
Revertendo ao caso dos autos, defende o recorrente que se deve declarar a caducidade do direito à liquidação da taxa objecto do processo, dado que da prova documental e testemunhal dos presentes autos se deve retirar a conclusão da existência das aludidas 9 mangueiras, a qual remonta, pelo menos, a 16 de Agosto de 2004. Presumindo-se que, com a indicação de tal data, se defenda a ultrapassagem do aludido prazo de quatro anos previsto no artº.45, nº.1, da L.G.T.
Não tem, manifestamente, razão o recorrente.
Desde logo, do exame da factualidade provada não se pode retirar a conclusão a que chega o recorrente, quanto à data em que, alegadamente, passaram a existir as 9 mangueiras no posto de abastecimento de combustível sito na EN 256, km 20,000, margem esquerda, Reguengos de Monsaraz, pelo mesmo explorado. E recorde-se, conforme já supra vincado, que o apelante não impugna a factualidade provada constante da sentença recorrida no âmbito do salvatério que deduz para este Tribunal (cfr.artº.640, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), nos termos previstos na lei.
Por outro lado, o dito prazo de caducidade de quatro anos previsto no citado artº.45, nº.1, da L.G.T., deve ter, no caso concreto, o seu termo inicial indexado à data do concreto conhecimento, por parte da entidade recorrida, do não cumprimento das regras de licenciamento previstas no dec.lei 13/71, de 23/1, relativamente a uma das mangueiras existentes no identificado posto de abastecimento de combustíveis, tudo, de resto, de acordo com o princípio geral de cômputo do prazo de caducidade a partir do momento em que o direito pode ser exercido (cfr.artº.329, do C.Civil).
No caso concreto, o termo inicial de cômputo do prazo de caducidade do direito à liquidação deve reportar-se à data de estruturação da informação nº.17/2009/DREVR, portanto 10/11/2009 (cfr.nº.4 do probatório), na qual se constatou a violação do dever de licenciamento em causa. Sendo o recorrente notificado da liquidação em causa nos presentes autos no dia 25/01/2010 (cfr.nº.8 do probatório), é manifesto que não decorreu o aludido prazo de caducidade de quatro anos, neste medida improcedendo o presente esteio da apelação.
Por último, aduz o recorrente que o acto de liquidação impugnado nos presentes autos visa exclusivamente a obtenção de receita fiscal fazendo apelo à utilização de juízos discricionários, ao liquidar uma taxa com base em interpretações sobre a alegada realidade licenciada. Que a liquidação das taxas pelo número de mangueiras que se verifica no caso impõe a conclusão de que existe violação dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da justiça consagrados, no artº.266, nº.2, da C.R.P., e com expressa referência, no plano da lei ordinária, no artº.55, da L.G.T., e nos artºs.5 e 6, do C.P.A. (cfr.conclusões 23 a 26 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a sentença recorrida comporta tal vício.
O princípio da proporcionalidade, é explicitado como princípio material informador e conformador da actividade administrativa, no citado artº.266, nº.2, da C.R.Portuguesa, assim implicando a juridicidade de toda a actividade da Administração (cfr.artº.5, nº.2, do C.P.A.; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.801 e seg.).
De acordo com o mesmo, na actuação administrativa terá de existir uma proporção adequada entre os meios empregues e o fim que se pretende atingir (cfr.José Manuel Santos Botelho, e Outros, Código do Procedimento Administrativo anotado e comentado, Almedina, 4ª. edição, 2000, pág.67, em anotação ao artº.5). No âmbito do procedimento tributário, a consagração de tal princípio resulta do artº.55, da L.G.Tributária, tendo expresso desenvolvimento no artº.46, do C.P.P.Tributário. O princípio da proporcionalidade obriga a Administração Tributária a abster-se da imposição aos contribuintes de obrigações que sejam desnecessárias ou inadequadas à satisfação dos fins que aquela visa prosseguir ou que vão além do que seja necessário e adequado impor aos mesmos contribuintes (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc. 6971/13; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Encontro da Escrita Editora, 4ª. Edição, 2012, pág.448 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.449 e seg.).
Mais se dirá que a relação sinalagmática, típica das taxas, entre o benefício recebido e a quantia paga não implica uma equivalência económica rigorosa entre ambos, mas não pode ocorrer uma desproporção que, pela sua dimensão, demonstre com clareza que não existe entre aquele benefício e a quantia paga a correspectividade ínsita à dita relação sinalagmática.
No caso “sub judice”, quanto à invocada inconstitucionalidade material por ofensa do princípio da proporcionalidade, desde logo, se deve mencionar que nos encontramos perante alegados vícios de inconstitucionalidade material e que buscam uma fiscalização concreta e com características oficiosas (cfr.artºs.204 e 280, nº.1, da C.R.Portuguesa; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.940 e seg.). No entanto, o que pode e deve ser objecto da fiscalização concreta da constitucionalidade, por parte dos Tribunais, são normas e não quaisquer decisões, sejam elas de natureza judicial ou administrativa, nem tão pouco eventuais interpretações que de tais normas possam ser efectuadas por aquelas decisões (cfr.artº.204, da C.R.Portuguesa; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.518 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/4/2006, proc.64561/96; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/1/2011, proc.4401/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 5/6/2012, proc.5445/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7164/13).
Por outro lado, a tributação por cada um dos equipamentos que permitem o abastecimento de combustíveis, ao tempo em que a norma foi criada e conforme já mencionado supra, tende a equivaler hoje ao número de mangueiras existentes em cada local de abastecimento de combustíveis, em que cada mangueira, em regra, contém um diverso tipo de combustível, como é do conhecimento geral, aproveitando a instalação de equipamentos comuns, como sejam de medição e de preços e de ocupação de espaço, tudo se traduzindo também em vantagens económicas as actuais possibilidades técnicas de reunirem numa única bomba abastecedora diversas mangueiras ao invés de instalarem em cada bomba uma única mangueira, não se descortinando, por isso, a violação do invocado princípio constitucional, violação essa que igualmente não é concretizada pelo recorrente.
Concluindo, não visualiza o Tribunal que o montante de taxa efectivamente cobrado pela entidade recorrida (€ 1.362,30 por cada mangueira abastecedora resultante da ampliação - cfr.nº.4 do probatório), liquidação essa visando a protecção da segurança das estradas nacionais, conforme se retira do preâmbulo do aludido dec.lei 13/71, de 23/1, tal como a cobertura dos custos inerentes aos procedimentos de autorização e licenciamento efectuados, seja violador do princípio da proporcionalidade constitucionalmente consagrado (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc.5766/12; Sérgio Vasques, O Sector Industrial e as Taxas de Licenciamento da Estradas de Portugal, in Taxas e Contribuições Sectoriais, Sérgio Vasques e Outros, Almedina, 2013, pág.238).
Arrematando, julga-se improcedente o recurso sob exame e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, a qual não padece dos vícios que lhe são assacados pelo recorrente, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, embora com a presente fundamentação.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 27 de Março de 2014


(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)