Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:314/13.0BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:05/21/2020
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:CADUCIDADE ISENÇÃO
JUSTO IMPEDIMENTO
INSOLVÊNCIA
Sumário:I-A isenção de IMT de que goza a aquisição de prédios para revenda caduca no caso de não serem vendidos no prazo de três anos, logo encontra-se sujeita a uma condição resolutiva que o legislador apenas pretendeu fixar por referência ao tempo decorrido e já não aos motivos subjacentes à falta de revenda
II-Se foi o próprio devedor que se apresentou à insolvência, se já apresentava uma situação patrimonial negativa desde 2010, não se percebendo, e não se demonstrando quais os motivos que terão estado no “arrastar” da apresentação à insolvência e mais ainda quais as razões e os motivos concretos porque não se consumou a revenda durante cerca de 35 meses, então a questão da insolvência do devedor não pode ser entendida e configurada como “justo impedimento”, visto que a impossibilidade prática de venda do bem no prazo legal, entenda-se no prazo de três anos, não pode, senão, entender-se que seja a si imputável, ou noutra formulação que a parte não tenha contribuído para a consumação de tal impossibilidade.
III-Para que pudesse considerar-se verificado o “justo impedimento” era necessário que houvesse uma verdadeira impossibilidade de realizar a venda, ainda que com perdas, em virtude de circunstâncias não imputáveis ao vendedor.
IV-Esta interpretação em nada subverte a ratio legis e traduz uma desigualdade. Com o princípio da igualdade o que se pretende evitar são situações de discriminação materialmente infundada, sem qualquer fundamento razoável ou sem qualquer justificação objetiva e racional.
V-O princípio da igualdade não tem, nem pode ter, o alcance de exigir uma solução jurídica diversa para cada concreta situação da vida.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:

I-RELATÓRIO

O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (IRFP) veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada do presente processo interposto pela sociedade denominada “V….., SA-EM LIQUIDAÇÃO”, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação de IMT, na parte em que considerou verificada a caducidade da isenção de tributação, por falta de revenda dos prédios no prazo de três anos, mantendo-se no demais.


***

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:

“I.              Na douta sentença ora sob recurso, o Tribunal “a quo” julgou a impugnação parcialmente procedente e determinou a anulação do ato de liquidação de IMT impugnado na parte em que considerou verificada a caducidade da isenção de tributação, por falta de revenda dos prédios no prazo de 3 anos;

II.               Para decidir a presente impugnação judicial, no sentido supra referido, o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” entendeu que a declaração de insolvência (…) impossibilitou a impugnante (a partir de 23 de fevereiro de 2012) de revender os prédios adquiridos com esse fito;

III.             Salvo o devido respeito por diferente entendimento, a decisão recorrida não fez a mais correta interpretação dos factos nem a mais correta aplicação do direito a esses mesmos factos, já que, ao contrário do que ali se decidiu, a declaração de insolvência da impugnante não a impossibilitou de revender os 254 prédios adquiridos para esse efeito;

IV.             Neste seu segmento a decisão em apreço, incorreu em erro de julgamento de facto e de direito;

V.              Nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 81.º, do CIRE, a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador de insolvência;

VI.             Nos termos do disposto no artigo 54.º, do CIRE, que o administrador da insolvência, uma vez notificado da nomeação, assume imediatamente a sua função;

VII.           A partir da declaração de insolvência, competem ao administrador da insolvência os poderes de administração e disposição de bens do insolvente, devendo, nesse âmbito, proceder à respetiva administração que deve abranger não só os bens já existentes, como aqueles que o insolvente venha a adquirir na pendência do processo;

VIII.          Nos termos do disposto no artigo 55.º, n.º 1, alíneas a) e b), do CIRE, cabe ao administrador da insolvência preparar o pagamento das dívidas do insolvente à custa das quantias em dinheiro existentes na massa insolvente, designadamente das que constituem produto da alienação, que lhe incumbe promover, dos bens que a integram, e prover, no entretanto, à conservação e frutificação dos direitos do insolvente e à continuação da exploração da empresa, se for o caso, evitando quanto possível o agravamento da sua situação económica;

IX.             Resulta do disposto das citadas normas do CIRE que, apesar da declaração de insolvência, os insolventes apesar de impossibilitados de proceder à alienação dos bens que integram a massa insolvente per se, podem fazê-lo através do administrador nomeado judicialmente no âmbito do processo de insolvência;

X.              A própria impugnante admite, nos artigos 97.º e 99.º, da PI que, a partir da declaração de insolvência, os poderes de administração e disposição dos bens integrantes da massa insolvente passaram a competir ao administrador da insolvência nomeado pelo respetivo tribunal;

XI.             Está provado nos presentes autos que a impugnante não esteve impossibilitada de revender os prédios que adquiriu e destinou a revenda, em 26 de março de 2009, dentro do prazo de caducidade de 3 anos estabelecido no artigo 11.º, n.º 5, do CIMT;

XII.            Mesmo que se entenda que a impugnante esteve efetivamente impossibilitada de revender os referidos prédios, o que se admite sem conceder, sempre caberia à impugnante demonstrar que essa alegada situação de “justo impedimento” para proceder à revenda dos prédios, dentro do prazo de caducidade estabelecido no artigo 11.º, n.º 5, do CIMT, não lhe pode ser atribuída e que essa demonstração não foi feita nos presentes autos;

XIII.          Este douto Tribunal já decidiu que “A invocação do “justo impedimento” exige a demonstração de que a não celebração do contrato definitivo de revenda dos prédios em causa dentro do limite temporal de caducidade da isenção não é imputável a conduta da recorrente.” (Acórdão proferido no processo n.º 07063/13, em 19-03-2015);

XIV.          Em situações como a dos presentes autos, só será de considerar como “justo impedimento” uma ocorrência para a qual o sujeito passivo em nada contribuiu, o que comprovadamente não se verifica quanto à impugnante;

XV.           Na situação em apreço, o facto que alegadamente impediu a impugnante de revender os ditos prédios no prazo de 3 anos a contar da sua aquisição (a apresentação à insolvência e posterior declaração judicial) apenas a si pode imputar-se;

XVI.          As circunstâncias que consubstanciam situações de “justo impedimento”, capazes de derrogar o termo do prazo de caducidade previsto no artigo 11.º, n.º 5, do CIMT, são situações extremas e de todo inesperadas e sem intervenção direta do sujeito passivo;

XVII.        In casu, está provado que foi a própria impugnante que se apresentou à insolvência e está igualmente provado que, no exercício de 2010, o seu resultado líquido foi negativo, o que demonstra que a declaração de insolvência proferida, em 23 de fevereiro de 2012, não configurou uma situação súbita e imprevisível, impeditiva de proceder à revenda dos referidos prédios no prazo de caducidade da isenção;

XVIII.       Ao decidir como decidiu o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento de facto e de direito;

XIX.          Ao decidir como decidiu o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo”, violou o disposto no n.º 5, do artigo 11.º, do CIMT;

XX.           Assim sendo como de facto é, e está devidamente provado nos presentes autos, impõe- se a revogação da sentença ora sob recurso, na parte relativa à não caducidade da isenção dos 254 prédios adquiridos pela impugnante para revenda e não revendidos no prazo de 3 anos e a manutenção da mesma na parte relativa às demais questões.

Pedido

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e, em consequência, ser a douta sentença ora recorrida revogada na parte desfavorável à Fazenda Pública e substituída por douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a presente impugnação, por não provada, com todas as devidas e legais consequências.

Mais requer a V.as Ex.as que, a final, atendendo ao facto do valor da causa ser superior a € 275 000,00, determinem a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, devida neste recurso, nos termos do disposto no n.º 7 do artigo 6.º do RCP.”


***

A Recorrida “V…..”, apresentou contra-alegações tendo concluído da seguinte forma:

«a)            O presente recurso foi interposto pela Fazenda Pública contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, no âmbito do processo n.º 314/13.0BEALM, N.º 136/02, datada de 31/01/2017, na parte em que a mesma julgou procedente a impugnação judicial, por considerar que a Recorrida se encontrava impossibilitada de realizar a revenda, por força do processo de insolvência, no prazo de 3 anos previsto no artigo 7.º do Código do IMT;

b)              O recurso agora apresentado não tem fundamento, pois não tem qualquer aderência à realidade dos factos e está assente em pressupostos que, quer no plano legal, quer no plano factual, são manifestamente errados;

c)               De facto, a Fazenda Pública parte de um pressuposto errado, ao considerar que as sociedades insolventes se encontram na plenitude das suas capacidades e personalidade jurídicas pois, após ser declarada a insolvência da sociedade, cessa a prossecução do seu objeto social e, por exemplo, a obtenção de lucros que é a base do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas;

d)              Com efeito, deixa de existir verdadeiramente um ativo fixo tangível ou existências, sendo apreendidos todos os bens que passam a incluir a massa insolvente (vide Acórdão da 2.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 29/10/2003, proferido no processo 01079/03, em que foi Relator Brandão de Pinho);

e)              Nessa medida também, todos os bens anteriormente pertencentes ao agora insolvente passam a integrar a massa insolvente, a qual serve, não para prosseguir o (agora impossível) objeto social da empresa, mas para pagar os créditos reconhecidos., daí que o produto da venda dos bens da massa insolvente não integre, por exemplo, o conceito de mais-valias, constante no artigo 46.º do Código do IRC;

f)               Assim e reportando-nos ao caso vertente, uma coisa é dizer-se que, mesmo após a declaração de insolvência, os bens que pertencem à massa insolvente podem ser alienados pelo respetivo Administrador da Insolvência, outra, bem diferente, é sugerir-se que a alienação que venha a ocorrer nesses moldes consubstancia o desenvolvimento normal (e natural) da atividade da sociedade insolvente, ignorando que esta se trata de uma sociedade que perdeu alguns dos seus privilégios societários e se encontra possibilitada de exercer a atividade comercial para a qual foi criada;

g)              Acresce que, tendo a ora Recorrida sido declarada insolvente em 23 de Fevereiro de 2012, e terminando em 26 de Março de 2012 o referido prazo de 3 anos, no período compreendido entre tais datas, era, efetivamente e na prática, impossível proceder à venda dos imóveis adquiridos em 2009, ainda que no âmbito do processo de insolvência;

h)              Efetivamente, pese embora o Administrador de Insolvência tenha sido nomeado na sentença de declaração de insolvência, a verdade é que o mesmo podia realizar atos de gestão corrente da sociedade, mas não podia proceder, na prática, à alienação dos imóveis sem a aprovação dos respetivos credores, reunidos em Assembleia Geral;

i) São estes últimos que decidem o destino da sociedade e do património que constitui a massa insolvente, não podendo o Administrador de Insolvência, na prática, dispor dos bens que a compõem sem a prévia aprovação daqueles e do próprio Relatório por si elaborado, algo que apenas acontece no âmbito da primeira Assembleia de Credores (cfr. artigo 156.º do CIRE);

j) No caso vertente, a sentença de insolvência apenas transitou em julgado em 2 de Abril de 2017 (facto dado como assente na sentença recorrida - 8.º), pelo que só após essa data, na realidade, poderiam ser alienados os bens do devedor, tal como preceitua o n.º 1 do artigo 158.º do CIRE;

k)              Pelo que falece a argumentação aduzida pela Fazenda Pública nos pontos 8.º a 14.º das suas alegações;

l) No que respeita à questão do “justo impedimento”, também é por demais evidente que as considerações feitas no recurso agora apresentado não podem proceder, porquanto, em momento algum, foram questionados nos autos os fundamentos e as motivações que levaram a Recorrida a lançar mão do processo de insolvência, tal como nunca foi colocada em causa a veracidade da situação económico-financeira que originou a própria declaração de insolvência;

m)             A menos que a própria sociedade insolvente se coloque deliberadamente nessa situação - o que, insista-se, não sucedeu no caso vertente, nem nunca foi sequer uma hipótese colocada pelo Tribunal onde correu o processo de insolvência e pelos credores da massa insolvente -, é evidente que se trata de um caso fortuito e inesperado;

n)              Importa também referir que o facto invocado no ponto 22.º das alegações de recurso, de que o resultado líquido da Recorrida era negativo desde o ano de 2010, não permite concluir que a insolvência era, já desde essa data, previsível e expectável, pois esta é uma situação, muitas das vezes, temporária;

o)              Resultou de modo absolutamente percetível da prova testemunhal produzida nos autos, que as flutuações na economia, ocorridas nos anos de 2011 e seguintes, impossibilitaram a Recorrida de revender a totalidade dos imóveis em causa, no prazo de 3 anos;

p)              Quanto ao alcance do instituto do “justo impedimento” propriamente dito, importa salientar uma vez mais que se trata de uma situação imprevista mas que não se pode cingir, como parece crer a Fazenda Pública, a casos extremos, de cataclismo, guerra ou grave alteração da ordem pública (cfr. ponto 20.º das alegações):

q)              No caso vertente, considerou - e bem - o Tribunal a quo que o fundamento para a verificação desse “justo impedimento” foi precisamente a declaração de insolvência, que, pelas razões acima expostas, impossibilitou a venda dos imóveis, originando o prolongamento no tempo da possibilidade de isentar de tributação, pelo período em que a insolvente esteve impedida de vender os seus bens;

r)               A Recorrida encontrava-se, a partir da declaração de insolvência, efetivamente impedida de concretizar a revenda dos imóveis e é essa circunstância, e só essa, que releva para efeitos da aferição da ocorrência de um “justo impedimento”;

s)               Por fim e como muito bem nota o Tribunal Recorrido, as eventuais alienações dos bens imóveis, em sede de processo de insolvência, sempre estariam isentas por efeitos do disposto no artigo 270.º do CIRE;

t)               Pelo que não pode proceder a argumentação expendida pela Fazenda Pública, devendo ser julgado improcedente o recurso agora apresentado, o que se requer.

Nestes termos, e nos mais de Direito aplicáveis, deve ser julgado improcedente, por não provado, o recurso agora apresentado pela Fazenda Pública, mantendo-se, nessa parte, a decisão proferida nos autos, com os fundamentos acima invocados, tudo com as demais consequências legais.

Nos termos do disposto no artigo 4.º, n.º 1, alínea u), do Regulamento das Custas Processuais, as sociedades comerciais que estejam em situação de insolvência ou em processo de recuperação de empresa encontram-se isentas de custas, razão pela qual as mesmas não foram liquidadas


***

O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) junto deste Tribunal, emitiu parecer, suscitando a incompetência absoluta deste Tribunal, em razão da hierarquia.

***

As partes foram notificadas do aludido parecer mantendo-se silentes.

***

Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.

***

II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:

“1)             A V….., S.A., tem sede na ….., iniciou a sua atividade em 10 de julho de 2007, e encontra-se coletada, a título principal, para o exercício da atividade de “Construção de Edifícios (Residenciais e Não Residenciais) ” e, a título secundário, para o exercício da atividade de “Compra e Venda de Bens Imobiliários”, a que correspondem respetivamente os CAE´s n.º 41200 e 68100 (fls. 25 a 27 do processo administrativo).

2)              Em 26 de março de 2009, no Cartório Notarial de Lisboa, J….., na qualidade de segundo outorgante e em representação da V….., S.A., outorgou um documento denominado de “Compra e Venda”, pela qual declarou comprar 304 imóveis pelo preço de € 33.404,441,00 (trinta e três milhões, quatrocentos e quatro mil, quatrocentos e quarenta e um euros) à D….., S.A., representada por M….., imóveis inscritos na matriz predial urbana da freguesia de ….., melhor identificados a fls. 32 verso a 99 do processo administrativo.

3)               A sociedade V….., S.A., declarou destinar os imóveis referenciados em 2) a revenda (fls. 97 do processo administrativo).

4)              Não foi liquidado o IMT devido em consequência da operação descrita em 2) em virtude de a sociedade V….., S.A., “beneficiar da isenção prevista no art.º 7 do CIMT” (fls. 97 verso do processo administrativo).

5)              De entre os imóveis constantes do instrumento em 2), constam os seguintes prédios urbanos e correspondentes preços, os quais eram compostos de lotes de terreno para construção urbana, todos eles inscritos na matriz predial urbana da freguesia de ….. sob os n.ºs …… (€ 270.000,00), n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., ….., n.º ….., n.º ….. (todos pelo valor de € 247.000,00), n.º ….. (€ 270.000,00), n.º ….. (€ 266.485,00), n.º ….. (€ 247.000,00), n.º ….. (€ 222.000,00), n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….. (todos pelo preço de € 214.000,00), n.º ….., n.º ….. (ambos pelo preço de € 222.000,00), n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….. (todos pelo valor de € 214.000,00), n.º ….., n.º ….. (ambos pelo preço de € 222.000,00), n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….. (todos pelo preço de € 214.000,000) e n.º ….. (€ 222.000,00) (cfr. documento a fls. 32 verso a 99 do processo administrativo).

6)              À medida em que foram sendo edificadas moradias nos prédios em 5), a sociedade V….., S.A., apresentou declarações de modelo 1 de IMT, nomeadamente em 6 de julho e 17 de dezembro de 2009 e 22 de dezembro de 2010, com base no motivo “1.1 – Prédio Novo”, pelo que os artigos referenciados deram origem a novos artigos matriciais correspondentes ao n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., n.º ….., tendo consequentemente sido fixado para cada um dos identificados imóveis o valor patrimonial tributário no valor de € 51.522,25 (por acordo e cfr. documento de fls. 105 e 105 verso do processo administrativo).

7)               Em 25 de janeiro de 2012 a sociedade V….., S.A., apresentou-se à insolvência no Tribunal de Comércio de Lisboa (fls. 202 a 205 dos autos).

8)              Em 23 de fevereiro de 2012 foi proferida sentença de declaração de insolvência da sociedade V….., S.A., e nomeada como administradora judicial A….. (com sede na …..), tendo a respetiva sentença transitado em julgado em 2 de abril de 2012 (fls. 23 verso do processo administrativo e 206 a 215 dos autos).

9)              Em 14 de maio de 2012, a coberto das ordens de serviços n.º OI….. e n.º OI….., os Serviços de Inspeção de Finanças da Direção de Finanças de Lisboa iniciaram um procedimento de inspeção tributária, de âmbito parcial, que incidiu sobre os exercícios de 2009, 2010, 2011 e 2012, tendo por objeto a verificação do cumprimento fiscal em sede de IMT pela sociedade V….., S.A. (fls. 11 a 12 verso e 15 verso do procedimento administrativo).

10)            Em 2 de agosto de 2012 o Serviço de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, através de cartas registadas com os n.º RC…..PT e RC…..PT, enviou os ofícios n.ºs ….. e n.º …..para a sociedade V….., S.A., e para A….., remetendo-os para as moradas indicadas em 1) e 8), pelos quais lhes foi comunicado que “no prazo de 15 dias poder(iam), querendo, exercer o direito de audição, por escrito ou oralmente, sobre o Projecto de Relatório da Inspeção Tributária, que se anexa” (fls. 107 verso e 108 do processo administrativo).

11)            O ofício enviado para A….., através do postal registado n.º RC…..PT, foi recebido no dia 3 de agosto de 2012 (fls. 315 dos autos).

12)            Em 31 de agosto de 2012 foi elaborado relatório de inspeção tributária, o qual procedeu a correções de natureza aritmética à matéria tributável da sociedade V….., S.A., em sede de IMT do ano de 2009 (no valor de € 1.966.450,00), 2010 (no valor de € 2.782.485,00), 2011 (no valor de € 6.476.000,00) e 2012 (no valor de € 16.715.546,00), de acordo com os seguintes fundamentos:
“(… ) III – Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria coletável
(…)
No âmbito do levantamento efetuado relativamente às operações imobiliárias ao nível das compras e sua afetação, apuramos que envolvem a aquisição de imóveis à empresa do grupo (D….., SA) que beneficiaram de isenção de IMT ao abrigo do artigo 7.º do CIMT, uma vez que o sujeito passivo assumiu no ato de compra que se destinavam à revenda.
Contudo, posteriormente à data de aquisição dos imóveis, verificou-se as seguintes situações:
a)               – Imóveis  vendidos no prazo de 3 anos, beneficiando da isenção do IMT,
b)              – Imóveis  vendidos no prazo de 3 anos, mas novamente para revenda,
c)               – Imóveis  não revendidos  no prazo de 3 anos,
d)              – Imóveis aos quais foi conferido destino diferente do da revenda, porque os lotes de terreno para construção deram origem  a  propriedade  plena  (moradias),  implicando  por  si, relativamente às situações elencadas nas alíneas b), c) e d), a caducidade do benefício de isenção previsto no artigo 7.º do CIMT.
Atendendo a que,
O Código de IMT estabelece no seu artigo 7.º os condicionalismos para o benefício da isenção de imposto, como sendo:
i) o prédio destinar-se a revenda;
ii)              antes  da  aquisição deve ser apresentada declaração comprovativa do exercício da actividade de revenda de imóveis  pela sociedade adquirente;
iii)             no ano anterior tem de ter existido o exercício normal da actividade de revenda pela mesma sociedade;
iv)             os prédios adquiridos têm de ser revendidos no prazo de 3 anos (sob pena de caducidade do benefício);
e  v)  os  prédios  embora  revendidos  no  prazo  legal,  não  sejam  revendidos,  novamente  para revenda.
Porém, o Código do IMT, nomeadamente o n.º 5 do artigo 11.º estabelece, igualmente, que a isenção deixa de aplicar-se quando for conferido ao imóvel um destino diferente, ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de 3 anos ou foram novamente para revenda.
Assim face à luz da legislação citada e à situação em concreto, tal como já se referiu verificam-se diversas situações:
1)               Os prédios revendidos no prazo de 3 anos, após a data da aquisição, mantêm o direito da citada isenção prevista nos termos do artigo 7.º do CIMT.
2)              Os prédios não revendidos no prazo de 3 anos, após a data de aquisição, ou os revendidos mas novamente para revenda, constituem situações que fazem caducar a isenção que havia sido concedida, como prescreve o n.º 5 do artigo 1.º do CIMT.
Por último,
3)               Os prédios correspondentes às parcelas de terreno para a construção que deram origem à inscrição de prédios novos, configura um destino diferente do de revenda, pelo que caducou o direito à isenção de IMT, prevista no n.º 5 do artigo 11.º do CIMT.
Das situações elencadas e que envolvem apenas a caducidade da isenção de IMT referida, o sujeito passivo deveria ter solicitado no prazo de 30 dias, a respectiva liquidação do IMI, conforme dispõe o artigo 34.º do CIMT.
Das diligências efectuadas até à data, constata-se que o sujeito passivo não procedeu à liquidação do IMT a que estava obrigado, sobre o valor do ato ou contrato dos imóveis ou sobre o valor patrimonial atribuído, quando superior (cfr. artigo 12.º do CIMT), pelo que infringiu o artigo 36º do CIMT.
Face ao referido, não tendo o sujeito passivo procedido à liquidação do IMT, no prazo estabelecido legalmente, nos termos dos citados artigos, propõe-se a liquidação do mesmo, cujo limite temporal diverge, consoante as situações antes referenciadas e, que de imediato passamos a identificar e quantificar.
III. 1.3 – Correções em sede de IMT
(…)
III. 1.3.1 – Valor tributável para efeitos de IMT
(…)
III. 1.3.1 – A) Prédios não revendidos no prazo de 3 anos, após a data de aquisição
Dos prédios adquiridos para revenda por escritura pública de 26 -03-2009, o sujeito passivo não revendeu no prazo de 3 anos, os prédios urbanos identificados na listagem (cfr. anexo 10), caducando deste forma a isenção prevista no n.º 5 do artigo 11.º do CIMT, que termina em 2012-03-26 ( – Data a partir da qual deve o sujeito passivo solicitar a liquidação do IMT, junto do Serviço de Finanças competente, conforme o preceituado constante dos artigos 19.º, 34.º e 36.º todos do CIMT).
Atendendo a que o sujeito passivo não requereu à respetiva liquidação do IMT devido, apurou - se que foi subtraído à tributação o valor global de € 13.715.546,00, respeitantes aos prédios adquiridos para revenda e não revendidos no prazo de 3 anos identificados na listagem (cfr. anexo 10), que deveria ter sido requerido a partir da data 26 -03-2012 (correspondente à data limite para revenda/data da caducidade da isenção), conforme se descreve:
Quadro I – Prédios adquiridos para revenda e não revendidos no prazo de 3 anos

Valor tributável global para efeitos de IMT
Data de aquisição              26-03-2009      
Data limite da revenda/caducidade da isenção    26-03-2012        € 16.715.546,00
Data limite para o SP solicitar a liquidação (30 dias, artigo 34.º n.º 1 do CIMT)       26-04-2012       
TOTAL    16.715.546,00

III. 1.3.1 – B) Prédios revendidos novamente para revenda
(…)
III. 1.3.1 – C) Prédios aos quais foi conferido destino diferente do da revenda

Em 26-03-2009, o sujeito passivo assumiu no ato da escritura de compra que os prédios se destinavam a revenda. Mas, pelos elementos apresentados pelo sujeito passivo e consultados no sistema informático da AT, a isenção de IMT que os prédios urbanos (lotes de terreno para construção) beneficiaram ao abrigo do artigo 7.º do CIMT, caducou pelo facto de lhe ter sido dado destino distinto do da venda (cfr. n.º 5 do artº 11.º do CIMT).
A data da caducidade da referida isenção coincide em termos temporais com a data em que os lotes de terreno para construção deram origem à inscrição de prédios novos 9 (…), com a indicação de “propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente” (moradias), conforme consta das declarações de liquidação modelo 1, com os registos identificados na listagem (cfr. anexo 12) e recepcionados em 2009 e 2010, as quais são passível de consulta no portal das finanças pelo sujeito passivo.
Assim sendo, nas listagens encontram-se elencados os prédios urbanos (a que o sujeito passivo conferiu destino diferente do da revenda), e os correspondentes valores tributáveis sobre os quais vai incidir a liquidação de IMT, o valor do contrato ou o valor patrimonial tributário se superior e a data a partir da qual deram origem a um prédio novo, enquanto data a que lhe deu destino diferente e, como tal, em que deve ser requerida a competente liquidação de IMT em falta e que a seguir se sintetiza:
Quadro I – Prédios que lhe foi conferido destino diferente do da revenda
Valor tributável global para efeitos de IMT
Data limite da Caducidade            06-07-2009       € 1.720.000,00
Data limite para o S.P. solicitar a liquidação         06-08-2009      
Data limite da Caducidade            17-12-2009        € 2.782.485,00
Data limite para o S.P. solicitar a liquidação         17-01-2010        
Data limite da Caducidade            22-12-2009       € 6.476.000,00
Data limite para o S.P. solicitar a liquidação         22-01-211          
TOTAL    € 10.978.000,00
(…)
IX – Direito de audição – Fundamentação
(…)
findo o prazo legalmente previsto, sem que o sujeito passivo tenha exercido o direito de audição que lhe assiste, propõe-se a manutenção das correções inicialmente propostas no projeto de conclusões do relatório.
(… )” (fls. 11, 15 verso a 19 verso do processo administrativo).

13)            Em 12 de setembro de 2012 a sociedade V….., S.A. recebeu o ofício n.º ….., o qual levou ao seu conhecimento o teor do relatório de inspeção tributária, ofício que foi enviado pelo Serviço de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, através de carta registada com o n.º RC…..PT (fls. 216 e 316 dos autos).

14)            Em 30 de outubro de 2012 foi efetuada a liquidação do IMT, cujo valor se cifra no valor de € 1.600.734,71, e de juros compensatórios no valor de € 83.601,40, de acordo com as notas demonstrativas seguintes:

Cálculo de juros compensatórios

Capital    Dia início            Dia fim Juros compensatórios

€ 420.940,00       23-01-2011        30-10-2012        € 29.846,37

Juros posteriores a 31-12-1998 – artº 2, DL 398/98

Capital    Inicio    Fim        Dias       Taxa      Juros

420.940,00           23-01-2011        30-10-2012        647         4,00%  29.846,38

Cálculo de juros compensatórios

Capital    Dia início            Dia fim Juros compensatórios

€ 878.044,80        26-04-2010       30-10-2012        € 18.090,13

Juros posteriores a 31-12-1998 – artº 2, DL 398/98

Capital    Inicio    Fim        Dias       Taxa      Juros

878.044,80           26-04-2012       30-10-2012        188        4,00%  18.090,13

Cálculo de juros compensatórios

Capital    Dia início            Dia fim Juros compensatórios

€ 9.088,38             24-12-2009       30-10-2012        € 1.037,82

Juros posteriores a 31-12-1998 – artº 2, DL 398/98

Capital    Inicio    Fim        Dias       Taxa      Juros

9.088,38 24-12-2009        30-10-2012        1042     4,00%   1.037,82

Cálculo de juros compensatórios

Capital    Dia início            Dia fim Juros compensatórios

€ 111.800,00        07-08-2009       30-10-2012        € 14.469,68

Juros posteriores a 31-12-1998 – artº 2, DL 398/98

Capital    Inicio    Fim        Dias       Taxa      Juros

111.800,00            07-08-2009       30-10-2012        1181      4,00%  14.469,68

Cálculo de juros compensatórios

Capital    Dia início            Dia fim Juros compensatórios

€ 180.861,52        18-01-2010        30-10-2012        € 20.157,39

Juros posteriores a 31-12-1998 – artº 2, DL 398/98

Capital    Inicio    Fim        Dias       Taxa      Juros

180.861,52            18-01-2010        30-10-2012        1017       4,00%  20.157,39

(cfr. fls. 112 a 119 dos autos).

15)            O Serviço de Finanças de Alcochete enviou para A….., na qualidade de Administradora de Insolvência da sociedade V….., S.A., o ofício n.º ….., pelo qual levou ao seu conhecimento o ato de liquidação mencionado, através de carta registada com aviso de receção n.º RD…..PT, sendo que o respetivo talão de receção se mostra assinado em 20 de novembro de 2012 (fls. 120 do processo administrativo).


***

A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte: “Inexistem factos não provados da instrução da causa”.

***

Consta como motivação da matéria de facto que: “A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos constantes do processo administrativo apenso e nos autos, os quais foram especificamente referidos. As testemunhas inquiridas, conforme ata de fls. 399/400 dos autos, não contribuíram para a formação da convicção do Tribunal visto que se limitaram a contextualizar e corroborar o teor dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo, sendo que tais documentos não foram impugnados pela Fazenda Pública.”

***

Por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada adita-se ao probatório, ao abrigo do preceituado no artigo 662.º, nº 1, do CPC, ex vi artigo 281.º do CPPT, a seguinte factualidade:
16) A sentença de insolvência prolatada pelo Tribunal do Comércio de Lisboa-1º juízo, no âmbito do processo nº 125/12-0TYLSB, e melhor evidenciada em 8), apresentava, designadamente, o seguinte teor:
“1 - V….., SA, pessoa colectiva n.° ….., com sede na ….., encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comerciai de Lisboa.
2 - V….., SA, tem por objecto social Construção, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim e tem o capital social de €50.000,00.
3 - É presidente do Conselho de Administração da requerente M…...
4 - A requerente não tem qualquer trabalhador ao seu serviço.
5 - Relativamente ao exercício de 2010 a requerente apresentou o resultado liquido do período negativo de €362.195,70, o activo de €29.810.529,40, o passivo de €30.134965,44 e o capital próprio negativo de €324.436,04.
*
A questão que nestes autos importa decidir é a de saber se deve ser declarada a insolvência da requerente, questão que passa pela determinação da situação de impossibilidade de cumprimento das suas obrigações vencidas e/ou da existência de um passivo manifestamente superior ao activo.
*
4. Fundamentação de direito
Prescreve o art. 3.º, n°1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas aprovado pelo Decreto-Lei n° 53/04 de 18 de Março, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n° 200/04 de 18 de Agosto (código a que pertencem todas as disposições infra citadas sem qualquer outra indiciação), que “É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas" O n° 2 do mesmo preceito acrescenta que, no caso de o devedor ser uma pessoa colectiva, c também considerado insolvente "quando o seu passivo seja manifestamente superior ao seu activo, avaliados segundo as normas contabilísticas aplicáveis ” Por seu lado, o n.°4 prescreve que “equipara-se à situação de insolvência actual a que seja meramente iminente, no caso de apresentação do devedora insolvência”.
Já o art. 28° do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa dispõe que "A apresentação à insolvência por parle do devedor implica o reconhecimento por este da sua situação de insolvência…”
A requerente admite estar em situação de insolvência, incapaz de fazer face a obrigações vencidas.
Da factualidade apurada verifica-se que no exercício de 2010 a requerente apresentou o resultado liquido do período negativo de €362.195,70, o activo de €29.810.529,40, o passivo de €30.134965,44 e o capital próprio negativo de €324.436,04.
Em face de tal factualidade é evidente que a requerente apresenta um activo inferior ao passivo e manifesta incapacidade para fazer face aos seus compromissos.'
Fica, pois, demonstrada a situação de insolvência da requerente pelo que, nos termos dos arts. 3o, n°s 1 e 2 e 28°, ambos do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, cabe declarar a mesma de imediato.
5. Decisão
Face a todo o exposto, julgando procedente a presente acção:
1 — Declaro a insolvência da V….. SA, pessoa colectiva n.° ….., com sede na ….., matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.
2 - Fixo a residência ao administrador da insolvente, M….., na ….., (nos termos do disposto no art. 36°, n°1, al c) do Código da Insolvência c da Recuperação de Empresa).
3 - Como Administrador da Insolvência nomeio a Sra. Dra. A…..,indicada pela devedora constante da lista oficiai de Administradores de Insolvência de Lisboa, com domicílio na ….. (nos termos do disposto no art 36°, n°1, al. d) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa).
4 - Não se nomeia Comissão de Credores, por não se conhecer a dimensão da massa insolvente (art 66° do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa).
5 - Ordeno a imediata apreensão, para imediata entrega ao administrador da insolvência, dos elementos da contabilidade da insolvente e de todos os seus bens, ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos (art 36°, al. g), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa).
6 - Declaro aberto o incidente de qualificação da insolvência com carácter pleno (art. 36° al. i) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa).
7 - Fixo em 30 dias o prazo para a reclamação de créditos (art. 36°, al. j), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa).
8 - Designo, para realização da Assembleia de Apreciação do Relatório a que alude o art. 156° do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa o próximo dia 30 de Abril de 2012, pelas 14.00 horas - art. 36°, al. n), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa.
9 - Dê publicidade à sentença nos termos previstos no art. 38°, n° 7 e 37°, n°s 7 e 8 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (na versão introduzida pelo Decreto Lei n° 116/08 de 04/07).
10 - Notifique a presente sentença:
a) ao administrador da insolvente referido supra em 2), pessoalmente, enviando cópia da petição inicial (art. 37°, n°1 do Código da Insolvência c da Recuperação de Empresa);
b) à insolvente (n°2, do art. 37°, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa);
c) ao Ministério Público (art. 37°, n°7, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa).
11 - Cite os cinco maiores credores identificados a fls. 6/7, nos termos do art. 37°, n°s 3 e 5 e os demais credores e outros interessados, nos termos do art. 37°, n° 7.
12 - Remeta certidão à Conservatória do Registo Comercial competente, no prazo de 5 dias, nos termos e para os efeitos previstos no art. 38°, n° 2, al. b) e n° 5 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa e arts. 9°, ais. i) e 1) do Código de Registo Comercial,
Após trânsito em julgado desta sentença remeta certidão com nota de trânsito.
13 - Cumpra o disposto no art. 38°, n° 6 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa (na versão introduzida pelos Decreto Lei n° 116/08 de 04/07 e 185/2009 de 12/08).
14 - Avoco todos os processos de execução fiscal pendentes contra a insolvente a fim de serem apensados ao presente processo (art. 181.º, n°s 2 e 4 do Código de Processo Tributário).
Comunique a presente sentença à DGI e à Repartição de Finanças de competente.
15 - Comunique a presente decisão ao Fundo de Garantia Salarial, nos termos e para os efeitos do disposto no n°2, do art. 37°, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
16 - Custas pela massa insolvente (art. 304°, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa).
*
Nos termos do disposto no art 36º, al, l) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, ficam advertidos os credores do insolvente de que devem comunicar de imediato ao administrador da insolvência a existência de quaisquer garantias reais de que beneficiem.
*
Noa termos do disposto no art. 36.º, al. m) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, ficam advertidos os devedores do insolvente de que as prestações a que estejam obrigados deverão set feitas ao administrador da insolvência e não ao insolvente.
*
Nos termos do disposto no art. 88º, nº1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, com a presente sentença fica vedada a possibilidade de instauração ou de prosseguimento de qualquer acção executiva que atinja o património da insolvente.
*
Notifique a Sra, Administradora nomeada para vir aos autos, no prazo de 5 dias,
confirmar a aceitação do cargo, juntar comprovativo da publicação dos anúncios e, para efeitos de ulterior processamento de remuneração, indicar o seu nº de contribuinte fiscal e o regime de tributação a que está sujeita.
*
Atento que não resulta dos autos a existência de liquidez da massa insolvente, (…) dê-se pagamento à Srª Administradora nomeada, logo que manifeste a aceitação (…)”

17) No exercício de 2010, “V….., SA”, declarou os seguintes resultados:
Resultado líquido do período negativo de €362.195,70
Ativo: €29.810.529,40
Passivo: €30.134965,44
Capital próprio negativo de €324.436,04.
(facto não controvertido: acordo das partes e facto que se extrai da factualidade constante na sentença de insolvência junta a fls. 210 a 215 dos autos);

***

III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação de IMT, no valor global de €1.674.209,91, anulando o ato impugnado na parte em que considerou verificada a caducidade da isenção de tributação, por falta de revenda dos prédios no prazo de três anos.

Em termos de delimitação da lide recursiva, importa salientar que apenas o DRFP interpôs recurso jurisdicional da sentença visada nos presentes autos, tendo, por conseguinte, transitado em julgado as remanescentes correções de IMT e todas as questões em que decaiu, concretamente, falta de audição prévia e consequente falta de fundamentação do ato de liquidação e ilegalidade do ato de liquidação de juros compensatórios.

Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se a sentença padece de erro de julgamento por errónea apreciação dos pressupostos de facto e de direito, competindo, para o efeito, analisar se, in casu, a declaração de insolvência pode ser entendida como “justo impedimento” como ajuizou o Tribunal a quo atentos os efeitos patrimoniais daí advenientes ou se tal factualidade não é, per se, suficiente para se concluir pela impossibilidade legal de revenda dos imóveis em contenda, e concreta subsunção e enquadramento jurídico enquanto “justo impedimento”, como sustenta a Recorrente.

Antes, porém, cumpre aferir da questão prévia suscitada pelo Digno Magistrado do Ministério Público referente à incompetência em razão da hierarquia.

Comecemos, então, pela arguida incompetência em razão da hierarquia, uma vez que a infração das regras da competência em razão da hierarquia determina a incompetência absoluta do tribunal, constituindo uma questão que o tribunal deve conhecer, oficiosamente ou mediante arguição, com prioridade sobre qualquer outra (cfr. artigos 16.º, n.ºs 1 e 2, 18.º, n.º 3, do CPPT e artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT).

Apreciando.

De harmonia com o disposto no artigo 280.º, nº 1, do CPPT das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do STA (artigos 26.º, alínea b) e 38.º, alínea a), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF)).

A competência, sendo um pressuposto processual afere-se pelo pedido e pela causa de pedir, ou seja, pela pretensão do autor e pelos factos com relevância jurídica, tal como são expostos pelo autor, sendo certo que não é a interpretação subjetiva desses factos que interessa à determinação da competência do tribunal mas a relevância objetiva desses factos.

Para determinação da competência hierárquica, à face do preceituado nos citados artigos 26.º, alínea b), e 38.º, alínea a) do ETAF e artigo 280º, n.º 1, do CPPT, o que é relevante é que o Recorrente, nas alegações de recurso e respetivas conclusões, suscite qualquer questão de facto ou invoque, como suporte da sua pretensão, factos que não foram dados como provados na decisão recorrida.

Com efeito, o recurso não versa exclusivamente matéria de direito, se nas respetivas conclusões se questionar a matéria de facto, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos, quer, ainda, por o Tribunal, no âmbito dos seus poderes cognição, ter entendido fixar matéria de facto que reputou relevante para a apreciação da lide[1].

In casu, não obstante a Recorrente não ter procedido à impugnação da matéria de facto, não se discernindo qualquer aditamento seja por substituição, seja por complementação, a verdade é que atentando nas suas conclusões, aquiesce-se a necessidade de juízo de valor sobre a matéria de facto.

Em bom rigor, sempre que para a apreciação do erro sobre os pressupostos de direito o Tribunal ad quem tenha que emitir uma apreciação ou um juízo de valor sobre a matéria de facto, independentemente da bondade ou da possibilidade de êxito da mesma, a questão envolve, necessariamente, matéria de facto.

No caso vertente, analisadas as conclusões das alegações da Recorrente, coadjuvadas com o teor das mesmas, constata-se que o objeto do recurso não se limita à questão de direito, defendendo que existe uma deficiente apreciação do direito aos factos que estiveram na origem da liquidação, mormente, em termos de valoração da declaração de insolvência da Recorrida e de que forma, e em que moldes, a mesma a impossibilitou de revender os prédios adquiridos, importando, assim, juízo de valor sobre a realidade contemplada no acervo probatório, mormente, nos pontos 7, 8, 12, 16 e 17.

Ademais, a alicerçar a competência do presente Tribunal está, desde logo, o aditamento de factualidade (pontos 16 e 17) pelo Tribunal ad quem e no âmbito dos seus poderes de cognição, pelo que em ordem ao consignado nos artigos 38.º, alínea a) e 26.º, alínea b) do ETAF, a competência para o seu conhecimento pertence a este Tribunal.

E por assim ser, sem necessidade de outros considerandos, improcede a exceção de incompetência absoluta deste Tribunal, em razão da hierarquia, aduzida pela Recorrida.

Vejamos, ora, se a decisão recorrida padece do erro de julgamento que lhe vem assacado.

A Recorrente alega que a decisão recorrida não fez a correta interpretação dos factos nem a adequada aplicação do direito a esses mesmos factos, já que, ao contrário do que ali se decidiu, a declaração de insolvência da Recorrida não a impossibilitou de revender os 254 prédios adquiridos para esse efeito.

Sublinha, para o efeito, que nos termos do disposto nos artigos 81.º, nº1 e 54.º ambos do CIRE, a partir da declaração de insolvência, competem ao administrador da insolvência os poderes de administração e disposição de bens do insolvente, devendo, nesse âmbito, proceder à respetiva administração que deve abranger não só os bens já existentes, como aqueles que o insolvente venha a adquirir na pendência do processo.

Logo, pese embora a partir da declaração de insolvência, os insolventes estejam impossibilitados de proceder à alienação dos bens que integram a massa insolvente, a verdade é que podem fazê-lo através do administrador nomeado judicialmente, no âmbito do processo de insolvência.

Portanto, a Recorrida não esteve impossibilitada de revender os prédios que adquiriu e destinou a revenda, em 26 de março de 2009, dentro do prazo de caducidade de 3 anos estabelecido no artigo 11.º, n.º 5, do CIMT.

De todo o modo, sublinha que mesmo que se entenda que a Recorrida esteve efetivamente impossibilitada de revender os referidos prédios, sempre lhe competiria demonstrar que essa alegada situação de “justo impedimento” para proceder à revenda dos prédios, dentro do prazo de caducidade estabelecido no artigo 11.º, n.º 5, do CIMT, não lhe pode ser atribuída, o que não logrou fazer no caso vertente.

Com efeito, apenas é passível de configuração enquanto “justo impedimento” uma ocorrência para a qual o sujeito passivo em nada contribuiu, o que comprovadamente não se verifica quanto à Recorrida, até porque foi a própria que se apresentou à insolvência.

Ademais, no exercício de 2010, a Recorrida já apresentava um resultado líquido negativo, pelo que a declaração de insolvência proferida, em 23 de fevereiro de 2012, não pode, de todo, configurar uma situação súbita e imprevisível, impeditiva de proceder à revenda dos referidos prédios no prazo de caducidade da isenção.

Dissente a Recorrida contra-alegando pela manutenção do julgado anulatório, visto que contrariamente ao defendido pela Recorrente o Tribunal a quo interpretou corretamente os factos ao direito.

Mais densifica, para o efeito, que a Recorrente parte de um pressuposto errado, ao considerar que as sociedades insolventes se encontram na plenitude das suas capacidades e personalidade jurídicas e isto porque após a declaração da insolvência da sociedade, cessa a prossecução do seu objeto social e, designadamente, a obtenção de lucros que é a base do IRC.

Com efeito, enfatiza que todos os bens anteriormente pertencentes ao agora insolvente passam a integrar a massa insolvente, a qual serve, não para prosseguir o objeto social da empresa, mas para pagar os créditos reconhecidos.

Razão pela qual, aduz que uma coisa é dizer-se que, mesmo após a declaração de insolvência, os bens que pertencem à massa insolvente podem ser alienados pelo respetivo administrador da insolvência, outra, bem diferente, é sugerir-se que a alienação que venha a ocorrer nesses moldes consubstancia o desenvolvimento normal da atividade da sociedade insolvente.

Ademais, sublinha que tendo a ora Recorrida sido declarada insolvente em 23 de fevereiro de 2012, e terminando em 26 de março de 2012 o referido prazo de 3 anos, no período compreendido entre tais datas, era, efetivamente e na prática, impossível proceder à venda dos imóveis adquiridos em 2009, ainda que no âmbito do processo de insolvência, até porque o Administrador de Insolvência não podia, na prática, proceder à alienação dos imóveis sem a aprovação dos respetivos credores, reunidos em Assembleia Geral.

Densifica quanto à questão do “justo impedimento”, que as considerações feitas no recurso agora apresentado não podem proceder, porquanto, em momento algum, foram questionados nos autos os fundamentos e as motivações que levaram a Recorrida a lançar mão do processo de insolvência, tal como nunca foi colocada em causa a veracidade da situação económico-financeira que originou a própria declaração de insolvência.

Termina dizendo que a partir da declaração de insolvência, se encontrava, efetivamente, impedida de concretizar a revenda dos imóveis e é essa circunstância, e só essa, que releva para efeitos da aferição da ocorrência de um “justo impedimento”.

Relevando, in fine, que, de resto, as eventuais alienações dos bens imóveis, em processo de insolvência, sempre estariam isentas por efeitos do disposto no artigo 270.º do CIRE.

Para concluir pela procedência o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo alinhou o seguinte discurso fundamentador:

“O prazo de 3 anos para efetuar a revenda inicia-se no próprio dia da aquisição (artigo 329.º do Código Civil).

O prazo de caducidade não se suspende nem interrompe e só impede a caducidade a prática do ato, dentro do prazo legal, a que a lei atribui efeito impeditivo (artigo 328.º e 331.º do Código Civil).

 Considera-se «justo impedimento» o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários que obste à prática atempada do ato (artigo 140.º n.º 1 do Código de Processo Civil, na redação atual, correspondente ao artigo 146.º do código revisto).

(…)

O Supremo Tribunal Administrativo, em aresto de 31 de janeiro de 2012, no processo n.º 0706/11, e no aresto de 6 de março de 2013, no processo n.º 0104/13 (assim como o Tribunal Central Administrativo Sul, no acórdão de 19 de março de 2015, no processo n.º 07063/13, todos disponíveis em www.dgsi.pt) decidiu que, para que se verifique o “justo impedimento”, ou seja a impossibilidade de concretização da revenda do imóvel  no prazo de caducidade da isenção de tributação, é necessário demonstrar uma verdadeira impossibilidade de realizar a venda, ainda que com perdas. Para que tal aconteça é insuficiente a existência de uma dificuldade (eventualmente a impossibilidade de a efetuar nos termos desejados em virtude das circunstâncias adversas de mercado), tendo que ser demonstrada uma alteração súbita, imprevisível e radical das condições de mercado, em determinadas circunstâncias (tais como situações de cataclismo, guerra ou grave alteração da ordem pública) que possam originar a uma verdadeira impossibilidade objetiva de alcançar a venda. (…)

Alega a impugnante que o prazo de caducidade de 3 anos para realizar a revenda ocorreu a 26 de março de 2012. Porém, como a 23 de fevereiro de 2012 foi proferida sentença que a declarou insolvente, atendendo à privação dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, em seu entendimento tal circunstância impossibilitou-a de proceder à revenda dos prédios, constituindo uma situação de “justo impedimento”.

(…)

O principal efeito da declaração de insolvência é o da privação dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, por si ou pelos seus administradores, passando tais poderes a competir ao administrador da insolvência.

Neste sentido dispõem os n.º 1 e n.º 6 do artigo 81.º do CIRE, que a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência, sob pena da ineficácia dos atos realizados pelo insolvente em contravenção com tal privação. (…)

“[é] entendimento do Tribunal que não se antolha como arbitrário o prazo de 3 anos fixado no artigo 11.º, n.º 5 do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, para se efetuar a revenda do prédio, mas antes fundado em razões objetivas, que se justificam e adequam à realização do ato de comércio em causa. (…)

[o] Tribunal entende que a declaração de insolvência referenciada em 8) da fundamentação de facto, impossibilitou a impugnante (a partir de 23 de fevereiro de 2012) de revender os prédios adquiridos com esse fito, considerando o efeito de privação de administração e de disposição de bens compreendidos na massa insolvente, nos termos assinalados.

E havendo uma situação de impossibilidade para efetuar a revenda, o prazo de caducidade deve justamente ser alongado pelo tempo correspondente à duração da impossibilidade. Nessa situação, em princípio, há-de assistir ao contribuinte o direito de revender os prédios com o benefício da isenção pelo período equivalente à duração da impossibilidade (pese embora, na situação em apreço, poder se aplicável a isenção prevista no artigo 271.º do CIRE).

Assim sendo, também não se divisa qualquer lacuna legal a este respeito, nem a necessidade de se proceder a uma interpretação corretiva das normas em referência.

Ante o exposto e em suma, ao não haver considerado o estado de impossibilidade da impugnante para concretizar a revenda dos prédios, o ato sob impugnação padece de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, devendo ser anulado em conformidade.”

Apreciando.

Comecemos por convocar o quadro jurídico que releva para o caso dos autos.

De harmonia com o disposto no artigo 7.º, nº 1 do CIMT:

“São isentas do IMT as aquisições de prédios para revenda, nos termos do número seguinte, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 112.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 109.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda”.

Por sua vez o nº 2 do citado normativo preceitua que:

 “A isenção prevista no número anterior não prejudica a liquidação e pagamento do imposto, nos termos gerais, salvo se se reconhecer que o adquirente exerce normal e habitualmente a atividade de comprador de prédios para revenda”.

Mais consignando o seu nº3 que:

“Para efeitos do disposto na parte final do número anterior, considera-se que o sujeito passivo exerce normal e habitualmente a atividade quando comprove o seu exercício no ano anterior mediante certidão passada pelo serviço de finanças competente, devendo constar sempre daquela certidão se, no ano anterior, foi adquirido para revenda ou revendido algum prédio antes adquirido para esse fim”.

No concernente à caducidade da isenção, o artigo 11.º, nº 5 do CIMT estatui que:

“A aquisição a que se refere o artigo 7.º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda”.

Resulta, assim, da conjugação do n.º 1, do artigo 7.º, e n.º 5, do artigo 11.º, do CIMT que a isenção de IMT, na aquisição de prédios para revenda, e no que para os autos releva caduca se os imóveis não forem revendidos no prazo de três anos.

O citado artigo 7.º, nº 1, insere-se formalmente nas “isenções” previstas no CIMT, sendo interpretado, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, como verdadeiro benefício fiscal[2], sendo que a isenção de tributação assume, por natureza, carácter excecional, porquanto encerra uma derrogação aos princípios gerais que presidem à tributação, na medida em que derrogam, de certa forma, os princípios da capacidade contributiva, da generalidade e da igualdade da tributação e apenas encontram justificação na tutela de interesses públicos constitucionalmente relevantes, superiores aos da própria tributação, sejam de carácter político, económico, social ou cultural.

Encontramo-nos, assim, perante uma “isenção condicionada à verificação de um conjunto de pressupostos, que ocorrem de forma sucessiva, muitos dos quais se produzem depois do facto gerador da obrigação de imposto[3].”

Para efeitos de operatividade da condição resolutiva consignada no n.º 5 do artigo 11.º do CIMT, importa, outrossim, aquilatar-se da possibilidade de apelo à figura do “justo impedimento”.

Noutra formulação, cumpre aferir se pode relevar, e em caso afirmativo, em que moldes, o instituto do “justo impedimento” preceituado no artigo 146.º do CPC (atual 140.º) ou, pelo menos, se deve relevar na verificação da condição resolutiva a diligência do contribuinte em ordem à revenda.

Comecemos, então, por chamar à colação o citado normativo, com a redação à data aplicável, o qual preceituava que:

“Considera-se “justo impedimento” o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do ato”.

Importa, desde já, relevar que pese embora o aludido preceito legal se reporte à prática de atos processuais -e, claramente, a não realização de revenda do prédio dentro do prazo de três anos não possa ser entendida como um ato processual- a verdade é que tem sido ponderada a possibilidade de aplicação de tal princípio em situações muito particulares.

Assim o doutrinou Jorge Lopes de Sousa:”[e]sta regra do “justo impedimento” que, como transparece da sua própria designação, é reclamada por exigências evidentes de justiça, deve ser considerada de aplicação generalizada, não só por imperativo constitucional decorrente do princípio da justiça que decorre da ideia de Estado de Direito democrático consignada no art. 2.º da CRP, mas também do próprio princípio do acesso aos tribunais e à justiça (arts. 20.º, n.º 1, e 268º, n.º 4, da CRP) que não pode deixar de exigir para a sua concretização a concessão de uma possibilidade efectiva e não apenas teórica de utilização dos meios contenciosos de defesa de direitos e interesses legalmente protegidos. Aliás deve entender-se que vigora no nosso direito uma regra básica de que não deve perder direitos pelo decurso do tempo quem esteve impossibilitado de exercê-los, regra essa que tem vários afloramentos, um dos quais é a regra do “justo impedimento”[4]

A Jurisprudência no tocante à questão específica da caducidade da isenção ponderou a questão, designadamente, no Acórdão do STA proferido no processo nº 0706/11, de 31.01.2012, da seguinte forma:

“Caso se admita essa posição, o que não temos por adquirido, poderia relevar-se para efeitos da caducidade da isenção a ocorrência de facto que impeça o contribuinte de respeitar o prazo de três anos para a revenda do prédio e que lhe não seja imputável.

No entanto, no caso sub judice os factos alegados pela Impugnante nunca poderiam consubstanciar o invocado “justo impedimento” porque não se referem a uma verdadeira impossibilidade de proceder à venda, mas apenas à falta de culpa por não ter efectuado a venda, o que é realidade bem diversa.

Toda a factualidade por ela alegada se refere, não a uma qualquer circunstância subjectiva (Que não vislumbramos, relativamente a uma sociedade, qual pudesse ser.) ou objectiva que tenha obstado à venda, que constitua um verdadeiro “impedimento”, mas antes à falta de culpa por não ter procedido à venda dentro do período de três anos após a compra; a sua alegação é no sentido de que, em razão da alteração das circunstâncias de mercado, não logrou conseguir interessado ao preço pretendido, apesar de todas as diligências que desenvolveu no sentido de efectuar a venda.

Ora, para que pudesse considerar-se verificado o “justo impedimento” era necessário que houvesse uma verdadeira impossibilidade de realizar a venda, ainda que com perdas, não sendo suficiente a dificuldade, eventualmente a impossibilidade de a efectuar nos termos desejados em virtude das circunstâncias adversas de mercado.

Admitimos que alterações súbitas, imprevisíveis e radicais das condições de mercado, em determinadas circunstâncias – referimo-nos, v.g., a situações de cataclismo, guerra ou grave alteração da ordem pública – possam dar origem a uma verdadeira impossibilidade objectiva de alcançar a venda. Mas, manifestamente, a alegação em causa não suporta tal impossibilidade.

Aliás, começando o prazo para a revenda a correr no dia imediatamente seguinte ao da aquisição, a existência de uma impossibilidade que se mantivesse ao longo de todo esse período de três anos concedido para a revenda sem perda da isenção, seria muito difícil de conceber fora do âmbito de situações excepcionais.

Designadamente, a crise do sector imobiliário a que se refere a Impugnante não se declarou de um dia para o outro e, muito menos, no dia seguinte ao da compra[5].” (destaque e sublinhado nosso).

Como visto, in casu, o Tribunal a quo acolhendo o entendimento da Recorrida e inclusivamente convocando a Jurisprudência a que supra se fez alusão, entendeu que a instauração do processo de insolvência obstou a que a venda dos bens imóveis em causa pudesse ser realizada, por entender que a insolvência acarreta uma situação de impossibilidade prática e efetiva de revenda alocando-a aos efeitos patrimoniais a ela advenientes, ou seja, indicando que o principal efeito da declaração de insolvência é o da privação dos poderes de administração e disposição dos bens integrantes da massa insolvente.

Logo, para se aquilatar do acerto da decisão recorrida, é vital chamar-se à colação o regime vertido no CIRE, com a redação à data aplicável.

Atentemos, então.

O processo de insolvência conforme contempla o artigo 1.º e resulta do preâmbulo do diploma é um processo de execução universal que tem como finalidade a liquidação do património de um devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores, ou a satisfação destes pela forma prevista num plano de insolvência, que nomeadamente se baseie na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente.

Sendo que quanto aos efeitos da declaração de insolvência importa ter presente que os mesmos podem ter carácter automático ou carácter eventual[6], sendo que no âmbito dos efeitos automáticos os mesmos podem ser bipartidos em efeitos pessoais e efeitos patrimoniais.

Os efeitos pessoais, como o próprio nome indica são todos aqueles efeitos que incidem sobre a esfera pessoal do insolvente, sendo que os efeitos patrimoniais, são todos aqueles efeitos que respeitam, diretamente, ao património do insolvente e que visam, em regra, a proteção direta dos credores concursais de qualquer atuação prejudicial do insolvente sobre os bens que integram a massa insolvente.

Como efeitos patrimoniais podemos assumir como tais: a indisponibilidade dos legais representantes sobre o património insolvente; a invalidade dos atos praticados pelos legais representantes; o suprimento da figura da massa insolvente como titulares dos bens e direitos patrimoniais do insolvente e a responsabilidade e a representação do insolvente nos seus órgãos para efeitos não patrimoniais.

Em ordem ao consignado no artigo 81.º do CIRE o insolvente, por efeito da declaração de insolvência, fica privado, por si ou por intermédio dos seus administradores, do poder de disposição e de administração dos bens que integram a massa insolvente.

Consagra-se, porém, a possibilidade de o devedor se manter na administração da massa insolvente nos casos em que esta integre uma empresa (cfr. artigos 223.º e seguintes do CIRE), pressupondo essa manutenção, entre outros aspetos, que o devedor a tenha requerido, tendo já apresentado, ou comprometendo-se a fazê-lo dentro de certo prazo, um plano de insolvência que preveja a continuidade da exploração da empresa por si próprio, e ainda que conte com a anuência do credor requerente ou da assembleia de credores.

Mais importa relevar que, conforme preceitua o nº2 do citado normativo, se encontra vedado ao devedor, dispor dos bens ou rendimentos futuros, mesmo daqueles que venha a adquirir apenas após o encerramento do processo, logo bens e rendimentos que não integram a massa insolvente, uma vez que são adquiridos após o encerramento do processo e por isso após a cessação dos efeitos da declaração de insolvência sobre o devedor.

Dir-se-á, portanto, que o administrador da insolvência assume a representação do insolvente para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessam à insolvência, conforme resulta claro do nº 4 do citado artigo 81.º do CIRE.

Como doutrinam Luís Carvalho Fernandes e João Labareda[7]:

“O efeito patrimonial da declaração de insolvência, quanto ao devedor, é de natureza primordial e reflete-se nos seus poderes de atuação nesse domínio da sua esfera jurídica. Na verdade, por força do nº 1 da norma em anotação, quanto aos bens compreendidos na massa insolvente, tal como a define o artº 46.º, o devedor fica privado dos poderes de administração e de disposição. No sentido de a tornar plenamente eficaz, esta limitação respeita tanto ao devedor como aos seus administradores, no sentido do art.º 6.º. Os poderes de que o devedor fica privado são atribuídos ao administrador da insolvência.”

Portanto, “de acordo com o regime legal da insolvência, o devedor insolvente privado dos poderes de administração e disposição dos bens que integram a massa insolvente, passa a ser representado, nesse âmbito, pelo administrador da insolvência a quem lhe são transferidos tais poderes, pelo que a declaração da insolvência não implica uma perda da sua capacidade judiciária, mas uma substituição na sua representação processual[8] [Miguel Teixeira de Sousa faz referência à denominada substituição representativa (o sujeito que instaura a acção ou contra o qual esta é proposta age em nome próprio e, por isso, é parte processual) alertando para o facto de a mesma não se confundir com a representação judiciária ou com qualquer forma de suprimento da incapacidade judiciária - As Partes, o Objecto (…), pp. 53 e 54.]”.

Neste particular, importa, outrossim, ter presente que à sentença de declaração da insolvência se segue a imediata apreensão dos elementos de contabilidade e de todos os bens integrantes da massa insolvente pelo administrador da insolvência, conforme preceitua o artigo 149.º do CIRE, sendo que após o seu trânsito e realizada a assembleia de apreciação do relatório, o administrador da insolvência procede, com prontidão, à venda de todos os bens apreendidos para a massa insolvente, independentemente da verificação do passivo, na medida em que a tanto se não oponham as deliberações tomadas pelos credores na referida assembleia, em conformidade com o que se encontra regulado no artigo 158.º do CIRE.

Estabelecendo-se, outrossim, no artigo 161.º, nº 1 do CIRE o princípio geral de que depende do consentimento da comissão de credores, ou, se esta não existir, da assembleia de credores, a prática de atos jurídicos que assumam especial relevo para o processo de insolvência. A lei não fornece o conceito de atos jurídicos de especial relevo, porém, no seu nº2, indica os fatores a atender para efeitos dessa qualificação, concretamente, os riscos envolvidos e as suas repercussões sobre a tramitação ulterior do processo, as perspetivas de satisfação dos credores da insolvência e a suscetibilidade de recuperação da empresa.

Ora, feitos estes considerandos e transpondo-os para o caso vertente, resulta que assiste razão à Recorrente quando sustenta que, sem embargo de estar vedado à Recorrida, após a prolação da sentença da insolvência, qualquer poder de disposição e administração dos bens integrantes da massa falida, tal apenas introduz uma alteração em termos de esfera de atuação, ou seja, os poderes que anteriormente se encontravam na esfera da insolvente passam para a esfera do Administrador de Insolvência.

“Costuma dizer-se que a privação dos poderes de administração e disposição dos bens do devedor é um efeito necessário da declaração de insolvência, uma vez que se produz em todos os casos e por mero efeito da declaração de insolvência. [p]or efeitos necessários entende-se aqueles cuja produção é automática e não depende senão da prolação da sentença que declara a insolvência do devedor. Integram-se aqui a privação dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente (cfr. art. 81.º do CIRE), os deveres de apresentação no tribunal e colaboração com os órgãos da insolvência (cfr. art. 83.º do CIRE), os deveres de apresentação no tribunal e de colaboração com os órgãos da insolvência (cfr. art. 83.º do CIRE), o dever de respeitar a residência fixada na sentença [cfr. art. 36.º, al. c), do CIRE] e o dever de entrega imediata de documentos relevantes para o processo [cfr. art. 36º, al. f), do CIRE] [cfr. Catarina Serra, O novo regime português da insolvência-Uma introdução, Coimbra, Almedina, 2010 (4ª edição), p.50].

Mas, se é certo que assiste razão à Recorrente quando defende a aludida substituição de papéis e de esferas de atuação é, igualmente, certo que na senda do propugnado pela Recorrida, o mesmo não pode proceder à alienação de quaisquer bens que integrem a massa falida até ao trânsito em julgado da decisão de declaração de insolvência e mediante o cumprimento dos pressupostos contemplados no citado artigo 158.º do CIRE.

Porém, aqui chegados, assiste-nos a seguinte questão:

Será que se pode entender que esse efeito patrimonial acarreta uma impossibilidade objetiva capaz de subsumir-se no conceito de “justo impedimento” e obstar à tributação em sede de IMT?

E a resposta ajuizamos que tem de ser negativa. Expliquemos porque assim o entendemos.

Importa, desde já, relevar que a isenção de IMT de que goza a aquisição de prédios para revenda caduca no caso de não serem vendidos no prazo de três anos, logo encontra-se sujeita a uma condição resolutiva que o legislador apenas pretendeu fixar por referência ao tempo decorrido e já não aos motivos subjacentes à falta de revenda.

Dir-se-á, portanto, que ressalvadas as situações de “justo impedimento”, o legislador não pretendeu, de todo, relevar os motivos por que a revenda não ocorreu dentro do prazo aí fixado mas, tão-só, a circunstância de esta não se ter efetuado nesse tempo.

Com efeito, em ordem ao consignado no artigo 9.º, nº2, do CC e seguindo os ensinamentos de BAPTISTA MACHADO, ter-se-á de ter como assente que o texto da lei, constitui o ponto de partida do processo hermenêutico e também um seu limite, na medida em que não é possível considerar aqueles sentidos que não tenham nas palavras da lei qualquer apoio, “um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.[9]

Note-se que se fosse intenção deliberada do legislador subsumir no normativo um elenco de situações obstativas da venda tê-lo ia feito de forma expressa e inequívoca, o que, como visto não logrou fazê-lo.

Na tarefa hermenêutica não podem “distinguir-se situações que o legislador não distinguiu (ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus). O intérprete – no nosso caso, em primeira linha, a AT e, em segunda linha e sindicando a actuação desta, o tribunal – não pode relevar distinções que o legislador não estabeleceu, a menos que pudesse concluir com certeza que o pensamento do legislador fora atraiçoado na redacção da norma e, assim, que se impunha uma interpretação restritiva, o que, manifestamente, não é o caso, pois inexistem indícios no sentido de que o legislador tenha dito mais do que aquilo que queria dizer (Cfr. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 186, que refere ainda que «[o] argumento em que assenta este tipo de interpretação costuma ser assim expresso: cessant ratione legis cessat eius dispositivo (lá onde termina a razão de ser da lei termina o seu alcance)[10]”.

Ademais, importa ter presente que as normas de benefícios fiscais merecem tratamento autónomo porque são normas antissistemáticas por definição, estando em tensão permanente com o princípio da capacidade contributiva, que derrogam como padrão na repartição do imposto[11].

Razão pela qual, devem respeitar o princípio de interpretação estrita ou declarativa, fundado precisamente na sua natureza excecional ou antissistemática.

Contrariamente ao propugnado pela Recorrida, a questão não pode ser entendida e configurada como “justo impedimento”, visto que a impossibilidade prática de venda do bem no prazo legal, entenda-se no prazo de três anos, não pode, senão, entender-se que seja a si imputável, ou noutra formulação que a parte não tenha contribuído para a consumação de tal impossibilidade.

Note-se que, in casu, foi o próprio devedor que se apresentou à insolvência. É certo que o Tribunal ad quem não descura que de harmonia com o consignado no artigo 18.º do CIRE constitui um dever de o devedor requerer a sua declaração de insolvência, mas a verdade é que também dimana de tal normativo que esse pedido se tem de concretizar no prazo de 60 dias seguintes à data do conhecimento da situação de insolvência ou à data em que devesse conhecê-la.

Sendo que, in casu, a Recorrida apresenta uma situação patrimonial negativa desde 2010, não se percebendo, e não se demonstrando quais os motivos que terão estado no “arrastar” da apresentação à insolvência e mais ainda quais as razões, quais os motivos concretos porque não se consumou a revenda durante cerca de 35 meses.

Com efeito, atentando na petição inicial a Recorrida não densifica e demonstra, em termos fáticos e como era seu ónus, quais os motivos subjacentes à circunstância da insolvência não ter sido requerida em data anterior. Note-se, de resto, que a Recorrida assume, desde logo, um abrandamento das vendas dos imóveis por si detidos desde, pelo menos, 2011.

Não sendo, de todo, suficiente a alegação vaga e absolutamente genérica de que “[a] revenda só não foi efectuada dentro do prazo de três anos fixado no artigo 11.º, nº5 do Código de IMT por circunstâncias exógenas à vontade da própria empresa-a sua insolvência-, não previsíveis aquando da compra dos prédios em 26 de Março de 2009.”.

O Tribunal está, efetivamente, ciente do contexto de crise no sector da construção e no mercado imobiliário, porém -e como desde logo, referencia e reconhece a Recorrida- a mesma teve início no ano de 2009, não permitindo, sem mais, preencher o conceito de “justo impedimento”. Até porque, é um risco inerente à atividade por ela exercida, sendo que o risco é uma contingência que o agente comercial nunca poderá deixar de ponderar.

Aliás, conforme esclarece o Aresto do STA, proferido no processo nº 0104/13, de 06 de março de 2013: “para que pudesse considerar-se verificado o “justo impedimento” era necessário que houvesse uma verdadeira impossibilidade de realizar a venda, ainda que com perdas, não sendo suficiente a dificuldade ou, eventualmente, a impossibilidade de a efectuar nos termos desejados em virtude das circunstâncias não imputáveis ao vendedor.” (destaques e sublinhados nossos).

Na verdade, a Recorrida centra toda a sua argumentação num período muito curto, ou seja, num período delimitado temporalmente entre a data da prolação da sentença de insolvência e a data do termo do prazo para revender o bem imóvel, ou seja, um período que atinge cerca de um mês, mas não trata de justificar, demonstrar e idoneamente provar o período temporal anterior que, como visto, cifra-se em 35 meses.

Aduza-se, em abono da verdade, que não é possível inferir que o “justo impedimento” tenha sido equacionado para as situações de insolvência e muito menos para as situações em que foi a própria a requerê-la e, mais ainda quando não prova, adequada e circunstanciadamente, as razões que levaram à apresentação à insolvência e em data tão próxima da caducidade da isenção.

Conforme doutrina Lopes do Rego[12], com a atual redação do normativo 146.º do CPC “[o] que deverá relevar decisivamente para a verificação do “justo impedimento” - mais do que a cabal demonstração da ocorrência de um evento totalmente imprevisível e absolutamente impeditivo da prática atempada do acto – é a inexistência de culpa da parte, seu representante ou mandatário no excedimento ou ultrapassagem do prazo peremptório, a qual deverá naturalmente ser valorada em consonância com o critério geral estabelecido no n.º 2 do art.º 487.º do C. Civil (…)”.

António Santos Abrantes Geraldes[13], enuncia, neste particular, que “[a] experiência aconselha que tal mecanismo seja reservado para situações que verdadeiramente o justifiquem, desconsiderando, para além dos argumentos artificiosos, eventos imputáveis à própria parte ou aos seus representantes e que sejam reveladores de negligência ou da falta de diligência devida.”

Sublinhe-se e reitere-se que o Tribunal ad quem não pode alhear-se que o prazo para a revenda começa a correr no dia imediatamente seguinte ao da aquisição, sendo que, in casu, a Recorrida apresentou-se à insolvência cerca de dois meses antes de se consumar a caducidade da isenção.

Note-se, neste particular, que não releva, nem pode relevar, a argumentação da Recorrida constante na alínea l) das suas contra-alegações no sentido de que “em momento algum, foram questionados nos autos os fundamentos e as motivações que levaram a Recorrida a lançar mão do processo de insolvência, tal como nunca foi colocada em causa a veracidade da situação económico-financeira que originou a própria declaração de insolvência”, e isto porque, como é bom de ver, competia à Recorrida demonstrar, inequivocamente, as razões da sua pretensão devendo esclarecer, por qualquer forma e através dos meios probatórios que tem ao seu dispor, porque motivo se apresentou à insolvência, porque o fez nessa data, e quais os motivos subjacentes à existência de resultados negativos em exercícios anteriores ao pedido de declaração de insolvência.

Em sede de procedimento administrativo tributário incumbe à Administração Tributária a prova dos factos constitutivos do ato administrativo, ou seja, cumpre à entidade fiscalizadora aquilatar e indagar sobre a verificação do facto tributável e demais elementos pertinentes à liquidação do imposto, porquanto, o procedimento só pode produzir uma liquidação em sentido estrito quando, face aos elementos apurados, estiver adquirida a plena convicção da existência e conteúdo do facto tributário.

De resto, tal conclusão resulta evidente em face do princípio da verdade material, ínsito nos artigos. 50.º, do CPPT e 58.º, n.º 1, da LGT.

Compete, portanto, à Administração Tributária identificar o facto tributário e justificar os fundamentos para a sua pretensão, in casu, demonstrar faticamente que a Recorrida adquiriu um conjunto de bens imóveis para revenda, que beneficiou da isenção contemplada no artigo 11.º, nº5 do CIMT, sujeita a uma condição resolutiva a qual não se verificou e que, por esse motivo, teria de liquidar o IMT devido. Competindo, por seu turno, à Recorrida alegar e provar, inequivocamente, as razões que levaram à não celebração do negócio no prazo legal, com a materialização de todas as condicionantes que impossibilitaram, em concreto, a revenda.

No caso sub judice, como é bom de ver e resulta expresso do Relatório de Inspeção Tributária, a Administração Tributária cumpriu o ónus que sobre si impendia, pelo que não pode relevar a alegação da Recorrida de que nunca foram sindicadas as razões que estiveram na génese da declaração de insolvência e bem assim no timing do seu pedido.

Mais importa ter presente que não pode ter o alcance almejado pela Recorrida a alegação de que a simples circunstância de existir um resultado negativo de exercício desde 2010, não permite inferir que a insolvência era já previsível e expetável. E isto porque, essa era a prova que competia e carecia de ter sido realizada pela Recorrida. Noutra formulação dir-se-á que importaria a alegação, devidamente substanciada, de que tais resultados mais não denunciavam que a existência de uma situação temporária e transitória. O que, como visto, não sucedeu nos autos.

Carecendo, igualmente, de qualquer relevância o aduzido quanto à prova testemunhal e isto porque a Recorrida não procedeu à impugnação da matéria de facto, mediante apresentação de ampliação de recurso. Pese embora a Recorrida, não tenha legitimidade para interpor recurso no segmento que lhe foi favorável, pode ao abrigo do artigo 636.º do CPC, proceder à ampliação do âmbito do recurso, impugnando, para o efeito, determinados pontos da matéria de facto, requerendo o seu aditamento, substituição ou mesmo supressão[14].

Com efeito, aduz que “de modo absolutamente percetível da prova testemunhal produzida nos autos, que as flutuações na economia, ocorridas nos anos de 2011 e seguintes, impossibilitaram a Recorrida de revender a totalidade dos imóveis em causa, no prazo de 3 anos”, mas a verdade é que não impugnou a prova testemunhal, e não requereu qualquer aditamento atinente à sua audição.

Note-se, ademais, que na decisão recorrida consta, de forma expressa, na motivação da matéria de facto que “ [a]s testemunhas inquiridas (…) não contribuíram para a formação da convicção do Tribunal visto que se limitaram a contextualizar e corroborar o teor dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo, sendo que tais documentos não foram impugnados pela Fazenda Pública”, e a verdade é que nada foi impugnado nesse e para esse efeito.

Mais importa relevar que contrariamente ao avançado pela Recorrida não é, de todo, indiferente se a situação de impedimento se verificou logo após o início do prazo de caducidade de 3 anos ou apenas nos últimos meses, não sendo, de todo, transponível a jurisprudência relativamente à dedutibilidade dos custos e à insusceptibilidade da Administração Tributária imiscuir-se na esfera de gestão da empresa, desde logo, porque, in casu, nos encontramos no âmbito de benefícios fiscais.

Note-se que quando é criado um benefício fiscal, está abrir-se a porta à sua utilização abusiva e à prática de operações de evasão e de fraude fiscal pelos agentes económicos, justificando-se, por esse motivo, a dotação do regime legal, de um conjunto económico de mecanismos preventivos[15].

Ademais, in limite, e sem embargo de todo o supra exposto, não podemos perder de vista que a insolvência jurídica do devedor, decretada no respetivo processo, faz ope legis desencadear o vencimento automático de todas as dívidas.

Com efeito, o artigo 91.º do CIRE, preceitua de forma clara e inequívoca que a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente, pelo que, in limite, sempre se poderia equacionar que existindo, impossibilidade prática da venda do bem imóvel, então o prazo de venda consumou-se na data da declaração da sentença de insolvência, ou seja, a condição resolutiva sucedeu nessa data, donde a dívida venceu-se imediatamente.

Até porque, conforme já evidenciado anteriormente o facto tributário ocorreu com a aquisição do imóvel “[u]ma coisa é a transmissão sujeita a imposto e outra coisa diferente é o nascimento da obrigação do pagamento do imposto, também é certo que a transmissão ocorre, no caso, com a aquisição do prédio para revenda e é nessa data que ocorre o facto gerador da obrigação de imposto; e é nessa data, e em face desse facto, que nasce a relação jurídica tributária, sendo que, porém, a obrigação de liquidação e de pagamento do imposto só nasce quando decorrerem os 3 anos sem que o prédio tenha sido revendido[16].”

Logo, se a lei prevê a aplicação do regime regra logo que se perfaçam três anos após a aquisição do imóvel -não tendo o legislador contemplado qualquer possibilidade de suspensão da condição resolutiva- e se estes três anos não acontecem, sendo encurtados face a uma insolvência cuja génese e motivos a ela atinentes não são minimamente demonstrados, então, dir-se-á, que sempre o IMT passaria a ser exigível a partir dessa data.

Como doutrina José maria Fernandes Pires[17], “[s]e algum dos factos de que a isenção depende não se chegarem a verificar, não chega sequer a constituir-se o direito à isenção, pelo que esse direito não chega a nascer na esfera jurídica do sujeito passivo”.

Mais densificando, que “Tal como no regime do IMI, também o IMT considera que o período máximo necessário para que a empresa revenda os prédios que adquiriu para esse fim é de três anos. Esse pressuposto assenta no entendimento de que o índice de rotação deste tipo de stocks é de três anos. Trata-se de um pressuposto subjacente à configuração deste regime legal, assente numa espécie de presunção de iuris et de iure, que não admite prova em contrário, de que a partir desse período temporal de permanência destes bens no activo circulante das empresas, elas os afectam ao seu activo imobilizado e passam a integrar o seu património acumulado, sendo por isso um índice de riqueza sujeito a imposto. Assim, mesmo que a não consumação da revenda não ocorra nos três anos por causas externas à empresa, dá-se na mesma a caducidade da isenção[18].”

Ainda, neste particular, importa relevar que não são inteiramente corretas as afirmações contempladas nas alíneas c) e d) das contra-alegações, não permitindo, de todo, sustentar a improcedência do recurso, visto que “[o] legislador fiscal não exclui da tributação as sociedades insolventes, porque apesar de se encontrarem em processo de insolvência não deixam se ser sociedades. Mais ainda, o legislador fiscal ao contemplar como sujeitos passivos de IRC “as entidades desprovidas de personalidade jurídica, com sede ou direção efetiva em território português”, bem como “as entidades, com ou sem personalidade jurídica, que não tenham sede nem direção efetiva em território português”, não faz depender a personalidade tributária (ou personalidade fiscal) da personalidade jurídica. Significa tal, pois, que para o legislador fiscal se determinada entidade não possuir personalidade jurídica, mas obtiver rendimentos, a mesma é sujeito passivo de IRC pois tem personalidade tributária.[19]

De chamar à colação, neste âmbito, o Aresto do STA proferido no processo nº 01145/09, de 24 de fevereiro de 2011, o qual doutrina que: “O facto de a sociedade ser declarada falida não obsta, pois, a que se mantenham, com as necessárias adaptações e em tudo o que não for incompatível com o regime processual da massa falida, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas, designadamente as regras previstas no CIRC para a tributação do lucro tributável das sociedades em liquidação.”

Ademais, “[o] facto de uma sociedade ter sido declarada falida e haver entrado em fase de liquidação, não obsta, sequer, a que se possa assistir ao término do seu processo de falência e ao reiniciar da sua normal actividade, com surgimento de matéria tributável para efeitos de IRC. Pelo que, não é o facto de se estar em presença de uma situação jurídica de falência e de liquidação do património que impede que se possam verificar ganhos fortuitos e inesperados, vendas de bens por valores que podem não só solver todas as dívidas como gerar sobras, incrementos patrimoniais esses para os quais nenhuma razão subsiste para se furtarem a tributação em sede de IRC. Por conseguinte, se na sociedade falida ocorrer actividade económica geradora de rendimentos sujeitos a IRC, tais rendimentos encontram-se sujeitos às regras de tributação previstas nos arts. 73º e segs. do CIRC [20].”

Importa, igualmente, reter que “Os bens apreendidos e vendidos em processo de insolvência continuam a ser propriedade do insolvente até à venda.” Porquanto, “A diferença entre o valor de aquisição e de venda dos bens imóveis, ainda que esta se faça em processo de insolvência e o respectivo produto fique afecto à satisfação dos credores da insolvência, não deixa de ser um rendimento obtido pelo insolvente.”  Sem embargo de “[o] CIRE, no n.º 1 do seu art. 268.º, prevê a isenção das mais-valias resultantes da dação em cumprimento ou cessão de bens do insolvente aos credores no âmbito do processo de insolvência, já não prevê idêntica isenção no caso da venda, nada fazendo crer (designadamente para efeitos da aplicação extensiva da norma a esta última situação) que o legislador tenha dito menos que pretendia.[21]

De todo o modo, e ainda que não inteiramente corretas as aludidas afirmações, como já evidenciado, sempre se dirá que as mesmas carecem de acuidade para a resolução da questão, visto que se ajuíza, conforme já evidenciado anteriormente, que a situação de insolvência em contenda não é passível de subsunção num, eventual, “justo impedimento”.

Mais importa, ter presente que não procede, igualmente, a argumentação concatenada com o consignado no artigo 270.º, nº2 do CIRE e isto porque, como é bom de ver, tal isenção está concatenada com a isenção de IMT sobre as transmissões onerosas de imóveis relativamente aos atos de venda, permuta ou cessão da empresa ou de estabelecimentos desta integrados no âmbito de planos de insolvência, de pagamentos ou de recuperação ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente[22].

Sendo que, in casu, a situação em contenda é a montante, ou seja, competiria fazer prova da alienação do bem adquirido pela sociedade no prazo legal de três anos, e da concreta possibilidade de a insolvência ser entendida como “justo impedimento”, ou seja, se a aludida insolvência poderia ser entendida com facto impeditivo de o contribuinte respeitar o prazo de três anos para a revenda do prédio e que o mesmo lhe não seja imputável.

De relevar, in fine, que esta ótica de entendimento e a interpretação propugnada em nada subvertem a ratio legis e traduzem uma desigualdade, não podendo relevar o argumento da Recorrida de que se deve diferenciar o tratamento jurídico dado ao contribuinte que, como ela, se encontrou impedida de proceder à revenda dos prédios adquiridos para aquele fim dentro do prazo de três anos por razões de ordem legal, daqueles contribuintes que não procedem à revenda dos imóveis dentro do mesmo prazo por mero desleixo ou negligência.

E isto porque conforme é entendimento unânime a igualdade tem de ser aferida em termos de igualdade vertical e horizontal, sendo que apenas nos encontramos perante um tratamento desigual quando se tratem situações iguais de forma desigual.

Noutra formulação, dir-se-á, que o princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da CRP, tem sido densificado pela doutrina, como tendo ínsita a ideia de generalidade ou universalidade, nos termos da qual todos os cidadãos se encontram adstritos ao cumprimento do dever de pagar impostos, e da uniformidade, a exigir que semelhante dever seja aferido por um mesmo critério – o critério da capacidade contributiva. Este implica, assim, igual imposto para os que dispõem de igual capacidade contributiva (igualdade horizontal) e diferente imposto (em termos qualitativos ou quantitativos) para os que dispõem de diferente capacidade contributiva na proporção desta diferença (igualdade vertical)[23].

É certo que, como bem nota a Recorrida, na sua p.i., o princípio da igualdade impõe, não só que se dê tratamento igual a situações essencialmente iguais, mas também que se dê tratamento desigual a situações desiguais, proibindo-se, consequentemente, o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual de situações desiguais.

Mas a verdade, é que “em relação ao postulado de que a situações desiguais deve ser dado tratamento desigual se impõe ter presente que o que se pretende evitar são situações de discriminação materialmente infundada, sem qualquer fundamento razoável ou sem qualquer justificação objectiva e racional. Tal princípio não tem, nem poderia ter, o alcance de exigir uma solução jurídica diversa para cada concreta situação da vida. Manifestamente, o princípio da igualdade, na sua vertente de que a situações desiguais deve ser dada tratamento desigual, não exige ao legislador que crie tantas facti-species quantas as situações concretas da vida que consiga prever e a todas dê tratamento jurídico diverso; o que proíbe é que ao não tratamento diverso de situações factualmente diferentes esteja subjacente uma qualquer intenção discriminatória. (…)

Ora, não pode impor-se ao legislador que releve os motivos por que a revenda não foi efectuada dentro do prazo de três anos, para lhes dar tratamento diverso consoante esses motivos sejam ou não imputáveis ao contribuinte.

O facto de o legislador relevar apenas o decurso do tempo surge como uma opção legislativa justificada em face da finalidade da isenção da sisa no caso de aquisição de prédio para revenda, opção que, nos termos que deixámos referidos, só seria passível de censura à luz do princípio constitucional da igualdade caso se demonstrasse que o legislador, ao não relevar esses motivos, tinha adoptado uma solução discriminatória, designadamente à luz dos critérios definidos no n.º 2 do art. 13.º da CRP.”

E por assim ser, não podendo a alegação aduzida pela Recorrida suportar a invocação do “justo impedimento”, nem existindo qualquer outra razão legal para relevar os motivos por que a revenda não foi efetuada dentro do prazo de três anos, a decisão não pode manter-se na ordem jurídica, devendo ser mantida a liquidação de IMT e respetivos juros compensatórios, atenta a sua ligação intrínseca.

Resta, ora, analisar a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, nº 7 do RCP, requerida pela Recorrente.

No Aresto do STA, proferido no processo nº 01953/13, de 07 de maio de 2014[24]: resulta claramente que: “A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade”.

No caso sub judice, considera-se que o valor de taxa de justiça devida a final, calculado nos termos do tabela I.B., do RCP, é excessivo. Porquanto, ponderadas as circunstâncias do caso vertente à luz dos critérios escolhidos pelo legislador, em especial, o comportamento processual das partes litigantes, sem qualquer reparo negativo a apontar, a complexidade do processo – atendendo a que as questões decidendas não exigiram do julgador especiais e diversos conhecimentos técnicos e jurídicos, antes se mantiveram dentro de parâmetros normais e comuns, encontra-se preenchido o circunstancialismo do n.º 7, do artigo 6.º do RCP, decretando-se a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça.


***

IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO jurisdicional interposto pela Fazenda Pública, revogar a sentença recorrida e julgar, consequentemente, improcedente a impugnação.

Sem custas (artigo 4.º, nº1, alínea u) RCP).

Tenha-se, em consideração, a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que excede os €275.000,00, para efeitos de elaboração da conta.

Registe e notifique.


Lisboa, 21 de maio de 2020

 (Patrícia Manuel Pires)

(Cristina Flora)

(Tânia Meireles da Cunha)


___________________________
[1] [1] Vide, designadamente, Acórdão do STA proferido no processo nº 0161/14, de 09 de abril de 2014 e demais jurisprudência nele citada
[2] Vide, designadamente, os Acórdãos do STA proferidos nos processos nº 01245/16 e 0456/17, de 22.02.2017 e 21.06.2017, respetivamente.
[3] José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina:2011, p.432
[4] Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora:6.ª edição, volume I,pp 273
[5] No mesmo sentido apontam os Acórdãos proferidos pelo STA no processo nº 0104/13, de 06.03.2013 e do TCA Sul prolatado no processo nº 07063/13, de 19.03.2015.
[6] Catarina Serra, O Regime Português da Insolvência, 5º Edição: Almedina, 2012
[7] Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas anotado:Quid Juris, 2ª edição, pp. 431 e 432
[8] Vide Acórdão do STJ, proferido no processo nº 5324/07.3TVLSB-A.L.S1, de 10.12.2019.
[9] Cfr. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, págs. 182, 188 e 189.
[10] In cit. Acórdão do STA, proferido no processo nº 0706/11, de 31.01.2012
[11] Vide Sérgio Vasques, Manual de Direito Fiscal, p. 312.
[12] Comentários ao Código de Processo Civil, vol I, Almedina, 2.ª edição, pág. 146
[13] Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, CPC anotado, Almedina, 2019, Vol.I, p.166
[14] Vide António Santos Abrantes Geraldes-Recursos no Novo Código de Processo Civil:5ªEdição, Almedina, p.124.
[15] Neste sentido, vide Ob. Cit. José Maria Fernandes Pires, p.435.
[16] Vide Acórdão do Pleno da Seção de Contencioso Tributário, proferido no processo nº 01135/12, de 10.04.2013.
[17] In ob. Cit.p.433.
[18] In ob. Cit. p. 435.
[19] Cidália Mota Lopes e Ana Cristina dos Santos Arromba Dinis-A Tributação das Sociedades Insolventes, ebook CEJ, p.45.
[20] Acórdão do STA, proferido no processo nº 0876/15, de 08.11.2017
[21] Vide Acórdão STA, proferido no processo nº 504/17, de 11.10.2017.
[22] Vide, neste âmbito, o Acórdão do STA, proferido no processo n.º 3/2017, que uniformiza jurisprudência, nos seguintes termos: “(…) a isenção de IMT prevista pelo n.º 2 do artigo 270.º do CIRE aplica-se, não apenas às vendas ou permutas de empresas ou estabelecimentos enquanto universalidade de bens, mas também às vendas e permutas de imóveis, enquanto elementos do seu ativo, desde que enquadradas no âmbito de um plano de insolvência ou de pagamento, ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente.”
[23] vide Casalta Nabais, Direito Fiscal. 5ª Edição, 2009, Coimbra, Almedina, pp. 151-152
[24] integralmente disponível para consulta em www.dgsi.pt.