Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1058/18.1BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:06/06/2019
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:ACIDENTE EM SERVIÇO;
NEXO DE CAUSALIDADE;
PRESUNÇÃO
Sumário:i) De acordo com o disposto no artigo 7.º, nº 2, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro (na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 33/2018, de 15 de Maio), “acidente em serviço é todo o que ocorre nas circunstâncias em que se verifica o acidente de trabalho, nos termos do regime geral, incluindo o ocorrido no trajecto de ida e de regresso para e do local de trabalho” (n.º 1). E “se a lesão corporal, perturbação funcional ou doença for reconhecida a seguir a um acidente, presume-se consequência deste” (n.º 2).

ii) É de subscrever o entendimento do tribunal a quo quanto à qualificação do evento como acidente em serviço – torção do joelho de que resultou dor e edema no joelho esquerdo, não se excluindo patologia meniscal, gerador de incapacidade temporária absoluta certificada por Junta Médica da ADSE -, se essa conclusão tem correspondência com a factualidade provada, assentando numa dedução lógica e racionalmente fundamentada naquela.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

C................, intentou a presente acção para reconhecimento de direitos emergentes de acidente em serviço contra o Ministério da Justiça, tendo impugnado o acto do Subdirector, em substituição do Director-Geral da Reinserção e dos Serviços Prisionais, que decidiu não qualificar como acidente em serviço o evento sucedido na formatura em 15.09.2016.

Por sentença do TAF de Sintra, a acção foi julgada procedente e, em consequência, anulado o despacho de 9.04.2018 que negou qualificar o incidente como acidente em serviço e condenada a Ent. Demandada a praticar acto que qualifique o referido acidente como acidente em serviço.

O Ministério da Justiça vem interpor recurso da mesma decisão, concluindo a sua alegação como segue:




"texto integral no original; imagem"


Não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Tribunal Central Administrativo, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.


Com dispensa dos vistos legais, importa apreciar e decidir.


I. 2. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar:

- Se o tribunal a quo errou no julgamento de facto e de direito ao ter concluído pela existência de acidente em serviço e assim ter condenado a Demandada como constante do respectivo dispositivo.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, a qual se reproduz ipsis verbis:

A) Em 15-09-2016, a Autora apresentou requerimento denominado “Participação e qualificação do acidente de trabalho”, ocorrido no PBX do Estabelecimento Prisional do Linhó, pela 8:00, do qual fez a seguinte descrição:

«Durante a formatura e quando o graduado deu a ordem de direita volver, ao realizar essa função o pé ficou preso e o joelho estalou (joelho esquerdo).»

Fiquei com dores ao nível do joelho esquerdo e tornozelo.» (Cfr. fls. 40 do Processo Administrativo -PA-)

B) Foi elaborado Boletim de Acompanhamento Médico, do qual resulta que a Autora foi assistida no HPP Cascais em 15-09-2016, pelas 19:00, com indicação que deve ser seguida no centro de saúde e de incapacidade temporária absoluta e com a seguinte descrição a nível de “sintomatologia e lesões diagnosticadas”:

«Dor e edema no joelho esquerdo, RX sem lesões traumáticas agudas não se excluindo patologia meniscal, tem indicação para reavaliar se sintomas persistirem.» (Cfr. fls. 41 do PA)

C) Na sequência da participação referida na al. A), foi levantado processo de averiguações pela Diretora do Estabelecimento Prisional do Linhó. (Cfr. fls. 44 a 46 do PA)

D) Em 3-11-2016, o Chefe do Corpo da Guarda Prisional Augusto ............... prestou, no processo de averiguações, as declarações que constam de fls. 58 do PA.

E) Em 7-11-2016, o Chefe do Corpo da Guarda Prisional Carlos ............... prestou, no processo de averiguações, as declarações que constam de fls. 60 do PA.

F) Em 10-11-2016, a Autora prestou, no processo de averiguações, as declarações que constam de fls. 57 do PA.

G) Em 24-11-2016, o Guarda Prisional Artur ............... prestou, no processo de averiguações, as declarações que constam de fls. 59 do PA.

H) Em 11-04-2017, a Autora apresentou-se a junta médica da ADSE, a qual deliberou que a mesma “Tem incapacidade temporária absoluta”. (Cfr. fls. 54 do PA)

I) Em 17-04-2017, a Instrutora do processo de averiguações elaborou relatório, do qual resulta o seguinte:

«ASSUNTO: Acidente de trabalho da guarda prisional, C................, SRH ........, ocorrido em 15/09/2016.

1- INTRODUÇÃO

O presente processo teve origem na participação apresentada pela sinistrada (fls 1), cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

A participação do acidente foi feita dentro do prazo legal, nos termos do n.º l do art.º 8.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro.

2- FACTOS APURADOS

Analisados os elementos constantes dos autos, é possível concluir que:

1. No dia 15/09/2016, a sinistrada - C................ - na formatura, ao efectuar o movimento de volver à direita, o pé esquerdo não terá acompanhado a rotação do joelho e terá assim provocado a torção do mesmo.

2. Ao longo do dia de trabalho a sinistrada ter-se-á queixado de dores com colegas e superiores, designadamente com o senhor chefe de guardas Augusto.

3. Porque a dor e inchaço no joelho terão aumentado, no final da tarde a sinistrada dirigiu-se ao Hospital de Cascais, onde foi observada pelas 19horas.

4. Da observação a que foi sujeita, resultou a seguinte sintomatologia e lesões diagnosticadas: "dor e edema no joelho esquerdo, RX sem lesões traumáticas agudas não se excluindo patologia meniscal, tem indicação para reavaliar se sintomas persistirem".

5. Foi-lhe fixada uma incapacidade temporária absoluta, que se manteve nas sucessivas avaliações médicas que se seguiram.

6. Em 15/12/2016, foi submetida a Junta Médica da ADSE, que lhe manteve a incapacidade temporária absoluta, mantém até hoje.

7. Tem nova Junta Médica marcada para o dia 16/05/2017.

8. A sinistrada refere nunca antes ter tido qualquer problema ou doença no joelho esquerdo e ainda que não pratica exercício físico.

3-MATÉRIA DE DIREITO

É acidente de trabalho o acidente que se verifique no local e no tempo do trabalho e produza directa ou indirectamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte a morte ou redução na capacidade de trabalho ou de ganho.

Tal conceito é delimitado por três elementos cumulativos, sendo um espacial (o local de trabalho), outro temporal (o tempo de trabalho) e o último causal (o nexo de causa e efeito entre o evento e a lesão, perturbação ou doença).

Não é posto em causa que, no caso "sub judice", a ocorrência se tenha verificado no local e no tempo de trabalho.

Por outro lado as lesões observadas e constantes do BAM são compatíveis com os factos supra descritos, sendo evidente o nexo de causalidade existente.

De referir que, no que se refere à prova deste nexo causal, a lei estabeleceu, a favor do trabalhador, uma presunção "juris tantum". Ou seja, a lesão observada no local e no tempo de trabalho presume-se consequência de acidente de trabalho, sendo certo que, no caso em apreço tal presunção não foi ilidida.

De resto, não parecem verificar-se nenhuma das circunstâncias previstas pelo artigo 14.º da Lei n.º 98/2009, de 4/09, susceptíveis de descaracterizar o acidente. É de sublinhar que, a doutrina e a jurisprudência (Ac. TRC de 26.04.2006, TRC de 13.03.2006, TRC de 07.06.2006, TRC de 03.05.2007, TRC de 03.12.2007, STJ de 17.05.2007) são unânimes no que toca a dizer que o ónus da prova dos factos que importem a descaracterização dos acidentes de trabalho, excluindo o direito à reparação, cabe ao empregador.

No que concerne a convicção da instrutora é de referir que, pese embora o movimento (que terá provocado a lesão) seja simples e ninguém se ter apercebido do momento exacto em que a sinistrada diz ter efectuado a torção (embora a tenham visto coxear) a verdade é que, observada no hospital, as lesões diagnosticadas mostraram-se coerentes com a ocorrência e queixas da sinistrada.

4 - PROPOSTA

Considerando que:

- De acordo com a factualidade descrita e com a estatuição legal, o acidente da guarda prisional - C................. - ocorreu no local e tempo de trabalho.

- Verifica-se um nexo causal directo, entre o sinistro e as lesões sofridas.

- O Boletim de Acompanhamento Médico atesta o diagnóstico, bem como as lesões associadas.

- Não se verifica nenhuma das circunstâncias susceptíveis de descaracterizar o acidente;

- O sinistrado deu atempadamente cumprimento a todos os formalismos legais.

Propõe-se que:

- O acidente de que foi vitima a trabalhadora, C................, ocorrido em 15/09/2016, seja qualificado como acidente de trabalho.

- Sejam justificadas as faltas dadas em virtude do acidente de trabalho, nos termos do n.º 1 do artigo 19.º do citado Decreto-Lei n.9 503/99;

- Sejam liquidadas as despesas decorrentes deste acidente;

- Seja o presente processo remetido ao Gabinete Jurídico e de Contencioso para consideração superior;» (Cfr. fls. 62 e 63 do PA)

J) Em 17-04-2017, a Diretora do Estabelecimento Prisional do Linhó proferiu o seguinte despacho relativamente ao relatório referido na al. anterior:

«Concordo.

Remeta-se o processo ao Gabinete Jurídico e de Contencioso.» (Cfr. fls. 64 do PA)

K) Em 25-09-2017, o Gabinete Jurídico e de Contencioso da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais elaborou a informação n.º …/AS/2017/GJC, a qual formulou as seguintes conclusões:

«III. Conclusão

Assim, com base nos elementos apresentados ao longo da presente informação, e confrontando o alegado nos autos de declarações prestados pelas testemunhas que se encontram junto ao processo, somos do parecer que, salvo melhor e mais fundada opinião:

III.I O acidente ocorrido com a Guarda Prisional C................., no dia 15.09.2016 não deve ser qualificado como "Acidente em serviço", nos termos das disposições conjugadas do n.º 1 do art.º 7.º do DL n.º 503/99, de 20 de Novembro e do n.º 1 do art.º 8 da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro, por se encontrarem em falta os elementos espacial, temporal e causais, necessários para que se possa qualificar um acidente como sendo em serviço.

III.II Assim, não devem ser liquidados os documentos de despesas apresentados pela sinistrada.

III.III Antes de ser tomada a decisão final, deve a interessada ser ouvida em sede de audiência prévia, nos termos do art.º 121.º e seguintes do CPA.» (Cfr. fls. 34 a 37 do PA)

L) Em 28-09-2017, o Diretor-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais proferiu o seguinte despacho na informação referida na al. anterior:

«Concordo.

Proceda-se à audiência prévia sugerida.» (Cfr. fls. 34 do PA)

M) Em 30-10-2017, a Autora dirigiu ao Diretor-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais articulado denominado “Audiência dos interessados”, no qual requereu que seja proferido ato “qualificando o acidente como tendo ocorrido em serviço” e indicou quatro testemunhas. (Cfr. fls. 26 a 28 do PA)

N) Em 7-02-2018, o Chefe do Corpo da Guarda Prisional Paulo ................. prestou as declarações que constam de fls. 23 do PA.

O) Em 8-02-2018, o Guarda Prisional Artur ............... prestou as declarações que constam de fls. 21 do PA.

P) Em 16-02-2018, o Guarda Prisional Francisco ................. prestou as declarações que constam de fls. 22 do PA.

Q) Em 19-02-2018, o Guarda Prisional Nuno ................. prestou as declarações que constam de fls. 20 do PA.

R) Em 2-04-2018, o Gabinete Jurídico e de Contencioso da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais elaborou a informação n.º …/AS/2018/GJC, da qual consta, designadamente, o seguinte:

«(…)

No caso em apreço, e analisando toda a documentação que se encontra junto ao processo, importa confrontar os depoimentos da sinistrada e das testemunhas cujas declarações se encontram junto ao processo - nomeadamente, o Guarda Prisional Artur ............... e os Chefes do Corpo da Guarda Prisional Augusto ............... e Carlos ................

Deverá atender-se ainda aos depoimentos das testemunhas entretanto indicadas pela sinistrada, nomeadamente, dos Guardas Prisionais Nuno ................., Francisco ................. e Paulo ..................

Ora, de acordo com o Auto de Declarações da Sinistrada, datado de 10.11.2016 (cfr. fls. 18), esta indica que, quando efetuou o movimento de volver à direita na formatura, percebeu que o pé esquerdo não rodou e não acompanhou a rotação do joelho, assim provocando uma torção. A sinistrada afirma ainda que "no momento imediatamente a seguir, quando destroçaram, curvou-se sobre o joelho esquerdo, queixosa de dor", tendo ficado imediatamente imobilizada. A sinistrada afirma que o colega Artur ................. ter-lhe-á dito "rapariga não penses mais nisso", sendo que a sinistrada lhe contou imediatamente o que havia sucedido.

A sinistrada afirma ainda que, passados poucos minutos, encontrou o Chefe do Corpo da Guarda Prisional Augusto ..............., a quem contou o sucedido.

De acordo com o Auto de Declarações prestadas pelo Guarda Prisional Artur ..............., datado de 24.11.2016 (cfr. fls. 20), a sinistrada dirigiu-se-lhe já depois da formatura, dizendo que se tinha aleijado no joelho, aquando da formatura. O referido Guarda Prisional indicou ainda que achou a situação estranha, não se recordando ainda se a sinistrada coxeava ou não durante a formatura. Por fim, afirmou que não viu a sinistrada imobilizada após a formatura e curvada sobre o joelho com dores, nem lhe disse "rapariga não penses mais nisso".

O Guarda Prisional Artur ................. prestou posteriormente novas declarações, datadas de 08.02.2018. Nas referidas declarações indica que se recordou, entretanto, de ver a sinistrada "num dia que já não consegue precisar", "a queixar-se de dores no joelho, depois da formatura. Não pode afirmar se a senhora se aleijou ou não na formatura. Durante a formatura não se apercebeu de nada. Só se recordou de a ver, depois da formatura, com a mão no joelho e queixar-se de dores”.

De acordo com o Auto de Declarações prestadas pelo Chefe do Corpo da Guarda Prisional Augusto ..............., datado de 3.11.2016 (cfr. fls. 19), a sinistrada apenas se queixou das dores a meio da manhã, tendo feito o seu serviço até ao final do dia. Esta testemunha indicou ainda que indagou junto dos colegas que estiveram na formatura nesse dia e ninguém se recordava de qualquer incidente.

É de particular relevância o Auto de Declarações prestado pelo Chefe da Guarda Prisional Carlos ..............., datado de 07.11.2016 (cfr. fls. 21). Trata-se do graduado de serviço encarregue da formatura no dia em que ocorreu o sinistro.

De acordo com esta testemunha, "durante a formatura não se apercebeu de qualquer incidente, nem tão pouco depois da formatura alguém se lhe queixou ou reportou alguma ocorrência. Mais disse que, como os senhores Guardas formam à sua frente, se algum não tivesse conseguido executar corretamente qualquer um dos movimentos, ficando em posição distinta dos restantes, certamente que se teria apercebido. Só bem mais tarde, o Chefe Augusto ............... lhe disse que a sinistrada se tinha queixado de se ter aleijado na formatura".

De acordo com o Auto de Declarações prestadas pelo Chefe do Corpo da Guarda Prisional Paulo ................., datado de 07.02.2018, "em dia que já não consegue precisar, no decorrendo ano de 2016, durante a formatura, apercebeu-se que a colega C................. se tinha aleijado no joelho, não se recorda se o esquerdo ou o direito". Refere ainda que, após a chamada, no fim da formatura, durante o movimento de "direita-volver", seguido de um "destroçar", apercebeu-se “que a colega se agarrou ao joelho. Perguntou-lhe o que teria sucedido e ela queixou-se de dores no joelho (...) o que lhe chamou a atenção foi o movimento da colega a agarrar-se ao joelho". Por fim, questionado se, antes do sucedido, viu a colega coxear, disse que "não recorda ter visto ninguém coxear nesse dia, mas também não está propriamente atento a estas questões".

De acordo com o Auto de Declarações prestadas pelo Guarda Prisional Francisco ................., datado de 16.02.2018, o mesmo disse que" Esteve na formatura do dia 15.09.2016. Recorda-se de, no final da formatura, ver a colega C................ agarrar-se ao joelho - não recorda qual - e queixar-se de dores".

Por fim, e de acordo com o Auto de Declarações prestadas pelo Guarda Prisional Nuno ................., datado de 19.02.2018, o mesmo disse que "em dia que já não consegue precisar, no decorrer do ano de 2016, após a formatura, apercebeu-se que a colega C................ se tinha aleijado no joelho, não se recorda se o esquerdo ou o direito. Imediatamente no final da formatura, recorda-se de ver a colega agarrada a um dos joelhos, tendo-lhe perguntado "então?", e seguiu".

Ou seja, atentos todos os depoimentos, facilmente se depreende que existem grandes discrepâncias entre o depoimento da sinistrada e o depoimento de várias testemunhas.

Senão, vejamos: a sinistrada afirma que, logo após o momento em que sentiu dores, curvou-se sobre o joelho esquerdo, queixosa de dor, tendo ficado imediatamente imobilizada, sendo que o Guarda Prisional Artur ............... assistiu ao sucedido, tendo proferido diversas palavras.

Ora, o referido Guarda Prisional, em auto de declarações datadas de 24.11.2016 informou que, para além de não ter proferido quaisquer palavras (nomeadamente, as palavras referidas pela sinistrada), o mesmo afirma que não viu a sinistrada imobilizada e curvada sobre o joelho, com dores.

No referido auto de declarações, esta testemunha afirma que a sinistrada dirigiu-se-lhe já depois de a formatura ter terminado, dizendo que se tinha aleijado no joelho (ou seja, a referida testemunha nunca viu a sinistrada imobilizada e curvada sobre o joelho esquerdo). A testemunha afirma ainda que nem sequer se recorda se a sinistrada coxeava.

Em auto de declarações datadas de 08.02.2018, esta testemunha recorda-se de "ver- num dia que já não consegue precisar", a sinistrada "a queixar-se de dores no joelho, depois da formatura". No entanto, a mesma é perentória ao afirmar que "Não pode afirmar se a senhora se aleijou ou não na formatura".

A sinistrada afirma também que, passados poucos minutos, encontrou o Chefe do Corpo da Guarda Prisional Augusto ..............., tendo-lhe contado o sucedido. Ora, o referido Chefe indica que a sinistrada apenas se queixou das dores a meio da manhã, tendo feito o seu serviço até ao final do dia.

Por seu turno, o graduado de serviço encarregue da formatura no dia em que ocorreu o sinistro afirma que durante a formatura não se apercebeu de qualquer incidente, nem tão pouco depois da formatura alguém se lhe queixou ou reportou alguma ocorrência.

De todos os testemunhos juntos ao processo, apenas um parece confirmar que a sinistrada sofreu uma lesão durante uma formatura. Trata-se do Chefe do Corpo da Guarda Prisional Paulo ................., que indica que em dia que já não consegue precisar, no decorrer de uma formatura, apercebeu-se que a sinistrada se tinha aleijado no joelho. Ou seja, apesar de esta testemunha confirmar que a sinistrada terá tido uma lesão durante a formatura, a mesma não consegue precisar em que dia ocorreu a lesão, não confirmando, de todo, que tal tenha sucedido no dia 15.09.2016.

Por seu turno, a testemunha Francisco ................. viu a sinistrada agarrada ao joelho no final da formatura, tal como a testemunha Nuno ................., que "em dia em que já não consegue precisar", apercebeu-se, após a formatura, que a sinistrada se tinha aleijado no joelho.

Ou seja, não existe qualquer testemunha a corroborar os factos alegados pela sinistrada e que confirme, de forma cabal e inequívoca, que a mesma sofreu uma lesão durante a formatura no dia 15.09.2016. Pelo contrário, ninguém reparou que tenha ocorrido alguma circunstância fora do comum durante a formatura. Até porque, de acordo com o Chefe Carlos ..............., o movimento de "volver à direita" é algo muito simples, sendo uma simples semi-rotação para o lado direito, num piso absolutamente liso. Esta testemunha é perentória, ao sublinhar que, caso algum guarda não tivesse conseguido executar qualquer um dos movimentos, ficando em posição distinta dos restantes, certamente que se teria apercebido.

Assim, face ao exposto, verifica-se que não se encontram cumpridos os pressupostos dos acidentes em serviço, previstos no art.º 7.º, n.º 1, do DL n.º 503/99 e 8.º, n.º 1, da Lei n.º 8/2009.

Com efeito, não se encontra comprovado que a lesão da sinistrada tenha ocorrido no local de trabalho (elemento espacial), nem se comprova que a mesma tenha ocorrido no tempo de trabalho (elemento temporal). É ainda de sublinhar que a sinistrada apenas se deslocou às urgências do Hospital Cuf Cascais por volta das 19.00 Horas, ou seja, várias horas depois da hora a que alega ter tido o acidente (08.00 Horas).

Por fim, não se comprova existir um nexo de causalidade entre o evento lesivo e as lesões sofridas pela sinistrada.

Foi elaborado relatório (cfr. fls. 23 a 25) pela Senhora Instrutora do Processo, onde esta propõe que o acidente sofrido pela Guarda Prisional Carma ................ seja qualificado como acidente de trabalho, devendo ser justificadas as faltas dadas em virtude do acidente de trabalho, nos termos do n.º 1 do art.º 19.º do Decreto-Lei n.º 503/99. No entanto, pelos motivos acima elencados, não acompanhamos este entendimento.

Mais concretamente, no aludido relatório, é referido que a lei estabeleceu, a favor do trabalhador, uma presunção “juris tantum" - ou seja, a lesão observada no local e no tempo do trabalho presume-se consequência do acidente de trabalho.

Ora, no caso sub judice, nem sequer se mostra comprovado que tenha ocorrido uma lesão no local de trabalho e no tempo de trabalho - como se viu, não existe nenhuma testemunha que corrobore de forma cabal e inequívoca que a lesão tenha ocorrido durante a formatura. Não tendo sido comprovado que tenha havido uma lesão no local e no tempo de trabalho, a referida presunção não é aplicável ao presente caso. Apenas seria aplicável se se tivesse comprovada a existência de uma lesão no local e no tempo do trabalho.

III. Conclusão

Assim, com base nos elementos apresentados ao longo da presente informação, e confrontando o alegado nos autos de declarações prestados pelas testemunhas que se encontram junto ao processo, somos do parecer que, salvo melhor e mais fundada opinião, e reiterando o exposto na Informação n.9 …/AS/2017/GJC:

III.I O acidente ocorrido com a Guarda Prisional C................, no dia 15.09.2016 não deve ser qualificado como "Acidente em serviço", nos termos das disposições conjugadas do n.º 1 do art.º 7.º do DL n.º 503/99, de 20 de Novembro e do n.º 1 do art.º 8 da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro, por se encontrarem em falta os elementos espacial, temporal e causais, necessários para que se possa qualificar um acidente como sendo em serviço.

III.II Assim, não devem ser liquidados os documentos de despesas apresentados pela sinistrada.» (Cfr. fls. 12 a 16 do PA, que se têm por integralmente reproduzidas)

S) Em 5-04-2018, a Chefe da Divisão do Gabinete Jurídico e de Contencioso da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais proferiu o seguinte parecer na informação referida na al. anterior:

«Concordo.

- As testemunhas arroladas em sede de audiência prévia não confirmam a versão da alegante.

- Assim, não estão reunidos os elementos de facto e de direito que sustentam a qualificação do participado como acidente de trabalho, pelo que é de não é de qualificar o participado como acidente de trabalho, com as legais consequências.

À Consideração superior.» (Cfr. fls. 12 do PA)

T) Em 9-04-2018, o Subdiretor-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais proferiu despacho de sancionamento das informações referidas nas duas alíneas anteriores. (Cfr. fls. 12 do PA)

U) Em 20-04-2018, a Autora assinou o aviso postal de receção das informações e despacho referidos nas alíneas anteriores. (Cfr. fls. 1 e 2 do PA)

V) A presente ação foi intentada em 26-09-2018. (Cfr. fls. 2 dos autos)

Não foram fixados factos não provados com interesse para a decisão.

Foi exarada a seguinte motivação da decisão sobre a matéria de facto:

A convicção do tribunal fundou-se nos documentos juntos pela Autora e nos documentos integrantes do processo administrativo, para os quais remete o probatório, os quais não foram impugnados.



II.2. De direito

Comece por se deixar estabelecido que a decisão sobre a matéria de facto não foi sujeita a impugnação, devendo assim dar-se como estabilizado o probatório fixado.

Com efeito, o Recorrente imputa sim erro de julgamento da valoração sobre os factos efectuada pelo tribunal a quo, afirmando que ocorre uma insuficiente análise crítica da prova, não tendo o tribunal efectuado um exame crítico da prova testemunhal. Afirma que não existem elementos probatórios que apontem inequivocamente para que a lesão alegada tenha ocorrido de manhã, durante o serviço, no dia indicado pela A.

Ora, o que se verifica é que no tribunal a quo não foi produzida prova testemunhal (requerida, aliás, pela A. e pelo ora Recorrente), tendo a mesma sido indeferida conforme despacho de 7.02.2019, devidamente notificado às partes. Sendo que o ora Recorrente não reagiu contra tal despacho, transitando assim o mesmo em julgado.

Assim, o (eventual) erro de julgamento que vem apontado – e que cumpre sindicar – é tão--somente o relativo à valoração da factualidade dada como provada, a qual assenta exclusivamente no elementos probatórios documentais. Prova documental essa devidamente indicada nas respectivas alíneas do probatório.

Donde, tendo isto presente, não se alcança o alegado pelo Recorrente quando refere a violação do art. 607.º, n.º 4, do CPC. Na verdade, não há dúvida que o tribunal declarou os factos que considerou provados, especificou a prova documental relevante e foi com base nesse meio de prova, consistente em elementos documentais e não controvertidos, que erigiu o probatório.

Assim, repete-se, não vindo impugnada a factualidade dada como provada (o que sempre teria que obedecer ao ónus processual que resulta do art. 640.º, do CPC), nem tendo sido interposto recurso do despacho que indeferiu a prova testemunhal requerida, a decisão sobre a matéria de facto terá que ser dada como estabilizada.

Posto isto, vejamos então se o tribunal a quo errou ao concluir pela existência de acidente em serviço, tendo presente o evento descrito no probatório.

Na sentença recorrida exarou-se o seguinte discurso fundamentador:

A presente ação tem por objeto imediato o despacho do Subdiretor-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, de 9-04-2018, que negou qualificar o incidente alegado pela Autora como acidente em serviço para efeitos do disposto no Decreto-Lei n.º 503/99.

De acordo com a fundamentação desse ato, que consta em especial da informação n.º …/AS/2018/GJC do Gabinete Jurídico e de Contencioso da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, não se encontram preenchidos os pressupostos dos acidentes de serviço previstos no n.º 1 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 503/99 e no n.º 1 do art.º 8.º da Lei n.º 98/2009, não se tendo comprovado que a lesão da sinistrada tenha ocorrido no local e tempo de trabalho, nem o nexo de causalidade entre o evento lesivo e as lesões sofridas pela Autora, cfr. facto R).

A conclusão diferente tinha chegado o relatório elaborado no âmbito do processo de averiguações movido pelo Estabelecimento Prisional do Linhó, que não foi acolhido pela Direção-Geral, o qual, com base nas mesmas normas, propôs a qualificação do acidente ocorrido em 15-09-2016 como acidente de trabalho, cfr. facto I).

Começando pela análise do regime jurídico aplicável, dispõe o n.º 1 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, que “Acidente em serviço é todo o que ocorre nas circunstâncias em que se verifica o acidente de trabalho, nos termos do regime geral, incluindo o ocorrido no trajecto de ida e de regresso para e do local de trabalho”.

Por sua vez, o n.º 1 do art.º 8.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, que “regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais”, qualifica como acidente de trabalho “aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza directa ou indirectamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte”.

Assim, como resulta do relatório do Estabelecimento Prisional do Linhó e da informação do Gabinete Jurídico e de Contencioso da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, a qualificação como acidente de trabalho impõe a verificação de três pressupostos cumulativos:

- Um elemento especial, que impõe que o acidente se verifique no local de trabalho;

- Um elemento temporal, que impõe que o acidente ocorra no tempo de trabalho; e

- Um elemento causal, que impõe que o acidente produza direta ou indiretamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença.

A propósito destes pressupostos, pode ler-se, designadamente, a fundamentação dos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19-11-2008, proc. n.º 08S2466 e da Relação de Coimbra de 16-06-2016, proc. n.º 306/11.3TTGRD.C1.

De acrescentar que, de acordo com o n.º 2 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 503/99, “Se a lesão corporal, perturbação funcional ou doença for reconhecida a seguir a um acidente, presumese consequência deste”. Norma que tem correspondência com o n.º 1 do art.º 10.º da Lei n.º 98/2009, segundo o qual “A lesão constatada no local e no tempo de trabalho ou nas circunstâncias previstas no artigo anterior presume-se consequência de acidente de trabalho”.

A interpretação desta última norma foi clarificada, em especial, pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1-06-2017, proc. n.º 919/11.3TTCBR-A.C1.S1, o qual concluiu o seguinte:

«a) O artigo 10º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro, ao dispor que a lesão constatada no local e no tempo de trabalho ou nas circunstâncias previstas no artigo anterior presume-se consequência de acidente de trabalho, estabelece uma presunção de causalidade, “juris tantum” entre o acidente e as suas consequências.

b) Esta presunção não liberta, porém, os sinistrados ou os seus beneficiários do ónus da prova da verificação do próprio evento causador das lesões, ónus que lhes compete.»

No mesmo sentido, decidiram, designadamente, os acórdãos da Relação do Porto de 11-04-2018, proc. n.º 1468/13.0TTVNG.P1 e da Relação de Lisboa de 11-07-2018, proc. n.º 7680/15.0T8SNT.L1-4.

Assim, “A prova da existência do evento causador do dano, compete fazer ao A./trabalhador que reclama o direito à reparação, art. 2º da LAT e art. 342º, nº 1, do CC”, cfr. acórdão da Relação do Porto de 30-05-2018, proc. n.º 1718/16.1T8MTS.P1.

A questão controvertida consiste precisamente em saber se, com base nos elementos probatórios reunidos no procedimento administrativo, os factos alegados pela Autora deveriam ter sido qualificados como acidente de trabalho, ou seja, como acidente em serviço para efeitos do disposto no n.º 1 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 503/99.

Como decorre da jurisprudência citada, compete à Autora a prova da existência dos factos que consubstanciam o acidente, sendo que, feita essa prova, nos termos do n.º 2 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 503/99, a lesão corporal reconhecida a seguir ao acidente de trabalho presume-se consequência deste.

Atendendo à factualidade provada nos presentes autos, afigura-se que o relatório elaborado no âmbito do Estabelecimento Prisional do Linhó foi o que logrou uma análise mais esclarecida dos elementos probatórios disponíveis e um apuramento mais plausível dos factos relevantes.

Na realidade, decorre do procedimento administrativo que a Autora iniciou funções no dia 15-09-2016, pela manhã, sem que lhe tenha sido reconhecida qualquer mazela física. Não havendo indícios ou, sequer, alegação por parte da Entidade Demandada de que se tenha ausentado do local de trabalho, depois do período normal de trabalho foi assistida numa unidade hospitalar onde lhe são reconhecidas lesões num joelho. Estas circunstâncias apontam para que tais lesões físicas tenham ocorrido em 15-09-2016 no local e tempo de trabalho.

Ademais, a causa do acidente invocado é idónea para provocar as lesões que lhe são diagnosticadas, por estar em causa uma parte do corpo (o joelho) necessária para a realização do movimento de rotação em causa.

Acresce que as objeções suscitadas pela fundamentação do ato impugnado à qualificação como acidente de serviço não se mostram determinantes. Na realidade, a descrição fáctica realizada pela Autora afigura-se compatível com uma lesão que se manifesta imediatamente, mas cuja gravidade, dor e edema se vão agravando depois da sua ocorrência. Daí que não seja de estranhar que as manifestações da lesão durante a formadura, apesar de existirem, não tenham sido imediatamente apreendidas por todos os presentes ou não tenham ficado na sua memória, como ocorreria se se tratasse, por exemplo, de uma fratura óssea. Nem sequer se perspetiva como relevante o facto de as testemunhas não saberem, ao certo, o dia em que tal evento teve lugar, pois o dia em concreto não estava em causa no depoimento das testemunhas. [sublinhados nossos]

Por outro lado, existem elementos probatórios que apontam inequivocamente para que a lesão alegada tenha ocorrido de manhã, durante o serviço, tendo as testemunhas ouvidas no procedimento administrativo relatado queixas da Autora no joelho durante e/ou após a formatura, designadamente Augusto ................. (facto D)), Artur ................. (factos G) e O)), Paulo ................. (facto N)), Francisco ................. (facto P)) e Nuno ................. (facto Q)).

No essencial, o ato impugnado centrou-se em circunstâncias instrumentais da prova do que foi alegado pela Autora (o dia preciso, o momento preciso das queixas, a falta de memória do ocorrido por parte de algumas testemunhas…), tendo perdido de vista e não tendo posto em causa o mais relevante, designadamente que a Autora entrou ao serviço sem quaisquer mazelas aparentes e, depois de um incidente na formatura que encontra apropriado suporte probatório, sai do serviço e dirige-se a uma unidade hospitalar onde lhe são diagnosticadas lesões consentâneas com o incidente por si alegado.

Nestes termos, encontram-se verificados os elementos espacial, temporal e causal a que se refere o n.º 1 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de interpretação conjugada com o n.º 1 do art.º 8.º da Lei n.º 98/2009, sendo que o elemento causal se presume nos termos do n.º 2 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 503/99.

Atento o exposto, o despacho impugnado errou na aplicação do n.º 1 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 503/99 e do n.º 1 do art.º 8.º da Lei n.º 98/2009, sendo, como tal, anulável.

Pelo que, como exposto, é reconhecido à Autora o direito alegado, sendo de condenar a Entidade Demandada a praticar ato que qualifique o acidente como acidente em serviço, para efeitos do disposto no art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 503/99, com as demais consequências, as quais não compete aqui particularizar por falta de elementos nos autos.

Ora, os elementos probatórios identificados pelo tribunal a quo para sustentar a presunção judicial derivada, têm correspondência com o que vem provado, não se detectando, assim, qualquer erro de julgamento. Presunção permitida, como resulta dos artigos 349.º e 351.º do Código Civil. Como se consagra naquele art. 349.º as presunções são “ilações que a lei ou o julgador tiram de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido”.

No caso, a conclusão alcançada pelo tribunal a quo tem correspondência com a factualidade provada, assentando numa dedução lógica e racionalmente fundamentada naquela. Tudo como explicitado na sentença recorrida. Sendo igualmente de evidenciar que nos termos do disposto no artigo 7.º, nº 2, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro (na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 33/2018, de 15 de Maio), “[s]e a lesão corporal, perturbação funcional ou doença for reconhecida a seguir a um acidente, presume-se consequência deste”.

Neste ponto, cabe evidenciar a pronúncia do Ministério Público nesta instância, a qual, aliás, dá resposta integral à questão objecto do recurso. Assim, transcrever-se-á a mesma na sua parte relevante:

“(…) o douto acórdão [sentença] recorrido fez de facto uma apreciação crítica da prova, analisando as declarações das testemunhas, devidamente conjugadas, e extraindo conclusões que se mostram perfeitamente lógicas e coerentes.

Pelo contrário, o recorrente limita-se a salientar os pontos divergentes de tais declarações , os quais, contudo, não dizem respeito à essencialidade dos pressupostos legais da caracterização do acidente como de trabalho, mas unicamente a elementos não relevantes, como a data exacta ou a visualização do momento exacto do acidente.

Com efeito, o facto de o chefe de guardas não se ter apercebido de qualquer incidente durante a formatura não demonstra a inexistência de tal incidente, tendo em conta a natureza do mesmo – não se tratou de uma queda ou acidente violento, mas unicamente de uma lesão num joelho decorrente de uma rotação em que o pé ficou preso, tal com descreve a autora.

Importa salientar a conclusão que foi extraída do processo inicial de averiguações e que consta do ponto I) da matéria de facto provada:

“No que concerne a convicção da instrutora é de referir que, pese embora o movimento (que terá provocado a lesão) seja simples e ninguém se ter apercebido do momento exacto em que a sinistrada diz ter efectuado a torção (embora a tenham visto coxear) a verdade é que, observada no hospital, as lesões diagnosticadas mostraram-se coerentes com a ocorrência e queixas da sinistrada.”

Ora, o depoimento do Chefe da Guarda Prisional Carlos ................., a que o recorrente dá relevância, demonstra que o mesmo teve conhecimento do incidente, no próprio dia porque “o Chefe Augusto ............... lhe disse que a sinistrada se tinha queixado de se ter aleijado na formatura “.

Por outro lado, são de salientar as declarações prestadas pelo Chefe do Corpo da Guarda Prisional Augusto ..............., - constante do ponto R) da matéria de facto provada – referindo que “ a sinistrada apenas se queixou das dores a meio da manhã, tendo feito o seu serviço até ao final do dia. ”

A sentença recorrida apreciou devidamente todos estes elementos referindo que :

“No essencial, o ato impugnado centrou-se em circunstâncias instrumentais da prova do que foi alegado pela Autora (o dia preciso, o momento preciso das queixas, a falta de memória do ocorrido por parte de algumas testemunhas…), tendo perdido de vista e não tendo posto em causa o mais relevante, designadamente que a Autora entrou ao serviço sem quaisquer mazelas aparentes e, depois de um incidente na formatura que encontra apropriado suporte probatório, sai do serviço e dirige-se a uma unidade hospitalar onde lhe são diagnosticadas lesões consentâneas com o incidente por si alegado.

Razões que determinam a improcedência do recurso interposto, devendo manter-se a sentença em conformidade.


III. Conclusões

Sumariando:

i) De acordo com o disposto no artigo 7.º, nº 2, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro (na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 33/2018, de 15 de Maio), “acidente em serviço é todo o que ocorre nas circunstâncias em que se verifica o acidente de trabalho, nos termos do regime geral, incluindo o ocorrido no trajecto de ida e de regresso para e do local de trabalho” (n.º 1). E “se a lesão corporal, perturbação funcional ou doença for reconhecida a seguir a um acidente, presume-se consequência deste” (n.º 2).

ii) É de subscrever o entendimento do tribunal a quo quanto à qualificação do evento como acidente em serviço – torção do joelho de que resultou dor e edema no joelho esquerdo, não se excluindo patologia meniscal, gerador de incapacidade temporária absoluta certificada por Junta Médica da ADSE -, se essa conclusão tem correspondência com a factualidade provada, assentando numa dedução lógica e racionalmente fundamentada naquela.



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da secção do contencioso administrativo deste tribunal central administrativo sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 6 de Junho de 2019



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Pedro Marchão Marques


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Alda Nunes


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José Gomes Correia