Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:0274/10.9BEBJA-A
Secção:CT
Data do Acordão:06/29/2017
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:RECURSO DE REVISÃO/DOCUMENTO NOVO/INDEFERIMENTO LIMINAR
Sumário:I – O recurso de revisão assume características típicas de uma acção declarativa ou de reconhecimento de uma pretensão em sentido amplo, como nos é revelado pelos pressupostos processuais e fundamentos específicos que o disciplinam, em especial, pelo facto de na petição de recurso a parte ter de alegar e comprovar possuir legitimidade para aduzir a revisão da sentença, estar em tempo e que se verifica, concretizando devidamente, uma das situações previstas no n.º 2 do preceito em apreço (isto é, que foi proferida decisão judicial transitada em julgado que declarou falso um documento que tenha sido essencial para a decisão cuja revisão vem peticionada, a existência de um documento novo que o interessado não tenha podido nem devesse ter apresentado no processo em que a decisão a rever foi proferida e que, só por si, seja suficiente para destruir a prova aí realizada ou a falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia).
II – Nos termos do disposto, conjugadamente, nos artigos 293.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 699.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, apenas é admitida a revisão de decisão transitada em julgado com fundamento em documento novo se o interessado alegar e comprovar que o não pôde ou não devia ter apresentado no processo e que seja suficiente para a destruição da prova feita, devendo o pedido ser liminarmente indeferido quando seja possível reconhecer de imediato que não há motivo para revisão.
III – Se na sentença revidenda - proferida no ano de 2015, em processo em que se questionava a legalidade de liquidação relativa a dívida de IRC – o Tribunal apenas se pronunciou e decidiu pela procedência da excepção de caducidade do direito de acção, é manifestamente irrelevante, porque ostensivamente inapto para sustentar qualquer pretensão de revisão daquela sentença, a existência de um documento emitido em 2011 pela Administração Tributária que se reporta a eventuais regularizações de créditos em sede de IVA.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:

            I – RELATÓRIO

 "Z... - Trabalhos de Engenharia, SA" instaurou, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, ao abrigo do preceituado no artigo 293.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o presente recurso de revisão, pedindo que fosse conferida «temporaneidade à impugnação e julgada a mesma procedente».

Para tanto, alegou, em síntese, que após ter sido proferida a decisão judicial cuja revisão peticiona, tomou conhecimento da existência de um «Despacho dos Serviços de Fiscalização da Autoridade Tributária – Direção de Finanças de ..., que lança por terra tudo o que esta tem afirmado a propósito das liquidações em causa», as quais, por força desse documento, são «insusceptíveis de produzir quaisquer efeitos», porque nulas, o que determina que se conclua pela «validade da Impugnação» e que a «mesma foi interposta em devido tempo (cfr. fls.1/2 a 1/16, dos autos de recurso de revisão apensos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

Sobre o referido requerimento inicial, recaiu despacho liminar aí se concluindo «inexistir legitimidade por parte da Requerente para a pretensa revisão de sentença, circunstancia esta que conduz necessária e manifestamente ao indeferimento liminar da mesma.» (cfr. fls. 114/1 a 114/16, dos autos de recurso de revisão, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

A 6 de Junho de 2016, a Recorrente, alegando ter sido notificada do “despacho de não admissão” do recurso, deduziu “RECLAMAÇÃO”, pedindo que o recurso de revisão fosse admitido e julgado procedente, mantendo, no essencial, em matéria de alegações, o já vertido na sua petição inicial de recurso de revisão (cfr. fls. 1/2 a 1/8 deste apenso de reclamação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

Após admissão da referida reclamação pelo Tribunal a quo e da subida dos autos a este Tribunal de recurso, por decisão da relatora foi proferida decisão com o seguinte teor:

«Nos termos do artigo 293.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que tem por epígrafe «Revisão da sentença», determinou o legislador que:

«1 — A decisão transitada em julgado pode ser objecto de revisão no prazo de quatro anos, correndo o respectivo processo por apenso ao processo em que a decisão foi proferida.

 2 — Apenas é admitida a revisão em caso de decisão judicial transitada em julgado declarando a falsidade do documento, ou documento novo que o interessado não tenha podido nem devia apresentar no processo e que seja suficiente para a destruição da prova feita, ou de falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia.

       3 — O requerimento da revisão é apresentado no tribunal que proferiu a decisão a rever, no prazo de 30 dias a contar dos factos referidos no número anterior, juntamente com a documentação necessária.

       4 — Se a revisão for requerida pelo Ministério Público, o prazo de apresentação do requerimento referido no número anterior é de 90 dias.

       5 — Salvo no que vem previsto no presente artigo, a revisão segue os termos do processo em que foi proferida a decisão revidenda.

Resulta, assim, do preceito transcrito, que embora inserido no título relativo aos recursos dos actos jurisdicionais, o recurso de revisão assume características típicas de uma verdadeira acção declarativa ou de reconhecimento de uma pretensão em sentido amplo, como nos é revelado pelos pressupostos processuais e fundamentos específicos que o disciplinam, em especial, para o que ora nos importa, pelo facto de na petição de recurso a parte ter de alegar e comprovar possuir legitimidade para aduzir a revisão da sentença, estar em tempo e que se verifica, concretizando devidamente, uma das situações previstas no n.º 2 do preceito em apreço (isto é, que foi proferida decisão judicial transitada em julgado que declarou falso um documento que tenha sido essencial para a decisão cuja revisão vem peticionada, a existência de um documento novo que o interessado não tenha podido nem devesse ter apresentado no processo em que a decisão a rever foi proferida e que, só por si, seja suficiente para destruir a prova aí realizada ou a falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia), seguindo, após, o processado, os exactos termos do processo em que foi proferida a decisão revidenda (no caso concreto, estando nós em presença de um pedido de revisão de sentença proferida em processo de impugnação judicial, os tramites processuais regulados nos artigos 99.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

Podemos, pois, concluir, que em processo tributário, o recurso de revisão é extraordinário a dois tempos.

Extraordinário porque constitui um meio de alteração de uma decisão já transitada em julgado, isto é, um mecanismo de derrogação excepcional da regra basilar do nosso ordenamento jurídico de que, transitada a decisão, o julgado permanece inalterado na ordem jurídica, imposta em nome de um princípio estrutural, também acolhido no nosso ordenamento jurídico, de que o caso julgado não deve ser entendido como um dogma absoluto e, consequentemente, pode e deve haver possibilidade de modificação de uma sentença se for patente a injustiça que a mesma encerra. Ou seja, este meio de reacção constitui a solução legal de compromisso entre os interesses de certeza e segurança jurídica realizados através da figura e regime do caso julgado e o interesse máximo de realização de justiça nas situações em que o julgado evidencia ser - por força de circunstâncias verdadeiramente excepcionais e que não era possível conhecer ao tempo do julgamento – um atentado ao sentimento de justiça ou, o mesmo é dizer, um ataque ao próprio fundamento primeiro da existência do direito e dos tribunais, sendo a esta luz que deve ser compreendida a sua consagração.

Extraordinário, porque sendo julgada admissível a revisão da sentença, se reinicia um novo julgamento, isto é, renova-se a apreciação da causa, produzindo-se acrescida prova, se tal se revelar necessário e fazendo nascer na ordem jurídica uma nova sentença sobre um mesmo litígio que opunha e volta a opor as mesmas partes.

Mas, sendo assim, facilmente se compreende que num processo de recurso de revisão de sentença duas hipóteses de reacção são previsíveis e podem ter lugar consoante a natureza da decisão e a pretensão que aí sejam aduzidas: se o que está em questão ou se pretende que o Tribunal Superior sindique é uma decisão que admitiu ou não admitiu o recurso de revisão ou o julgou procedente ou improcedente - seja porque proferida em despacho liminar, com fundamento na não verificação dos pressupostos processuais de que está dependente, seja por manifesta improcedência, seja, ainda, porque, instruída a causa, se decide pela revisão ou pela não revisão da sentença revidenda – então o meio de reacção é o recurso jurisdicional enquanto meio próprio de impugnação das decisões judiciais (cfr. artigos 627.º do Código de Processo Civil e 279.º, n.º 1 e 280.º, n.º 1, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário); se a decisão que se pretende ver reapreciada e alterada é relativa ao não recebimento de um requerimento de recurso jurisdicional da decisão de não admissão ou improcedência de recurso extraordinário de revisão, então o meio próprio é a reclamação judicial prevista no artigo 643.º do Código de Processo Civil.

No caso concreto, e se bem entendemos a decisão questionada, o Tribunal a quo, bem ou mal ora não releva, julgou ser de indeferir liminarmente o pedido de revisão por manifesta impertinência do documento apresentado, aduzindo, nesse sentido, dois fundamentos: por um lado, porque tendo a decisão revidenda de improcedência assentado na caducidade do direito de acção, ser irrelevante o teor de um documento que apenas teria a virtualidade de afectar uma decisão de mérito, isto é, de validade ou invalidade da própria liquidação, em nada afectando os pressupostos que estiveram na base da decisão de intempestividade da acção; por outro lado, porque ainda que fosse de considerar que estamos em presença de um documento novo, sempre o mesmo seria irrelevante por se reportar a uma outra sociedade e um «espaço temporal diverso daquele que está em causa nos autos». Isto é (presume-se), por se reportar a um período tributário ou tributo que não está nem nunca esteve em causa no processo em que foi proferida a sentença cuja revisão se peticionava.

É, pois, com esta decisão de mérito da sua pretensão de revisão, com o seu indeferimento liminar por manifesta improcedência que o requerente do pedido de revisão se não conforma, pretendendo, como claramente se surpreende no requerimento “de reclamação” que apresentou, que este Tribunal Central, enquanto Tribunal de recurso, reaprecie o julgado e decida pela procedência (de mérito) do seu pedido de revisão.

Ora, sendo esta inquestionavelmente, a sua pretensão (e um direito que lhe assiste) é igualmente inequívoco que essa pretensão apenas poderá ser apreciada no âmbito do meio processual que lhe corresponde, que não é, manifestamente, a “reclamação” prevista no artigo 643.º do Código de Processo Civil, e de que o recorrente lançou mão, por esta não constituir um mecanismo apto a sindicar a decisão que rejeita ou julga improcedente o recurso de revisão.

Como deixámos dito, não se trata aqui de saber se o juiz a quo devia ou não ter admitido um vulgar ou ordinário recurso jurisdicional ou se devia ter admitido o recurso jurisdicional da decisão que não admitiu ou julgou improcedente o recurso extraordinário de revisão, mas de uma sindicância do mérito da decisão de não admissão por falta de verificação dos pressupostos específicos da sua interposição ou de improcedência do recurso de revisão que, insiste-se, só por meio de interposição de recurso jurisdicional pode ser atacada.

Não o tendo feito e, ao invés, tendo apresentado reclamação nos termos do artigo 643.º do Código de Processo Civil, como se de um mero controlo de um despacho formal de não admissão de recurso se tratasse, a questão que se coloca, agora, é o que devia ter feito o Tribunal a quo, isto é, se devia ter procedido à rejeição da reclamação com aquele fundamento ou se se lhe impunha determinar a sua convolação em requerimento de interposição de recurso jurisdicional, aferindo, previamente, se estavam preenchidos os pressupostos necessários para tal e, após, admitido que fosse o recurso jurisdicional, ordenar que os autos prosseguissem os termos legalmente previstos.

Ainda que não se nos afigure liquida a resposta a esta questão, entendemos que, sendo manifesto o erro no meio processual escolhido como forma de reacção, cumpriria ao juiz, ouvida previamente a parte “reclamante” e confirmada que estivesse a verificação dos pressupostos exigíveis (designadamente de tempestividade e/ou legitimidade) ter procedido à referida convolação.

Na verdade, embora não ignoremos as posições que a doutrina vem veiculando a propósito da amputação dos poderes que resultaram para o juiz de 1ª instancia com a actual redacção imprimida ao disposto no artigo 643.º do Código de Processo Civil, isto é, que à luz do que hoje dispõe a lei processual civil, o juiz deixou de se poder “pronunciar sobre a matéria da reclamação”, o que significa, como adiantam diversos autores, que mesmo que tenha motivos para “reconsiderar o sentido da decisão» está-lhe «vedada a sua reparação», [1] cremos que essa impossibilidade de pronúncia se restringe, como a doutrina expressamente refere, à matéria” da reclamação, isto é, ao conteúdo ou sentido da decisão (de não admissão do recurso ordinário), à impossibilidade de alterar o que substancialmente ficou decidido e não a uma impossibilidade absoluta de controlar a idoneidade do próprio meio de reacção, de que resultariam incontáveis e nefastos reflexos para o próprio andamento dos autos.

Aliás, em sede de recurso contencioso tributário, a interpretação contrária traduzir-se-ia, desde logo, na criação (por via interpretativa-legislativa), de condições aptas a uma verdadeira fraude à lei, uma vez que, não sendo, em regra, obrigatória a apresentação de alegações com o requerimento de interposição de recurso jurisdicional (por força do preceituado no artigo 282.º, n.º 1, 2 e 3, do Código de Procedimento e processo Tributário) o recurso à apresentação de uma reclamação associado ao poder-dever de convolação que entendemos assistir ao Tribunal (ad quem ou a quo), conduziria, inevitavelmente, a que o prazo imperativo de 15 dias para alegar, contado obrigatoriamente a partir da notificação de admissão do recurso jurisdicional - in casu, da sua admissão após convolação – se estendesse injustificadamente (no mínimo 30 dias, por força da tramitação própria da própria reclamação) e, consequentemente, a que a parte beneficiasse, por força deste mecanismo e da referida interpretação absoluta de não interferência imediata do juiz de 1ª instância nestas concretas situações, de um prazo de preparação e apresentação de alegações de recurso consideravelmente mais alargado do que o que se mostra, em geral, imperativamente determinado, com a consequente, também aqui, violação do principio da igualdade e da legalidade.

Temos, pois, por seguro, e salvo o devido respeito, que ao juiz de 1ª instancia não só não está vedada a rejeição de uma reclamação por inidoneidade do meio processual como lhe está imposto que afira da sua eventual convolação em recurso jurisdicional.

 E se é certo que este Tribunal de recurso, perante essa omissão do Tribunal a quo, não está, em abstracto, impedido de o fazer, isto é, não está impedido de aferir dessa potencial convolação, não é menos certo que, in casu, nem os autos possuem os elementos de facto necessários para essa decisão, nem, mesmo que os tivessem, a tramitação seguida está apta a que, sem mais, os presentes autos prossigam como se de um recurso jurisdicional se tratasse.

Desde logo, e no que respeita aos elementos de facto, compulsados os autos verificamos que não existe qualquer documento de que resulte a data em que o recorrente terá sido notificado do despacho de indeferimento liminar do recurso extraordinário de revisão (dos factos apurados apenas resulta ter sido proferida decisão a 18 de Maio de 2016, mas não a data da sua notificação, já que dos autos não consta o oficio através do qual aquela se concretizou, situação a que, eventualmente, não será alheia uma eventual selecção do processado realizada antes da sua subida), o que inviabiliza o necessário controlo quanto a ter sido observado, na apresentação do requerimento, o prazo de 10 dias imposto pelo artigo 280.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Acresce que, mesmo que estivesse apurado nos autos que o requerimento de “reclamação” foi apresentado antes de decorrido o referido prazo de 10 dias, sempre este Tribunal de recurso estaria impedido de, singelamente, convolar aquela “reclamação” em requerimento de interposição de recurso jurisdicional e proceder à sua apreciação do mérito, uma vez que, o princípio do aproveitamento dos actos e de celeridade na administração da justiça, subjacentes a esse poder-dever que em abstracto sobre nós impende, se não pode sobrepor nem à salvaguarda dos direitos legalmente reconhecidos à contra-parte - que, como os autos documentam e os factos assentes acolheram, apenas foi notificada para se pronunciar sobre uma reclamação e não de um despacho de admissão de recurso jurisdicional - para, querendo, contra-alegar, nem à competência para proferir o próprio despacho de admissibilidade que o legislador processual, hoje, reserva, em nosso entender, em exclusivo ao juiz da decisão recorrida (juiz a quo), por força do preceituado no artigo 641.º do Código de Processo Civil, cabendo ao juiz relator do Tribunal ad quem apenas o poder de o modificar quanto “ao modo de subida” ou quanto ao “efeito” que aquele primeiro lhe atribuiu, nos termos do disposto nos artigos 653.º e 654.º, ambos do Código em último citado.

E, sendo assim, por todo o exposto, importa anular todo o processado subsequente à apresentação do requerimento de reclamação e ordenar a baixa dos autos ao Tribunal a quo onde, realizadas as diligências que entenda oportunas, e tendo em consideração o enquadramento legal supra exposto, deverá ser aferida da sua eventual convolação em requerimento de interposição de recurso jurisdicional, nos termos do artigos 280.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, dando-se, após, sendo caso disso, operatividade ao preceituado no artigo 282.º, n.º 2 e 3, do mesmo Código, isto é, ser proferido despacho de admissão de recurso, proceder à notificação das partes para os efeitos aí previstos e, a final, ordenar a subida do recurso jurisdicional.».

Após trânsito em julgado do referido despacho e da baixa dos autos, foi proferido despacho de admissão do recurso jurisdicional, não tendo a Fazenda Pública contra-alegado.

Apresentado o processo com «Termo de Vista» ao Ministério Público junto deste Tribunal Central, foi emitido parecer no sentido de manutenção do julgado, aí se defendendo que a excepção de caducidade que está na base da decisão cuja revisão se propugna obsta a que seja dado o relevo pretendido ao documento apresentado.

Tendo já sido colhidos os “Vistos” das Meritíssimas Juízas Desembargadoras Adjuntas, submetem-se, agora, os autos à conferência para decisão.

            II – OBEJCTO DO RECURSO

           

Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (artigo 635.°, n°2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (n°3 do mesmo artigo 635°). Pelo que, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, importa, assim, decidir se, como defende a recorrente, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé errou na apreciação dos factos e na aplicação do direito ao indeferir liminarmente o recurso de revisão por si interposto.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Do julgamento de 1ª instância resulta que aí foram julgados provados com relevo para a apreciação do mérito dos autos os seguintes factos, que ora, e com redacção nossa, se autonomizam e complementam ao abrigo do preceituado no artigo 662.º do Código de Processo Civil:

1. A 26 de Julho de 2010, “O... – Sociedade Imobiliária e Turística, S.A.” impugnou judicialmente as liquidações relativas a IRC dos anos de 2003 a 2006, no montante global de € 121.641,82, a qual correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja sob o n.º 274/10.9BEBJA (cfr. fls. 4 a 13, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

2. Por sentença de 29 de Abril de 2015, foi julgada procedente a excepção de caducidade do direito a deduzir impugnação judicial e absolvida a Fazenda Pública da instância (cfr. fls. 143 a 145 do processo principal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

3. A 11 de Maio de 2015, a Impugnante interpôs recurso jurisdicional da sentença referida em 2., sobre o qual recaiu, a 8 de Junho de 2015, despacho de admissão, que lhe foi notificado (cfr. fls. 150 a 156, do processo principal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

4. A 10 de Julho de 2015 deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, um requerimento, no qual, em resumo, invocando a realização de uma nova inspecção e subsequentes rectificações “que retiram qualquer efeito e validade à liquidação que fundamenta a supra referida liquidação” (cfr. fls. 159-165, do processo principal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

5. No requerimento antecedente e tendo em vista a identificação do processo a que o mesmo se dirigia está aposto pelo signatário “PROC. N.º 274/10.9BEBJA”.

6. Com o mesmo requerimento e para prova e esclarecimento do aí invocado foi junto um documento, emitido pela Administração Tributária, em que era dado conhecimento à Impugnante do seguinte:

«Oficio Nº  017052

Entraria Geral:                                                         Exm°. Senhor

Nº Identificação Fiscal (NIF): ...               Administrador da firma Z... - TRABALHOS DE

                                                                                ENGENHARIA, SA …

Sua Ref:

Técnico: (…)

Registado com Aviso de Recepção

Assunto: IVA - PEDIDO DE REVISÃO DOS ACTOS TRIBUTÁRIOS (ART. 76°, N". 4 E 5 DA LEI GERAL TRIBUTÁRIA) - NOTIFICAÇÃO

Pelo presente fica notificado do despacho de 2012-06-06, do Sr. Subdirector-geral da Direcção de Serviços do IVA, proferido na informação nº 13667, de 2012-05-07, da qual se anexa cópia.

De harmonia com a referida decisão, foi reconhecido um crédito de IVA a seu favor no valor de € 53,021,77, o qual se encontra condicionado â obrigatoriedade de regularização em sede de IRC, bem como da decisão que vier a ser proferida no processo de impugnação judicial em curso, onde é contestada a LA de IVA n° ..., no valor de € 70.862,70.

Mais, fica ainda notificado das Informações n°s. 2738 de 2011-11-09 e 2510, de 2011-10-10, ambas da Direcção de Serviços do IVA, Divisão de Administração II, das quais se enviam cópias.» (cfr. fls. 160; do processo principal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

7. Da informação referida no ofício transcrito, consta o seguinte:


(…)

INFORMAÇÃO


1. A Direcção de Finanças de ..., através do Oficio n°12209 de 2010-03-31 enviou a esta Direcção de Serviços, o Pedido de Revisão Oficiosa, nos termos do artº78º da Lei Geral Tributária, do sujeito passivo, O... - Sociedade Imobiliária e Turística Lda actualmente com a denominação de Z... - Trabalhos de Engenharia, S.A. NIPC, ..., a solicitar que lhe fosse permitido a compensação ou o reporte do crédito de IVA, no montante de €70.862,70, referente ao IVA pago nos períodos, entre o início da sua actividade (1999) e Abril de 2004, em que se encontrava enquadrado no regime de isenção, ao abrigo do art°9º do CIVA.

2. O pedido de revisão foi analisado dando origem à informação nº2739, de 2011-11-09, desta DS, onde, em conformidade com a Informação dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de ..., de 2011-07-14, se concluiu que o pedido de regularização do IVA a favor da requerente era parcialmente procedente no valor de €58.021,77.

3. Na sequência daquela informação foi dado conhecimento da decisão à Direcção de Serviços de Cobrança - Divisão de Cobrança Voluntária (IVA), para efeitos de regularização da conta corrente e comunicação ao sujeito passivo do modo como poderia regularizara seu favor o montante de €58.021,77.

4. A Direcção de Serviços de Cobrança - Divisão de Cobrança Voluntária (IVA) emitiu a informação nº23, de 2012-03-16 (proc.º...), com despacho concordante do Sr. Subdirector-Geral, em 2012-04-13, onde se conclui o seguinte:

“(…)

11- (…) tendo em conta que o sujeito passivo utilizou o crédito de €70.862,70, no reporte das declarações seguintes, não é possível a utilização daquele crédito para compensar a dívida do mesmo montante, nem tão pouco autorizar que o mesmo seja ressarcido do crédito de €58,021,77 conforme propõe o Serviço de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de ... na sua informação de 2011-07-14 exarada do despacho do superior hierárquico datado de 2011-07-25.

12- Neste caso, verificando-se que o sujeito passivo tinha direito ao crédito de €58.021,77, a solução correta para que o mesmo recupere aquele crédito será no sentido de anular parcialmente a liquidação adicional nº ... no valor de €70.862,70 para €12,840,93.

13. Mas atendendo que a mesma se encontra impugnada, este processo de revisão deverá aguardar a decisão do processo de impugnação referido no ponto 10.2 desta informação, no caso de se verificar que o sujeito passivo efectuou a regularização em sede de IRC referida nos pontos S e G da informação n.º2739 de 2011-11-09, da Direcção de Serviços do IVA, exarada do despacho concordante do Subdirector Geral (Substituto legal do Director-geral) ou seja “debitar o correspondente imobilizado acumulado em curso (ou reajustar o valor do imobilizado e correspondentes amo...ações acumuladas) proveito extraordinário, pelo valor total de €62.907,01"

5. Em face do informado pela DSC e tendo em consideração que existe processo de impugnação Judicial relativamente à LA nº..., deverá ser dado conhecimento à DF de ..., para os efeitos que tiver como convenientes, designadamente informação ao Representante da Fazenda Pública e a notificação da requerente, frisando-se a obrigatoriedade da regularização em sede de IRC, como condição da anulação parcial da LA em referência.»  (cfr. fls. 161 do processo principal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

8. Notificada a Fazenda Pública veio a mesma opor-se ao pedido de declaração de inutilidade nos presentes autos, invocando, designadamente, que o referido requerimento se reportar a um outro processo que no mesmo Tribunal e sob o n.º 305/10.2BEBJA corria termos (cfr. requerimento de fls. 170-171, do processo principal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

9. Por despacho de 5 de Janeiro de 2015, foi indeferido o pedido referido em 6. com fundamento em que, com o transito em julgado da sentença se esgotara o poder jurisdicional do juiz e, consequentemente “mostra-se impossível objectiva e processualmente” a modificabilidade da decisão (cfr. fls. 190-192, (cfr. fls. 160; do processo principal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

10. A 14 de Março, a Impugnante interpôs recurso extraordinário de revisão (cfr. fls. 1 a 15 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

11. Com a petição inicial do recurso de revisão, referido em 10., juntou a recorrente os documentos que constam de fls. 21 a 76, cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos.

12. A 18 de Maio de 2016 foi proferido o despacho recorrido, o qual detém, na íntegra, o seguinte teor:

«Veio a sociedade "Z... - Trabalhos de Engenharia, SA" fazer instaurar processo de revisão de sentença, nos termos do disposto no art. 293° do CPPT, relativa a por apenso ao processo n° 274/10. BEBJA.

Apresenta como fundamentos do pedido de revisão o conhecimento de um despacho que lança por terra as liquidações impugnadas designadamente sustentando a invalidade da liquidação inicial, erro de raciocínio, inexistência das dívidas exequendas.

Configurando-se a sociedade com potencial interesse em agir e legitimidade veio a mesma pelo meio próprio intentar a revisão de sentença.

Foi concretizada a devida apensação.

Debruçando-nos sobre o fundamento da revisão, verifica-se ser este o conhecimento de um documento novo tal como prevê o art. 293° do CPPT.

Quanto a este refere o Exmo Senhor Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa em Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 2007, Áreas Editora, pág. 865, que a novidade do documento será aferida em relação ao processo em que foi proferida a decisão recorrida, sendo considerada nova quando não foi apresentado no primeiro processo e o interessado não o podia apresentar.

Vejamos:

O processo principal versa sobre as liquidações adicionais de IRC relativas aos anos de 2003 a 2006 emitidas pela ATA na sequência de procedimento inspectivo.

A decisão proferida não foi de mérito da aludida impugnação já que foi julgada verificada a excepção de caducidade do direito de impugnar. Tal decisão foi proferida em 29/04/2015 e transitou em julgado.

O invocado documento novo em que se sustenta a sociedade, junto pela mesma com o pedido de revisão enquanto documento nº4 refere-se ao resultado de acção inspectiva realizada à distinta sociedade comercial, a "O... - Sociedade Imobiliária Turística, SA”,

sendo que é esta efectivamente a sociedade Impugnante nos autos principais e não Z..., sendo que a acção incidiu sobre o ano de 2009 e com um âmbito geral.

Conclui-se, pois, que o documento novo em nada releva para a decisão preterida pois que julgando, como julgou, verificada excepção dilatória não existe possibilidade jurídica de a rever nos termos peticionados. Ademais, e mais censurável para a parte e respectivo subscritor da petição inicial, versa o sobredito documento sobre espaço temporal diverso daquele que está em causa nos autos.

Pelo exposto, conclui-se inexistir legitimidade por parte da Requerente para a pretensa revisão de sentença, circunstância esta que conduz necessária e manifestamente ao indeferimento liminar da mesma.».

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Expostos os factos pertinentes à apreciação do mérito da causa e da questão colocada em recurso, importa, agora, proceder à sua apreciação, isto é, decidir se assiste razão à recorrente ao defender que a sentença recorrida deve ser revogada por o documento novo junto com a interposição do recurso jurisdicional só por si determinar a nulidade das liquidações oportunamente impugnadas e, consequentemente, para impor que a sentença cuja revisão é peticionada o seja no sentido por si preconizado.

Vejamos, então, começando por transcrever aqueles que são os preceitos nucleares quer ao nível a admissão, quer ao nível a procedência do próprio recurso de revisão e que são, directamente e por aplicação subsidiária, respectivamente, os artigos 293.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 696.º e 699.ºdo Código de Processo Civil (CPC):

- «Artigo 293.º

Revisão da sentença

1 - A decisão transitada em julgado pode ser objecto de revisão no prazo de quatro anos, correndo o respectivo processo por apenso ao processo em que a decisão foi proferida.

2 - Apenas é admitida a revisão em caso de decisão judicial transitada em julgado declarando a falsidade do documento, ou documento novo que o interessado não tenha podido nem devia apresentar no processo e que seja suficiente para a destruição da prova feita, ou de falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia.

(…)»;

- «Artigo 696.º (art.º 771.º CPC 1961)

Fundamentos do recurso

A decisão transitada em julgado só pode ser objeto de revisão quando:

(…)

c) Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida»;

- « Artigo 699.º (art.º 774.º CPC 1961)

Admissão do recurso

1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 641.º, o tribunal a que for dirigido o requerimento indefere-o quando não tenha sido instruído nos termos do artigo anterior ou quando reconheça de imediato que não há motivo para revisão.».

Expostos os normativos pertinentes e em que, embora não expressamente, se fundou a sentença recorrida, passemos agora à análise critica desta em ordem a formular o juízo que em recurso nos vem pedido.

Nesse sentido, importa começar por definir claramente os pressupostos de facto e direito da decisão, da qual resulta - se bem interpretamos a sentença recorrida, e como, de resto, já ficou visível no despacho que como relator proferimos (transcrito no ponto I deste acórdão) – que o Tribunal a quo julgou ser de indeferir liminarmente o pedido de revisão por manifesta impertinência do documento apresentado, justificando esse julgamento em duas ordens de razões: (i) a decisão revidenda fundou-se em exclusivo na caducidade do direito de acção sendo absolutamente irrelevante para a pôr em causa um documento que apenas teria a virtualidade de afectar uma decisão de mérito, isto é, de validade ou invalidade da própria liquidação, mas em nada afectando os pressupostos que estiveram na base da decisão de intempestividade da acção; (ii) ainda que fosse de considerar estarmos em presença de um documento novo, sempre o mesmo seria irrelevante por se reportar a uma «outra sociedade» e um «espaço temporal diverso daquele que está em causa nos autos» (presume-se, por se reportar a um exercício fiscal ou tributo que não esteve em causa no processo em que foi proferida a sentença cuja revisão se peticionava).

Ora, com excepção da questão da ilegitimidade - em que discordamos do entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo por estar nos autos, no mínimo, fortemente indiciado queZ... – Trabalhos de Engenharia S.A.” é a nova denominação da então Impugnante, ”O... – Sociedade Imobiliária Turística, S.A.”  - sendo que se o Tribunal tivesse dúvidas face aos documentos e informações oficiais que constam dos autos deveria ter exigido certidão emitida pela Conservatória do Registo Comercial devidamente actualizada à data da instauração do recurso de revisão) - não cremos que a decisão de indeferimento liminar mereça ser objecto de censura.

Efectivamente, nos termos do disposto, conjugadamente, nos artigos 293.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 699.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (que supra deixámos transcritos na parte pertinente atento o fundamento invocado pela recorrente), apenas é admitida a revisão de decisão transitada em julgado com fundamento em documento novo que o interessado não tenha podido apresentar ou não devesse ter apresentado no processo e que seja suficiente para a destruição da prova feita, devendo o pedido ser liminarmente indeferido quando seja possível reconhecer de imediato que não há motivo para revisão.

Ora, como bem se registou na sentença recorrida, o documento que a recorrente apresentou para sustentar a sua pretensão é manifestamente incapaz a fundar uma modificação da decisão “em sentido mais favorável à parte vencida”.

Na verdade, como de forma clara se colhe dos autos apensos, e fizemos questão de verter no probatório, a recorrente apresentou uma Impugnação judicial que teve por objecto liquidações em sede de IRC relativas aos anos de 2003 a 2006, aduzindo um conjunto de vícios de que, em seu entender, as mesmas padeceriam e de cuja procedência resultaria a anulação que peticionava.

Acontece porém que, como igualmente resulta do probatório, mais concretamente da sentença revidenda, o Tribunal de 1ª instância não apreciou do mérito da acção, isto é, o Tribunal não apreciou qualquer um dos vícios então suscitados, tendo exclusivamente decidido uma questão que previamente se lhe impunha que apreciasse, a excepção de caducidade do direito de acção suscitada pela Fazenda Pública, julgando-a procedente.

Como salientou, ainda que de forma muito sucinta, a sentença recorrida, o “documento novo” em que a ora recorrente pretende sustentar o seu pedido de revisão não é apto a produzir esse efeito porque em nada contende com a referida decisão de caducidade do direito de acção. Isto é, tendo a decisão revidenda de procedência da excepção do direito de acção sido aferida, como é óbvio que tinha que ser, por referência às liquidações e notificações das liquidações impugnadas nesses autos, é absolutamente irrelevante para efeitos de questionar essa decisão (“destruir a prova em que ela se louvou”) qualquer despacho ou decisão que a Administração Fiscal tenha proferido relativamente a outras liquidações ou na sequência de outras inspecções.

Acresce que, como aliás a recorrente não devia ignorar, e nesta parte deve ser acentuado o juízo de censura que formulamos sobre o seu comportamento, o “documento novoque se junta aos autos, nem é novo, nem se reporta à inspecção que deu origem às liquidações impugnadas e cujo direito a impugnar foi apreciado na sentença revidenda.

Não é novo, porque é um documento que foi produzido em 2011 e que desde essa data a Impugnante, a quem foi dirigido e que ora o apresenta, tem em seu poder pelo menos desde o ano de 2011.

Como a este propósito a doutrina e a jurisprudência dos Tribunais Superiores nos têm ensinado: “ A al. c) integra um outro fundamento de revisão agora traduzido no relevo de documento que a parte desconhecia ou de que não pôde fazer use e que se revele crucial para modificar a decisão em sentido mais favorável ao recorrente”, impossibilidade essa que tanto pode ser “objectiva” como “subjectiva” mas, em qualquer dos casos só por si determinantes da modificação almejada».[2]

No caso concreto essa impossibilidade subjectiva ou objectiva não está demonstrada. Pelo contrário, está provado precisamente o seu contrário,  já que, como dissemos, o referido documento foi emitido muito antes da prolação da sentença revidenda, da própria interposição do recurso jurisdicional e deste recurso de revisão, tendo dele sido notificada Impugnante e ora recorrente (e talvez resida no circunstancialismo ora evidenciado a justificação para a forma vaga como a recorrente descreve as circunstâncias de modo e tempo em que “veio a ter conhecimento” do mesmo).

Não se reporta à inspecção que deram origem às liquidações impugnadas, porque assim se tem de concluir da leitura do próprio documento n.º 4, junto com a petição inicial do recurso de revisão, da qual resulta, inquestionavelmente, que o ofício em referência se reporta a uma inspecção realizada à recorrente em sede de IVA. Tal como a questões relacionadas com IVA – inspecções, correcções, revisões e regularizações – se reportam os demais documentos apresentados com o pedido de revisão de sentença, alguns dos quais, já apresentados pela recorrente nos autos principais e para sustentar um pedido de inutilidade superveniente da lide, e que conduziram, inclusive, a que a própria administração tributária, nos autos principais, no momento em que se opôs a essa declaração de inutilidade, tivesse colocado a hipótese de ter havido erro (lapso) no processo a que se dirigia (cfr. factualidade vertida em 8., do ponto III supra).

É, pois, de confirmar a sentença recorrida, sem nos pronunciarmos sobre uma eventual condenação da recorrente como litigante de má-fé, nos termos e ao abrigo do preceituado no artigo 542.º, als. a), b) e d), do Código de Processo Civil, uma vez que os autos não possuem, nesta data, os elementos necessários a emitirmos, com segurança, um juízo dessa natureza.

V – Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, negando provimento ao recurso jurisdicional, em confirmar, com os fundamentos expostos, a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.

Registe e notifique.

                                                 *****
Lisboa, 29 de Junho de 2017


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                              [Anabela Russo]


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[Lurdes Toscano]




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                                                         [Ana Pinhol]

 


[1] António Santos Abrantes Geraldes, “ Recursos no Novo Código de Processo Civil”, pag. 148, 2ª edição, 2014, Almedina. No mesmo sentido, Amâncio Ferreira, “Manual de Recursos em Processo Civil”, 8ª edição, pag. 95.
[2] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2013, anotação 6., ao artigo 696.º, pág. 406. Vide, ainda, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 2010 e de 11 de Setembro de 2007, ambos integralmente disponíveis em www.dgsi.pt.