Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08192/14
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:05/21/2015
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores: EXECUÇÃO DE JULGADOS.
Sumário:
I. Para efeitos de aferir da tempestividade da execução de julgados atento o prazo previsto no n.º 2 do art. 170.º do CPTA, terá de ser determinado a partir da data da notificação da remessa do processo ao órgão da administração tributária, a que se refere o art. 146.º, n.º 2, do CPPT, de modo a garantir o direito à tutela jurisdicional efectiva consagrado no art. 268º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa;

II. Nos termos do n.º 1 do art. 170.º do CPTA, deve o executado efectuar espontaneamente o pagamento, no prazo máximo de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da decisão, como dispõe o n.º 1 do art. 160.º do CPTA, contados nos termos do disposto no art. 72.º do CPA (na redacção anterior ao DL n.º 4/2015, de 07 de Janeiro);


III. A Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, aditou o n.º 5 do art. 43.º da LGT, que entrou em vigor em 01/01/2012 (cfr. art. 215.º), e que dispõe que “[n]o período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.”

IV. Deste modo, e de acordo com este preceito legal, os juros de mora são os definidos na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas, e por conseguinte, fica afastada a aplicação subsidiária do regime previsto no art. 559.º do Código Civil para as dívidas cíveis, ex vi do art. 2.º, alínea e) do CPPT.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


PROCESSO N.º 08192/14

I. RELATÓRIO

LUÍS ……………………. e mulher, com demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé, no âmbito do processo de EXECUÇÃO DE JULGADOS, que julgou verifica a excepção de caducidade do direito de acção e absolveu a Fazenda Pública da instância.

O Recorrente apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:

I. O prazo de 6 meses do artigo 170.º da lei 15/2002 é um prazo de caducidade sujeito ao regime dos artigos 298º e 328.º e ss do Código Civil;
II. O regime de caducidade do exercício de um direito pode ser afastado pela verificação de causas impeditivas da caducidade previstas no artigo 331.º do Código Civil;
III. Em 09.02.2010, pelos ofícios nº 2107 e 2108, referentes ao cumprimento da sentença judicial, a administração fiscal informou os recorrentes que o Serviço de Finanças de Queluz solicitou à Direcção de Reembolsos emissão do reembolso de € 3.901,21,referente ao IRS de 2001,2002 e 2003;
IV. O reconhecimento expresso do direito dos recorrentes ocorreu ante de 09.09.2010, data limite para o exercido do direito de executar a sentença condenatória;
V. Quer antes do termo do prazo de caducidade previsto no artigo 170.º, nº 2, da Lei nº S/2002, de 22.02, quer depois de 09.09.2010, a administração fiscal reconheceu expressamente o direito dos recorrentes ao reembolso do IRS de 2001, 2002 e 2003;
VI. O reconhecimento do direito dos recorrentes pela administração fiscal impede, em definitivo, a verificação da caducidade do direito de propor a presente execução;
VII. A decisão em crise violou o disposto no artigo 331.º,n.º, do C.C. e os artigos 5.º a 6.º A, do Código de Procedimento Administrativo e 22.º da Constituição da República Portuguesa;
VIII. Deve, por isso, a sentença em crise ser revogada por outra que reconheça que não caducou o direito dos recorrentes em propor a presente execução para pagamento de quantia certa e, em consequência, ordene o prosseguimento dos autos.
****

A Recorrida, não apresentou contra-alegações.
****

Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
****

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
****

A questão invocada pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimita o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir consiste em saber se a acção é tempestiva, aferindo se já decorreu o prazo de caducidade do direito de acção previsto no art. 170.º, n.º 2 do CPTA, se a sentença recorrida violou o disposto no art. 331.º, n.º 2 do CC e art. 5.º a 6.º-A do CPA (conclusões I. a VI) e se foi violado o art. 22.º da Constituição da República Portuguesa.


II. FUNDAMENTAÇÃO

1. Matéria de facto

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
“1.

Em 27 de Novembro de 2009, por sentença proferida no processo n.º 450/08.4BELLE, foi julgada procedente a Acção para Reconhecimento de Direito em Matéria Tributária que os Exequentes deduziram contra a Administração Tributária pedindo o reconhecimento do direito ao reembolso de IRS, dos anos de 2001, 2002 e 2003, no valor de € 3.901,21 – cfr. fls. 148 do processo principal.
2.

Aquele processo foi devolvido ao S erviço de Finanças e recebido por este em 5 de Fevereiro de 2010 – cfr. fls. 172 do processo principal.
3.
A presente Execução foi deduzida em 1 de Abril de 2014 – cfr. fls. 3 dos autos.”

Dá-se como provado o seguinte facto, ao abrigo do preceituado no artigo 662.º do CPC, com relevo para a decisão do recurso:

4 – A devolução do processo ao Serviço de Finanças referida no ponto 2, não foi notificada à Exequente (cfr. fls. 171 e 172 do processo em apenso).

5 – A sentença mencionada em 1. transitou em julgado em 18/12/2009 (cfr. fls. 150 a 152 dos autos).


2. Do Direito

Conforme resulta dos autos, o Exequente, ora Recorrente, veio propor acção de execução de julgados para o pagamento de quantia certa relativamente à sentença proferida em 27/11/2009, pela qual a Executada, ora Recorrida, foi condenada a reembolsar o montante total de 3.901,21€.

Foi suscitada pela Fazenda Pública a excepção de caducidade do direito de acção.

Cumpre então, aferir se a acção é tempestiva, aferindo se já decorreu o prazo de caducidade do direito de acção previsto no art. 170.º, n.º 2 do CPTA, conforme se decidiu na sentença recorrida.

Com efeito, a sentença recorrida julgou verifica a excepção suscitada, com a seguinte fundamentação que aqui se transcreve na parte com interesse para a decisão do recurso:

“ (…) quando a Administração não dê execução à sentença que condene naquele paga mento, o interessado pode pedir, no prazo de seis meses, a execução ao tribunal competente – artigo 170.º, n.º 2, do CPTA. No caso dos autos, como a Acção foi devolvida à Administração em 5 de Fevereiro de 2010 – cfr. ponto 2 do probatório -, o prazo de 30 dias para execução espontânea da sentença começou a correr no dia seguinte (artigo 279.º, alínea b), do CC), tendo terminado no dia 8 de Março, segunda -feira. Deste modo, o prazo de 6 meses para deduzir a Execução começou a correr no dia 9 de Março de 2010, tendo terminado no dia 9 de Setembro de 2010, pelo que tendo a Petição sido remetida em 1 de Abril de 2014, é a mesma intempestiva.”

Conforme resulta dos factos provados, a acção foi efectivamente devolvida ao Serviço de Finanças em 5/02/2010, sucede que a exequente não foi notificada dessa devolução, tal como resulta do ponto 4 dos factos provados, ora aditado, sendo este facto essencial para se aferir da tempestividade da acção, o que não foi considerado pela sentença recorrida.

Na verdade esse facto releva para se poder aferir da tempestividade da acção de execução de julgados, pois “[o] prazo para executar o julgado, fixado no artigo 176.º, n.º 2, do CPTA, reportando-se ao termo do prazo para a execução espontânea previsto no artigo 175.º do mesmo diploma legal, terá de ser determinado a partir da data da notificação da remessa do processo ao órgão da administração tributária, a que se refere o artigo 146.º, n.º 2, do CPPT, de modo a garantir o direito à tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo 268º, nº 4, da Constituição. – cfr. sumário do Ac. do STA de 12/02/2015, proc. n.º 01169/14 (sublinhado nosso).

É certo que o acórdão versa sobre o prazo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos, mas é inteiramente aplicável à execução para pagamento de quantia certa ora em causa nos autos, porquanto, razões não há para sustentar entendimento diverso. Na verdade, o que releva é estar em causa é a contagem de um prazo de execução, e deste modo, há que conferir plena eficácia ao princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva do contribuinte.
Sublinhe-se no entanto que, pese embora releve para efeitos de se aferir da tempestividade da execução de julgados a data da notificação da remessa do processo ao órgão da administração tributária, a que se refere o artigo 146.º, n.º 2, do CPPT, há que ter presente que o dever da Administração Tributária (AT) executar espontaneamente o julgado surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial (art. 100.º da LGT) – Nesse sentido, vide, Ac. do TCAS de 07/05/2015, proc. n.º 07963/14, processo que relatámos, e jurisprudência aí citada.

Regressando à matéria da tempestividade da acção de execução de julgados, sobre esse assunto já decidiu o Ac. do STA de 15/05/2013, no processo n.º 1317/12, jurisprudência que foi seguida no acórdão do STA de 12/02/2015, proc. n.º 01169/14, supra referido, e que aqui também seguimos por ser em tudo aplicável ao caso dos autos:

“A melhor doutrina (Jorge Lopes de Sousa in CPPT anotado e comentado 6ª edição vol. II pag.530 é a que defende que “O requerimento de execução deverá ser considerado tempestivo desde que seja apresentado no prazo de seis meses a contar do termo do prazo de execução espontânea, contado a partir da remessa do processo à administração tributária”, independentemente da obrigação que assiste à mesma administração de executar imediatamente os julgados logo após o trânsito em julgado da decisão judicial (artº 100º da LGT) e mesmo que não seja apresentado o aludido requerimento pelo contribuinte de remessa do processo.
E, mais adiante na mesma obra e local referenciado: “Por outro lado determinando a remessa do processo à administração tributária indirectamente o início do prazo para o contribuinte requerer a execução de julgado, deverá entender-se que a preclusão do seu direito de requerer a execução só ocorrerá se lhe for efectuada notificação da data em que for efectuada a remessa, pois sem esse conhecimento o contribuinte não terá conhecimento da data em que terminará o prazo de execução espontânea, que é também aquela em que começa o prazo de que dispõe para requerer a execução de julgado” […]
No nosso caso é certo que não se mostra fixada no probatório a data de tal eventual remessa pelo que não é líquido que tenha caducado o direito das contribuintes de requererem a execução de julgados como se considerou na 1ª Instância, sendo esse o fundamento da não convolação, decisão que não se pode manter.

Acresce citar aqui o ac. deste STA de 17/06/2009 tirado no recurso nº 73/09 de onde se destaca porque, totalmente, elucidativa a seguinte passagem: “(…) Se, como dissemos, o prazo de 6 meses para requerer a execução de julgado se inicia após o termo do prazo legal para a execução espontânea do decidido, existindo norma tributária que estabelece que o prazo para a execução espontânea pela Administração tributária se conta da remessa do processo ao órgão da administração tributária competente para a execução (havendo a faculdade do interessado, que não o dever, de requerer essa remessa), parece que deve entender-se, como sustenta o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto no seu parecer junto aos autos, que a remessa do processo ao órgão da Administração tributária teria de ser oficiosamente notificada pela secretaria do tribunal à interessada, nos termos do n.º 2 do artigo 229.º do Código de Processo Civil, pois que o direito processual da parte à execução do julgado não depende de prazo a fixar pelo juiz nem de prévia citação, antes decorre da lei, que fixa o seu termo inicial na dependência da prática de um acto do próprio Tribunal (a remessa do processo ao serviço de finanças).
Não tendo a remessa do processo sido notificada à interessada, nem lhe tendo sido igualmente notificada qualquer nova liquidação de imposto ou correcção da liquidação anterior em execução do decidido, não deve entender-se ter caducado o seu direito para requerer a execução do julgado pois que tal efeito, decorrente em parte da inércia do tribunal ou da Administração em comunicar-lhe o facto do qual depende o termo inicial de um prazo através do qual faz valer o seu direito à execução, seria atentatório do seu direito à tutela jurisdicional efectiva (artigo 268.º, n.º 4 da Constituição da República).”. (sublinhado nosso).

Em suma, não se pode entender que se verifica a caducidade do direito de acção (execução de julgados) quando o Exequente não é notificado da remessa do processo à AT, pois a verdade é que, por facto imputável ao tribunal, desconhece o início do decurso do prazo para o exercício do seu direito.

Aplicando aquela jurisprudência ao caso dos autos, então, para efeitos de aferir da tempestividade da execução de julgados atento o prazo previsto no n.º 2 do art. 170.º do CPTA, terá de ser determinado a partir da data da notificação da remessa do processo ao órgão da administração tributária, a que se refere o art. 146.º, n.º 2, do CPPT, de modo a garantir o direito à tutela jurisdicional efectiva consagrado no art. 268º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa.

Ora, in casu, resulta dos factos provados que a Recorrente não foi notificada da devolução do processo ao serviço de finanças, e deste modo, verificando-se a falta de notificação, e aplicando aquela jurisprudência ao caso dos autos, a acção deverá ser considerada tempestiva.

Por conseguinte, o recurso merece provimento e consequentemente a sentença recorrida deve ser revogada.

Cumpre então, conhecer em substituição ao abrigo do disposto no art. 665.º, n.º 2, tendo sido conferida às partes a possibilidade de serem ouvidas ao abrigo do n.º 3, tendo a Recorrente se pronunciado a fls. 108 e ss dos autos.

Conforme resulta dos autos, por sentença transitada em julgado, a Executada foi condenada a devolver à exequente os reembolsos indevidamente compensados, no montante de 3.901,21€ (cfr. ponto 1. dos factos provados).

Pretende, então, a Exequente, “a notificação da executada para pagar, no prazo de 20 dias, a quantia de € 3.901,21 (…) acrescidos de juros de mora à taxa legal em vigor, 4% ao ano, desde 20/01/2010, data do trânsito em julgado da sentença, até completo reembolso (…)”. Mais requer que o pagamento nos termos do n.º 4 do art. 172.º do CPTA, e subsidiariamente, nos termos do n.º 8 do mesmo preceito legal.
Apreciando.

Conforme resulta do disposto no art. 100.º da LGT a “administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.”

De modo idêntico se estatui no n.º 1 do art. 173.º do CPTA: “Sem prejuízo do eventual poder de praticar novo acto administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado.”.

Mais esclarece o n.º 2 daquele preceito legal que “[p]ara efeitos do disposto no número anterior, a Administração pode ficar constituída no dever de praticar actos dotados de eficácia retroactiva que não envolvam a imposição de deveres, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses legalmente protegidos, bem como no dever de remover, reformar ou substituir actos jurídicos e alterar situações de facto que possam ter surgido na pendência do processo e cuja manutenção seja incompatível com a execução da sentença de anulação.”.

Por conseguinte, in casu, a Exequente deveria ter dado execução à decisão proferida no Acórdão do STA de 18/09/2013, processo n.º 1180/11, procedendo à “imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios”.

Pese embora o art. 146.º, n.º 2, do CPPT determine que “… [o] prazo de execução espontânea das sentenças e acórdãos dos tribunais tributários conta-se a partir da data em que o processo tiver sido remetido ao órgão da administração tributária competente para a execução, podendo o interessado requerer a remessa no prazo de 8 dias após o trânsito em julgado da decisão”, há que entender que o disposto na LGT prevalece sobre o CPPT, como resulta do art. 1.º, do CPPT (nesse sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário- anotado e comentado, Vol. II, 6.º Ed., Áreas Editora, 2011, p. 528).

Com efeito, dispõe o art. 1.º do CPPT que O presente Código aplica-se, sem prejuízo do disposto no direito comunitário, noutras normas de direito internacional que vigorem directamente na ordem interna, na lei geral tributária ou em legislação especial, incluindo as normas que regulam a liquidação e cobrança dos tributos parafiscais (…)” (sublinhado nosso).

Por outro lado, sendo esta matéria relativa a garantia dos contribuintes está sujeita ao princípio da reserva (relativa) de lei, nos termos do disposto nos art.ºs 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, al. i), ambos da Constituição da República Portuguesa. Por conseguinte, para que o desiderato constitucional seja respeitado, a definição, por decreto-lei, de matéria relativa às garantias dos contribuintes, está dependente de prévia lei habilitante, o que sucedeu, no caso da LGT, mas que não existiu para o CPPT. Pelo que a concluir-se pela prevalência do n.º 2 do art.º 146.º, do CPPT, sempre este estaria ferido de inconstitucionalidade (Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário- anotado e comentado, Vol. II, 6.º Ed., Áreas Editora, 2011, p. 529).

Mais refere Jorge Lopes de Sousa, naquela obra, p. 530: “[d]e qualquer forma, o que importa é concluir que a obrigação da administração tributária executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial, que não é necessário requerimento do interessado para existir essa obrigação e que a falta de tal requerimento no prazo indicado no n.º 2 do art. 146.º do CPPT não faz precludir o direito deste a exigir perante a administração tributária e os tribunais a execução de julgado”.

Idêntico entendimento foi adoptado no Acórdão do STA de 3/12/2008, proc. n.º 0570-A/08: “I - O artº 146º, nº 2 do CPPT na medida em que não se compatibiliza com o disposto no artº 100º da LGT é organicamente inconstitucional. II - De qualquer forma, a obrigação da Administração Tributária de executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial e não com a remessa, a requerimento do contribuinte, do processo para o serviço de finanças competente. III - A falta de tal requerimento no prazo indicado no nº 2 do artº 146º do CPPT, não faz precludir o direito do contribuinte de a exigir perante a administração tributária e os tribunais a execução de julgado.”.

Do mesmo modo, com origem no mesmo processo do acórdão supra citado, foi proferido o Acórdão do Pleno CT do STA de 02/12/2009, proc. n.º 0570-A/08: “A obrigação da Administração Tributária de executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial e não com a remessa, a requerimento do contribuinte, do processo para o serviço competente para a execução”.

Sublinhe-se ainda que aquela jurisprudência mantém-se actual, conforme resulta do Acórdão do STA de 12/02/2014, processo nº 01528/13, se decidiu o seguinte: I - O dever de cumprir espontaneamente o julgado tributário surge com o trânsito em julgado deste e não com a remessa do processo ao órgão competente para a execução. II - Se o requerimento de execução de julgado anulatório deu entrada no Tribunal decorridos mais de três meses sobre a data em que presumivelmente o trânsito em julgado da sentença exequenda se verificou não pode concluir-se ter sido prematuramente apresentado. III - O interessado dispõe de mera faculdade, que não do dever, de requerer a remessa dos autos ao órgão da administração competente para a execução da decisão judicial tributária. IV - Se o facto de não ter em seu poder o processo físico dificulta o cumprimento por parte da Administração tributária do seu dever de cumprir o julgado, caberá ao Representante da Fazenda Pública procurar superar essa dificuldade (artigo 15.º n.º 1, alínea a) e n.º 2 do CPPT), designadamente requerendo ao Tribunal a devolução do processo ao órgão competente para a execução ou solicitando os elementos tidos como necessários para cabal cumprimento do julgado.”

Pelo exposto, conclui-se pela aplicação do disposto no art. 100.º da LGT, pelo que a obrigação da administração tributária executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial.

Não obstante, relativamente ao prazo para a execução espontânea da sentença, in casu, por sentença do TAF de Loulé a AT foi condenada ao pagamento de uma quantia, pelo que, nos termos do n.º 1 do art. 170.º do CPTA, deveria ter executado o pagamento espontaneamente no prazo máximo de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da decisão, como dispõe o n.º 1 do art. 160.º do CPTA, contados nos termos do disposto no art. 72.º do CPA (na redacção anterior ao DL n.º 4/2015, de 07 de Janeiro).

Nos termos do disposto no art. 72.º do CPA na contagem do prazo não se inclui na contagem o dia em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr, e que o prazo começa a correr independentemente de quaisquer formalidades e suspende-se nos sábados, domingos e feriados, e por último que o termo do prazo que caia em dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o acto não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.

Verifica-se o trânsito em julgado de uma decisão “logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou reclamação” – art. 628.º do CPC.

In casu, a decisão transitou em julgado em 18/12/2009 (cfr. ponto 5. dos factos provados), pelo que a AT deveria ter executado o pagamento espontaneamente até ao dia 02/02/2010.

Sucede que, até à presente data, a Executada não procedeu ao pagamento daquelas quantias, pelo que há que concluir que incumpriu o dever de executar espontaneamente a decisão judicial, dentro do prazo legalmente estabelecido, pelo que deverá ser condenada ao pagamento da quantia de 3.901,21€.

Por outro lado, a Recorrente tem direito a juros de mora nos termos do disposto no n.º 2 do art. 102.º da LGT, a partir do termo do prazo da sua execução espontânea (02/02/2010).

Vejamos então quanto à taxa aplicável.

Conforme a jurisprudência do STA vinha afirmando de forma reiteirada e pacífica “(…) taxa de juro de mora aplicável aos casos em que estes são devidos pelo Estado aos particulares não é a prevista no artigo 3.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março, antes a taxa de juro de juro legal supletiva a que se refere o artigo 559.º do Código Civil (subsidiariamente aplicável às obrigações tributárias ex vi do artigo 2.º da LGT), ao tempo fixada em 4% ao ano pela Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.” – Ac. do STA de 30/10/2013, proc. n.º 0955/13 (no mesmo sentido, Acórdãos do Pleno do STA de 17/06/2009, Proc. n.º 447/07, Acórdão do STA de 02/03/2011, Proc. n.º 0880/10, de 06/02/2013, Proc. n.º 01114/12 e de 08/05/2013, Proc. 33/13).

Sucede que, foi aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, o n.º 5 do art. 43.º da LGT, que entrou em vigor em 01/01/2012 (cfr. art. 215.º), e que dispõe o seguinte:

No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.”



Deste modo, e de acordo com este preceito legal, aplicável aos presentes autos, os juros de mora são os definidos na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas, ficando, portanto, afastada aquela jurisprudência supra exposta, na medida em que a LGT passou a prever expressamente que o regime aplicável é o da lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas, havendo, portanto, regulamentação específica nesta matéria, e por conseguinte, fica afastada a aplicação subsidiária do regime previsto no art. 559.º do Código Civil para as dívidas cíveis, ex vi do art. 2.º, alínea e) do CPPT.

Pelo exposto, concluiu-se que a Recorrente tem direito a juros de mora a calcular sobre o montante de 3.901,21€, a partir da data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado (02/02/2010) até a data da emissão da nota de crédito, a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.

3. Sumário do acórdão

I. Para efeitos de aferir da tempestividade da execução de julgados atento o prazo previsto no n.º 2 do art. 170.º do CPTA, terá de ser determinado a partir da data da notificação da remessa do processo ao órgão da administração tributária, a que se refere o art. 146.º, n.º 2, do CPPT, de modo a garantir o direito à tutela jurisdicional efectiva consagrado no art. 268º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa;

II. Nos termos do n.º 1 do art. 170.º do CPTA, deve o executado efectuar espontaneamente o pagamento, no prazo máximo de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da decisão, como dispõe o n.º 1 do art. 160.º do CPTA, contados nos termos do disposto no art. 72.º do CPA (na redacção anterior ao DL n.º 4/2015, de 07 de Janeiro);


III. A Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, aditou o n.º 5 do art. 43.º da LGT, que entrou em vigor em 01/01/2012 (cfr. art. 215.º), e que dispõe que “[n]o período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.”

IV. Deste modo, e de acordo com este preceito legal, os juros de mora são os definidos na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas, e por conseguinte, fica afastada a aplicação subsidiária do regime previsto no art. 559.º do Código Civil para as dívidas cíveis, ex vi do art. 2.º, alínea e) do CPPT.


III. DECISÃO

Em face do exposto, concede-se provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida, e em substituição determina-se ao executado que, no prazo de 30 dias:
I. Efectue o reembolso à Exequente da quantia de 3.901,21€;
II. Efectue o pagamento à Exequente de juros mora, calculados sobre o montante de 3.901,21€, a partir de 02/02/2010 até a data da emissão da nota de crédito, a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas;
III. Em caso de incumprimento da Executada, no prazo estipulado, o pagamento deverá ser efectuado por conta da dotação orçamental inscrita à ordem do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, nos termos do art. 170.º, n.º 2, al. b) do CPTA, conforme requerido.
****
Custas pela Executada.
D.n.
Lisboa, 21 de Maio de 2015.

____________________________

Cristina Flora

____________________________

Cremilde Abreu Miranda

____________________________

Joaquim Condesso