Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05241/11
Secção:CT
Data do Acordão:07/13/2016
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IRC, DESCONSIDERAÇÃO DE CUSTOS, ÓNUS DA PROVA
Sumário:I. Arrogando-se do direito à dedutibilidade de custos que diz terem sido desconsiderados pela Administração Tributária, é sobre si que recai o dever de comprovar esses custos (cfr. artigo 74°, n°1, da LGT) e sobre a Administração Tributária apenas recairia o dever de corrigir os custos por via da correcção presumida dos proveitos se tivesse havido lugar a correcção nas vendas (número de imóveis vendidos), que não apenas dos valores declarados (contabilizados) das vendas.
II. A responsabilidade perante a Administração Tributária cabe apenas às empresas ou, eventualmente, aos gerentes ou administradores destas, em regime de responsabilidade subsidiaria.
III. Os Técnicos Oficiais de Contas respondem perante os seus clientes por eventuais erros ou comportamentos ocorridos no exercício da sua profissão.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I.RELATÓRIO
CO…, LDA, veio interpor o presente recurso jurisdicional da sentença do TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DE LISBOA, datada de 08 de Junho de 2011, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação de IRC e juros compensatórios, respeitante ao ano de 2004, no valor global de €441.584,50.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«a) A actividade do sujeito passivo, ora recorrente, mais não é do que a recuperação dos imóveis adquiridos para esse fim, colocando-os à venda de seguida.
b) Os imóveis dos autos eram colocados à venda e entregues aos compradores com as casas de banho e as cozinhas em tosco, com as paredes e os tectos em estuques, com os roços abertos para meter canalizações, sem acabamentos, com os pavimentos por colocar, sem móveis e loiças de casa de banho e de cozinha.
c) Houve compradores, designadamente, os dos últimos andares, que pretenderam outro tipo de obras para além daquelas que resultam do anteriormente afirmado, mandando fazer escadas internas nas suas fracções, de acesso aos sótãos, os quais transformaram mandando aí fazer divisórias e diversas obras.
d) O preço base de venda das fracções do prédio dos autos, não contemplava as obras e os materiais suplementares, atrás referidos.

e) Nessas obras, utilizavam-se, entre outros, os serviços de pedreiro, ladrilhador, pintor, carpinteiro e electricista.
f) E assim, resulta à evidência dos referidos depoimentos, que a mão-de-obra e os materiais compreendidos nessas obras, feitas a gosto, à escolha e a pedido dos compradores, foram pagos à parte pelos compradores nelas interessados, não constando, por isso, no valor das escrituras.
g) Tendo sido esta a situação que se verificou em relação aos imóveis adquiridos nas circunstâncias apontadas, nomeadamente, a folhas 76 a 97 do relatório de inspecção, pelos compradores Patrícia , Maria , Ana , João e Ana , Luís e Fernando .
h) A escritura de Patrícia, que comprou a fracção "l" correspondente ao 3° andar esquerdo, da Rua , n°106 a 118, realizou-se pelo preço acordado para a venda à mesma do imóvel, ou seja de 274.400,00 €;
i) A diferença de 274.400,00€ para o valor efectivamente recebido de 473.858,00€, corresponde ao custo, mão-de-obra e materiais, das diversas alterações feitas, que não estava contemplado no preço base de venda. O preço base é o que consta da escritura de compra e venda do imóvel, sendo a diferença correspondente ao valor das obras efectuadas.
j) Da importância total, € 236.929,00 foram depositados numa conta titulada em nome da sócia Maria , que a fez sua a título de reembolso de suprimentos de que era credora.
k) A escritura a favor de Maria , que comprou a fracção "F" correspondente ao 2° andar direito, da Rua , n° 106 a 118, realizou-se pelo preço acordado para a venda à mesma do imóvel, ou seja de 212.000,00€;
I) A diferença de 212.000,00€ para o valor efectivamente recebido de 374.098,00€, corresponde ao custo, mão-de-obra e materiais, das alterações feitas nas casas de banho, cozinha, que não estava contemplado no preço base de venda.
m) Da importância total, 187.049,00€, foram depositados numa conta titulada em nome da sócia Maria , que a fez sua a título de reembolso de suprimentos de que era credora.
n) A escritura a favor de Fernando , que comprou a fracção 1403 "G", da Rua , n°106 a 118, realizou-se pelo preço acordado para a venda à mesma do imóvel, ou seja de 224.500,00€, que não reflectia as obras de construção civil inerentes às duas casas de banho e cozinha, que foram realizadas;
o) A diferença de 224.500,00€ para o valor efectivamente recebido de 374.100,00€, corresponde ao custo, mão-de-obra e materiais, das alterações feitas nas casas de banho, cozinha, que não estava contemplado no preço base de venda.
p) Foi celebrado em 15 de Setembro de 2003, um Contrato Promessa de Compra e Venda (cfr páginas 665 a 670, do Anexo 29, ao relatório final da inspecção, Doc 7 da p.i.), com Ana , contrato esse que previa a cessão da respectiva posição contratual (ponto 2, da cláusula 1ª);
q) O contrato anteriormente referido, na alínea a) da sua cláusula 2ª, previa que as fracções que viessem a corresponder ao 2° Andar esquerdo e a um lugar de garagem sito no rés-do-chão, eram prometidas vender e comprar, mediante a execução de diversas obras de construção civil, em particular inerentes às duas casa de banho e cozinha;
r) As obras referidas na alínea anterior foram efectivamente realizadas e suportadas pelos sócios e gerentes da recorrente.
s) Dois cheques de 25.000,00€ e 125.000,00€, respectivamente foram depositados, na ora recorrente, a titulo de reforço de suprimentos dos seus sócios;
t) A escritura da Ana , que comprou a fracção 1403 E, realizou-se pelo preço acordado para a venda ao mesmo do imóvel, ou seja de 250.000,00€;
u) A diferença de 250.000,00€ para o valor efectivamente recebido de 320.000,00€, corresponde ao custo, mão-de-obra e materiais, das alterações feitas nas casas de banho, cozinha, que não estava contemplado no preço base de venda, e que foi pago em separado pela compradora, conforme resulta de folhas 84, do relatório final da inspecção, em 3 prestações, de 5.000,00€, 45.000,00€ e 20.000,00€, e resulta das declarações prestadas pela mesma na audiência de inquirição de testemunhas.
v) A sócia Maria , depositou um cheque da importância de 270.000,00€ numa conta bancária titulada em seu nome, a qual deveria ter sido contabilizada na ora impugnante, a título de levantamento de suprimentos de que era credora.
w) As obras realizadas na fracção em questão, dizem respeito a diversas alterações e remodelações, já que o preço base não contemplava aquelas.
x) Relativamente a Luís , a escritura realizou-se pelo preço acordado para a venda ao mesmo do imóvel, ou seja de 300.000,00€;
y) A diferença de preço entre o valor referido no artigo anterior e o que resulta da totalidade dos cheques emitidos, corresponde a obras cujo montante de 143.920,00€ foi pago pelo comprador, conforme resulta de folhas 90, do relatório final da inspecção, através de cheque emitido à ordem da sócia Maria .
z) Tais obras foram pagas pela sócia , a qual foi ressarcida das mesmas através do cheque atrás referido, o qual teria sido depositado em conta bancária da ora recorrente.
aa) O depósito de tal cheque, deveria, em conformidade ter sido contabilizado como reforço de suprimentos, o que não aconteceu.
bb) Foi ainda recebido pela recorrente, a quantia de 5.000,00€, em cheque emitido pelo comprador, o qual se destinou a indemnizar um inquilino, tendo o mesmo sido endossado à sócia atrás identificada, sem que tais operações tenham sido reflectidas na contabilidade.
cc) Da situação atrás referida não resulta quaisquer desvios patrimoniais e/ou de réditos.
dd) E para pagamento da referida escritura, (como referido no artigo 133, da petição de impugnação), foram recebidos e depositados nas contas da ora recorrente, dois cheques, respectivamente de 1.600,00€ e 298.400,00€. Acresce referir que,
ee) Relativamente a João e Ana , a escritura realizou-se pelo preço acordado para a venda ao mesmo do imóvel, ou seja de 240.000,00 €;
ff) A diferença de preço entre o valor referido no artigo anterior e o que resulta da totalidade dos cheques emitidos, corresponde a obras cujo montante de 71.749,00€ foi pago pela compradora, em 2 prestações, de 9.351,00€, 62.398,00€, respectivamente. Acresce referir que,
gg) O valor das obras foi pago através de 2 cheques, sendo um de 62.398,00€, emitido a favor do sócio António , o qual o endossou à sócia Maria , já que fora esta que houvera suportado o respectivo custo total.
hh) O segundo cheque de montante igual a 9.351,00€ foi emitido a favor da referida sócia a qual o depositou numa sua conta, contrariamente ao que é sugerido a folhas 82, do relatório da inspecção (cfr páginas 485 e 486). Resta referir que,
ii) As obras realizadas na fracção em questão, dizem respeito a alterações e remodelações nas casas de banho e cozinha, e aplicação de pavimento, já que o preço base, como atrás já referido, não contemplava aquelas, mas tão-somente a recuperação de paredes e tectos. Neste sentido, e,
ii) O preço da transacção do imóvel, ou seja 240.000,00€, foi pago através de transferência bancária para a ora recorrente. Daqui resulta que,
kk) Ao não dar como provado que a mão-de-obra e os materiais compreendidos nas obras dos autos foram pagas à parte pelos compradores, o Tribunal recorrido está a desconsiderar a prova testemunhal atrás referida fazendo deste modo um errado julgamento da matéria de facto, que a ser correcto, levaria à prova do contrário, ou seja que as obras foram pagas á parte pelos compradores. Pois,
II) A considerar a prova atrás referida resulta inequívoco que os trabalhos suplementares feitos a pedido dos compradores, não estão compreendidos no preço base de venda reflectido no preço das respectivas escrituras, pois este reflecte tão só a transacção do imóvel no estado em que se encontrava, ou seja, em tosco e sem alguns acabamentos.
mm) A não existência da totalidade das facturas relativas às obras efectuadas é irrelevante se estivermos perante a determinação da matéria colectável por recurso a métodos indirectos, porque nesta sede, a AF está "obrigada" a calcular os custos necessários para a obtenção dos proveitos presumidos e não apenas estes. . .
nn) Vários adquirentes efectuaram "pagamentos de lMT" considerando, nos termos da lei, o valor das obras efectuadas no imóvel, indispensáveis para a sua utilização e que aumentaram o valor locativo do mesmo;
oo) Os depósitos de cheques - passados em nome da sociedade -, nas contas bancárias dos sócios destinavam-se a reembolsos de suprimentos destes.
pp) Existia uma conta corrente entre os sócios da sociedade que reflectia o aporte e reembolso de suprimentos dos sócios à sociedade com referência aos períodos anteriores a 2004 e ao próprio exercício.
qq) Mais uma vez o tribunal fez um errado julgamento da matéria de facto, ao não valorar, nesta parte, os depoimentos das testemunhas e concomitantemente a prova pelas mesmas produzida, que a ser atendida levaria a uma decisão diversa da proferida, ou seja, a considerar a existência dos suprimentos.
rr) O instituto a que a AF deitou mão para tributar a sociedade impugnante é um mero quantificador de proveitos e custos e não da qualificação dos mesmos.
ss) No caso em apreço constata-se que a AF foi hábil em quantificar proveitos presumidos, esquecendo-se, do mesmo modo, em quantificar os presumíveis custos necessários à obtenção daqueles; quando é certo que,
tt) A realização das obras suplementares originou a existência dos respectivos custos.
uu) Mesmo admitindo, sem reservas, o recurso a métodos indirectos, é mister que tal instituto, discricionário, pugne pela quantificação, simultânea, de proveitos e de custos necessários para a obtenção destes, e não só dos proveitos.
vv) Os sócios da impugnante, identificados nos autos, em particular a sócia sempre transmitiram ao TOC da ora recorrente, a natureza, quantidade e preços das obras, material e mão-de-obra, realizadas nos imóveis vendidos e anteriormente identificados, entregando-lhe as respectivas escrituras de venda, e ainda os extractos bancários da sociedade bem como relação das verbas por si recebidas, que diziam respeito à Impugnante, directamente de terceiros, para que o mesmo procedesse ao seu registo e contabilização.
ww) Apenas quando a recorrente teve conhecimento do relatório da fiscalização, os sócios desta, se aperceberam da falta de registo e/ou contabilização das operações atrás referidas;
xx) Os preços constantes das escrituras, não são simulados, correspondendo aos preços de venda dos respectivos imóveis, depois de recuperados, mas sem contemplar os custos das obras suplementares realizadas em alguns deles. Pois,
yy) Os custos das obras atrás referidas foram pagos à parte pelos compradores, não fazendo os mesmos parte da compra e venda;
zz) Os sócios não se apropriaram ilegitimamente de quaisquer quantias, no âmbito das relações existentes entre os mesmos e a ora impugnante; Por outro lado,
aaa) As instruções dadas ao seu TOC sempre foram no sentido de registar e contabilizar o que fosse devido, e de apresentar nos prazos legais à AF, o que por lei tivesse de ser declarado ou participado dentro dos mesmos.

TERMOS EM QUE,
Deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, a qual deverá ser substituída por acórdão que, acolhendo as razões da recorrente, julgue procedente a impugnação e considere ilegal a liquidação dos autos, que deverá ser anulada, com as legais consequências.
Assim se fará a costumeira justiça».

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Não foram apresentadas contra-alegações.

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Foi dada vista ao MINISTÉRIO PÚBLICO e a Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer a fls. 490/491 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.

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Foram colhidos os vistos aos Exmos Juízes Adjuntos, pelo que vem o processo submetido à Secção do Contencioso Tributário para julgamento do recurso já que nada obsta.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Novo Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do Recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Com este pano de fundo, as questões a apreciar e decidir consistem em saber:
(i) se a sentença sob recurso incorre em erro de julgamento da
matéria de facto, ao não valorar o depoimento das testemunhas, que a ser atendido levaria a considerar que « os trabalhos suplementares feitos a pedido dos compradores, não estão compreendidos no preço base de venda reflectido no preço das respectivas escrituras» e a « existência de suprimentos» [Conclusão a) a rr)];
(ii) se a sentença sob recurso incorre em erro de julgamento quanto à
não quantificação de presumíveis custos [Conclusão ss) a tt)].

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III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a fundamentação respectiva que nos seguintes termos:
«A) A impugnante é uma sociedade por quotas, tendo por objecto a administração, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, da qual foram sócios gerentes, até à data da respectiva dissolução, António e Maria ;
B) Em 23 de Setembro de 2005, foi emitida a ordem de serviço n°,relativa a procedimento de inspecção externa, em sede de IRC, exercícios de 2002, 2003 e 2004, tendo por sujeito passivo a impugnante (cf. fls. 48 dos autos);
C) Por carta registada de 22-11-2006 e recebida em 27-11-2006, a Administração Fiscal envia a António , legal representante da ora impugnante comunicando-lhe que já havia notificado a impugnante no dia 21-11-2006 do relatório final da Inspecção Tributária quanto a IRC e reportado aos exercícios de 2002, 2003 e 2004, na pessoa do Sr. José , na qualidade de TOC da impugnante (fls. 326 e 327 do PAT);

D) Em 16/1 1/2006, foi elaborado o relatório final da inspecção, lendo-se nas respectivas conclusões, designadamente, o seguinte (cf. fls. 440 e segs. do PAT):
“(…)
IV Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos
Após a realização da acção de Inspecção, cujos factos verificados se descrevem no presente documento de trabalho, se conclui que os resultados tributáveis declarados, não podem ser aceites para efeitos fiscais, uma vez que os elementos de escrita não são considerados, dados os fundamentos a seguir indicados, o que já havia acontecido para o exercício de 2001:
1.°
Os elementos que estão na base do despacho do Exmo. Sr. Subdirector-Geral da Inspecção Tributária, recepcionado nesta Direcção de Finanças através do ofício n°,de 01/09/2005 dos quais se extraiu certidão, anexo 1.
2.°
O resultado do cruzamento realizado nesta. Direcção de Finanças entre a informação contida em actos notariais de escrituras publicas de venda de imóveis, praticados pelo. s. p. e os valores declarados quer para efeitos de SISA quer de IRC, já que os valores pagos, conforme cheques emitidos pelos compradores, e os valores declarados para qualquer um dos impostos referidos, são divergentes com efeito em omissões declarativas com natureza de fraude fiscal; elementos relativos à matriz. 517, fracção O, do adquirente A - págs. 73 a 97;
3.°
Indício de subfacturação nas vendas, fundamentou o pedido das contas bancárias dos sócios da sociedade na qualidade titulares e co-titulares feito directamente aos mesmos, pag. 7;
4.°
Existência de duas Declarações modelo 22 de IRC do exercício de 2004, com valores diferentes, cujas diferenças se reportam a valores de venda de fracções de 2001, remetidas por dois

TOC's diferentes sem qualquer justificação, pág. 11 a 15;
5.°
Só depois de alguma persistência, o TOC responsável, disponibilizou a conta de Vendas e das Existências via, pág. 20;
6.°
A existência de várias declarações de rendimento dos sócios para os exercícios de 2001 e de 2004, que se relacionam com os factos que determinaram as várias declarações de IRC para o , pag. 15;
Inexistência de contabilidade auxiliar - Diário, Razões Auxiliares e Balancetes, base à escrituração dos livros selados, o que impossibilitou a análise pormenorizada de todos os movimentos relativos a factos patrimoniais, pág. 18;
8.°
Inexistência de inventário físico das existências para qualquer um dos exercícios analisados, pág. 21;
Determinação dos custos das existências vendidas sem documento de suporte complementar dos valores que titulam as saídas das existências; pág. 21;
10.°
Não terem sido contabilizadas em existências 1 fracção do artigo de matriz 304, outra do artigo 954 e contabilizar-se em existências, fracções que haviam sido vendidos em 2001, como o caso das fracções E, F, l e L do artigo e fracção A do artigo , pág. 27;
11.°
Inexistência de suportes de cálculo a realizar pelo s. p. quanto à determinação das existências em Balanço ou às vendidas que documentem o inventário final ou custo das existências vendidas, inviabilizando o conhecimento directo dos valores envolvidos, desconhecendo-se o quanto respeita a cada uma das fracções, pág. 21 a 37;
12.°
A impossibilidade de quantificação directa e exacta do custo das vendas das fracções vendidas e não contabilizadas como tal, pág. 30;
13.°
A impossibilidade de quantificação directa e exacta das existências indevidamente consideradas em Balanço uma vez que as fracções foram vendidas embora não contabilizadas como tal, pág. 21 a 37;
14.°
Contabilização da saída das existências e do custo das vendas da fracção A da matriz sendo que a venda se reporta ao exercício de 2001, pág. 58;
15.°
A matriz não foi movimentada nas entradas nem saídas das existências nos exercícios de 2001 a 2004, embora se operassem vendas de fracções relativas a este artigo matricial, pág. 27, 37 e 58;
16.°
Inexistente controle das fracções efectivamente vendidas e em existências por comparação com o sistema informático na componente património, a propriedade horizontal e escrituras realizadas o que correspondeu a desvios em quantidades e valores quer nas vendas quer nas existências, que poderia ter sido resolvido com a implementação de procedimentos de controle, do movimento de entrada e saída das fracções, pág. 21 a 37;
17.°
Omissões às vendas dos valores das escrituras realizadas em 2002, pág. 65 a 75;
18.°
Omissões às vendas face aos valores dos cheques emitidos, conforme meios de pagamento apresentados pelos adquirentes, comparativamente ao declarado em IRC e Sisa/IMT, pág. 73 a 97;
19.º
Omissões às vendas face aos valores apresentados conforme notificação de 21/06/2006, comparativamente ao declarado em IRC, pág. 54;
20.°
Meios de pagamento, cheques, identificados nos cruzamentos realizados com os extractos bancários, que serviram para pagamento das fracções que não correspondem ao declarado, pág. 50 a 53;
21.°
Omissões à contabilização do Custo das existências vendidas, de fracções efectivamente vendidas com escrituras realizadas e consequentemente omitidas para efeitos de resultado fiscal, pág. 55 a 65;
22.°
Contabilização de existências, relativas a fracções já vendidas com escrituras realizadas e consequente sobrevalorização das mesmas com efeitos no resultado fiscal, pág. 55 a 65;
23.°
Os saldos negativos de caixa, evidência duma clara falta de rigor contabilístico, que não se coadunam com adequada informação patrimonial, já que sendo este agregado constituído por dinheiro, em notas e moedas de banco, o seu valor nunca pode ser negativo, pág. 44 a 48;
24.°
As constantes movimentações contabilísticas realizadas entre as contas de Suprimentos e de Caixa, sem os correspondentes fluxos reais, não obstante o valor contabilizado em bancos ser elevado, pág. 44 a 48;
25.°
Os elevados saldos de caixa em determinados períodos que não reflectem um adequado procedimento de segurança de activos, pág. 44 a 48;
Deste modo, face dos fundamentos descritos neste item e ainda por tudo o quanto contêm este documento de trabalho, é impossível a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação do Rendimento Colectável e Base Tributável para efeitos de IRC, dado que não reflecte a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, pelo que se observam as condições para aplicação dos mecanismos previstos na alínea b) do art.87°, alíneas a) e c) do art.88°, alínea i) do art.90°, todos da LGT, seguindo o conteúdo do artigo 52° do CIRC, para aplicação dos Métodos Indirectos, quanto ao exercício de 2002, 2003 e 2004.
(…)”
E) Em 20 de Novembro de 2006, foi exarado parecer do Chefe de Divisão sobre o relatório final de inspecção, com o seguinte teor (fls. 332 e 333 do PAT):
" Confirmo a presente informação.
Da verificação tributária efectuada aos exercícios de 2002, 2003 e 2004, constatou-se, entre outras irregularidades, a ausência de controle dos factos patrimoniais ocorridos e a ineficaz transposição dos mesmos para os respectivos registos contabilísticos, factos que se traduzem na omissão e na inexactidão dos valores contabilizados de vendas e de custos das existências, ocorrências estas que eliminam a credibilidade do sistema de informação contabilístico do Sujeito Passivo em questão.
Deste modo, nada tenho a opor quanto aos valores corrigidos e/ou propostos, em sede de LR.C., face os fundamentos alegados e critérios aplicados e, em pormenor, descritos no capítulo III - correcções de natureza aritmética (fls. 102 a 105) e capítulos IV e V - correcções feitas por avaliação indirecta, nos termos da alínea a) do art.87°, alínea c) do art.88° e alínea i) do art.90°, todos da Lei Geral
Tributária (fls. 105 a 112).
Do facto resulta que os Resultados Declarados pelo Sujeito Passivo, de €31.776,52, (€ 113.944,67) e € 471.590,87, relativamente a cada um dos exercícios referidos, sejam alterados para €383.541,27, (90.024,66) e 1.883.129,81, cujo apuramento se discrimina no quadro V.lll, a folhas 113 do relatório.
Mais ainda, o prazo de caducidade para a liquidação dos tributos encontra-se suspenso, nos termos do art.46°, n°1, da Lei Geral Tributária.
Nos termos e para efeitos dos artigos 60° da L G. T, e do R.C.P.I.T., foi o Sujeito Passivo notificado, sem que, no entanto e até à presente data, tenha exercido o direito de audição prévia.
Pelos factos tributários verificados, cuja conduta consubstancia uma falta tipificada nos termos do art.103°, n°1 alínea a) do R.G.I.T., aprovado pela Lei n°15/2001, de 5 de Junho, foi levantado o competente Auto de Notícia, que, para os devidos efeitos, deverá ser enviado à Divisão dos Processos Criminais e Fiscais.
Nos termos e para os efeitos dos arts.62° do R.C.P.I.T. e 77° da L.G.T. dever-se-á proceder à notificação ao Sujeito Passivo do resultado desta acção inspectiva.
À Consideração Superior.
(…)”.
F) Em 20 de Novembro de 2006, foi exarado despacho pela Directora de Finanças Adjunta, Por Delegação, da Direcção de Finanças de , sobre o relatório final de inspecção, com o seguinte teor (cf. fls. 332, do PAT):
"Concordo. Face ao relatório e pareceres da Chefe de Equipa e da Chefe de Divisão, nada a opor.
Dos fundamentos deles constantes, resulta que se encontram verificados os pressupostos legais estabelecidos no artigo 52° do CIRC e nos arts.87° e 88° da LGT, para apuramento da matéria colectável dos exercícios de 2002, 2003 e 2004 com recurso a métodos indirectos, não sendo possível a quantificação e comprovação directa e exacta da matéria colectável.
Desta forma, com os fundamentos referenciados, determino que se proceda, nos termos dos preceitos legais citados, bem como do art.90° da LGT e art.52° do CIRC, à determinação da matéria colectável com recurso à aplicação de métodos indirectos para o seu apuramento relativamente aos exercícios acima enunciados.
Determino ainda a fixação da matéria colectável de IRC referente aos exercícios em referência, nos montantes propostos.
Para o efeito foram elaborados DC-Único n°s .
Remeta-se o auto de notícia ao Serviço de Finanças competente.
Notifique-se.
(…)”.
G) Na sequência da notificação referida na alínea C) a impugnante apresentou um pedido de revisão da matéria tributável, nos termos do art.91° da LGT, tendo a reunião para os devidos efeitos sido efectuada em 18/01/2007 e 19/01/2007, na Direcção de Finanças de , de harmonia com o disposto nos arts.91° a 94° da LGT (fls. 163 e sgs. dos autos);
H) Para efeitos do Procedimento de Revisão supra indicado, foi efectuado o debate contraditório entre os peritos do sujeito passivo e da AT, os quais não chegaram a acordo, pelos motivos e fundamentos constantes nos inerentes laudos lavrados por cada um, os quais fazem parte integrante das Actas n° 06/07 de 18/01/2007 e n°07/07, de 19/01/2007, lavradas para o efeito procedimental (fls. 164 a 183 dos autos);
l) Por não ter havido acordo entre os peritos Intervenientes no Procedimento de Revisão, a que se referem os arts.91° a 94° da LGT, o órgão competente para a fixação da matéria tributária resolveu, em 24 de Janeiro de 2007, manter a matéria tributável, antes fixada para o ano de 2004, de €1.883.129,81, com a fundamentação de fls. 184 a 193 dos autos;
J) Em 12 de Fevereiro de 2007 foi emitida a liquidação n°, no valor de €441.584,50, tendo a impugnante sido notificada da liquidação de IRC e dos juros compensatórios do exercício de 2004, ora impugnados, através do registo dos CTT , datado de 27.02.2007 e da Demonstração de Compensação com o registo n° , datado de 27.02.2007, (fls. 42 e 43 dos autos);
L) O prazo de pagamento voluntário terminou em 02.04.2007 sem que o mesmo tivesse sido efectuado, pelo que foi extraída a respectiva certidão de dívida que serviu de base ao processo de execução fiscal n° (fls. 324 do PAT);
M) Não foi deduzida reclamação graciosa ou recurso hierárquico com o mesmo objecto;
N) A presente impugnação deu entrada no TAF de Lisboa no dia 02/07/2007, cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos;
O) Da mesma impugnante e em matéria idêntica, relativa a IRC, mas referente ao exercício de 2001, correu neste Tribunal Tributário de Lisboa a impugnação n°/06.4BELSB, cuja sentença proferida em 06/06/2008 considerou a impugnação totalmente improcedente;
P) Inconformada com a sentença referida na alínea anterior, a impugnante recorreu da mesma para o Tribunal Central Administrativo Sul, cujo processo tomou o n°/08 e onde foi proferido Acórdão, em 17/02/2009, onde se negou provimento ao recurso e se manteve a sentença recorrida.
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Todos os factos têm por base probatória, os documentos juntos em cada ponto.
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Factos não provados:
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão».

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B.DE DIREITO

Na sequência de uma acção de fiscalização, a Administração Tributária considerou que a contabilidade da sociedade «CO…, LDA» ora recorrente, com referência ao exercício do ano de 2004, não reflecte a sua verdadeira situação patrimonial e que as fracções em causa nos autos foram adquiridas por valores superiores aos mencionados nas escrituras de compra e venda. Consequentemente, a Administração Tributária procedeu à correcção do lucro tributável declarado e à liquidação adicional do IRC que considerou em falta.

A recorrente impugnou judicialmente essa liquidação e a Mmª Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa julgou improcedente a impugnação. Da leitura da motivação e respectivas conclusões de recurso constata-se que a recorrente fundamenta o seu inconformismo na circunstância da prova testemunhal produzida, decorrer que o preço base de venda das fracções adquiridas pelos compradores Patrícia …, Maria …, Ana …, João … e Ana …, Luís … e Fernando … o foram pelo preço declarado nas respectivas escrituras de compra venda, sendo as diferenças encontradas pela Administração Tributária relativas ao custo (mão de obra e materiais) das obras efectuadas nos imóveis por estes adquiridos e a pedido dos mesmos.

Deixando já aqui adiantada a nossa posição, consideramos que bem andou a Mmª Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa ao não enveredar pela posição espelhada na petição inicial e seguida nas alegações de recurso, pelas seguintes e essenciais razões:

Desde logo, como sabemos, o montante declarado como preço de compra/venda constante em escritura pública de compra e venda de imóvel, pode ser afastado pela Administração Tributária no âmbito do seu poder de correcção das declarações dos contribuintes, desde que existam indícios certos e seguros, que o mesmo não corresponde à realidade, sem necessidade de decisão judicial de nulidade desse negócio.

E, como igualmente sabemos, o ónus da prova para afastar esse preço declarado é da Administração Tributária, enquanto facto constitutivo do seu direito à liquidação por montante diverso/superior ao declarado, tendo a liquidação de ser anulada quando esta o não logre alcançar.

Posto isto, vejamos de perto o discurso fundamentador da sentença recorrida: «Não resulta dos autos qualquer certeza ou prova de que a mão-de-obra e os materiais compreendidos nessas obras foram pagos à parte pelos compradores.

E não existe qualquer factura ou documento dessas mesmas obras, pois não foram apresentados à AF nem no decurso da acção de inspecção, nem na Comissão de Revisão, nem juntos com a presente impugnação, afirmando as testemunhas inquiridas sobre esses mesmos factos que nunca os possuíram.

Aliás, no âmbito das diligências encetadas vários dos adquirentes foram regularizar o pagamento de IMT e juntar cópia do contrato promessa de compra e venda no qual declararam o valor real, correspondente ao valor declarado na escritura e o valor das alegadas obras, bem como cópias dos cheques emitidos.

A este propósito, foi ouvida como testemunha uma das adquirentes de uma fracção – Ana – que inquirida se relativamente ao valor pago de € 70.000,00 relativamente às alegadas obras, se foi emitida factura, referiu não saber. No entanto, relativamente a esta testemunha e conforme se encontra evidenciado no relatório de inspecção tributária, esta testemunha procedeu ao pagamento do IMT pela diferença dos € 70.000,00.

A nosso ver, os factos descritos, no seu conjunto, constituem indícios seguros de omissão de proveitos e de que a contabilidade não reflecte o resultado efectivamente obtido.

Efectivamente, o cruzamento efectuado entre as escrituras públicas de venda dos imóveis e os valores declarados pelos compradores para efeitos de IMT bem como os cheques por estes emitidos e constantes do processo de Inspecção Tributária, revelam de modo muito contundente uma omissão de proveitos, possíveis de quantificar directamente e que portanto deram lugar às correcções técnicas descritas no Relatório, mas revelam também e sobretudo que os registos contabilísticos da impugnante não revelam a sua real situação patrimonial e tributária.

Tendo ficado demonstrada a subfacturação nas vendas, afigurou-se necessário aceder às contas bancárias dos sócios nas quais se confirmou que reuniam depósitos de cheques passados em nome da sociedade, nunca registados na sua contabilidade, o que também por si só será revelador de uma impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação do rendimento colectável de IRC.

No que respeita ao argumento invocado pela impugnante de que relativamente a algumas diferenças estas repercurtir-se-iam em suprimentos efectuados pelos sócios, tal afirmação é desprovida de qualquer conteúdo ou prova documental tendo em conta que dos elementos contabilísticos vertidos nos autos é impossível aferir tal facto, tendo em conta que inexistem documentos de suporte e registos contabilísticos desses suprimentos na contabilidade, como aliás, reconhece o TOC, Sr. José , no seu depoimento testemunhal.».

A recorrente veio indicar os depoimentos que, na sua perspectiva, justificavam a pretendida alteração da matéria de facto. Para o efeito, identificou as testemunhas José , Luis , José e Ana , assim como referenciou a data e hora em que tais depoimentos foram prestados e o CD onde se encontra a respetiva gravação, indicando o seu tempo de duração, e, para além disso, transcreveu e destacou a “negrito” as passagens da gravação tidas por relevantes e que, em seu entender, relevavam para a alteração do decidido.

Deste modo, articuladamente ponderadas as conclusões com a fundamentação do recurso, conclui-se que as alegações de recurso apresentadas pela recorrente respeitam as exigências contidas no artigo 685º do CPC.

Tendo-se procedido à audição integral do CD em que ficaram registados os depoimentos prestados em audiência de julgamento pelas testemunhas que – segundo a recorrente – teriam confirmado, de forma satisfatória e convincente, a sua versão, i.é., que os valores pagos por cada um dos adquirentes que excedam o preço declarado nas escrituras de compra e venda correspondem ao custo referente a mão de obra e materiais utilizados nas alterações efectuadas nas fracções, não pode este Tribunal ad quem, como já havíamos adiantado, acolher a tese apresentada pela recorrente.

Na verdade, as testemunhas inquiridas (a excepção da testemunha Ana ) afirmaram que a recorrente dedicava-se à compra e venda de imóveis “ degradados”. Mas se isso é assim, ficou de longe por demonstrar, que os valores titulados por cheques recebidos pelos sócios da recorrente correspondem ao pagamento das obras efectuadas nas ditas fracções e que os mesmos não se mostram compreendidos no preço base de venda.

Depois, e muito mais decisivamente, porque os depoimentos oferecidos nada referem quanto aos materiais utilizados em cada uma das fracções, por outro lado, as testemunhas Luís e José afirmaram que as fracções eram vendidas em tosco e as obras realizadas eram “ geralmente” sempre as mesmas.

Ora, se assim é, sempre ficou por explicar a diferença do valor/custo das obras em cada uma das fracções e devia tê-lo sido até porque não foi apresentada qualquer factura ou documento com potencialidade de demonstrar a efectivação das alegadas obras de alteração/ remodelações.

Acresce dizer, que a testemunha Ana afirmou em juízo que foram efectuadas obras na cozinha e nas duas casas de banho, todavia nada esclareceu em que termos foi o negócio celebrado, ou seja, se o valor do preço do imóvel englobava ou não o valor das ditas obras, cujo valor igualmente não mencionou.

Assim sendo, e porque a produção desta prova testemunhal esteve sujeita aos princípios da imediação e da livre apreciação por parte do julgador em 1.ª instância, não tendo sido apontadas, nem se encontrando, razões ponderosas para afastar a convicção inscrita na decisão sob recurso improcedem nesta parte as conclusões da alegação da Recorrente.

E, idêntico destino é dado quanto á alegada existência de suprimentos efectuados pelos sócios. Com efeito, entendeu e bem a Mmª Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa «tal afirmação é desprovida de qualquer conteúdo ou prova documental tendo em conta que dos elementos contabilísticos vertidos nos autos é impossível aferir tal facto, tendo em conta que inexistem documentos de suporte e registos contabilísticos desses suprimentos na contabilidade, como aliás, reconhece o TOC, Sr. José , no seu depoimento testemunhal.».
Alegou, a recorrente, que a falta de lançamento contabilístico das operações, quer a nível dos proveitos, como sejam as escrituras públicas, quer a nível dos custos é da inteira responsabilidade do Técnico Oficial de Contas. Tal posição, foi considerada e bem irrelevante pela Mmª Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, conforme ilustra o que a este propósito ficou consignado na sentença sob recurso: «Também se terá de considerar irrelevante a alegação de que o TOC à data responsável, não utilizou, e podia e deveria ter utilizado, os meios de que dispunha, para que a contabilidade da ora impugnante tivesse sido elaborada de acordo com os sãos princípios e regras que legitima e obrigatoriamente devem pautar o comportamento destes profissionais, e como tal, reflectisse a verdadeira situação patrimonial e consequentemente tributária, da ora impugnante, o que não aconteceu. Assim, como, a alegada falta de conhecimentos ou de habilitação dos sócios para se aperceberem da realidade contabilística da empresa, tanto mais que existe obrigação legal de nomear um TOC, que existia na sociedade em causa.
Nem podia deixar de ser assim, atentas as funções e especiais responsabilidades dos TOC. De facto, nos termos do disposto no art. 6.º, n.º. 1, do Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas (aprovado pelo Decreto-Lei nº 452/1999 de 5 de Novembro), o TOC tem por funções “planificar, organizar e coordenar a execução da contabilidade das entidades sujeitas aos impostos sobre o rendimento que possuam ou devam possuir contabilidade regularmente organizada, segundo os planos de contas oficialmente aplicáveis, respeitando as normas legais e
os princípios contabilísticos vigentes, bem como das demais entidades obrigadas, mediante portaria do Ministro das Finanças, a dispor de técnicos oficiais de contas”, cabendo-lhe “assumir a responsabilidade pela regularidade técnica, nas áreas contabilística e fiscal” destas entidades.». Em todo o caso, a responsabilidade perante a Administração Tributária cabe apenas às empresas ou, eventualmente, aos gerentes ou administradores destas, em regime de responsabilidade subsidiaria. Os Técnicos Oficiais de Contas respondem perante os seus clientes por eventuais erros ou comportamentos ocorridos no exercício da sua profissão. A responsabilidade perante a Administração Tributaria, no caso concreto, cabe á recorrente e não ao Técnico Oficial de Contas.

Alegou, ainda, para a recorrente a Administração Tributária limitou-se a quantificar proveitos presumidos esquecendo-se de quantificar os presumíveis custos necessários à obtenção daqueles proveitos, quando os mesmos ficaram demonstrados pela prova produzida.

A recorrente, com o devido respeito, não tem razão, pois que, arrogando-se do direito à dedutibilidade de custos que diz terem sido desconsiderados pela Administração Tributária, é sobre si que recai o dever de comprovar esses custos (cfr. artigo 74°, n°1, da LGT) e sobre a Administração Tributária apenas recairia o dever de corrigir os custos por via da correcção presumida dos proveitos se tivesse havido lugar a correcção nas vendas (número de imóveis vendidos), que não apenas dos valores declarados (contabilizados) das vendas, como é o caso sub judice.

Desde modo, dado que a recorrente não comprovou despesas para além das consideradas pela Administração Tributária, não havia lugar a qualquer correcção nos custos.

Haverá, pois, que negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida que assim julgou e decidiu manter na Ordem Jurídica a liquidação de imposto e de juros impugnada.

IV. CONCLUSÕES

I. Arrogando-se do direito à dedutibilidade de custos que diz terem sido desconsiderados pela Administração Tributária, é sobre si que recai o dever de comprovar esses custos (cfr. artigo 74°, n°1, da LGT) e sobre a Administração Tributária apenas recairia o dever de corrigir os custos por via da correcção presumida dos proveitos se tivesse havido lugar a correcção nas vendas (número de imóveis vendidos), que não apenas dos valores declarados (contabilizados) das vendas.

II. A responsabilidade perante a Administração Tributária cabe apenas às empresas ou, eventualmente, aos gerentes ou administradores destas, em regime de responsabilidade subsidiaria.

III. Os Técnicos Oficiais de Contas respondem perante os seus clientes por eventuais erros ou comportamentos ocorridos no exercício da sua profissão.

V.DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da Recorrente.

Registe e notifique.


Lisboa, 13 de Julho de 2016.

[Ana Pinhol]


[Jorge Cortês]


[Cristina Flora]