Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:3462/15.8BESNT
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:06/01/2017
Relator:HELENA CANELAS
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL
Sumário:I – De harmonia com o disposto no artigo 2º nº 8 do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), aprovado pelo DL. n.º 59/2015, de 21 de Abril o Fundo de Garantia Salarial só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.

II – O prazo previsto no nº 8 do artigo 2º do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), aprovado pelo DL. n.º 59/2015, de 21 de Abril, para que seja requerido ao Fundo de Garantia Salarial o pagamento de créditos laborais é um prazo de caducidade.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO
Sandra ……………… (devidamente identificada nos autos) autora na Ação Administrativa Especial em que é Réu o Fundo de Garantia Salarialna qual visou a impugnação da decisão de indeferimento do seu pedido de pagamento de créditos laborais, e a condenação da entidade a deferir o pedido – inconformada com a sentença de 17/07/2016 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou improcedente a ação, absolvendo o réu dos pedidos, dela interpõe o presente recurso, pugnando pela sua revogação com substituição por decisão que julgue a ação procedente, condenando a Entidade Recorrida deferir o pedido, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
I. Do art.º 1.º do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), aprovado pelo DL n.º 59/2015, de 21 de Abril, resulta, claramente, ser apenas um o requisito para pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, o qual consiste na existência de sentença que declare a insolvência do empregador.

II. A leitura da norma constante no art.º 2.º, n.º 8, do NRFGS, tem de ser harmonizada com o art.º 1.º, n.º 1, al. a), do mesmo diploma legal.

III. O requisito de accionamento do Fundo de Garantia Salarial é o da declaração de insolvência da entidade patronal.

IV. Destarte, o prazo constante no art.º 2, n.º 8, do NRFGS, não começou a correr a partir da data da revogação do contrato de trabalho, uma vez que nesta data, a entidade patronal ainda não havia sido declarada insolvente.

V. A Recorrente nem sequer podia, legalmente, accionar o Fundo de Garantia Salarial no prazo de um ano após a cessação do seu contrato de trabalho, porquanto, ainda não tinha havido declaração de insolvência do empregador, o que só veio a ocorrer 2 anos depois.

VI. Qualquer interpretação do art.º 2.º, n.º 8, do NRFGS, que impedisse a Recorrente de reclamar o seu crédito, por via do Fundo de Garantia Salarial, por ter cessado o seu contrato de trabalho há mais de um ano, mesmo sem ter sido declarada a insolvência do empregador, seria contrária à Constituição da República Portuguesa, nomeadamente, ao art.º 59.º, n.º 1, al. a) e ao art.º 13.º.

VII. De todo o modo, e sem prescindir do que acima se defendeu, o prazo previsto no art.º 2.º, n.º 8, do NRFGS, é um prazo de prescrição.

VIII. Mesmo que, por mera hipótese, se aceite a tese da sentença recorrida, que o prazo de 1 ano começou a contar desde a data em que foi celebrado o acordo de revogação do contrato de trabalho, o que não se admite, tal prazo foi interrompido com a entrada em juízo da acção judicial que pediu a condenação da sua entidade patronal no pagamento dos seus créditos laborais.

IX. Não obstante os créditos laborais em questão serem devidos desde a data da cessação do contrato, os mesmos são igualmente devidos e encontravam-se vencidos aquando da propositura da acção de insolvência, razão pela qual a Recorrente não ultrapassou o prazo inscrito no art.º 2.º, n.º 4, da Lei n.º 59/2015.

X. A decisão proferida pelo FGS é anulável (art.º 163.º do C.P.A.).

XI. A decisão recorrida violou o disposto nos art.ºs 8.º, n.º 2 e 2.º, n.º 4, do DL 59/2015, de 21/04, e 13.º e 59.º, n.º 1, al. a), da Constituição da República Portuguesa.


Não foram apresentadas contra-alegações.

Remetidos os autos em recurso a este Tribunal Central Administrativo sul nete, notificada nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146.º e 147.º do CPTA, a Digna Magistrada do Ministério Público emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso, pelos fundamentos, que ali expôs e se passam a transcrever:
«O Fundo de Garantia Salarial cobre os créditos que se venceram nos seis meses anteriores à data de início do processo de insolvência, o qual se iniciou em 26-03-2015.
Em 28-04-2015 viu a autora reconhecidos os seus créditos por sentença transitada em julgado, proferida na ação por si intentada em 10-02-2014, a qual condenou a empresa empregadora no pagamento de 8.400,00 euros.
Por sua vez a revogação do contrato de trabalho ocorreu em 06-06-2013, pelo que o pagamento dos mesmos tinha que ser requerido até 7-6-2014, nos termos do nº 8 do artº 2º do DL. nº 59/2015, de 21-04.
Este dispositivo legal ao prever que o trabalhador possa pedir ao FGS o pagamento dos seus créditos de trabalho, só exige que haja cessação do contrato de trabalho e não que tenha sido reconhecida judicialmente a ipossibilidade da entidade empregadora pagar.
Tal tem a ver, provavelmente, com a possibilidade do FGS se substituir ao trabalhador na reclamação de créditos no processo de insolvência, nos termos do artº 4º do DL citado. Ou seja, o trabalhador tem que pedri a intervenção do FGS no prazo estipulado no nº 8 do artº 2º citados, mas para que este pague os créditos referentes aos seis meses anteriores à propositura de ação de insolvência, tem que esta ser previamente declarada por sentença, nos termos do artº 1º nº 1 do DL. nº 59/2015.
Portanto, nos termos da atual legislação, quando procede ao pagamento, o FGS já tentou assegurou o reembolso do montante que vai pagar ao trabalhador, o que denota a intenção de haver o mín9imo de pagamentos sem retorno, pelo FGS.
Ora, no caso vertente, tal não foi possível, pois o FGS não pode ter intervenção no processo de insolvência o qual foi decidido por sentença de 27-04-2015 e a recorrente só requereu o pagamento àquela entidade em 17-06-2015.
Quanto à discussão entre a natureza do prazo estabelecido no nº 8 do artº 2º do DL. 59/2015, se é de prescrição ou de caducidade, parece-nos que a mesma é irrelevante para a questão aqui tratada dado que é a própria lei que define os trâmites a seguir, bem como os respetivos prazos.
E, finalmente, quanto à invocada inconstitucionalidade da interpretação dada ao nº 8 do artº 2º em análise, pela douta sentença recorrida, pretensamente violadora dos artigos 59º nº 1 al´. a) e 13º da CRP, a mesma é meramente conclusiva, não vem minimamente fundamentada, desconhecendo-se qual a motivação que presidiu à sua invocação, pelo que não é possível ao tribunal substituir-se à recorrente e decidir com fundamentos seus.
Termos em que, pelo exposto, emitimos parecer no sentido da improcedência do presente recurso jurisdicional.»

Sendo que notificadas as partes do antecedente parecer nenhuma se apresentou a responder.

Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pela recorrente as conclusões de recurso, a questão essencial que vem trazida a este Tribunal em recurso é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento quanto à solução jurídica da causa por errada interpretação e aplicação de direito, mormente das disposições dos art.ºs 8.º, n.º 2 e 2.º, n.º 4, do DL 59/2015, de 21/04, e 13.º e 59.º, n.º 1, al. a), da Constituição da República Portuguesa.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A – De facto

O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, nos seguintes termos, expressis verbis:
A) A autora teve um vínculo laboral com a sociedade «A…………………., Lda» - ver processo administrativo.

B) Em 6.6.2013 a autora e a sua entidade patronal celebraram um acordo de revogação do contrato de trabalho, com efeitos imediatos, inserido num processo de reorganização e reestruturação da organização, resultante de uma alteração de processos de trabalho com vista à otimização dos serviços no Departamento de Engenharia – ver doc nº 1 da pi, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

C) Neste acordo de revogação do contrato de trabalho ficou a entidade patronal obrigada a pagar à autora, a título de compensação pecuniária de natureza global, a importância liquida de €: 14.400,00 – ver doc nº 1 da pi.

D) Ficou ainda estipulado que o pagamento da quantia seria efetuado através de 12 prestações mensais e sucessivas no valor de €: 1.200,00, com início em junho de 2013 e término em maio de 2014 – ver doc 1 da pi.

E) A entidade patronal cumpriu este acordo durante 5 meses, tendo faltado com o pagamento das prestações seguintes – por confissão (art 5º da pi).

F) Em 10.2.2014 a autora intentou ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, pedindo a condenação daquela no pagamento das prestações não pagas – ver doc nº 2 da pi, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

G) Esta ação correu termos na Comarca de Lisboa Oeste – Sintra – Inst Local – Secção Cível – J3. Sob o nº 19355/14.3YIPRT – ver doc nº 2 junto com a pi.

H) Por sentença, transitada em julgado em 28.4.2015, a ação foi julgada procedente e a ré « A…………………….., Lda» condenada a pagar àquela a quantia de €: 8.400,00, acrescida do valor de €: 84,00 a título de juros de mora vencidos – ver doc nº 2 junto com a pi.

I) A 26.3.2015 foi pedida a insolvência da sociedade «A……………………….., Lda», no âmbito do processo nº 389/15.7T8OLH, que correu termos na Comarca de Faro – Olhão – Inst Criminal – Secção Comércio – J2, que veio a ser declarada por sentença de 27.4.2015 – ver paa.

J) No âmbito do referido processo de insolvência a autora reclamou os seus créditos laborais, os quais foram reconhecidos – ver paa.

K) Em 12.6.2015, o Administrador de Insolvência remeteu ao Fundo de Garantia Salarial o requerimento com vista ao pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho – ver doc nº 3 junto com a pi, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

L) Em 17.6.2015 a autora também enviou ao Fundo de Garantia Salarial o requerimento com vista ao pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, no valor total de €: 8.543,50 – ver doc nº 4 da pi, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

M) A 14.8.2015 a autora foi notificada do projeto de indeferimento da respetiva pretensão, com fundamento na não apresentação do requerimento no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do nº 8 do art 2º do DL nº 59/2015, de 21.4 – ver fls 24 do paa.

N) A autora exerceu o direito de audiência prévia, em 24.8.2015 e a 2.9.2015, alegando, em suma, ter ocorrido interrupção do prazo de prescrição, por força da aplicação dos arts 309º e 311º, nº 1 do Código Civil, considerando a existência de sentença judicial em processo de reconhecimento de créditos laborais – ver fls 42 e 43 do paa.

O) Os serviços da demandada elaboraram informação em que consideram que não está em causa qualquer prazo de prescrição, mas sim de caducidade, uma vez que o requerimento foi entregue após a entrada em vigor do DL nº 59/2015, de 21.4 ver fls 39 a 41 do paa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

P) Em 10.9.2015 a autora recebeu a resposta do Fundo de Garantia Salarial indeferindo a pretensão da autora com o fundamento seguinte: de acordo com os elementos registados no sistema de informação da Segurança Social, a qualificação como TCO na A …………………., Lda, cessou em 6.6.2013, sendo o seu requerimento recebido pelos serviços em 19.6.2015. Assim sendo não está em causa qualquer prazo de prescrição, mas sim de caducidade, uma vez que o requerimento foi entregue após a entrada em vigor do Novo Regime do FGS, publicado em anexo ao DL nº 59/2015, de 21.4. Com efeito, «ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor», nos termos do nº 1 do art 3º do Preâmbulo do diploma supra indicado, pelo que no caso concreto não irão ser considerados os seus créditos, atendendo à aplicação do art 2º, nº 8 do RFGS ver doc nº 5 junto com a pi, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

Q) A instância teve início a 24.11.2015 – ver petição inicial.

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B – De direito
1. Da decisão recorrida
Pela sentença recorrida o Tribunal a quo julgou improcedente a ação, absolvendo o Réu do pedido, decisão que tendo por base a factualidade que nela foi dada como provada, vertida supra, assentou no seguinte discurso fundamentador, que se passa a transcrever:
«A questão que vem colocada – que o Fundo de Garantia Salarial pague à autora créditos salariais emergentes da cessação do contrato de trabalho, no valor total de €: 8.543,50 – foi resolvida pela Administração à luz do novo regime do Fundo de Garantia Salarial, a saber o DL nº 59/2015, de 21.4.
Nos termos do art 3º, nº 1 do DL nº 59/2015 o novo regime unificado do FGS entrou em vigor a 4 de maio de 2015, sendo aplicável aos requerimentos apresentados depois desta data, como acontece com o da autora (de 17.6.2015).
Tendo sido consequentemente revogados os arts 316º a 326º da Lei 35/2004, de 29.7, alterada pela Lei nº 9/2006, de 20.3, pelo DL nº 164/2007, de 3.5 e pela Lei nº 59/2008, de 11.9, e o DL nº 139/2001, de 24.4.
O Fundo de Garantia Salarial (FGS), antes e agora, tem como objetivo assegurar o pagamento ao trabalhador de créditos resultantes do contrato de trabalho ou da violação (despedimento ilícito) ou sua cessação, quando as entidades empregadoras não os podem pagar por estarem em situação de insolvência ou por se encontrarem numa situação económica difícil.
Nos termos do art 1º, nº 1 do DL nº 59/2015, de 21.4, para aceder ao Fundo de
Garantia Salarial tem de ter sido:
- proferida sentença de declaração de insolvência do empregador;
- proferido despacho do juiz que designa o administrador judicial provisório, em caso de Processo Especial de Revitalização (PER);
- proferido despacho de aceitação do requerimento proferido pelo IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação, I.P., no âmbito do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas.
Já o trabalhador, nos termos do art 1º, nº 2, tem de:
- Ter contrato de trabalho ou uma relação de trabalho subordinado (relação patrão/empregado), com empregador com atividade em Portugal;
- Exercer ou ter exercido habitualmente a sua atividade em território nacional, mas ao serviço de empregador com atividade no território de dois ou mais Estados Membros, ainda que o empregador seja declarado insolvente por tribunal ou autoridade competente de outro Estado-Membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu;
- A entidade empregadora dever-lhe quantias (salários; subsídios de férias, de Natal ou de alimentação; indemnizações ou compensações por ter terminado o contrato de trabalho ou não terem sido cumpridas as suas condições) – cfr art 2º, nº 1.
O pagamento dos créditos pelo FGS ao trabalhador não é automático, tem de ser requerido, através do Formulário Mod. GS 1 – DGSS - Requerimento - Pagamento
de créditos emergentes do contrato de trabalho - Fundo de garantia salarial, e instruído com documentos – cfr art 5º.
De acordo com o art 2º, nº 4, o Fundo de Garantia Salarial cobre os pagamentos
que deveriam ter sido feitos ao trabalhador pela entidade empregadora nos seis meses anteriores à data de início do processo de insolvência, da apresentação do requerimento do Processo Especial de Revitalização ou do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), até aos limites indicados no art 3º (por mês, o FGS paga até três vezes o valor do salário mínimo nacional que estava em vigor na data em que a entidade empregadora devia ter pago o salário, logo, o limite global garantido é igual a dezoito vezes o salário mínimo nacional que estava em vigor na data de vencimento dos créditos/dívida, não podendo cada salário ser superior a três vezes a remuneração mínima mensal garantida para o ano a que dizem respeito os créditos).
O pagamento dos créditos requeridos apenas é assegurado pelo FGS até um ano (antes 9 meses – art 319º, nº 3 da Lei nº 35/2004) a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
Assim, o art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, de 21.4, dispõe: O Fundo só assegura o
pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
A Entidade Demandada indeferiu expressamente o pedido da autora, para que lhe fossem pagos créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho, no valor total de €: 8.543,50, com fundamento no art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, de 21.4, por ter passado mais de um ano sobre a data da cessação do contrato de trabalho da autora, entendendo esse prazo como sendo de caducidade.
A autora contrapõe tratar-se de um prazo de prescrição, pugnando por uma leitura da norma do art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015 de harmonia com o disposto no art 1º, nº 1, al a) do mesmo diploma. Ou seja, para a autora, apenas se a declaração de insolvência fizer cessar o contrato de trabalho, a mesma pode requerer ao Fundo o pagamento do seu crédito. Portanto, o prazo de um ano para pedir ao Fundo o pagamento de créditos laborais não pode começar a correr a partir da data da revogação do contrato de trabalho, uma vez que nesta data a entidade patronal ainda não havia sido declarada insolvente.
Concluindo que qualquer interpretação do art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015 que impedisse a autora de reclamar o seu crédito, por via do Fundo de Garantia Salarial, por ter cessado o seu contrato de trabalho há mais de um ano, mesmo sem ter sido declarada a insolvência do empregador, seria contrária à CRP, nomeadamente, ao art 59º, nº 1, al a) e ao art 13º.
Ainda a autora diz que o prazo de 1 ano ficou interrompido com a ação judicial
instaurada a 10.2.2014.
Como se pode constatar, o litígio nasce a propósito do prazo previsto no art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, relativamente ao seu início e ao seu decurso, qualificando-o a autora como de prescrição e a demandada como de caducidade.
Em questão está o pagamento de créditos laborais à autora face ao incumprimento da entidade empregadora.
Vejamos.
Sobre o tempo e a sua repercussão nas relações jurídicas dispõe o art 298º do
Código Civil o seguinte:
1. Estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição.
2. Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.

O art 2º, nº 8 estabelece um prazo para o trabalhador pedir o pagamento de créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial, sem dizer expressamente que se trata de prazo prescricional (art 298º, nº 2 do CC).
Uma vez que a lei nada refere acerca da natureza daquele prazo, forçoso é concluir que se trata de um prazo de caducidade e não de prescrição (como por exemplo o previsto no art 337º do Código do Trabalho).
Sem entramos em grandes considerações, importa deixar algumas notas essenciais a propósito da caducidade, relevantes para os passos seguintes da apreciação.
Na caducidade, o prazo visa preestabelecer o lapso de tempo dentro do qual ou a partir do qual, há-de exercer-se o direito, por imposição da lei ou vontade negocial. O prazo, na caducidade, é condição de admissibilidade e procedibilidade, por ser elemento constitutivo do direito.
A caducidade encontra o seu fundamento específico no interesse público da paz
familiar e segurança social da circulação, e no interesse da brevidade das relações jurídicas.
O prazo de caducidade é um prazo prefixo que, pressupondo o interesse na rápida definição do direito, não se compadece com dilações e, por isso, não comporta a paralisação do direito.
Assim, por determinação legal expressa, excepto nos casos em que a lei o determine, os prazos de caducidade não se suspendem nem se interrompem [artº 328º do CC].
E, também por essa razão – o interesse na rápida definição do direito – são sempre mais curtos que os prazos de prescrição.
Se a lei não fixar outra data, nos casos em que a lei se limita a fixar o prazo da caducidade, sem fixar a data a partir do qual se conta, começa a correr a partir do momento em que puder ser exercido [artº 329º CC].
O decurso do prazo de caducidade provoca a extinção ou a perda da prerrogativa de exercer o direito.
Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do ato a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo [artº 331º, nº 1 do CC]. Pelo que, a única forma de evitar a caducidade é praticar, dentro do prazo correspondente, o ato que tenha efeito impeditivo.
Pois bem, no caso, o prazo do art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, de acordo com o art 329º do CC, começa a correr a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
O início da contagem do prazo de caducidade vem, assim, expressamente fixado na letra da lei e corresponde ao momento a partir do qual a autora pode pedir ao Fundo o pagamento dos créditos laborais em dívida.
O que significa que o início da contagem do prazo do art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015 não depende, como pretende a autora, da existência de sentença que declare a insolvência do empregador.
Com efeito, a existência de sentença de declaração de insolvência do empregador constitui requisito de pagamento ao trabalhador de créditos laborais pelo Fundo, mas não condiciona a apresentação do requerimento de pagamento.
Também, no caso, nem mesmo se pode defender que o pedido de insolvência do empregador, de 26.3.2015, ou a sentença que, em 27.4.2015, declarou a insolvência tenham efeito impeditivo da caducidade, porque, lembre-se, o acordo de revogação do contrato de trabalho da autora data de 6.6.2013 e teve efeito imediato.
Socorre-se ainda a autora do efeito interruptivo da instauração da ação especial
para cumprimento de obrigações pecuniárias, em 10.2.2014, contra a sua entidade empregadora, para condenação daquela no pagamento das prestações acordadas e não pagas de créditos laborais.
No entanto, a lei – o Código Civil ou o DL nº 59/2015 – não atribuiu à instauração de ação, à citação ou notificação judicial efeito interruptivo da caducidade, como a propósito dispõe para a prescrição (art 323º do CC).
Também, apesar dos créditos laborais reclamados pela autora junto do Fundo estarem reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado, em 28.4.2015, a lei não atribui aos direitos reconhecidos em sentença ou título executivo o efeito previsto no art 311º do CC.
E percebe-se, por o prazo de caducidade pressupor a rápida definição do direito e, no caso, o regime do Fundo de Garantia Salarial pretender proteger os trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador, servindo para lhes assegurar um mínimo de proteção, em particular para garantir o pagamento dos seus créditos em dívida.
Aqui chegados, está provado que em 6.6.2013, se operou a desvinculação da autora, que acordou com a sua entidade empregadora revogar o contrato de trabalho que mantinha com aquela e, nessa data, os créditos laborais (que são os créditos aqui em causa) venceram-se com a cessação do contrato de trabalho.
Assim, a caducidade do direito da autora consumava-se às 24 horas de 7.6.2014.
Ora a presente ação foi intentada a 24.11.2015.
Como tal é evidente que a citação do Fundo de Garantia Salarial foi efetuada depois de se haver completado o prazo de caducidade.
Esta decisão, que acompanha a da entidade demandada, não viola o disposto no DL nº 59/2015, de 21.4, nem o disposto nos arts 59º, nº 1, al a) e 13º da Constituição da República Portuguesa, porque o prazo do art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015 e também o do art 2º, nº 4, visam garantir o pagamento de créditos salariais em determinadas circunstâncias, verificados que estejam os pressupostos previstos na lei, e em tempo útil.
Ao prever que o Fundo possa pagar nos termos previstos no art 2º do DL 59/2015 o legislador bastou-se com a exigibilidade do crédito, considerando suficiente que se tenha vencido. Não impôs, portanto, que sobre ele se haja constituído um título executivo.
E bem se compreende que assim seja.
Com efeito, a criação deste Fundo teve como objetivo fundamental garantir, essencialmente em tempo útil, o pagamento das prestações referidas na lei, bem sabendo o legislador que a habitual morosidade dos tribunais é incompatível com a liquidação célere dessas prestações.
E não faria qualquer sentido que, por um lado, previsse o pagamento pelo Fundo, com o objetivo de garantir um rápido acesso às prestações devidas, e depois sujeitasse o interessado à prévia obrigação de obter uma sentença judicial transitada em julgado como sua condição, decisão que amiudadas vezes demora alguns anos.
Por outro lado, ao prever a sub-rogação do Fundo nos direitos do trabalhador (art 4º do DL nº 59/2015) o legislador contemplou, justamente, que pagando o Fundo num primeiro momento, na sequência do vencimento de algumas obrigações laborais, era possível que a entidade patronal viesse a conseguir pagar mais tarde, num segundo momento, voluntariamente, ou por via de ação no tribunal do trabalho, ou, ainda, por via do processo de falência (ou similar).
Nesta conformidade, uma vez que os créditos laborais da autora se venceram em 2013 e a ação de insolvência da sociedade empregadora foi instaurada em 26.3.2015, ainda, é forçoso concluir que o período de referência a que se refere o art 2º, nº 4 do DL nº 59/2015 se situa entre 26.3.2015 e 26.9.2014. E, consequentemente, tais créditos venceram-se fora desse período.
A jurisprudência dos tribunais superiores desta jurisdição administrativa tem vindo reiteradamente a entender que, no caso da entidade empregadora vir a ser judicialmente declarada insolvente, o Fundo de Garantia Salarial assegurará os créditos salariais que se hajam vencido nos seis meses que antecederam a data de propositura da ação de insolvência ou da data de entrada do requerimento relativo ao procedimento de conciliação (previsto no DL n.º 316/98) – cfr Acs do STA de 17.12.2008, processo nº 0705/08; de 04.02.2009, processo nº 0704/08; de 07.01.2009, processo nº 0780/08; de 10.02.2009, processo nº 0820/08; de 11.02.2009, processo nº 0703/08; de 25.02.2009, processo nº 0728/08; de 12.03.2009, processo nº 0712/08; de 25.03.2009, processo nº 1110/08, de 02.04.2009, processo nº 0858/08; de 10.09.2009, processo nº 1111/08; Acs do TCA Norte de 15.7.2014, nº 166/11; de 14.2.2014, nº 756/07; 3.5.2013, nº 340/11.
Isto porque, explica o acórdão proferido pelo TCA Norte, em 3.5.2013, no processo nº 340/11, «a finalidade social do Fundo de Garantia Salarial justifica que sejam adotados limites à sua intervenção, não só temporais que decorrem do enquadramento comunitário que lhe está subjacente -Diretiva 80/987/CC, de 20/10 - como também, atinentes às importâncias pagas».
A ratio deste regime legal, máxime do disposto no art 2º, nº 4 e nº 8 do DL nº 59/2015, é fundamentalmente, como já dissemos, a de assegurar, por um lado, o pagamento de créditos não muito dilatados no tempo - e daí o limite temporal cujo recuo máximo se situa no sexto mês anterior à data da entrada da ação ou do requerimento em causa - e por outro, de créditos balizados numa moldura quantitativa máxima garantida - 6 meses de retribuição não superior a 3 salários mínimos nacionais.
Concluindo, na situação em apreço, a autora requereu o pagamento dos créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial, em 17.6.2015, quando estava volvido o prazo previsto no art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, de 21.4, e bem assim o prazo previsto no art. 2º, nº 4 do mesmo diploma legal.
Pelo que bem decidiu a demandada, ao indeferir-lhe a respetiva pretensão material, de pagamento de créditos laborais, que a entidade empregadora lhe ficou a dever, pelo Fundo de Garantia Salarial

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2. Da tese da recorrente
Pugna a recorrente pela revogação da sentença recorrida com substituição por decisão que julgue a ação procedente, condenando a Entidade Recorrida deferir o pedido de pagamento dos seus créditos salariais, sustentando ter aquela violado o disposto nos art.ºs 8.º, n.º 2 e 2.º, n.º 4, do DL 59/2015, de 21/04, e 13.º e 59.º, n.º 1, al. a), da Constituição da República Portuguesa.
Argumenta a tal respeito, em suma, nos termos expôs nas suas alegações de recurso e reconduziu às respetivas conclusões, que do art.º 1.º do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), aprovado pelo DL n.º 59/2015, de 21 de Abril, resulta, claramente, ser apenas um o requisito para pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, o qual consiste na existência de sentença que declare a insolvência do empregador; que a leitura da norma constante no art.º 2.º, n.º 8, do NRFGS, tem de ser harmonizada com o art.º 1.º, n.º 1, al. a), do mesmo diploma legal; que o requisito de accionamento do Fundo de Garantia Salarial é o da declaração de insolvência da entidade patronal; que o prazo constante no art.º 2, n.º 8, do NRFGS, não começou a correr a partir da data da revogação do contrato de trabalho, uma vez que nesta data, a entidade patronal ainda não havia sido declarada insolvente; que a Recorrente nem sequer podia, legalmente, acionar o Fundo de Garantia Salarial no prazo de um ano após a cessação do seu contrato de trabalho, porquanto, ainda não tinha havido declaração de insolvência do empregador, o que só veio a ocorrer 2 anos depois; que qualquer interpretação do art.º 2.º, n.º 8, do NRFGS, que impedisse a Recorrente de reclamar o seu crédito, por via do Fundo de Garantia Salarial, por ter cessado o seu contrato de trabalho há mais de um ano, mesmo sem ter sido declarada a insolvência do empregador, seria contrária à Constituição da República Portuguesa, nomeadamente, ao art.º 59.º, n.º 1, al. a) e ao art.º 13.º.
Defende ainda, subsidiariamente, que o prazo previsto no art.º 2.º, n.º 8, do NRFGS, é um prazo de prescrição; que mesmo que se entenda que o prazo de 1 ano começou a contar desde a data em que foi celebrado o acordo de revogação do contrato de trabalho, tal prazo foi interrompido com a entrada em juízo da ação judicial que pediu a condenação da sua entidade patronal no pagamento dos seus créditos laborais; que não obstante os créditos laborais em questão serem devidos desde a data da cessação do contrato, os mesmos são igualmente devidos e encontravam-se vencidos aquando da propositura da ação de insolvência, razão pela qual a Recorrente não ultrapassou o prazo inscrito no art.º 2.º, n.º 4, da Lei n.º 59/2015.

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3. Da análise e apreciação do recurso
3.1 De harmonia com o disposto no artigo 380º do Código do Trabalho (aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto), a garantia do pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, que não possam ser pagos pelo empregador por motivo de insolvência ou de situação económica difícil é assumida e suportada pelo Fundo de Garantia Salarial (cujo financiamento é assegurado pelos empregadores, através de verbas respeitantes à parcela dos encargos de solidariedade laboral da taxa contributiva global, e pelo Estado - cfr. artigo 321º do Regulamento do Código de Trabalho).
Matéria que veio a ser regulamentada no Capítulo XXVI do Regulamento do Código de Trabalho, aprovado pela Lei nº 35/2004, de 29 de julho (cfr. artigos 316º ss.).
Esta legislação nacional, referente ao Fundo de Garantia Salarial, resulta da transposição da Diretiva n.º 80/987/CEE, do Conselho, de 20 de Outubro, relativa à aproximação das legislações dos Estados membros respeitantes à proteção dos trabalhadores em caso de insolvência do empregador, alterada pela Diretiva n.º 2002/74/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Setembro, com a qual se visou assegurar aos trabalhadores assalariados um mínimo de proteção em caso de insolvência do respetivo empregador, obrigando os Estados-Membros a criar uma instituição que garantisse aos trabalhadores em causa o pagamento dos seus créditos em dívida.
3.2 Entretanto a Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprovou a revisão do Código do Trabalho, revogou a Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto (Código de Trabalho), na redação dada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de Março, pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, e pela Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, e a Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho (Regulamento do Código do Trabalho), na redação dada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de Março, e pelo Decreto-Lei n.º 164/2007, de 3 de Maio (cfr. artigo 12º alíneas a) e b)). Todavia os normativos dos artigos 317º a 326º do Regulamento do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, mantiveram-se em vigor até terem sido revogados pelo artigo 4º alínea a) do DL. n.º 59/2015, de 21 de Abril, por força do artigo 12º n.º 6 alínea o) da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprovou o Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS).
Sendo que este resulta, por sua vez, na transposição da Diretiva n.º 2008/94/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, relativa à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador.
O que significa que a interpretação dos normativos nacionais haverá de ser feita em conformidade (interpretação conforme) com a Diretiva comunitária transposta.
3.3 O DL. n.º 59/2015, de 21 de Abril, que aprovou o Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), cuja entrada em vigor ocorreu em 04-04-2015 (primeiro dia útil do mês seguinte ao da sua publicação – cfr. artigo 5º), prevê o seguinte, no que respeita à sua aplicação no tempo:
Artigo 3.º
Aplicação da lei no tempo
1 - Ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado em anexo ao presente decreto-lei, os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor.
2 - Os requerimentos apresentados ao Fundo de Garantia Salarial e pendentes de decisão são apreciados de acordo com a lei em vigor no momento da sua apresentação.
3 - Ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado em anexo ao presente decreto-lei, sendo objeto de reapreciação oficiosa:
a) Os requerimentos apresentados, na pendência de Processo Especial de Revitalização, instituído pela Lei n.º 16/2012, de 20 de abril;
b) Os requerimentos apresentados entre 1 de setembro de 2012 e a data da entrada em vigor do presente decreto-lei, por trabalhadores abrangidos por plano de insolvência, homologado por sentença, no âmbito do processo de insolvência.

3.4 Na situação presente a recorrente enviou em 17-06-2015 ao Fundo de Garantia Salarial requerimento com vista ao pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, no valor total de 8.543,50 €, relativamente à sociedade Asunim, Solar, Lda, sua entidade patronal, a qual foi declarada insolvente.
Aquele pedido foi todavia indeferido pelo Fundo de Garantia Salarial na consideração de que, aplicando-se ao pedido da recorrente o Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), aprovado pelo DL. n.º 59/2015, de 21 de Abril, o requerimento de pagamento dos créditos laborais havia sido apresentado para além do prazo de 1 ano contado do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do nº 8 do artigo 2º do DL nº 59/2015, de 21 de abril.
3.5 Dispõe o artigo 2º nº 8 do NRFGS que o Fundo de Garantia Salarial “…só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”.
3.6 A sentença recorrida, enfrentando a argumentação expandida pela recorrente na ação em prol da ilegalidade do ato de indeferimento, considerou que o artigo 2º nº 8 do NRFGS estabelece um prazo para o trabalhador pedir o pagamento de créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial, sem dizer expressamente que se trata de prazo prescricional (art 298º, nº 2 do CC), de modo que nada referindo a lei acerca da natureza daquele prazo, é de concluir tratar-se de um prazo de caducidade e não de prescrição. E considerando que o prazo do artigo 2º nº 8 do DL nº 59/2015, começa a correr a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, em conformidade com o disposto no artigo 329º do CC, entendeu que o início da contagem daquele prazo, de caducidade, vem expressamente fixado na letra da lei e corresponde ao momento a partir do qual a autora pode pedir ao Fundo o pagamento dos créditos laborais em dívida, pelo que o início da sua contagem não depende, como pretende a autora, da existência de sentença que declare a insolvência do empregador.
3.7 Propugna a recorrente no presente recurso que a leitura da norma constante no artigo 2º nº 8 do NRFGS tem de ser harmonizada com o artigo 1º nº 1, alínea a), do mesmo diploma legal; que o requisito de acionamento do Fundo de Garantia Salarial é o da declaração de insolvência da entidade patronal e que o prazo constante naquele artigo 2º nº 8 do NRFGS não começou, no caso presente, a correr a partir da data da revogação do contrato de trabalho, porque nessa data a entidade patronal ainda não havia sido declarada insolvente. Diz ainda que a Recorrente nem sequer podia, legalmente, acionar o Fundo de Garantia Salarial no prazo de um ano após a cessação do seu contrato de trabalho, porquanto, ainda não tinha havido declaração de insolvência do empregador, o que só veio a ocorrer 2 anos depois e que qualquer interpretação do artigo 2.º, n.º 8, do NRFGS, que impedisse a Recorrente de reclamar o seu crédito, por via do Fundo de Garantia Salarial, por ter cessado o seu contrato de trabalho há mais de um ano, mesmo sem ter sido declarada a insolvência do empregador, seria contrária à Constituição da República Portuguesa, nomeadamente, ao art.º 59.º, n.º 1, al. a) e ao art.º 13.º.
3.8 Em conformidade com o disposto no artigo 1º do NRFGS o Fundo de Garantia Salarial assegura ao trabalhador (que exerça ou tenha exercido habitualmente a sua atividade em território nacional ao serviço de empregador com atividade no território de dois ou mais Estados-Membros, ainda que este seja declarado insolvente por tribunal ou outra autoridade competente de outro Estado-Membro da União Europeia ou outro Estado abrangido pelo Acordo sobre o Espaço Económico Europeu) o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, desde que seja: a) Proferida sentença de declaração de insolvência do empregador; b) Proferido despacho do juiz que designa o administrador judicial provisório, em caso de processo especial de revitalização.
Sendo que à luz do disposto no artigo 2º do NRFGS os créditos garantidos abrangem “…os créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação.
3.9 A redação destes normativos é muito similar à que constava dos artigos 317º e 318º do Regulamento do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, nos termos dos quais o Fundo de Garantia Salarial assegurava ao trabalhador, em caso de incumprimento pelo empregador, “…o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação” (artigo 317º), abrangendo as situações em que “… o empregador seja judicialmente declarado insolvente” (artigo 318º nº1) ou “…desde que se tenha iniciado o procedimento de conciliação previsto no Decreto-Lei n.º 316/98, de 20 de Outubro” (artigo 318º nº1).
O mesmo sucede com o disposto no artigo no artigo 2º nº 4 do NRFGS, o qual estipula que o Fundo assegura o pagamento dos créditos “…que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas” e com o nº 5 do mesmo artigo, nos termos do qual “…caso não existam créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.º 1 do artigo seguinte, o Fundo assegura o pagamento, até este limite, de créditos vencidos após o referido período de referência.” Tratando-se assim de normas equivalentes às que constavam dos nºs 1 e 2 do artigo 319º do Regulamento do Código do Trabalho (Lei n.º 35/2004) que dispunham o seguinte:
“Artigo 319.º
Créditos abrangidos
1 - O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no artigo 317.º que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação ou apresentação do requerimento referido no artigo anterior.
2 - Caso não haja créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior, ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.º 1 do artigo seguinte, o Fundo de Garantia Salarial assegura até este limite o pagamento de créditos vencidos após o referido período de referência.
(…)”

3.10 E é neste contexto que surge, inserido no artigo 2º do NRFGS, o seu nº 8, aqui em discussão, estipulando que “…o Fundo só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”.
Ora esta disposição consagra, na verdade, uma modificação do prazo que anteriormente se encontrava previsto para a formulação do requerimento, já que no antigo nº 3 do artigo 319º do Regulamento do Código do Trabalho (Lei n.º 35/2004) se dispunha o seguinte:
“Artigo 319.º
Créditos abrangidos
1 – (…)
2 – (…)
3 - O Fundo de Garantia Salarial só assegura o pagamento dos créditos que lhe sejam reclamados até três meses antes da respetiva prescrição”.

Isto considerando que os créditos laborais, entendidos estes como os emergentes de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, prescrevem decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do Código de Trabalho (cfr. artigo 337º).
3.11 Pretendia-se, através deste normativo, afastar o acionamento da garantia do Fundo de Garantia Salarial relativamente a créditos laborais no limiar da sua prescrição, de modo a evitar o pagamento, pelo Fundo, de créditos entretanto prescritos. O que implicava a aferição do momento (futuro) da prescrição dos créditos, sendo certo que esta está sujeita, nos termos legais gerais, a causas de suspensão e interrupção, o que se traduzia numa causa de maior incerteza e dificuldade quanto ao cômputo do prazo dentro do qual o trabalhador deveria solicitar ao Fundo de Garantia Salarial o pagamento dos créditos.
3.12 O nº 8 do artigo 2º do NRFGS veio simplificar e objetivar a contagem do prazo para a formulação do respetivo requerimento ao Fundo de Garantia Salarial ao estabelecer como limite o prazo de um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
Mas a alteração do prazo não operou a modificação da sua natureza que é, num e noutro caso, a de um prazo de caducidade.
3.13 Discorreu a este respeito a sentença recorrida o seguinte, que se passa a transcrever: «Sobre o tempo e a sua repercussão nas relações jurídicas dispõe o art 298º do Código Civil o seguinte:
1. Estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição.
2. Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.

O art 2º, nº 8 estabelece um prazo para o trabalhador pedir o pagamento de créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial, sem dizer expressamente que se trata de prazo prescricional (art 298º, nº 2 do CC).
Uma vez que a lei nada refere acerca da natureza daquele prazo, forçoso é concluir que se trata de um prazo de caducidade e não de prescrição (como por exemplo o previsto no art 337º do Código do Trabalho).
Sem entramos em grandes considerações, importa deixar algumas notas essenciais a propósito da caducidade, relevantes para os passos seguintes da apreciação.
Na caducidade, o prazo visa preestabelecer o lapso de tempo dentro do qual ou a partir do qual, há-de exercer-se o direito, por imposição da lei ou vontade negocial. O prazo, na caducidade, é condição de admissibilidade e procedibilidade, por ser elemento constitutivo do direito.
A caducidade encontra o seu fundamento específico no interesse público da paz familiar e segurança social da circulação, e no interesse da brevidade das relações jurídicas.
O prazo de caducidade é um prazo prefixo que, pressupondo o interesse na rápida definição do direito, não se compadece com dilações e, por isso, não comporta a paralisação do direito.
Assim, por determinação legal expressa, excepto nos casos em que a lei o determine, os prazos de caducidade não se suspendem nem se interrompem [artº 328º do CC].
E, também por essa razão – o interesse na rápida definição do direito – são sempre mais curtos que os prazos de prescrição.
Se a lei não fixar outra data, nos casos em que a lei se limita a fixar o prazo da caducidade, sem fixar a data a partir do qual se conta, começa a correr a partir do momento em que puder ser exercido [artº 329º CC].
O decurso do prazo de caducidade provoca a extinção ou a perda da prerrogativa de exercer o direito.
Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do ato a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo [artº 331º, nº 1 do CC]. Pelo que, a única forma de evitar a caducidade é praticar, dentro do prazo correspondente, o ato que tenha efeito impeditivo.
Pois bem, no caso, o prazo do art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, de acordo com o art 329º do CC, começa a correr a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
O início da contagem do prazo de caducidade vem, assim, expressamente fixado na letra da lei e corresponde ao momento a partir do qual a autora pode pedir ao Fundo o pagamento dos créditos laborais em dívida.»

3.14 E o entendimento assim tido é de manter. Razão pela qual não colhe a argumentação expendida pela recorrente no sentido de que com a instauração da ação judicial em que pediu a condenação da entidade patronal no pagamento dos seus créditos laborais, se interrompeu aquele prazo de um ano previsto no artigo 2º nº 8 do NRFGS.
3.15 Por outro lado, a interpretação feita dos citados normativos nacionais está em consonância com as normas comunitárias, mormente com a Diretiva nº 2008/94/CE, que admite (à semelhança da Diretiva n.º 80/987/CEE, do Conselho, de 20 de Outubro, alterada pela Diretiva n.º 2002/74/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Setembro) que os Estados-Membros possam limitar a obrigação de pagamento das instituições de garantia; devendo contudo, quando fizerem uso dessa faculdade, determinar a duração do período que dá lugar ao pagamento dos créditos em dívida pela instituição de garantia, duração não pode ser inferior ao período relativo à remuneração dos três últimos meses da relação de trabalho anterior e/ou posterior a uma data que seja fixada pelos Estados-Membros, podendo ser calculado este período mínimo de três meses com base num período de referência cuja duração não pode ser inferior a seis meses (cfr. artigo 4º).
Relembre-se que o Tribunal de Justiça da União Europeia, no seu acórdão de 28-11-2013, Proc. C-309/12 considerou, em sede de reenvio prejudical, que «a Diretiva 80/987/CEE do Conselho, de 20 de outubro de 1980, relativa à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador, conforme alterada pela Diretiva 2002/74/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de setembro de 2002, deve ser interpretada no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional que não garante os créditos salariais vencidos mais de seis meses antes da propositura da ação de insolvência do empregador, mesmo quando os trabalhadores tenham proposto, antes do início desse período, uma ação judicial contra o seu empregador, com vista à fixação do valor desses créditos e à sua cobrança coerciva» (disponível in, http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=fundo%2Bgarantia%2Bsalarial&docid=144986&pageIndex=0&doclang=pt&mode=req&dir=&occ=first&part=1&cid=393942#ctx1).
Entendimento que foi reiterado por aquele Tribunal de Justiça no Proc. C-511/12, em despacho de 10-04-2014 (disponível, in, http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=fundo%2Bgarantia%2Bsalarial&docid=151102&pageIndex=0&doclang=pt&mode=req&dir=&occ=first&part=1&cid=393942#ctx1)
3.16 Acresce dizer, face à invocação feita pelo recorrente, que a interpretação assim feita dos normativos em causa não traduz qualquer infração aos artigos 59º nº 1, al. a) e 13.º da Constituição da República Portuguesa.
Desde logo porque não se pode concluir que nos normativos em causa sejam estabelecidas distinções discriminatórias ou desigualdades de tratamento materialmente infundadas, sem fundamento razoável ou sem qualquer justificação ou exigências desproporcionais. Nem tão pouco que ocorra violação de conteúdo essencial de um direito fundamental, a que o recorrente faz referência. Sendo certo que nada em concreto é vertido nos autos que permita concluir no sentido propugnado, nem a recorrente nada densificou nesse sentido.
De todo o modo sempre se retenha ao que foi dito, em situação similar, ainda que ao abrigo do quadro normativo anterior, no Acórdão do TCA Norte, Proc. 00756/07.0BEPRT, e que se acompanha, e que se passa a transcrever:
XXII. Da interpretação firmada e do entendimento expendido não se descortina que ocorra, ainda, uma qualquer infração dos preceitos constitucionais insertos nos arts. 13.º e 59.º da CRP.
XXIII. Na sua dimensão material ou substancial o princípio constitucional da igualdade vincula em primeira linha o legislador ordinário. Todavia, este princípio não impede o órgão legislativo de definir as circunstâncias e os fatores tidos como relevantes e justificadores de uma desigualdade de regime jurídico num caso concreto, dentro da sua liberdade de conformação legislativa.
XXIV. Tal princípio constitucional não pode ser entendido de forma absoluta, em termos tais que impeça o legislador de estabelecer uma disciplina diferente quando diversas forem as situações que as disposições normativas visam regular.
XXV. É que este princípio, enquanto entendido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a realização de distinções, proíbe-lhe, antes, a adoção de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, ou seja, desigualdades de tratamento materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ou sem qualquer justificação objetiva e racional.
XXVI. Numa expressão sintética, o princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se na ideia geral de proibição do arbítrio.
XXVII. Ora nesta sede não se descortina ocorrer uma consagração arbitrária dum regime legal de garantia/cobertura dos créditos salariais que infrinja o princípio da igualdade na dimensão apontada, nomeadamente, a inserta no art. 13.º da CRP, sendo que não é o facto do art. 319.º da Lei n.º 35/2004 não integrar na sua previsão uma cobertura como a pretendida pelos AA./recorrentes que conduz à violação do referido princípio na certeza de que uma tal cobertura mostra-se, no juízo do TJUE atrás enunciado, como conforme também com o Direito da União tal como já atrás havíamos referido
(…)
XXIX. Delimitando o âmbito da previsão da al. a) n.º 1 do art. 59.º da CRP sustentou-se no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 642/05 de 16.02.2005 [Proc. n.º 497/05 in: «www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos»] que o mesmo “… impõe que a remuneração do trabalho obedeça a princípios de justiça. (…) Ora a justiça exige que quando o trabalho prestado for igual em quantidade, natureza e qualidade seja igual a remuneração. E reclama (nalguns casos apenas consentirá) que a remuneração seja diferente, pagando-se mais a quem tiver melhores habilitações ou mais tempo de serviço. Deste modo se realiza a igualdade (…). (…) O direito de que aqui se trata é um direito de igualdade - mas de uma igualdade material que exige que se tome sempre em consideração a realidade social em que as pessoas vivem e se movimentam - e não de uma igualdade meramente formal e uniformizadora (…). (…) Uma justa retribuição do trabalho é, no fundo, o que os princípios enunciados no preceito visam assegurar: a retribuição deve ser conforme à quantidade, natureza e qualidade do trabalho; deve garantir uma existência condigna e a trabalho igual - igual em quantidade, natureza e qualidade - deve corresponder salário igual. (…) O princípio «para trabalho igual salário igual» não proíbe, naturalmente, que o mesmo tipo de trabalho seja remunerado em termos quantitativamente diferentes, conforme seja feito por pessoas com mais ou menos habilitações e com mais ou menos tempo de serviço, pagando-se mais, naturalmente, aos que maiores habilitações possuem e mais tempo de serviço têm. O que o princípio proíbe é que se pague de maneira diferente a trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho, têm iguais habilitações e o mesmo tempo de serviço. (…) O que, pois, se proíbe são as discriminações, as distinções sem fundamento material, designadamente porque assentes em meras categorias subjetivas. (…) Se as diferenças de remuneração assentarem em critérios objetivos, então elas são materialmente fundadas e não discriminatórias ...”.
XXX. Ora importa notar que o direito fundamental em questão de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias e que aí recebe consagração constitucional, a justificar eventual aplicação imediata do preceito, é o próprio direito à remuneração do trabalho [cfr. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira in: “Constituição da República Portuguesa Anotada”, vol. I, 4.ª edição, revista, pág. 772].
XXXI. Ora na situação vertente não se vislumbra a infração ao preceito constitucional em crise já que a sua esfera ou âmbito não se prendem ou contendem com o quadro normativo que se mostra definido pelo art. 319.º do diploma em referência.
XXXII. Neste diploma e no normativo em crise não se põe em questão ou se disciplina o direito ao salário, ou o direito a reclamar o seu pagamento e o dever do seu pagamento por parte do empregador devedor, porquanto no mesmo define-se tão-só, em cumprimento daquilo que são obrigações de transposição do Direito da União, um regime de garantia e/ou de proteção dos créditos salariais em caso de insolvência do empregador para o qual, também em decorrência de imposição da União, delimita temporalmente no tempo [por referência à data da instauração da ação de declaração da insolvência] o período de cobertura ou garante, responsabilizando, nessa medida, o «FGS»
XXXIII. Não se pode, efetivamente, dizer ou afirmar que é constitucionalmente imposto ao legislador ordinário, em nome do princípio que se extrai da al. a) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, que, relativamente a cada crédito laboral vencido e não liquidado pelo empregador, tenha de ter ou de gozar de cobertura/garantia por parte do Estado, através do «FGS».
XXXIV. Não estamos perante qualquer diminuição ou restrição de um direito retributivo ou remuneratório a ponto de fazer funcionar a previsão do comando constitucional em questão.”.
3.17 Assim sendo, e aqui chegados, tem que concluir-se não merecer provimento o recurso, devendo assim manter-se a decisão recorrida. O que se decide.
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IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao recurso jurisdicional, confirmando-se a sentença recorrida.
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Custas pelo recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia (cfr. fls. 21) - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigo 4º nº 1 alínea a) do RCP.
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Notifique.
D.N.
Lisboa, 1 de Junho de 2017


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Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora)





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Maria Cristina Gallego dos Santos




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Catarina de Moura Ferreira Ribeiro Gonçalves Jarmela