Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08167/14
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:05/21/2015
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
NULIDADE DA SENTENÇA DEVIDO A FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE FACTO E DE DIREITO.
ARTº.615, Nº.1, AL.B), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
NULIDADE DA SENTENÇA QUANDO OS SEUS FUNDAMENTOS ESTÃO EM OPOSIÇÃO COM A DECISÃO.
ARTº.615, Nº.1, AL.C), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA. PROVA TESTEMUNHAL.
ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA. ALCANCE DA FORÇA PROBATÓRIA PLENA.
CORREÇÕES À MATÉRIA COLECTÁVEL AO ABRIGO DO ARTº.39, Nº.2, DA L.G.T.
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. DECISÕES-SURPRESA.
DIREITO DE AUDIÇÃO PRÉVIA. ARTº.60, DA L.G.T.
DISPENSA DO DIREITO DE AUDIÊNCIA ANTES DA LIQUIDAÇÃO (ARTº.60, Nº.3, DA L.G.T.).
Sumário:
1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).
2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma.
3. Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação. No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário.
4. Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.c), do C. P. Civil, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artº.154, nº.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada. No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário.
5. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
6. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
7. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
8. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
9. Se a decisão do julgador, no que diz respeito à prova testemunhal produzida, estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
10. A A. Fiscal não tem qualquer interesse na destruição do negócio jurídico de compra e venda, decorrente da sua declaração de nulidade, uma vez que não está em causa o negócio celebrado, mas apenas e tão só o valor por que o mesmo se efectuou. Tal valor, declarado pelas partes na escritura, não reveste força probatória plena, uma vez que esta apenas cobre os factos praticados pela autoridade ou oficial público respectivo (cfr.artº.371, nº.1, do C.Civil). Ora, a declaração pelas partes do valor pelo qual foi realizado o negócio não está protegido por tal força probatória. Pelo que, a Fazenda Pública pode efectuar as correções à matéria colectável de I.R.C. sem necessidade de obter a declaração de nulidade da escritura pública, tudo conforme dispõe o artº.39, nº.2, da L.G.T.
11. Estabelece-se no artº.3, nº.3, do C.P.C., que o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem. Com o aditamento desta norma, operado pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, visou-se a proibição da prolação de decisões-surpresa e aplicando-se tal regra não apenas na 1ª. Instância mas também na regulamentação de diferentes aspectos atinentes à tramitação e julgamento dos recursos. Deve, pois, concluir-se que o princípio do contraditório, o qual se configura como um dos princípios fundamentais do nosso direito processual civil, assegura não só a igualdade das partes, como, no que aqui interessa, é um instrumento destinado a evitar as citadas decisões-surpresa.
12. Consagra o artº.267, nº.5, da Constituição da República Portuguesa, após a revisão introduzida pela lei constitucional nº.1/2001, o direito de todos os cidadãos participarem na formação das decisões ou deliberações da Administração que lhes disserem respeito. A lei ordinária, concretizou inicialmente este direito no artº.100, do C. P. Administrativo, aprovado pelo dec.lei 442/91, de 15/11, estando actualmente tal direito expressamente previsto no artº.60, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12 (cfr.artº.45, do C.P.P.T.).
13. O direito de audiência prévia de que goza o administrado incide sobre o objecto do procedimento, tal como ele surge após a instrução e antes da decisão. Estando em preparação uma decisão, a comunicação feita ao interessado para o exercício do direito de audiência deve dar-lhe conhecimento do projecto da mesma decisão, a sua fundamentação, o prazo em que o mesmo direito pode ser exercido e a informação relativa à possibilidade de exercício do citado direito por forma oral ou escrita.
14. A falta de audição prévia do contribuinte, nos casos consagrados no artº.60, nº.1, da Lei Geral Tributária, constitui um vício de procedimento susceptível de conduzir à anulação da decisão que vier a ser tomada (cfr.artº.135, do C.P.Administrativo).
15. Não haverá qualquer obstáculo à dispensa do direito de audiência do contribuinte antes da liquidação, desde que o mesmo já tenha sido assegurado noutra fase do procedimento e não se verificarem alterações da situação factual que subjaz ao acto tributário (cfr.artº.60, nº.3, da L.G.T, na redacção de natureza interpretativa introduzida pelo artº.13, nº.1, da Lei 16-A/2002, de 31/5).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X


“……………………………………., L.DA.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.155 a 163 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedente a impugnação pelo recorrente intentada, visando actos de liquidação de I.R.C. e juros compensatórios, relativos aos anos de 2003, 2004 e 2005 e no montante total de € 14.659,72.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.232 a 244 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões, após notificação para sintetizar as mesmas:
1-Conforme resulta de fls., a alegante, impugnou as liquidações referentes ao I.R.C. dos anos de 2003, 2004 e 2005, alegando o que acima se transcreveu;
2-O recorrido apresentou contestação, alegando o que consta de fls.;
3-Produzida a prova, a recorrente concluiu como na p.i., mantendo coerentemente o que sempre alegou;
4-Por sentença de fls., o Meretíssimo Juiz decidiu o seguinte: " ... Termos em que julgo improcedente a impugnação. ";
5-A recorrente impugnou a decisão que deu causa a esta impugnação e arrolou a devida prova;
6-Na sentença recorrida decidiu-se pelo que consta do Relatório, sendo certo que o mesmo foi impugnado pela recorrente;
7-O nosso direito não permite que sejam tidos em conta relatórios elaborados pelos serviços fiscais, quando os mesmos são impugnados e apresentadas conclusões muito diversas daquelas que os serviços apresentam, sem qualquer justificação legal, como foi o caso neste processo;
8-As diligências probatórias requeridas pela recorrente, só perante a insistência desta é que tiveram lugar, tendo sido decididas pelo Tribunal Central Administrativo Sul, após recurso apresentado pela aqui recorrente;
9-Às mesmas não foi dada pelo Tribunal a quo a devida relevância, tendo ficado superficialmente resolvida esta questão (da análise da produção de prova testemunhal) apenas num único e só parágrafo, numas míseras 19 linhas;
10-A decisão da 1ª. instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação se os factos tido como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa, devendo, oficiosamente, ordenar a renovação da produção de prova, a produção de novos meios de prova, anular a decisão proferida na 1ª instância ou determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o Tribunal de 1ª instância a fundamente - situações, aqui, que se verificam, sendo imperativa a revogação da sentença recorrida;
11-O Meritíssimo Juiz continuou a desconsiderar, em absoluto, os factos relativamente aos quais havia sido formulado o requerimento de prova e a lei não permite este tipo de interpretações e aplicação da lei, pelo que deve a sentença recorrida ser revogada, com todas as consequências legais;
12-A sentença recorrida padece de erro de julgamento por violação do principio do contraditório, nos termos do artigo 3, n° 3, do CPC;
13-A violação do direito de audição prévia é passível de, só por si, conduzir à anulação da liquidação adicional em discussão nos presentes autos;
14-O respeito pelo "direito de audição" tem assento constitucional, impondo a obrigatoriedade de assegurar a participação dos interessados nas decisões administrativas que lhes dizem respeito;
15- As decisões proferidas posteriormente à liquidação, em processo de impugnação, porque autónomas do "direito de audição prévia" em sede administrativa, não podem prejudicar a essencialidade deste direito;
16-A recorrente, antes da emissão do relatório inspetivo e das liquidações, nunca havia sido notificada das mesmas;
17-A recorrente só teve oportunidade de se defender, quanto a essa concreta factualidade, depois da emissão do relatório e das liquidações;
18- O direito de audição prévia pressupõe a concessão ao contribuinte de uma garantia de defesa previamente à conclusão do procedimento administrativo, o que não aconteceu no caso dos autos, pois em circunstância alguma foi a recorrente notificada para efeitos do exercício do direito de audição prévia, cometendo assim, a recorrida cometeu uma nulidade;
19-Sobre a AT incide o ónus de provar a existência de todos os pressupostos (de facto e de direito) que a determinaram a efectuar correcções ao declarado pelo contribuinte, incumbindo-lhe, por isso, indagar sobre a verificação do facto tributário que afirma ter existido, através da realização de todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material, só podendo efectuar a liquidação adicional quando os elementos que tiver apurado permitam formar a séria convicção sobre a existência do facto tributário não declarado (total ou parcialmente) pelo contribuinte (princípio da verdade material - arts. 50 do CPPT e 58 n° 1 da LGT);
20-A Autoridade Tributária não realizou todas as diligências necessárias para averiguar da veracidade dos factos e não é por os adquirentes terem efectuado as liquidações adicionais que corresponde à verdade os factos alegados pela recorrida;
21-A escrita da recorrente está devidamente organizada, todos os documentos estão bem classificados e lançados, todos os proveitos e despesas foram lançados com os reais valores recebidos pela recorrente, bem como não existem recebimentos não declarados e assim, não há lugar a qualquer liquidação adicional em sede de IRC pela recorrente;
22- É do senso comum que as pessoas menos instruídas, quando notificadas pelas finanças ou por outro sector do Estado, para pagar, pagam sem se questionar se devem ou não - foi o que aconteceu no presente caso;
23- Conforme resulta da escritura pública o valor da venda foi 75.000,00 € e não pelo preço de 139.663,41 €, como quer a recorrida fazer crer;
24- A recorrente e os respectivos compradores, com a venda da fração, objecto da escritura de 9/04/2003, apenas recebeu e pagaram, respectivamente, o valor de 75.000,00 €, e não outro valor qualquer;
25-É este o valor que consta da escritura pública de compra e venda e não outro;
26-Para fazer prova desse facto, a recorrente, para além da escritura pública outorgada entre a recorrente e os compradores, indicou testemunhas na sua impugnação que tinham conhecimento do negócio e do valor da mesma;
27- Não poderia o Meritíssimo juiz decidir como decidiu, apenas e com base no Relatório apresentado pela recorrida, sem atender consideravelmente à prova indicada e requerida pela recorrente, pois esta era essencial para a descoberta da verdade;
28-A entidade impugnada não provou nada do que disse no seu Relatório, pois este foi impugnado pela impugnante nos termos da lei, e como tal não pode servir para provar o que foi decidido na sentença recorrida;
29-Tendo sido impugnado, teria de ter sido apresentada prova pela Administração Fiscal, e pela impugnante e só depois dessa prova poderia eventualmente decidir-se pelo relatório ou por outras provas, nunca como se decidiu como se de facto tal relatório não tivesse sido impugnado;
30- A sentença recorrida interpretou deficientemente todas as normas legais que indica nessa sentença, e como tal impõe-se a revogação de tal sentença, daí e necessidade também, de se considerar nulo todo o processado pela administração fiscal, nesta matéria e até ao momento, incluindo o decidido na sentença recorrida, pelo facto de embora ter sido alegada esta matéria, a mesma não foi sequer conhecida - omissão de pronúncia;
31-A omissão de pronúncia gera a nulidade de todo o processado, nulidade esta que, aqui e desde já, se requer a sua apreciação;
32-Quando os documentos são impugnados, não podem servir para uma parte provar o que quer que seja, sem que seja realizada a audiência de julgamento ou outros meios de prova - pericial, documental, etc.;
33- O Meritíssimo Juiz viu o relatório e deu como provado o que consta de tal relatório, sem sequer ter em conta o que disse o impugnante sobre todas as questões na impugnação, dando valor ao relatório que de modo algum pode ser dado naquela fase processual;
34-É assim nula a decisão recorrida, por erro de interpretação e aplicação da lei, como da interpretação da prova documental;
35- As escrituras públicas descritas no relatório, obedeceram à forma prevista na Lei, e apenas os valores aí declarados podem ser impugnados, ou alterados, caso seja pedida essa alteração, ao Tribunal competente, e dentro do prazo legal;
36- A escritura pública é um documento autêntico e que por si só faz prova plena do que dela consta, e a falsidade apenas pode ser declarada pelo Tribunal, não pela Administração fiscal, ou por outra qualquer administração pública ou privada;
37- Para se poder alterar o valor declarado numa escritura pública, seria necessário primeiramente, quem tem legitimidade, propor uma ação em Tribunal, requerer-se a nulidade da escritura, e só depois da sentença transitada em julgado, caso esta fosse favorável à tese da nulidade, poderia a administração fiscal alterar os valores declarados e notificar a recorrente do relatório de liquidação adicional;
38- Tem também a sentença recorrida nesta parte, tem de ser revogada, pois sendo documento autêntico, não pode por si só um simples técnico tributário declarar o contrário da escritura pública e entender por si só que está errada tal escritura;
39-Não é porque consta num documento um valor mais elevado do que está escrito na escritura pública, que pode por si só ser aceite, sem que seja feita essa prova em audiência de julgamento e provado para que se destinou tal quantia, como se decidiu na sentença recorrida;
40-A lei não permite que se decida deste modo, pelo menos sem que seja dada oportunidade à parte de provar o contrário, como de facto sucedeu neste caso em concreto e daí ter de ser também revogada a sentença recorrida nesta parte, o que desde já e também aqui se requer;
41-Nenhuma norma legal, nomeadamente as indicadas na sentença recorrida, permite que por si só e sem mais, nomeadamente quando é impugnada essa decisão da administração tributária, aplicarem-se as normas legais referidas na sentença recorrida, pelo que também terá a sentença recorrida de ser revogada, por ter decidido que tudo foi bem feito pela administração fiscal;
42-Não há dúvidas que assiste razão à recorrente e que não pode a administração fiscal calcular outros valores, sem antes no Tribunal competente conseguir uma "decisão judicial que declare a sua nulidade" e daí também a necessidade de revogação da sentença recorrida;
43- A venda efectuada foi realizada pelo valor da escritura pública, e não pelo valor que o Sr. Inspector Tributário, entendeu no despacho que deu causa à impugnação e sentença recorrida - nenhuma prova foi feita em contrário do que alegou a recorrente, pois nenhuma prova foi feita na audiência de julgamento nesse sentido e como o relatório foi impugnado, não pode ser tido em conta para estes efeitos;
44- Nem sequer está fundamentada a sentença recorrida nesta parte, limita-se apenas a dizer que está correcto, sem se fundamentar o porquê dessa correção e a lei não permite que se elaborem sentenças economicistas, como aquela que deu causa a este recurso;
45-Além de não ter apreciado todas as questões apresentadas na impugnação, ainda existe falta de fundamentação de acordo com o que a lei impõe - violando o disposto nos artigos, 154 e 615 do CPC, e artigos 123, 124 e 125, do CPPT;
46- A sentença recorrida ao não ter conhecido da violação por parte da entidade impugnada do disposto no artigo 16, e alínea a) do artigo 17 do Código de Processo Tributário e 8, 55, 56 e 60 LGT, cometeu uma nulidade;
47- A interpretação das normas legais enumeradas na sentença recorrida, não é aquela que entendemos ser mais apropriada, sendo certo que nessa sentença nada se disse sobre as outras normas legais acima transcritas, nomeadamente artigos 20 e 268 da CRP, pelo que dúvidas não existem de que a sentença recorrida terá de ser revogada;
48- A sentença recorrida tem de ser revogada por ser ilegal e inconstitucional, dado que dúvidas não existem que não está fundamentada tanto de facto como de direito como exige a Lei, violando o disposto nos artigos 158 (atual 154) e 668 (atuaI 615) do CPC.;
49- O interesse da recorrente é legalmente protegido, o que faz com que a decisão impugnada tenha de ser apreciada e julgada de acordo com o que se requereu;
50-Julgar-se improcedente por não provada a impugnação - quando nenhuma prova foi ouvida ou inquirida - tal sentença viola o disposto nas alíneas b), c) e d) do artigo 668 (atuaI 615) da C. P. C;
51-A decisão recorrida não se pronunciou sobre estas questões, e aquelas que apreciou, apreciou-as deficientemente;
52-A decisão recorrida, também não fundamenta de facto e de direito a sua decisão e em parte, os seus fundamentos estão em oposição com a decisão;
53-Deixando o Meritíssimo Juiz "a quo" de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, nomeadamente as já alegadas nesta peça processual, tanto mais, que as partes precisam de ser bem elucidadas sobre os motivos da decisão;
54-Não basta pois que o Meritíssimo Juiz "a quo", decida a questão posta, em "crise", sendo indispensável que produza as razões em que se apoia o seu veredicto;
55-Lendo, atentamente, a sentença recorrida, nesta parte, ou noutra parte seguinte qualquer, verifica-se que não se indica nela um único facto concreto susceptível de revelar, informar, e fundamentar, a real e efectiva situação, do verdadeiro motivo de poder decidir-se como de facto se decidiu;
56-O Meritíssimo Juiz "a quo" com a decisão recorrida não assegurou a defesa dos direitos da recorrente, e não fundamentar exaustivamente a sua decisão, e ao ter interpretado deficientemente as normas legais que enumera na sentença recorrida;
57-A decisão recorrida, não está de modo algum fundamentada que permita à recorrente compreender o sentido e alcance de tal decisão;
58-A sentença recorrida violou:
a)Artigos 113 e 120 CPPT;
b)Artigos 91, n° 4, 124 e 125, do Código do Procedimento Administrativo;
c)Artigos 20, 13, 205, 207, 208, 266, 267, e nºs 3, 4 e 5, do artigo 268 da CRP;
d) Artigos 3, n° 1, 158, 201, alíneas b), c) e d) do artigo 668 da C. P. C. , aplicáveis por força do disposto no artigo 1 do Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de Julho;
e)Artigos 371 e 372 do C.C;
f)Artigos 8, 39, 55, 56, 60 da LGT;
59-Termos em que, se requer a V. Exas. a revogação da sentença recorrida, por ser de Lei, Direito e JUSTIÇA.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal teve vista do processo (cfr.fls.249 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.155 a 157 dos autos):
1-A impugnante foi sujeita a fiscalização externa no âmbito da qual foi elaborado o relatório junto a fls.3 a 7 do processo administrativo apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido;
2-A acção de fiscalização permitiu verificar que o valor da venda da fracção A, cor­respondente a uma moradia, do prédio sito na Rua …………….., vendida a Ana ……………….. e Luís ………………….., foi de € 139.663,41 e não € 75.000,00 como declarado na escritura outorgada em 9/4/2003 (cfr. documentos juntos a fls.3 a 9 do processo administrativo apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido);
3-A A.T. baseou-se no contrato promessa de compra e venda celebrado entre as partes que acordaram este valor, bem como no facto de os adquirentes terem efectuado as liquidações adicionais dos impostos devidos;
4-A omissão verificada é referente ao exercício de 2003, no entanto, uma vez que tinha prejuízos a reportar que utilizou em parte nos exercícios de 2003, 2004 e 2005, procedeu-se à correcção da matéria colectável desses exercícios:
a. Nos montantes de € 28.011,80 para 2003; € 25.296,48 para 2004; e € 251,77 para 2005;
b. Daqui resultando as liquidações juntas a fls.11 a 13 dos presentes autos que a impugnante contesta;
5-Notificada para exercer o direito de audição, a impugnante negou ter celebrado o contrato promessa junto aos autos e que o valor da venda fosse outro que não o constante da escritura (cfr. documentos juntos a fls.1 a 3 do dossier “Direito de Audição” constante do processo administrativo apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido);
6-Os factos alegados foram apreciados no relatório, mantendo-se, no entanto, as correcções propostas;
7-Os adquirentes procederam à regularização da situação, pagando os impostos adicionais em falta (cfr. relatório junto a fls.3 a 7 do processo administrativo apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido);
8-O relatório da inspeção foi notificado à impugnante por ofício nº.3982, de 20/6/2007 (cfr. documentos juntos a fls.1 e 2 do processo administrativo apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Com interesse para a decisão da causa nada mais se provou…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do tribunal baseou-se nos seguintes meios de prova:
PROVA DOCUMENTAL. Os meios de prova documental que serviram para a convicção do tribunal estão referidos no «probatório» com remissão para as fls. do processo onde se encontram.
PROV A TESTEMUNHAL. Quanto a este meio de prova, foi ouvida a testemunha Fernando...................., amigo do sócio gerente da impugnante e cujo depoimento não mereceu qualquer credibilidade. Disse a testemunha, entre outros factos, que o Sr. ..............., sócio gerente da impugnante, fez um loteamento com duas vivendas na urbanização ………………… em Pataias em 2002, e que por dificuldades financeiras chegou uma altura em que não pode acabar a obra, combinando então com o comprador que seria ele a acabá-la. Daí ter sido vendida por um valor inferior. A falta de credibilidade da testemunha resulta do facto de não ter conhecimento directo dos factos, mas apenas mediante aquilo que o Sr.............. lhe contou, da incongruência de dizer que o prédio foi vendido por «cento e tal mil Euros», quando na verdade, a fracção "…." do …………… foi vendida por um valor declarado de € 75.000,00. Para além disso, a versão de que a determinada altura faltou o dinheiro ao construtor para acabar o prédio também não tem qualquer aderência à realidade. É que o contrato promessa de compra e venda foi celebrado em 30/1/2003 e a escritura foi outorgada em 9/4/2003; ou seja, entre um documento e outro mediaram três meses, pelo que a ter surgido a repentina falta de dinheiro ao construtor, haveria tempo para alterar o contrato promessa. Mas mais importante ainda é saber-se que os adquirentes pagaram os adicionais de impostos devidos, o que certamente não aconteceria se a versão da testemunha tivesse algum resquício de verdade…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar totalmente improcedente a impugnação que originou o presente processo, em virtude do insucesso dos fundamentos da mesma.
X

Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.685-A, do C.P.Civil; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O apelante discorda do decidido aduzindo, em primeiro lugar e em síntese, que a sentença recorrida ao não ter conhecido da violação por parte da entidade impugnada do disposto nos artºs. 16, e 17, al.a), do Código de Processo Tributário, e artºs.8, 55, 56 e 60, da L.G.T., cometeu uma nulidade (cfr.conclusões 30, 31 e 46 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, supomos, uma nulidade por omissão de pronúncia da decisão recorrida.
Examinemos se o presente processo enferma de tal vício.
A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Esta peça processual pode padecer de vícios de duas ordens, os quais obstam à eficácia ou validade da dicção do direito:
1-Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação;
2-Por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artº.615, do C.P.Civil.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/5/2011, proc.4629/11).
Mais se dirá que a sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Trata-se, em qualquer caso, nesta nulidade, de falta de pronúncia sobre questões e não de falta de realização de diligências instrutórias ou de falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas. A falta de realização de diligências constituirá uma nulidade processual e não uma nulidade de sentença. A falta de avaliação de provas produzidas, tal como a sua errada avaliação, constituirá um erro de julgamento da matéria de facto. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e referir se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P. Tributário).
Mais, a nulidade de omissão de pronúncia impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.608, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade da sentença, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.577 e 578, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº.133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac.T.C.A.Sul-2.ªSecção, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365).
Revertendo ao caso dos autos, do exame da decisão do Tribunal “a quo”, principalmente do seu enquadramento jurídico (cfr.fls.157 a 163 dos autos), deve concluir-se que foram analisadas e decididas as causas de pedir (questões) estruturadas pelo recorrente na p.i. do presente processo (cfr. articulado junto a fls.2 a 9 dos autos), não se vislumbrando qualquer omissão de pronúncia, sendo que o próprio apelante também não concretiza quais as questões que, concretamente, deixaram de ser apreciadas, tudo levando em consideração o articulado inicial deste processo. Mais, não pode considerar-se uma questão a alegada violação de normas, desde logo algumas que já não estão em vigor, como seja os artºs.16, e 17, al.a), do Código de Processo Tributário, diploma revogado pelo C.P.P.T. e que deixou de vigorar em 31/12/1999 (cfr.artºs.2 e 4, do dec.lei 433/99, de 26/10).
Atento o acabado de mencionar, não se vê que a sentença recorrida tenha omitido pronúncia e, nestes termos, improcedendo este fundamento do recurso.
Mais alega o recorrente, em síntese, que não foi dada, pelo Tribunal "a quo", a devida relevância às diligências probatórias realizadas a seu pedido, tendo ficado superficialmente resolvida esta questão (da análise da produção de prova testemunhal) apenas num único parágrafo e numas míseras 19 linhas. Que é nula a decisão recorrida, por erro de interpretação e aplicação da lei, como da interpretação da prova documental. Que a sentença recorrida não está fundamentada. Que a lei não permite que se elaborem sentenças economicistas, como aquela que deu causa a este recurso, assim violando o disposto nos artºs.154 e 615, do C.P.C., e 123, 124 e 125, do C.P.P.T. (cfr. conclusões 9, 34, 44, 45 e 48 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo entendemos, a nulidade da sentença devido a falta de especificação dos fundamentos de facto da decisão.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al. b), do C.P.Civil, é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.139 a 141; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.687 a 689; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36).
No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.357 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.871/10; ac.S.T.A-2ª.Secção, 13/10/2010, rec.218/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6406/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13).
Voltando ao caso concreto, conforme se retira do exame da decisão recorrida constante de fls.155 a 163 do presente processo e das referências supra exaradas à fundamentação da decisão de facto constante da mesma, deve julgar-se manifestamente improcedente a alegação do recorrente, visto que o vício que consubstancia esta nulidade, conforme mencionado acima, consiste na falta de fundamentação absoluta, não bastando que a justificação da decisão (tanto na vertente factual como no aspecto do enquadramento jurídico) se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Concluindo, improcede o presente esteio do recurso incidente sobre a alegada falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão recorrida.
Defende o recorrente, igualmente, que na decisão recorrida, em parte, os seus fundamentos estão em oposição com a decisão (cfr.conclusão 52 do recurso), pretendendo assacar à decisão do Tribunal "a quo" o vício de nulidade devido a contradição entre os fundamentos e a decisão.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal pecha.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.c), do C. P. Civil, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artº.154, nº.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.141 e 142; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.689 e 690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36 e 37).
No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário. Mais se dirá que não ocorre esta nulidade quando a alegada contradição for entre os fundamentos de facto da decisão ou, por outras palavras, quando se tenham dado como assentes factos incompatíveis entre si, como parece querer defender o recorrente (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.361 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 18/2/2010, rec.1158/09; ac.S.T.A-2ª.Secção, 4/5/2011, rec.66/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/3/2012, proc. 1103/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/2/2013, proc.5713/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/8/2013, proc.6883/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/4/2014, proc.7435/14).
No caso “sub judice”, não vislumbra este Tribunal que a sentença recorrida padeça da nulidade em análise. Concretizando, a decisão recorrida não comporta nenhuma contradição entre os fundamentos e a decisão, na medida em que, tendo decidido pela improcedência da impugnação deduzida, a fundamentação jurídica de tal peça processual vai no mesmo sentido, chegando o Tribunal “a quo” à conclusão de que os vícios carreados pelo ora recorrente para o processo no articulado inicial não vingam. De resto, também se deve relevar que o apelante não concretiza qual a parte da fundamentação de tal peça jurídica que se encontra em contradição com o seu dispositivo.
Em suma, não se vê que a sentença recorrida padeça de qualquer vício lógico (obscuridade; contradição) na sua estrutura que tenha por consequência a respectiva declaração de nulidade.
Face ao exposto, julga-se improcedente este fundamento do recurso.
Argui também o apelante, em síntese e conforme acima se refere, que a decisão recorrida continuou a desconsiderar, em absoluto, os factos relativamente aos quais havia sido formulado o requerimento de prova. Que resulta da escritura pública que o valor da venda foi € 75.000,00 e não de € 139.663,41. Que para fazer prova desse facto, o recorrente, para além da escritura pública outorgada, indicou testemunhas na sua impugnação que tinham conhecimento do negócio e do valor da mesma. Que não podia o Tribunal "a quo" decidir como decidiu, apenas com base no relatório apresentado pela A. Fiscal, sem atender à prova indicada e requerida pelo apelante, pois esta era essencial para a descoberta da verdade. Que a A. Fiscal não provou nada do que disse no seu relatório, pois este foi impugnado pelo recorrente nos termos da lei. Que a escritura pública é um documento autêntico e que por si só faz prova plena do que dela consta, sendo que a sua falsidade apenas pode ser declarada pelo Tribunal, não pela Administração Fiscal (cfr. conclusões 11, 23 a 29 e 35 a 39 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, supomos, um erro de julgamento de facto da sentença recorrida.
Dissequemos se a decisão do Tribunal "a quo" padece de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
Tal ónus rigoroso deve considerar-se mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 27/02/2014, proc.7205/13).
No caso concreto, não pode deixar de estar votado ao insucesso o fundamento do recurso em análise devido a manifesta falta de cumprimento do ónus mencionado supra, desde logo, quanto aos concretos meios probatórios (tanto relativos à prova testemunhal como à prova documental), constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre a matéria de facto, diversa da adoptada pela decisão recorrida.
Por outro lado, no que concretamente diz respeito à produção de prova testemunhal, refira-se que se a decisão do julgador estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.6280/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6418/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/11/2014, proc.8060/14).
Arrematando, este Tribunal não tem obrigação de conhecer do presente esteio da apelação.
Apesar disso, sempre se dirá que a credibilidade do depoimento testemunhal (uma única testemunha) foi examinada pelo Tribunal "a quo", em sede de fundamentação da decisão da matéria de facto, tudo conforme supra se exarou. Já no que se refere ao valor de venda do imóvel, a decisão do Tribunal "a quo", baseou-se no contrato promessa de compra e venda celebrado entre as partes que acordaram este valor, bem como no facto de os adquirentes terem efectuado as liquidações adicionais dos impostos devidos (cfr.nº.3 do probatório).
E deve recordar-se que a A. Fiscal não tem qualquer interesse na destruição do negócio jurídico, decorrente da sua declaração de nulidade, uma vez que não está em causa o negócio celebrado, mas apenas e tão só o valor por que o mesmo se efectuou. Tal valor, declarado pelas partes na escritura, não reveste força probatória plena, uma vez que esta apenas cobre os factos praticados pela autoridade ou oficial público respectivo (cfr.artº.371, nº.1, do C.Civil). Ora, a declaração pelas partes do valor pelo qual foi realizado o negócio não está protegido por tal força probatória. Pelo que, a Fazenda Pública pode efectuar as correções à matéria colectável de I.R.C. sem necessidade de obter a declaração de nulidade da escritura pública, tudo conforme dispõe o artº.39, nº.2, da L.G.T. (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 26/2/2003, rec.89/03; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/5/2007, proc.1068/06; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Editora Encontro da Escrita, 4ª. Edição, 2012, pág.322).
Mais aduz o recorrente que a sentença recorrida padece de erro de julgamento por violação do principio do contraditório, nos termos do artº.3, nº.3, do C.P.C. (cfr.conclusão 12 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, supõe-se, consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece deste vício.
Estabelece-se no artº.3, nº.3, do C.P.C., que o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem. Com o aditamento desta norma, operado pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, visou-se a proibição da prolação de decisões-surpresa e aplicando-se tal regra não apenas na 1ª. Instância mas também na regulamentação de diferentes aspectos atinentes à tramitação e julgamento dos recursos. Deve, pois, concluir-se que o princípio do contraditório, o qual se configura como um dos princípios fundamentais do nosso direito processual civil, assegura não só a igualdade das partes, como, no que aqui interessa, é um instrumento destinado a evitar as decisões-surpresa (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 24/5/2011, proc.3514/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/8/2013, proc.6900/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.368).
No caso “sub judice”, examinando a tramitação processual do presente processo não vislumbra este Tribunal com base em que fundamento se possa concluir que a decisão de 1ª. Instância violou o princípio do contraditório, conforme defende o recorrente, embora não concretizando tal violação.
Concluindo, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente esteio do recurso.
Alega, ainda e em resumo, o apelante que a violação do direito de audição prévia é passível de, só por si, conduzir à anulação das liquidações em discussão nos presentes autos (cfr.conclusões 13 a 18 do recurso), com base em tal argumentação pretendendo, segundo cremos, assacar à decisão recorrida mais um vício de erro de julgamento de direito.
Deslindemos se a sentença recorrida comporta tal vício.
Consagra o artº.267, nº.5, da Constituição da República Portuguesa, o direito de todos os cidadãos participarem na formação das decisões ou deliberações da Administração que lhes disserem respeito. A lei ordinária, concretizou, inicialmente, este direito no artº.100, do C.P.Administrativo, aprovado pelo dec.lei 442/91, de 15/11, estando actualmente tal direito expressamente previsto no artº.60, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12 (cfr.artº.45, do C.P.P.T.).
O direito de audiência prévia de que goza o administrado incide sobre o objecto do procedimento, tal como ele surge após a instrução e antes da decisão. Estando em preparação uma decisão, a comunicação feita ao interessado para o exercício do direito de audiência deve dar-lhe conhecimento do projecto da mesma decisão, a sua fundamentação, o prazo em que o mesmo direito pode ser exercido e a informação relativa à possibilidade de exercício do citado direito por forma oral ou escrita (cfr.ac.S.T.A.-2ª. Secção, 25/1/2000, rec.21244, Ac.Dout., nº.466, pág.1275 e seg.; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 2/7/2003, rec.684/03; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/09/2013, proc.1510/06; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Encontro da Escrita Editora, 4ª. Edição, 2012, pág.502 e seg.).
A falta de audição prévia do contribuinte, nos casos em que é obrigatória, constitui um vício de forma do procedimento tributário susceptível de conduzir à anulação da decisão que vier a ser tomada (cfr.artº.135, do C.P.Administrativo; Diogo Leite de Campos e Outros, ob.cit., pág.515; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.437).
Mesmo antes da entrada em vigor da L.G.T., é uniforme a jurisprudência do S.T.A.-2ª.Secção no sentido de que o C.P.A., publicado após a entrada em vigor do C.P.T., estabelece, no seu art.2, nº.5, na redacção dada pelo dec.lei 6/96, de 31/1, que as suas normas que concretizam preceitos constitucionais são aplicáveis a toda e qualquer actuação da Administração Pública, entendimento este que já era defensável à face da redacção inicial. Uma dessas normas que concretizam preceitos constitucionais, é o artº. 100, do C.P.A., pelo que ele terá passado a ser potencialmente aplicável no procedimento tributário. Assim, deve concluir-se que, após a entrada em vigor do C.P.A. e até à vigência da L.G.T. (que contém normas especiais sobre a matéria no seu artº.60), a participação dos interessados no procedimento tributário não podia deixar de ser assegurada, seja através de formas especiais, seja nos termos do C.P.A., sem prejuízo dos casos de dispensa ou inexistência deste direito previstos no seu artº.103, do mesmo diploma, e do próprio condicionalismo em que o próprio artº.100 prevê tal direito de audiência (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 10/4/2002, rec.26248; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/10/2012, proc. 5791/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/1/2014, proc.7094/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.424 e seg.).
“In casu”, conforme se retira do exame do probatório (cfr.nº.5 da factualidade provada), tendo sido facultado o exercício do direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção ao recorrente, só se impunha o exercício de novo direito se a liquidação se baseasse em elementos distintos daqueles por que o direito de audição inicialmente se concretizou (cfr.artº.60, nº.3, da L.G.T.). Manifestamente, não é o caso dos autos, pelo que se nega provimento ao presente fundamento do recurso.
Por último, o recorrente chama à colação a alegada violação de um extenso rol de preceitos legais e constitucionais (cfr. a sentença violou os seguintes artigos:
a)Artigos 113 e 120 CPPT;
b)Artigos 91, n° 4, 124 e 125, do Código do Procedimento Administrativo;
c)Artigos 20, 13, 205, 207, 208, 266, 267, e nºs 3, 4 e 5, do artigo 268 da CRP;
d) Artigos 3, n° 1, 158, 201, alíneas b), c) e d) do artigo 668 da C. P. C. , aplicáveis por força do disposto no artigo 1 do Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de Julho;
e)Artigos 371 e 372 do C.C;
f)Artigos 8, 39, 55, 56, 60 da LGT).
Quanto a esta pretensa violação de preceitos legais e constitucionais, o recorrente não concretiza minimamente essas infracções, sendo que já se afirmou que a decisão recorrida não padece de qualquer nulidade, não se vislumbrando em que termos foram colocados em crise os preceitos citados, a não ser com referência ao facto de a decisão recorrida ter sido desfavorável ao apelante. Este Tribunal também não vislumbra tais alegadas violações, assim estando o presente esteio do recurso condenado ao insucesso.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul ACORDAM EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 21 de Maio de 2015



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)