Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08871/12
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:06/01/2017
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:PROCESSO EXECUTIVO
JULGADO ANULATÓRIO
FIXAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE SELECÇÃO E CONHECIMENTO DOS MESMOS PELO JÚRI DEPOIS DO ACESSO PELO MESMO AOS CURRICULA DOS CANDIDATOS
Sumário:I) - A execução dos julgados anulatórios consiste na reconstituição da situação actual hipotética, ou seja, no refazer da situação que existiria se, na vez do acto judicialmente suprimido, tivesse sido praticado um acto depurado do vício invalidante.

II - Num concurso interno de acesso, limitado, anulado por vício de violação de lei por ofensa ao disposto nos artigos 27°, n°. 1, als. f e g), e 5º, n° 2, al. b), ambos do D.L. n° 204/98, de 11-07, quer porque o aviso de abertura do concurso não continha o sistema de classificação final, quer porque os critérios de ponderação da avaliação curricular só foram definidos pelo júri após o termo do prazo de apresentação das candidaturas, o que a execução do acórdão anulatório implica é tão só afixação dos critérios de avaliação dos currículos e de o sistema de classificação final, e respectiva fórmula classificativa, e o seu conhecimento pelos CANDIDATOS JÁ ADMITIDOS e, em seguida a prática dos subsequentes actos do procedimento do concurso, (v.g. avaliação, classificação e ordenação dos candidatos e homologação da lista de classificação final), sendo que os actos do concurso situados a montante, como a sua abertura e a admissão dos candidatos, permanecerão indemnes.

III) – Assim, em processo de execução de decisão anulatória todos os actos do procedimento anteriores àquele em que o vício emergiu ficam a coberto da pronúncia judicial invalidante, de modo que, e normalmente, a execução do julgado consistirá em refazer, a partir do ponto viciado, os termos do procedimento que sofreram os efeitos desse vício.

IV) - Visto que o acórdão anulatório se fundou no facto de o júri do concurso ter procedido à fixação de critérios que não constavam do aviso de abertura, e à respectiva quantificação, em momento posterior ao conhecimento da identidade dos candidatos, e à apreciação dos seus curricula, porque o acto impugnado foi anulado por, indevidamente, se terem fixado critérios em momento em que não o poderiam ser, então haveria de reiniciar-se o procedimento com vista ao prosseguimento do concurso, com a eliminação da fase abrangida pela decisão anulatória, nomeando- se um novo júri que procedesse à avaliação dos elementos curriculares dos candidatos.

V) – Decorre de todo o explanado e seguindo jurisprudência pacífica que, tendo sido anulado, por decisão administrativa, o acto de homologação da lista classificativa final do concurso de provimento, pelo facto de o júri ter fixado os critérios e factores de avaliação depois de conhecidos os currículos dos candidatos, sendo ilegal, por violação do princípio da imparcialidade, a fixação de novos critérios pelo mesmo júri, impõe-se, para a reconstituição da situação que existiria se a ilegalidade não tivesse sido cometida, a constituição de novo júri para prosseguir a subsequente tramitação do concurso, incluindo afixação dos critérios e factores de avaliação antes de conhecer a identidade dos candidatos e de ter acesso aos respectivos currículos.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I- RELATÓRIO

Abel ……………….., com os demais sinais nos autos, propôs a presente acção de execução de sentença de anulação de acto administrativo contra a Universidade Nova de Lisboa e a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa visando obter a execução da sentença proferida em 28.11.2003. confirmada pelo Acórdão do TCA de 27.04.2006. em sede do recurso contencioso, que anulou a deliberação de 16.09.1999 do júri do concurso para provimento de um lugar de professor associado no grupo de disciplinas de Química Orgânica Fundamental e Biorgânica, Química Orgânica Estrutural, Química dos Produtos Naturais e Química Orgânica de Síntese da FCT da UNI, por procedência do vício de violação de lei, por desrespeito do princípio da divulgação atempada dos métodos de selecção, com o fundamento essencial de ter sido erradamente executada a decisão proferida no processo principal, já transitada em julgado.

Não se conformando com a sentença do TAC de Lisboa pela qual foi a acção julgada parcialmente procedente, vem interpor o presente recurso em que apresentou alegação formulando as seguintes conclusões:

“1. O que o ora Recorrente pedia nestes autos, conforme foi abundantemente sustentado e explicado na Petição Inicial da acção de execução de sentença, era que o Douto Tribunal decretasse a correcta execução do julgado e declarasse a nulidade dos actos de “execução” (que não o foram) do julgado anulatório de 28 de Novembro de 2003.
2. O Tribunal conferiu provimento parcial á acção e declarou a nulidade do Edital n° 266/2006, do acto de 22.06.2006 do Director da FCT e da comunicação de 30.06.2006, (segundo travessão do dispositivo da Sentença). Este segmento da decisão, na medida em que declarou a nulidade de tais actos, é inatacável, não padecendo de qualquer erro de julgamento, e não integra o objecto do presente recurso.
3. Mas além disso, era igualmente pedido que o Douto Tribunal determinasse que o concurso iniciado em 1998 fosse retomado, de acordo com os pressupostos legais e curriculares de então, mas agora com cumprimento das determinações legais aplicáveis.
4. Isso pressuporia que os actos do concurso que não são afectados pelo julgado anulatório fossem mantidos, e que fossem apenas realizados os actos por ele afectados, o que significaria retomar o concurso com aqueles (e apenas com aqueles) que apresentaram candidatura ao concurso iniciado em 1998, com a diferença de que agora, esses candidatos seriam avaliados por um (novo) júri que, contrariamente ao sucedido anteriormente, não fixaria os critérios de avaliação depois de conhecidos os candidatos.
5. Neste ponto, no entender do Recorrente, a Douta Sentença recorrida claudicou.
6. A este respeito, o Tribunal determinou, em primeiro lugar, que se mantém na ordem jurídica o acto de 23.05.2006 do Director da FCT, ou seja, o acto que determinou a abertura de um novo concurso em substituição do anterior (cf. terceiro travessão do dispositivo da Sentença); e determinou também que “Deve o Executado, em sede de reconstituição da situação jurídica violada, proceder ã publicação do edital de abertura do concurso, mas reportando os efeitos deste a 12.10.1998, quer quanto a requisitos, a critérios e a currículos. Antes do conhecimento dos currículos há que proceder á nomeação do júri conforme os artigos 45° e 46° do ECDU e à definição dos critérios de selecção, a serem divulgados aos candidatos, seguindo-se a demais tramitação legal do concurso. (...) (quarto travessão do dispositivo).
7. Destes segmentos da decisão e da correspondente parte da fundamentação, retira-se que o Tribunal acolheu o entendimento segundo o qual a execução do julgado anulatório de 2003 exige que seja aberto um novo concurso, com apresentação de novas candidaturas e currículos, potencialmente por novos candidatos que não concorreram ao primeiro concurso, embora o Tribunal considere (e aí, considera bem, mas isso não chega) que tal novo concurso apenas pode ter por referência quer os pressupostos jurídicos quer os pressupostos curriculares reportados a 12.10.1998, data da publicação do edital do concurso inicial.
8. E com estes últimos segmentos da decisão e da fundamentação que, salvo o devido respeito, não se pode concordar, e é unicamente deles que se recorre.
9. A sentença incorre em erro de julgamento por desrespeito do caso julgado anulatório a executar e por incorrecta aplicação dos princípios da imparcialidade, isenção, igualdade, objectividade e transparência.
10. Violando, dessa forma, o ECDU e o Decreto-Lei n.° 204/98, na forma de os compatibilizar que resulta do julgado anulatório e da petição inicial destes autos; os princípios da imparcialidade, da isenção, da igualdade, da objectividade e da transparência; os arts. 133°, n.° 2, alínea h) e 140°, n.° 1, alínea b), do CPA; e o art. 173°, n.° 1, do CPTA.
11. Com efeito, ao determinar que haja publicação de novo edital e apresentação de novas candidaturas, a Douta Sentença viola o julgado anulatório, que apenas se estendeu ao acto de fixação extemporânea (na reunião do júri de 23.04.1999) e aos actos dele consequentes e dependentes, e não aos demais actos procedimentais que não sejam afectados pelo vício em questão.
12.- Como se demonstrou à saciedade na PI e nestas alegações, a ilegalidade em causa não inquinou o concurso ab initio, contrariamente ao que é expressamente afirmado na Sentença.
13. O julgado anulatório manifestamente não decidiu tal coisa; e nem podia ter decidido, porque essa afirmação só seria possível se, como vimos, (i) os critérios publicados ab initio tivessem sido ilegais, e não eram, ou (ii) se existisse uma qualquer norma que obrigasse à publicação de todos os critérios de selecção logo no edital, e não existia.
14.- É patente a incorrecção da afirmação da Sentença segundo a qual tal reconstituição da situação só é possível com a abertura de um novo concurso Em que medida um vício ocorrido porque o Júri definiu critérios de classificação quando já tinha ou podia ter tido conhecimento dos currículos só pode ser resolvido com um novo concurso, não se aproveitando nada do anterior?
15. Da Douta Sentença resulta que uma reconstituição do julgado anulatório que passasse pela manutenção dos candidatos que na altura se apresentaram e dos respectivos currículos, mas com mudança completa dos membros do Júri e reunião dos mesmos, para definir os critérios de classificação, antes de terem acesso aos currículos, não respeitaria os princípios da imparcialidade, da isenção, da igualdade, da objectividade e da transparência.
16. E para o Tribunal isto seria assim porque, aplicando as “regras próprias da vida” (?), não haveria garantia de que os membros do novo Júri — ainda que não fossem os mesmos! — não saberiam quem eram os candidatos, isto é, e nas palavras da Sentença, seria sempre “possível” (sic) que os membros do Júri soubessem quem são os candidatos e pudessem afeiçoar os critérios...
17. E claro que sabemos que é sempre “possível” que as pessoas pratiquem actos do foro criminal — já que os actos que a Meritíssima Juiz sugere que seriam os mais prováveis, à luz das “regras próprias da vida”, se fosse nomeado outro Júri, constituído por outras pessoas, são actos do foro criminal.
18. Mas dizer que uma certa hipótese de reconstituição da situação, claramente a que respeita fielmente o julgado anulatório e obedece a outros princípios jurídicos como os do aproveitamento dos actos, não pode ser aplicada, porque é “possível” que as pessoas cometam actos do foro criminal, isso é inaceitável.
19. Compreende-se, claro, que a Meritíssima Juiz procure soluções que acautelem a imparcialidade e a objectividade na avaliação, mas não pode optar por critérios e soluções que não têm qualquer virtualidade de garantir imparcialidade adicional face à solução proposta pelo Exequente.
20. Pois mesmo assumindo o juízo de prognose muitíssimo duvidoso da Sentença acerca da possibilidade de haver viciação do concurso, em que é que a abertura de um novo concurso, que ainda para mais terá sempre de se reportar aos requisitos vigentes em 12.10.1998, constitui uma garantia adicional de que os membros do Júri desse outro concurso não saberão quem foram os candidatos e não conhecerão os seus currículos? É simples: em nada.
21.É irrelevante saber se o Júri, qualquer que ele seja, pode ou não em abstracto ter conhecimento das candidaturas: é a Administração Executada (a infractora, recorde-se) que tem de garantir que o júri não tem acesso à identidade dos candidatos que já apresentaram candidatura ao concurso anterior ou aos seus currículos, antes de definir todos os critérios.
22. Não podem ser os candidatos a ter o ónus de entregar novos requerimentos, novos currículos, novos trabalhos... só porque, em abstracto, a Administração não consegue guardar e vigiar documentos com o zelo, sigilo e responsabilidade que lhe é exigida!
23. E a Administração que tem de nomear os membros do Júri; explicar que eles terão de aplicar os pressupostos e requisitos em vigor em 1998 e com base em currículos de 1998; explicar (sem concretizar, claro) que esse facto algo estranho se prende com a necessidade de reconstituição de um concurso público; e, sobretudo, manter o mais rigoroso sigilo para esses membros do Júri sobre a identidade e os currículos dos candidatos que apresentaram candidatura.
24. Não só nada disto se afigura como inatingível, como, sobretudo, todas estas operações são exactamente as mesmas, nem mais nem menos, do que as que terão de ser feitas mesmo que se abra um novo concurso.
25. A Douta Sentença sub judice também não pode ser mantida porque ao errar na aplicação do Direito que ao caso cabe, determina que a final de contas, os candidatos ao concurso aberto em 1 998 poderão ficar privados da sua posição jurídica consolidada decorrente da sua qualidade procedimental de (únicos) candidatos e outras pessoas que não se candidataram na altura poderão ganhar o direito ao lugar.
26. De facto, ao permitir que o julgado anulatório seja executado publicitando novo edital e admitindo que sejam opositores pessoas que não participaram no concurso, o Tribunal está a permitir, objectivamente, duas situações insustentáveis: primeiro, que os que efectivamente participaram no concurso em 1998 possam não tomar conhecimento do novo edital, ou não conseguir, em tempo útil, preparar novamente as suas candidaturas, o que levará à sua não participação; e segundo, que possam vencer esse concurso pessoas que não participaram na altura, por exemplo porque não foram diligentes ao ponto de conseguir entregar a sua candidatura em tempo.
27. Naquela primeira, veja-se o resultado nitidamente absurdo e contrário ao julgado anulatório a que se chegaria: uma pessoa que foi opositora ao concurso em 1998 perderá o direito a ver a sua candidatura apreciada, apesar de o julgado anulatório ter determinado que aquele concurso de 1998 deveria ser retomado, e de ter determinado que o vício — provocado pelo Executado! — só teve lugar depois da entrega das candidaturas.
28. Quer dizer: através desta forma completamente anómala de reconstituição da situação actual hipotética, conseguir-se-ia excluir da dita reconstituição um candidato que ganhou o direito a ver a sua candidatura apreciada quando apresentou essa candidatura ao procedimento em 1998.
29. Mas a segunda situação é também chocante. Admita-se que vem a apresentar candidatura alguém que não tinha apresentado candidatura inicialmente, e vence o concurso. Nesse caso, teremos uma pessoa que, sem qualquer razão material justificativa, “ganha” um direito a um lugar, quando no decurso do prazo do concurso, na altura devida, não apresentou candidatura! Ou seja, na altura, não se interessou o suficiente para se manifestar como candidato; e agora, por força de um concurso aberto em 2011, ganharia o direito a um lugar, com efeitos retroactivos!
30. Poderia dizer-se: mas esse candidato pode não se ter apresentado ao concurso, na altura, porque não estavam no edital os métodos de classificação. Só que tal raciocínio é distorcido, como já se disse, pelo pressuposto erróneo e desconforme com o Direito da época, de que o edital tinha de divulgar os métodos de selecção: não tinha. E por isso ninguém pode vir invocar que não se apresentou a concorrer só porque não conhecia os métodos de selecção; esse argumento não tem qualquer suporte legal.
31. Por fim, os acórdãos citados na Douta Sentença recorrida, supostamente em abono da sua tese, bem como muitos outros que indicamos, deveriam ter levado o tribunal a quo a uma decisão diferente.
32. O acórdão do TCAN de 10/12/2010, proferido no processo n.° 345-A/01, como na Sentença sub judice, considerou que a abertura de um novo concurso era um meio adequado de execução do julgado anulatório; só que, bem ao contrário do que acontece nestes autos, no processo decidido por esse acórdão, a sentença anulatória exequenda anulou o acto por vícios que afectavam o próprio acto de abertura do concurso e o edital publicado em Diário da República, pelo que o acórdão não apoia a tese da Sentença.
33. Relativamente ao acórdão do STA de 16/12/2004, processo 410276A, é ainda mais patente o desfasamento entre a Sentença e o acórdão que ela cita supostamente em seu apoio.
34. Nesse aresto, o fundamento da anulação era exactamente o mesmo que o destes autos: definição dos critérios depois de conhecidos os currículos. E repare-se como a sentença foi executada, sem que isso merecesse qualquer reparo ao STA: precisamente com a nomeação de um novo júri e a retoma do concurso a partir do momento em que ele tinha sido viciado! Ou seja, o STA legitimou a tal solução que o Tribunal a quo afirma ser inadmissível como execução da sentença anulatória.
35. Por fim, a citação do acórdão do STA de 01/06/2004, processo 41027A revela um erro ainda mais flagrante, se possível. Nesse caso, estava-se, sim, perante um concurso de provimento cuja decisão tinha sido anulada com o mesmo fundamento do concurso dos autos. Mas existia esta “pequena” diferença: é que aí, a entidade administrativa resolveu tentar executar o julgado anulatório sem substituir os membros do júri, ou seja, pondo os mesmos membros do júri que já conheciam os currículos a fixar novos critérios!
36. E assim, não é de estranhar que nesse acórdão, o Supremo tenha afirmado que essa decisão não se conformava com o julgado anulatório: toda a fundamentação do acórdão é dirigida a provar que o prévio conhecimento, pelo mesmo júri que já tinha aberto as candidaturas, das candidatas, representava um perigo para o princípio da imparcialidade, e por isso, ao não se substituir o júri, incorreu- se em violação desse princípio. Ou seja, do acórdão resulta exactamente o oposto do que o Tribunal a quo considera resultar!
37.- Ora o Recorrente não quer que seja o mesmo júri afixar os critérios de selecção, mas sim outro, conforme o pedido formulado deixa completamente claro.
38. E essa é uma solução que, sem margem para dúvidas, tem sido defendida pela jurisprudência administrativa superior. Isso mesmo o demonstram não só os acórdãos acima referidos, (mal) citados na Douta Sentença, mas ainda todos os seguintes acórdãos do STA: de 04/03/97, Proc. n.° 31932A; de 06/04/2000, Proc. n.° 41906A; de 09/07/2003, Proc. n.° 31962A; de 24/02/2005, Proc. n.° 032377A; de 23/03/2006, Proc. n.° 01057/04; de 06/07/2006, Proc. 32377A; e de 28/11 /2007, Proc. 1050/06.
Nestes termos e nos mais de Direito, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, e em consequência, revogada a Douta Sentença, nas partes em que:
a) nega provimento ao pedido de declaração de nulidade do acto de 23.05.2006 (terceiro travessão do dispositivo) e
b) determina que o Executado abra novo concurso, com publicação de novo edital e apresentação de novas candidaturas, como forma de execução do julgado anulatório (quarto travessão do dispositivo),
Devendo esses segmentos da decisão ser substituídos por decisão que, em conformidade com o pedido formulado, declare nulo o acto de 23.05.2006 e determine que a execução do julgado anulatório se faça através dos actos e operações materiais descritos na alínea a) do petitório com remissão para o art. 261° da PI, com relevo para a nomeação de um novo júri do concurso e a avaliação (apenas) das candidaturas apresentadas em devido tempo.”

Não foram apresentadas contra-alegações.

O DMMP junto deste tribunal notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146º, nº1 do CPTA, pronunciou-se no sentido de que o recurso mercê ser provido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 Dos Factos

A Mmª Juíza «a quo» com base na prova documental, deu como provados, com interesse para a decisão do processo, os seguintes factos:

“A. Por edital publicado no Diário da República. 2ª Série, de 12.10.1448. foi aberto concurso para provimento de um lugar de professor associado no grupo de disciplinas de Química Orgânica Fundamental e Biorgânica. Química Orgânica Estrutural. Química dos Produtos Naturais e Química Orgânica de Síntese da FCT da UNL (acordo).
B. O ora Exequente foi opositor ao concurso tendo ficado graduado em 1º lugar na lista de classificação final, a qual lhe foi comunicada em 22.07.1999 (acordo).
C. Em 16/09/1999, o candidato ordenado em 2º lugar na citada lista. Cristopher …………………, à data Professor Associado convidado da FCT interpôs recurso contencioso da anulação da deliberação do júri do concurso que elaborou a graduação definitiva dos candidatos (acordo).
D. Por Despacho de 28.03.2000 do Vice-Reitor da UNL, publicado pelo Aviso n.° 7506 2000 (2ª Série), o Exequente foi nomeado definitivamente Professor Associado do quadro de pessoal docente da FCT, tendo assinado o termo de aceitação em 11.05.2000 (acordo).
E. Em 28.11.2003 foi proferida a sentença de fls 135 a 150 dos autos n.°819/1999, da ex 4ª secção, da ex 6ª UO, que aqui se da por reproduzida, que têm como Recorrente Christopher David Maycock, que anulou a deliberação de 16/09/1999 do júri do concurso para provimento de um lugar de professor associado no grupo de disciplinas de Química Orgânica Fundamental e Biorgânica. Química Orgânica Estrutural. Química dos Produtos Naturais e Química Orgânica de Síntese da FCT da UNL, que ordenou o ora Exequente cm primeiro lugar c ordenou Christopher …………………….. em segundo lugar da lista, por procedência do vício de violação de lei, por desrespeito do princípio da divulgação atempada dos métodos de selecção, sentença confirmada pelo Ac. do TC A Sul de 27.04.2009. de fls. 1 95 a 195 autos principais, que aqui se dá por reproduzido.
F. Em 16.05.2006 foi elaborado pelo Gabinete Jurídico da UNL o parecer de fls.105 a 107, que aqui se dá por reproduzido.
G. Em 22.05.2009 foi elaborado pelo Gabinete Jurídico da 1 NI o parecer de fls.108 e 109, que aqui se da por reproduzido. que propõe o seguinte:
Da aplicação destas normas ao caso concreto do concurso para provimento de um lugar de Prof. Associado da FCT da UNL, resulta que:
1º O procedimento concursal terá de recuar à fase de abertura, o que pressupõe a revogação de todos os actos anteriores à deliberação, cuja anulação foi decretada pelo Tribunal, incluindo o anterior Edital.
2° Deverá ser repetida a publicação do Edital, a que se refere o art.° 59° do ECDU, devendo este fixar, em definitivo, o método de selecção a utilizar, designadamente, o sistema de classificação final,
3º Seguir-se-á a apresentação das candidaturas e, os ulteriores termos do procedimento concursal, seguindo este o ECDU na medida em que se adeqúe ao preceituado nos art.° 3.°, n° 2 e 5.° do DL 204/98.»(Cfr. doc. de fls. 198 e 109).
H. Em 23.05.2006 o Reitor da UNL exarou sob o parecer do Gabinete Jurídico da UNL, de 22.05.2006 o seguinte despacho: - 1. Dar cumprimento à sentença nos termos propostos. 2. Dar conhecimento ao Sr. Director da FCT a fim de proceder em conformidade, o que significa que terá de cumprir com urgência de forma a minimizar os efeitos negativos sobre o candidato ordenado em primeiro lugar" (acordo; cfr. doc. de fls. 108 e 109).
I. Em 30.05.2006 foi remetida ao Director da FCT, pelo Reitor da UNL, cópia do Acórdão acima identificado, acompanhado de cópias de informações do Gabinete Jurídico, onde foi exarado o despacho antecedente (acordo).
J. Em 16.06.2006 foi publicado no DR nº 115. II Série, o Edital nº 266/2006 (2ª Série), de 25.05.2006. do Reitor da UNL, para abertura de concurso, conforme doc. de fls. 101 a 112 que aqui se da por reproduzido.
K. Em 22.06.2006 o Director da FCT exarou uma "Guia dc Apresentação" com o seguinte teor: "Vai o Professor Doutor ……………………….. apresentar-se no Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, no próximo dia 1 de Julho de 2006, na sequência da sentença do Tribunal Central Administrativo do Sul, conforme doc. de fls. 113, que aqui se dá por reproduzido.
L. Em 29.06.2006 a FCT comunicou ao ora exequente o acto praticado pelo Director da FCT em 22.06.2006, vertido na referida "Guia de Apresentação" (acordo).
M. Com data de 28.06.2006 foi enviado pelo Director da FCT ao Presidente do IST o ofício de fls. 115, que aqui se dá por reproduzido.
N. Em 30.06.2006 foi comunicado ao ora Exequente pela Coordenadora da Secção de Química orgânica. Prof. Dr. ……………….., do Despacho da Prof Dr ……………….., Presidente do departamento de Química com o seguinte teor: "Considerando a decisão do Tribunal que anulou o concurso para Professor Associado do quadro desta faculdade do qual tinha resultado o início funções do Prol Abel Vieira, foi o mesmo mandado apresentar no IST a partir de 1 de Julho de 2006 (portanto, no dia seguinte à notificação), ficando deste modo impedido de continuar a exercer funções nesta faculdade Nestes termos, solicito que a partir daquela data redistribua, no âmbito da secção que é responsável, todas as funções que estavam cometidas ao referido docente (cf doc. de fls. 121).
O. Em 03.07.2006 deu entrada neste TAC a Pi do processo nº 1754/06.6BELSB. da 3ª UO, em apenso, de suspensão de eficácia do despacho do Reitor da UNL de 23.05.2006, do edital n° 266/2006. de 26.05.2006 e do acto do Director da FCT de 22.06.2006, sendo proferida nesses autos em 29.12.2006 a sentença de fls. 385 a 404, que deferiu o requerido pedido de suspensão de eficácia a qual foi confirmada pelo TCA pelo Ac. de fls. 868 a 876 dos autos apensos.
P. Em 06.09.2006 o ora Exequente apresentou junto do Director da FCT da UTL o requerimento de fls. 124 e 125. que aqui se dá por reproduzido.
Q. Em resposta o Director da FCT da UTL enviou ao ora Exequente o ofício de fls. 126, que aqui se da por reproduzido.
R. Em 22.07.2006 a Divisão de Recursos Humanos determinou a suspensão do vencimento do Exequente com efeitos a partir de 01.06.2006 (acordo; cf. doc. de fls. 128).”
*

2.2. – Da aplicação do Direito aos Factos

Atentas as conclusões alegatórias que delimitam o perímetro recursório e a factualidade fixada, a questão decidenda consiste em saber, ante omnia, se a sentença incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito, sendo que o recorrente justifica o cometimento de tal vício na parte em que a Meritíssima Juiz a quo proferiu a decisão no tocante ao acto de 23.05.2006 do Director da FCT e à condenação do Executado na publicação de novo edital e recepção de novas candidaturas.
Segundo o Recorrente, ao proferir tal decisão, o Tribunal acaba por chegar a uma solução que vai contra, ou pelo menos, que vai além, dos limites do caso julgado na sentença anulatória que serve de título executivo aos presentes autos. A sentença padece, pois, nesse segmento decisório, de erro de julgamento.
Importa, na verdade, determinar se o julgado anulatório permite ou não tratar o aviso de abertura do concurso de 1998 e a respectiva publicação como sendo ilegais, o que passa por aferir o que a tal propósito decorre da Sentença recorrida.
Como emerge do julgado anulatório, este teve por sentido e limites a anulação do acto final de decisão do concurso público, por o mesmo padecer de vício de violação de lei, e bem assim, a anulação de todos os actos procedimentais que padeciam do mesmo vício.
Assim, neste momento e atenta a pretensão do Recorrente, tendo em conta os limites e extensão da sentença exequenda, que, como bem salienta o Recorrente, é o único padrão que pode delimitar o escopo dos vícios procedimentais detectados, é essencial para a questão a decidir fixar o momento no qual ocorreu o vício de violação de lei que determinou a anulação desses actos.
Analisando a sentença anulatória (doc. 4 junto à PI), capta-se que o julgador afirma que a conduta do júri que inquinou o procedimento se situa entre a publicitação do Edital, em 12 de Outubro de 1998, e a sua reunião de 23 de Abril de 1999.
Mais nela se aduz que a conduta do júri que inquinou o procedimento foi o não ter “para além do que constava do edital de abertura do concurso até à data de 23/04/99” divulgado o sistema de classificação.
Do exposto, é forçoso concluir que da fundamentação do julgado exequendo resulta claramente que o que estava no edital, quanto à avaliação, por remissão para as regras do ECDU, está correcto. Porém, do mesmo também resulta que, se havia critérios, para além daquelas regras gerais constantes do edital, que iriam ser aplicados pelo júri, então este teria de os dar a conhecer antes de ler os curricula, ou seja e concretamente, antes de 23/04/99.
Por assim ser e em concordância com o Recorrente, o efeito anulatório da decisão exequenda só era susceptível de se estender também ao edital de abertura do concurso em duas hipóteses:- (i)se os próprios critérios de avaliação contidos no edital eram ilegais, no sentido de contrários à lei e regulamentos então em vigor — e aí, obviamente, o edital seria inválido por vício de violação de lei; (ii) se a simples ausência, do edital, dos critérios que depois vieram a ser aplicados seria, ela própria, um vício de violação de lei, para o que seria necessário demonstrar que a Administração tinha necessariamente de revelar os ditos critérios de selecção aquando da publicação do edital, e não em momento posterior.
O certo é que do discurso fundamentador da sentença exequenda conjugado com o teor do edital publicado em 12.10.1998 e por referência ao quadro legal aplicável à data da sua publicação, é forçoso concluir que os métodos de selecção aí fixados não eram desconformes à lei. Certo também que ainda que o edital enfermasse de omissão por não incluir os métodos de selecção que mais tarde foram utilizados, isso era perfeitamente inócuo já que esse vício só ocorreria se à data do edital existisse uma norma que estabelecesse que todos os métodos de selecção teriam de constar do edital e ao tempo inexistia uma tal norma.
Por assim ser, é patente e claro na sentença anulatória que o vício que condicionou a anulação da deliberação em causa foi praticado no decurso do procedimento concursal e não no momento da sua abertura ou publicitação.
Vale então aqui o ensinamento doutrinário do Prof. Mário Aroso de Almeida, Reinstrução do Procedimento e plenitude do processo de execução de sentenças, em Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativos - Pleno da Ia Secção - de 29.11.1997, P. 27 517-B, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.° 3, pág. 12 e segs, segundo o qual “por força das regras gerais acerca do respeito do caso julgado, são válidos todos os actos do concurso que não foram objecto de censura por parte da decisão”
Ora e acompanhando o raciocínio do Recorrente, isso significa que na sentença exequenda não se anulou o edital o qual, para todos os efeitos, se consolidou na ordem jurídica como um acto válido.
Consequentemente, porque o caso julgado se impõe quer à Administração quer aos tribunais, todas as decisões — sejam elas um acto administrativo de execução do julgado, ou uma sentença num processo de execução de sentença — têm de respeitar os limites desse caso julgado, partindo dele e apenas dele, não inovando e não o contrariando.
Com a reforma de 2004, concretizada para dar cumprimento ao objectivo constitucional da garantia da tutela judicial efectiva dos direitos dos particulares e, sobremodo, ao preceito constitucional que prevê a obrigatoriedade das sentenças administrativas para as autoridades públicas ínsito no actual artº 205º, nºs. 2 e 3 da Constituição, a administração passa a ter o dever de execução espontânea circunscrito a um certo prazo e o ónus de invocar a existência de causa legítima de inexecução, nesse prazo ou em sede de oposição ao pedido de execução do particular, que deixou de estar obrigado a requerer a declaração da respectiva inexistência.
Como enfatiza Vieira de Andrade, in Justiça Administrativa (Lições), 5ª edição, pág. 352, “o processo executivo visa obter, pela via judicial, as providências materiais que concretizem, no plano dos factos, aquilo que foi juridicamente determinado pelo tribunal no processo declarativo.
Desde logo, a doutrina e a lei apontam para um conceito amplo de execução, que inclui as modalidades de cumprimento espontâneo ou voluntário da sentença, em especial pela Administração, bem como a própria garantia do respeito pelo julgado, pelo menos na medida em que seja necessário para o restabelecimento de direitos violados.”
No mesmo sentido, também se pronuncia o Prof. Freitas do Amaral, A Execução das sentenças dos tribunais administrativos, 2ª, ed., p.p.33 e ss, acentuando as limitações de uma execução forçada no processo administrativo, quando são as autoridades que detêm o poder de coagir.
Do exposto resulta do artº 158º do CPTA a obrigatoriedade das decisões dos tribunais administrativos que implica o dever de cumprimento espontâneo das sentenças pela Administração dentro de um determinado prazo, salvo a verificação de causa legítima de inexecução, o que quer dizer que o particular não tem agora o ónus de requerer à Administração a execução da sentença para o colocar em mora.
Da conjugação dos artºs. 158º, 162º, 164º, 170º, nºs 1 e 2, 175º e 176º do CPTA, decorre que, em vista do caso concreto, findo o prazo de três meses, o particular tem o direito e o ónus de iniciar o processo de execução e as autoridades administrativas apenas podem deixar de cumprir o julgado se ocorrer uma causa legítima de inexecução que, legalmente, só poderão ser a impossibilidade absoluta e o grave prejuízo para o interesse público em tal execução, ressalvando-se o caso de pagamento de uma quantia certa, em que não pode ser invocada uma tal causa.
É de salientar neste contexto, que o conhecimento da existência ou inexistência de causa legítima de inexecução, não integra o objecto principal do processo de execução, constituindo uma mera questão incidental.
Perspectivando a situação dos autos segundo tais princípios o que o tribunal a quo tinha de fazer era, tão só, determinar, se existe, ou não, causa legítima de inexecução, na consideração de que a causa legítima de inexecução específica da sentença pode ser invocada na fase pré-executiva de cumprimento espontâneo (artº 163º do CPTA), durante o processo executivo, em oposição (artº 165º), ou, na execução de sentença anulatória, na respectiva contestação (artº 177º).
Donde que, as questões colocadas pelo Recorrente, revelam claramente que não foi dado cumprimento do julgado anulatório em causa nestes autos, com inobservância do caso julgado.
A propósito do caso julgado escreveu-se no Acórdão do STA, de 14.02.02, proc. 10/02-30, o seguinte:
“ (…) Conforme se refere nos artigos 673º e 671º do Código do Processo Civil a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que a julga e, transitada, a decisão sobre a relação material controvertida fica tendo força obrigatória dentro do processo e fora dele (…)”.
Tendo-se nele ainda dito, com recurso às obras ali citadas da nossa melhor doutrina (Manuel de Andrade, Rui Machete, Vital Moreira e Gomes Canotilho) que:
“…O caso julgado material destina-se a tornar certa e inatacável a posição das partes quanto aos bens litigados…”
"...o caso julgado material consiste na indiscutibilidade da afirmação sobre a legalidade do acto contido na sentença administrativa, a qual é assim vinculativa para qualquer tribunal ou entidade pública e para os próprios particulares que a têm de aceitar como um dado imodificável."
Inatacabilidade e indiscutibilidade que perante o disposto no então invocado e aqui também invocado art.º 205° da Constituição da República, designadamente pelo que se estatui no seu n.º 2° “As decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades.”
Na verdade, “…as decisões judiciais (transitadas em julgado) não necessitam de nenhuma homologação ou confirmação de outra autoridade para se tomarem obrigatórias, nem podem ser anuladas ou superadas por uma decisão de nenhuma outra autoridade...".
Como "...se a Constituição manda respeitar os casos julgados mesmo quando eles assentem em normas inconstitucionais, por maioria de razão se imporá tal respeito quando se não verifique tal situação. " (Vital Moreira e Gomes Canotilho).
Aplicando tal Doutrina ao caso concreto, tendo em conta o decidido no acórdão anulatório não pode deixar de ser integralmente aplicada.
Saliente-se que um dos efeitos substantivos do acórdão que concede provimento ao recurso e, em consequência, julgou procedente a acção impugnatória, a par do efeito declarativo e do efeito anulatório, é o efeito executório: concedido provimento ao recurso e determinada a anulação, resulta para a Administração o dever legal de extrair todas as consequências jurídicas da anulação, isto é, o dever jurídico de executar a sentença do tribunal administrativo.
E o dever de executar a sentença, que tem como corolário o direito subjectivo do Exequente a quem foi favorável, consiste no dever de extrair todas as consequências jurídicas da anulação decretada pelo tribunal, traduzindo-se tal dever na obrigação, para a Administração, de praticar todos os actos jurídicos e todas as operações materiais que sejam necessárias à reintegração da ordem jurídica violada.
Tal reintegração deve traduzir-se não no dever legal de repor o administrado na situação anterior à prática do acto ilegal, mas sim consistir na reconstituição da situação jurídica que actualmente existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado: reconstituição da situação actual hipotética (neste sentido Diogo Freitas do Amaral, in Direito Administrativo, Lições, vol. IV, 1988, pag. 228 e ss).
Assim, sobre a ilegalidade declarada pela sentença anulatória e ora exequendo formou-se caso julgado não apenas formal mas também material, que a decisão que viesse a determinar a suspensão desta instância nos termos pretendidos pela recorrente manifestamente afrontaria.
É consabido que o caso julgado material ou externo é o que tem força obrigatória dentro do processo e fora dele, impedindo que o mesmo ou outro tribunal, ou qualquer outra autoridade, possa definir em termos diferentes o direito concreto aplicável à relação material litigada – A . Varela, Manual Proc. Civil, 2ª ed.-703.
Por força do disposto no art.5.º, n.º 4, do DL n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro, é aplicável ao presente processo de execução de julgado o regime previsto no Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
As regras fundamentais deste Código sobre a execução de sentenças de anulação de actos administrativos são enunciadas nos n.ºs 1 e 2 do art. 173.º, em que esse estabelece que «sem prejuízo do eventual poder de praticar novo acto administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado. bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado» e que «a Administração pode ficar constituída no dever de praticar actos dotados de eficácia retroactiva que não envolvam a imposição de deveres, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses legalmente protegidos, bem como no dever de remover, reformar ou substituir actos jurídicos e alterar situações de facto que possam ter surgido na pendência do processo e cuja manutenção seja incompatível com a execução da sentença de anulação».
O Supremo Tribunal Administrativo, tem perfilhado o entendimento de que em processos de impugnação de actos administrativos o caso julgado abrange a qualificação como vícios, positiva ou negativa, pelo que o âmbito do dever de execução se determina em função das razões que motivaram a anulação.
Daí que, volvidos mais de 3 meses sobre o envio de tal resposta, sem lhe ter sido comunicada qualquer nova decisão da entidade administrativa quanto à impossibilidade absoluta da execução do julgado, o ora exequente tenha legitimamente concluído pela falta de execução espontânea do julgado anulatório, e, assim, formulado com inteira legitimidade o pedido de declaração de inexistência de causa legítima de inexecução.
Ora, só constituem causa legítima de inexecução a impossibilidade e o grave prejuízo para o interesse público no cumprimento da decisão judicial.
In casu, não foi invocada causa legitima de inexecução nem que a execução cause grave prejuízo para o interesse público, nem se vislumbra, atenta a natureza do julgado anulatório, qualquer razão que objectivamente possa obstar à execução.
Sucede que, a execução das sentenças anulatórias dos tribunais administrativos impõe à Administração a obrigação de desenvolver uma actividade de execução com a finalidade de pôr a situação de facto de acordo com a situação de direito constituída pela decisão anulatória.
E esta obrigação subdivide-se, segundo a lei, em dois deveres concretos:
- dever de respeitar o julgado, conformando-se com as limitações que dele resultam para o eventual exercício dos seus poderes [efeito preclusivo ou inibitório – cfr. art. 173º n.º 1, do CPTA (“Sem prejuízo do eventual poder de praticar novo acto administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado (…)”)], e
- dever de reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto anulado [efeito repristinatório ou reconstitutivo – cfr. art. 173º n.º 1, do CPTA (“(…) a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado (…)”)].
Nesse sentido e a título exemplificativo, veja-se o Acórdão da Secção do CA- 2º Juízo do TCAS de 12-03-2015, proferido no Processo nº 05144/09.
Conclui-se, pois, que o respeito pelo caso julgado significa que a Administração, a repetir o acto anulado, terá de o fazer desprovido das ilegalidades que motivaram a anulação, não podendo reincidir nessas ilegalidades, sob pena de incorrer em nulidade (cfr. arts. 133º n.º 2, al. h), do CPA, e 158º n.º 2, do CPTA).
Assim, a autoridade do caso julgado que se impunha à Administração respeitar, no presente caso (cfr. arts. 205º n.º 2, da CRP, e 158º, do CPTA), enquanto constituída no dever de executar o julgado anulatório, era limitada pelo pedido e pelo segmento da causa de pedir que foram julgados procedentes no âmbito do recurso contencioso n.º 607/98 – neste sentido, entre muitos outros, Acs. Do STA de 2.7.2008 (Pleno), proc. N.º 1328ª/03, e 18.11.209, proc. N.º 581/09 -, ou seja, pela anulação do acto que não graduou em 1º lugar a Exequente e permitiu que o contrato de concessão fosse outorgado com outra entidade.
O âmbito da reconstituição da situação actual hipotética que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado (artº 173º nº 1 CPTA),impõe que se tenha presente que “(...) Ao nível do conteúdo, a execução do efeito repristinatório da anulação concretiza-se na recolocação do interessado na posição da qual o acto anulado o tinha retirado, restabelecendo a situação que existiria no momento em que esse acto foi praticado.
O cumprimento do dever de executar o efeito repristinatório da anulação circunscreve-se, deste modo, à reconstituição do statu quo ante, isto é, da situação inicial que existia no momento da intervenção ilegal, e concretiza-se na remoção da situação de agressão que a alterou no plano dos factos.
Ao dispor o nº 1 do artº 173º do CPTA que “a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado”, isso quer dizer que há o dever de reconstituição da situação actual hipotética que deveria existir caso o acto ilegal, anulado judicialmente, não tivesse sido praticado, retroage os seus efeitos ao momento em que esse acto ilegal foi praticado, ou seja, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que a Administração deveria ter actuado.
Donde que a actuação do Executado em dar cumprimento ao julgado anulatório impõe-se como uma obrigação constituída judicialmente, nos termos do artº 158º do CPTA, o que significa que a decisão judicial é obrigatória para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre quaisquer autoridades administrativas, sob pena de nulidade dos actos contrários que sejam praticados e ainda, de responsabilidade civil, criminal e disciplinar dos titulares dos órgãos incumbidos da execução.
In casu, o que cabe unicamente aferir é se ocorre causa legítima de inexecução, que, como já se demonstrou, não tendo sido expressamente invocada, deve ser dado cumprimento ao disposto no artº 178º, nº 1 do CPTA.
O interesse e utilidade da instância executiva para o exequente que obteve vencimento da causa, existe não só quando a seguir ao trânsito em julgado de uma decisão judicial nada tenha ocorrido, por omissão da Administração, como no presente caso, mas também quando na sequência do decidido a Administração tenha adoptado uma qualquer conduta, pois o interessado tem interesse e utilidade em ver essa conduta apreciada jurisdicionalmente, no sentido da sua compatibilidade com o anterior julgado.
Consequentemente, a utilidade da instância executiva não se esgota na adopção de um qualquer acto administrativo ou de operações materiais pela Administração condenada em juízo, importando, tendo utilidade para o interessado, em ver apreciado da correspondência dos novos actos com a decisão transitada em julgado, sobretudo quando essa nova decisão não vai ao encontro da pretensão material requerida.
Volvendo ao caso dos autos e tendo e à luz de tais normas e princípios, vemos que o Executado não podia, em 23.05.2006, postergar o edital publicado em 12.10.1998 e determinar a abertura de um novo concurso, sendo esse acto manifestamente nulo por afrontar o caso julgado (art. 133°, n° 2, alínea h) do CPA), padecendo, ainda, da invalidade derivada por representar um acto de revogação de um acto constitutivo de direitos válido, que é o acto de abertura do concurso (neste sentido: TCAN 27-01-2011, proc. 62/2003-Coimbra).
Ora, o Tribunal a quo também descurou que esse edital persiste e subsiste na ordem jurídica e por isso a reconstrução do procedimento concursal só poderá fazer-se a partir desse acto e ressalvando tudo aquilo que no procedimento tiver acontecido e que não se mostrasse afectado pelo vício de violação de lei que determinou a anulação.
Sufraga-se, por isso, a tese do Recorrente de que ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo incorre em erro de julgamento por incorrecta aplicação do Direito aplicável ao caso: o ECDU e o Decreto-Lei n.° 204/98, na forma de os compatibilizar que resulta do julgado anulatório e da PI; os princípios da imparcialidade, da isenção, da igualdade, da objectividade e da transparência; o art. 133°, n° 2, alínea h) do CPA e o art. 140°, n° 1, alínea b) do mesmo Código; e o art. 173°, n° 1, do CPTA.
É que não podemos deixar de seguir o ponto de vista do Recorrente no sentido de que o próprio edital constitui o termo inicial da execução de sentença em acatamento do julgado anulatório o que vale por dizer, usando os termos expressos pelo Recorrente, que, subsistindo na ordem jurídica, o edital determina o prosseguimento do concurso a partir de si próprio, ou seja, ele determina que o concurso iniciado em 1998 (e não um novo concurso, iniciado em 2011, como pretende o Tribunal e como resulta do acto de 23.05.2006) prossiga.
Por outro lado, impõe-se distinguir com rigor os actos procedimentais que foram afectados pelo julgado anulatório dos que se mantiveram incólumes.
Nesse sentido, é incontroverso que não foram abrangidos pelo julgado anulatório, os seguintes o acto do Executado que determinou a admissão das candidaturas e a entrega das mesmas pelos candidatos já que a invalidade ficou circunscrita à fixação extemporânea de critérios, depois do conhecimento das candidaturas.
Logo e por respeito pelo julgado anulatório, é o acto de definição extemporânea dos critérios de classificação e a sua não divulgação atempada, o acto afectado e gerador da invalidade de todos os actos concursais que, a partir desse, o tiveram por pressuposto, mormente os actos de aplicação de critérios e aprovação da grelha da classificação, e a homologação da decisão final.
Ora, na sentença recorrida, depois de se identificar correctamente o vício que foi declarado pelo julgado anulatório, ou seja, a não divulgação do sistema de selecção dos candidatos previamente à data em que o júri tomou conhecimento dos currículos ou pôde ter acesso a eles, considerou que o cumprimento do julgado anulatório se faria repetindo o concurso a partir da fase em que deveria ter procedido à divulgação dos métodos de classificação, mas garantindo que antes da fixação e da divulgação de tais critérios ainda não poderia o júri ter acesso a quaisquer currículos dos candidatos.
Até aqui, concorda-se com os termos solução proposta mas, já se adere às reservas levantadas pelo Recorrente quanto a saber se tal reconstituição da situação só é possível com a abertura de um novo concurso na consideração feita na sentença recorrida de que em causa estava uma ilegalidade que inquinou o concurso ab initio, pelo que a “retoma do anterior concurso com o mesmo universo de candidaturas, proposta pelo Exequente, feriria inelutavelmente o novo procedimento com o mesmo vício de violação de lei. Face à matéria fáctica apurada e aplicando aqui as regras próprias da vida, se o anterior concurso fosse retomado com os anteriores candidatos, mesmo que se alterasse a composição do júri, era possível que esse júri ou alguns dos seus membros pudessem ter conhecimento de quais os candidatos que haviam participado no concurso inicial e assim pudessem afeiçoar os critérios concursais aos currículos desses candidatos.”
Não se concorda com este enquadramento, desde logo porque parte de uma premissa errada: como se viu e contrariamente ao afirmado na sentença, o acto ilegal segundo o julgado anulatório, não inquinou o concurso ab initio, porquanto, os critérios publicados ab initio não eram ilegais e inexistia qualquer norma que obrigasse à publicação de todos os critérios de selecção logo no edital pois, ao tempo do concurso em apreço, era permitido que os critérios fossem definidos pelo júri durante o prazo de candidaturas, e era apenas a jurisprudência que, como corolário do princípio da imparcialidade, fixava um limite máximo para tal definição, que era o momento do conhecimento ou possibilidade de conhecimento, pelo júri, dos currículos.
Nesse sentido, pontificam os acórdãos citados pelo Recorrente nas alegações de recurso: do STA de 27/05/1999, proc. 31962;- do STA de 21/06/2000, proc. 41289;-do STA (Pleno) de 12/11 /2003, proc. 39386;- do STA de 09/12/2004, proc. 0594/04;- do STA de 13/01/2005, proc. 0730/04;- do STA (Pleno) de 1 3/11 /2007, proc. 1140/06;- do ST A de 18/03/2010, proc. 781/09; - do TCAS de 04/03/2010, proc. 5463/09 e do TC AN de 06/05/2011, proc. 00216/05.3BEPRT.
Ora, no caso posto, decorre do probatório que o edital foi publicado em 12.10.1998, as candidaturas foram apresentadas e que em 23.04.1999, é que o júri pôde ter acesso aos currículos e definiu os métodos de classificação não previamente divulgados.
Daí que, na verdade, não possa afirmar-se, como o faz a Mª Juíza, que a factualidade acabada de referir possa configurar uma ilegalidade que inquinou o concurso ab initio e que a reconstituição da situação só é possível com a abertura de um novo concurso.
Não há dúvida de que a Meritíssima Juíza a quo entende que era exigível que o Júri publicitasse os critérios de classificação antes de poder sequer receber os currículos.
Todavia, concorda-se com o Recorrente no sentido de que a definição e divulgação atempada dos critérios antes do conhecimento dos currículos não visa dar a conhecer esses critérios aos potenciais candidatos, para que eles possam elaborar os seus currículos de acordo com esses critérios, mas sim assegurar a imparcialidade e a igualdade no procedimento concursal, pela prévia fixação desses critérios antes de se saber quem vai ser avaliado.
A raison d´etre da divulgação atempada ter de correr antes da prestação de provas e também antes de o Júri poder saber quem são os candidatos e conhecer os seus currículos, não importa que essa informação tenha de constar no edital, já que, para o cumprimento dos princípios da imparcialidade, da igualdade, da objectividade e da transparência, basta que os critérios de classificação sejam definidos, isto é. fixados, sem que o Júri tenha ou possa ter conhecimento dos currículos, e sejam então divulgados, o que de acordo com a jurisprudência, e dado que o legislador omitiu o momento procedimental em que isso tem de acontecer, significa que isso tem de acontecer, no máximo, até ao momento imediatamente anterior ao termo do prazo de entrega de candidaturas.
Acresce que na sentença se sustenta que, tendo em vista os princípios da imparcialidade, da isenção, da igualdade, da objectividade e da transparência, uma reconstituição do julgado anulatório que passasse pela manutenção dos candidatos que na altura se apresentaram e dos respectivos currículos, mas com mudança completa dos membros do Júri e reunião dos mesmos, para definir os critérios de classificação, antes de terem acesso aos currículos, aplicando as “regras próprias da vida”, não haveria garantia de que os membros do novo Júri, ainda que não fossem os mesmos, não saberiam quem eram os candidatos, já que, conforme afirmação vertida na Sentença, seria “possível” que os membros do Júri soubessem quem são os candidatos e pudessem afeiçoar os critérios.
Para nós é errática essa análise antes de tudo porque nega a hipótese de reconstituição da situação que é a única compatível com o julgado anulatório e obedece a outros princípios jurídicos como os do aproveitamento dos actos, ainda por cima com o argumento de que que com esse agir se visa acautelar a imparcialidade e a objectividade na avaliação.
Ademais, a Sentença incorreu manifestamente em erro na aplicação do Direito aplicável ao caso concreto e que é o ECDU e o Decreto-Lei n° 204/98, com respeito pelo julgado anulatório nas vertentes já assinaladas com salvaguarda dos princípios da imparcialidade, da igualdade, da objectividade e da transparência; os arts. 133°, n.° 2, alínea h) e 140°, n.° 1, alínea b), do CPA; e o art. 173°, n.° 1, do CPTA, ao determinar que os candidatos ao concurso aberto em 1998 poderão ficar privados da sua posição jurídica consolidada decorrente da sua qualidade procedimental de (únicos) candidatos, e outras pessoas poderão, sem justificação, ganhar o direito ao lugar ao qual não se candidataram inicialmente.
Com efeito, essa é a única conclusão a extrair da fundamentação da sentença quando possibilita que o julgado anulatório seja executado publicitando o concurso “renovado” e admitindo que nele sejam opositores pessoas que não participaram no concurso de 1998.
Em termos práticos, essa solução importaria, tal como sublinha o Recorrente que “os que efectivamente participaram no concurso em 1998 possam não tomar conhecimento do novo edital, ou não conseguir, em tempo útil, preparar novamente as suas candidaturas.com a informação restrita a 1998, o que levará à sua não participação; e segundo, que outras pessoas que na altura devida não quiseram apresentar candidatura o possam fazer neste momento, mais de dez anos depois.
Naquela primeira hipótese, veja-se o resultado nitidamente absurdo e contrário ao julgado anulatório a que se chegaria: uma pessoa que foi opositor ao concurso em 1998 perderá o direito a ver a sua candidatura apreciada, apesar de o julgado anulatório ter determinado que aquele concurso de 1998 deveria ser retomado, e de ter determinado que o vício — provocado pelo Executado! — só teve lugar depois da entrega das candidaturas e portanto não as afectou.
Quer dizer: através desta forma completamente anómala de reconstituição da situação actual hipotética, conseguir-se-ia excluir da dita reconstituição um candidato que ganhou o direito a ver a sua candidatura apreciada quando apresentou essa candidatura ao procedimento em 1998.”
Essa posição é insustentável tendo em conta o já assinalado limite objectivo do caso julgado das decisões anulatórias de actos administrativos “...seja no que respeita ao feito preclusivo, seja no que respeita ao feito conformador do futuro exercício do poder administrativo, determina-se pelo vício que fundamenta a decisão...” (cfr. Ac. do STA/Pleno de 08.05.2003 - Proc. n.° 40821A in: «www.dgsi.pt/jsta» - no mesmo sentido, ainda Ac. STA/Pleno de 29.01.1997 - Proc. n.°27517 in: Apêndice DR de 28.05.1999, págs. 165 e segs.), pelo que a eficácia de caso julgado anulatório se encontra circunscrita às ilegalidades que ditaram a anulação contenciosa do acto nada obstando, desta feita, a que a Administração emita novo acto com idêntico núcleo decisório mas liberto daquelas mesmas ilegalidades (cfr. Ac. do STA /Pleno de 08.05.2003 - Proc. n.° 40821A, de 02.07.2008 - Proc. n. ° 01328A/03, Ac. STA/Secção de 30.09.2010 - Proc. n.° 01388A/03 m:« www.dgsi.pt/jsta ») ”.
Tendemos, por isso, a reconhecer razão ao Recorrente: não pode ser o mesmo júri afixar os critérios de selecção, mas sim outro, solução que está na linha da jurisprudência dos tribunais superiores da qual são representativos os acórdãos os seguintes indicados nas alegações recursórias do Recorrente e que se citam com a devida vénia mediante a transcrição dos respectivos sumários:
- Acórdão do STA de 04/03/97. proferido no Processo n.° 31932A:
“I - Se, tocantemente a um concurso de provimento, foi contenciosamente considerado que o júri violou o princípio da imparcialidade - causa de anulação do acto impugnado - por fixar os critérios de avaliação dos currículos depois de já conhecer estes, não se torna impossível executar o sentenciado, pois que se pode, nomeadamente, constituir novo júri. ”
- Acórdão do STA de 06/04/2000. proferido no Processo n.° 41906A:
“anulado o acto de homologação de lista classificativa final de um concurso de provimento, por violação do princípio da imparcialidade (o júri fixou os critérios e factores de avaliação dos candidatos depois de conhecer os seus currículos) impõe-se, para a reconstituição da situação, a constituição de novo júri, a fixação por este, antes de conhecer a identidade dos candidatos e respectivos currículos, dos critérios e factores de avaliação..., bem como a prática da subsequente tramitação do concurso (v.g. avaliação, classificação e ordenação dos candidatos e homologação da lista de classificação final)”.
- Acórdão do STA de 09/07/2003. proferido no Processo n.° 31962A:
I - Tendo o julgado anulatório suprimido o acto culminante de um concurso de pessoal por os «critérios de avaliação» aprovados pelo júri não terem «sido levados ao conhecimento dos concorrentes» antes do «início das operações integradoras de algum dos métodos de selecção fixados no aviso» de abertura, torna-se claro que a pronúncia judicial não implicou a supressão daquele aviso.
II - A decisão judicial anulatória tem ordinariamente aptidão para definir, não apenas o vício factor de ilegalidade, mas também o quadro procedimental em que se deve mover a Administração na sua subsequente tarefa de reintegração da ordem jurídica violada.
III - Assim, a decisão anulatória dita em I não pode ter-se por executada através de um acto que anulou «a radice» o mencionado concurso, já que a execução em causa deverá consistir na reconstrução, a partir do passo viciado do concurso, de todos os termos do procedimento que sofreram os efeitos desse vício.
- Acórdão do STA de 24/02/2005, proferido no Processo n° 032377A:
“VI - Se o acto impugnado foi anulado por, indevidamente, se terem fixado critérios em momento em que não o poderiam ser, então haveria de reiniciar-se o procedimento com vista ao prosseguimento do concurso, com a eliminação da fase abrangida pela decisão anulatória, nomeando-se um novo júri que proceda à avaliação dos elementos curriculares dos candidatos.”
- Acórdão do STA de 23/03/2006, proferido no Processo n° 01057/04;
“I - A execução dos julgados anulatórios consiste na reconstituição da situação actual hipotética, ou seja, no refazer da situação que existiria se, na vez do acto judicialmente suprimido, tivesse sido praticado um acto depurado do vício invalidante.
II - Num concurso interno de acesso, limitado, anulado por vício de violação de lei por ofensa ao disposto nos artigos 27°, n°. 1, als. f e g), e 5º, n° 2, al. b), ambos do D.L. n° 204/98, de 11-07, quer porque o aviso de abertura do concurso não continha o sistema de classificação final, quer porque os critérios de ponderação da avaliação curricular só foram definidos pelo júri após o termo do prazo de apresentação das candidaturas, o que a execução do acórdão anulatório implica é tão só afixação dos critérios de avaliação dos currículos e de o sistema de classificação final, e respectiva fórmula classificativa, e o seu conhecimento pelos CANDIDATOS JÁ ADMITIDOS e, em seguida a prática dos subsequentes actos do procedimento do concurso, (v.g. avaliação, classificação e ordenação dos candidatos e homologação da lista de classificação final), sendo que os actos do concurso situados a montante, como a sua abertura e a admissão dos candidatos, permanecerão indemnes - acórdãos de 6-04-2000, Proc.° n.° 41906-A, in AP DR 9-12-2002, 3471, e de 8-07-99, Proc.° n.° 31932-A, in AP DR de 9-92002, 4552). Como se escreve no acórdão de 9-07-2003, Proc.° n.° 31962-A, em processo de execução de decisão anulatória semelhante à dos presentes autos, “todos os actos do procedimento anteriores àquele em que o vício emergiu ficam a coberto da pronúncia judicial invalidante, de modo que, e normalmente, a execução do julgado consistirá em refazer, a partir do ponto viciado, os termos do procedimento que sofreram os efeitos desse vício”.
- Acórdão do STA de 06/07/2006, proferido no Processo 32377A:
“O acórdão anulatório fundou-se no facto de o júri do concurso ter procedido afixação de critérios que não constavam do aviso de abertura, e à respectiva quantificação, em momento posterior ao conhecimento da identidade dos candidatos, e à apreciação dos seus curricula. Ora, se o acto impugnado foi anulado por, indevidamente, se terem fixado critérios em momento em que não o poderiam ser, então haveria de reiniciar-se o procedimento com vista ao prosseguimento do concurso, com a eliminação da fase abrangida pela decisão anulatória, nomeando- se um novo júri que procedesse à avaliação dos elementos curriculares dos candidatos”.
- Acórdão do STA de 28/11 /2007, proferido no Processo 1050/06:
“Anulado, por decisão administrativa, o acto de homologação da lista classificativa final de um concurso de provimento, pelo facto de o júri ter fixado os critérios e factores de avaliação depois de conhecidos os currículos dos candidatos, sendo ilegal, por violação do princípio da imparcialidade, a fixação de novos critérios pelo mesmo júri, impõe-se, para a reconstituição da situação que existiria se a ilegalidade não tivesse sido cometida, a constituição de novo júri para prosseguir a subsequente tramitação do concurso, incluindo afixação dos critérios e factores de avaliação antes de conhecer a identidade dos candidatos e de ter acesso aos respectivos currículos.”

Procede, a essa luz, o presente recurso.
*

3. Decisão

Em face do exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso interposto e, em consequência:
a) -revogar a sentença recorrida, julgar procedente o pedido de declaração de nulidade do acto de 23.05.2006 e determinar que a execução do julgado anulatório se faça através dos actos e operações materiais descritos na alínea a) do petitório com remissão para o art. 261° da PI, com relevo para a nomeação de um novo júri do concurso e a avaliação (apenas) das candidaturas apresentadas em devido tempo.
b)- Condenar as Recorridas nas custas.

*

Lisboa,01 de Junho de 2017
[José Gomes Correia]
[António Paulo Esteves Aguiar de Vasconcelos]
[Pedro José Marchão Marques]