Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09850/16
Secção:CT
Data do Acordão:10/13/2016
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:ANULAÇÃO DA VENDA/ TEMPESTIVIDADE/ NULIDADE
Sumário:I - Na sequência da suspensão do procedimento da venda pelo pagamento por conta que satisfaça os requisitos do n.º 4 do art. 264.º do CPPT e sendo a modalidade da venda a de propostas por carta fechada, impõe-se que o órgão da execução fiscal comunique ao executado o dia e hora da abertura das propostas.
II - No caso concreto, aos executados não foi dado conhecimento da nova data da venda marcada para o dia 10/08/15, demonstrando-se que efectivamente os executados só em 21/10/15 tomaram conhecimento que a venda foi realizada em 10/08/15.
III – Assim sendo, dispondo os executados do prazo de 15 dias (artigo 257º, nº1, alínea c) e nº 2 do CPPT) para apresentar, junto do competente serviço, o pedido de anulação de venda, tal prazo foi observado, já que a petição foi apresentada em 6/10/15, precisamente o último dia em que podia ser apresentada.
IV - A falta comunicação a que alude o ponto I, porque susceptível de influir na venda, constitui nulidade que determina a anulação deste acto e, consequentemente, a anulação da venda, tudo nos termos do disposto nos arts. 195.º, n.º 1, e 839.º, n.º 1, alínea c), do CPC.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

N... e T..., melhor identificados nos autos, apresentaram reclamação, nos termos do artº 276º do CPPT, contra o despacho de indeferimento do pedido por si formulado de anulação da venda do imóvel penhorado no âmbito da execução fiscal nº ... e apensos, a correr termos no Serviço de Finanças de ....

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada julgou improcedente a reclamação deduzida, assim mantendo a decisão do órgão de execução fiscal que considerou extemporâneo o requerimento de anulação de venda apresentado.

Inconformados com tal sentença, os Reclamantes, e ora Recorrentes, interpuseram recurso jurisdicional, formulando a final as seguintes conclusões:

1. Os executados foram notificados em 03/03/2015 do despacho que ordena a venda em leilão da sua casa de morada de família no âmbito do processo de execução fiscal objeto dos autos;

2. Em 29/05/2015 os executados procederam ao pagamento parcial, em quantia superior a 20%, da quantia exequenda;

3. Tal facto é suscetível de fazer suspender o procedimento da venda;

4. Resulta do artigo 220.º do CPC ex vi 2.º e) do CPPT que os executados deveriam ter sido notificados do levantamento da suspensão e consequente agendamento da venda judicial.

5. Não o tendo sido, ficou limitado o exercício de direitos eventualmente capazes para pôr termo ao processo.

6. O prazo previsto no artigo 257.º n.º 2 é um prazo relativamente curto tendo em vista a segurança jurídico dos interesses de ordem publica.

7. Que colide com o interesse dos aqui recorrentes não lhe sendo oponível quando aos mesmos não foram dadas todas as garantias de oposição ao processo executivo.

8. A venda judicial é um acto jurisdicional e como tal está condicionada pelo disposto no artigo 138.º do CPC.

9. Porém, e ainda assim, a venda ocorreu a 10/08/2015, por isso em férias judiciais.

10. Mesmo que se entenda que os executados deveriam ter representado a possibilidade de a venda vir a ocorrer logo após o levantamento da suspensão, não lhes é exigível, como não seria de esperar do homem médio, que representassem a possibilidade desta venda ser feita em férias judiciais.

11. A omissão da notificação da data da venda constitui indubitavelmente uma preterição de uma formalidade legal que os executados apenas tomaram consciência quando tiveram conhecimento da venda que não lhes foi anunciada.

12. O que apenas veio a acontecer quando a autoridade tributária notificou os executados da venda, ou seja, a 21/09/2015.

13. Ao fazer tábua rasa da informação constante dos autos e que constituem prova por confissão pela recorrida dos factos alegados pelos recorrentes o Tribunal a quo andou mal.

14. E interpretou a norma prevista no n.º 2 do artigo 257.º do CPPT sabendo que os executados não sabiam da data da venda do imóvel, de forma inconstitucional.

15. Violando os princípios basilares da tutela jurisdicional consignados no artigo 20.º da constituição da república portuguesa.

16. Concluindo-se portanto que a petição é tempestiva. Sem prescindir,

17. O Tribunal "a quo" assenta a sua convicção de extemporaneidade única e exclusivamente no facto de entender que o único elemento probatório que os ora recorrentes juntaram aos autos para corroborar tais alegações foi o talão de atendimento do serviço de finanças.

18. Não tido em consideração quer os factos remanescentes expostos quer a demais prova produzida e junta ao processo executivo.

19. O talão comprovativo da sua presença no serviço de finanças não foi tido em consideração,

20. E nem foi tido em consideração pelo Tribunal a quo a dificuldade da produção de prova que resulta deste tipo de alegações.

21. Valoração essa que passaria pela diminuição da exigência probatória.

22. Sob pena de a douta sentença violar os preceitos constitucionais de direito e tutela jurisdicional efetiva e o direito a um processo justo e equitativo. Ademais,

23. Atendendo à função jurisdicionais e social dos tribunais e ainda ao que a este respeito dispõem os artigos 411.º e 526.º do CPC ex vi artigo 2.º e) do CPPT, o Tribunal a quo podia e devia convidar as partes a instruir o processo de forma a carrear elementos essenciais à justa composição do litígio.

24. E ainda ordenando oficiosamente as diligências que lhe parecessem adequadas ao mesmo fim.

25. Ao não o fazer incorreu numa nulidade processual e,

26. Numa violação grave da proteção dos direitos, liberdades e garantias dos aqui executados que lhe incumbia.

27. Por outro lado, o Tribunal a quo veio-se ainda pronunciar no sentido de que os argumentos usados para pedir a anulação da penhora não são sequer suscetíveis de serem conhecidos em sede de impugnação pois que teriam de ter sido invocados em sede de oposição à penhora.

28. O que os executados não concedem.

29. Os executados não se opõe à penhora do imóvel mas sim à sua venda.

30. Venda essa que, face à existência de outros bens suscetíveis de pagar a quantia exequenda, tornam esta venda completamente desproporcional.

31. E por isso, legalmente inadmissível.

32. Pelo que, podia e devia aquele tribunal ter conhecido da ilegalidade suscitada

Justiça!


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Não foram apresentadas contra-alegações.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de não ser concedido provimento ao recurso.

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Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente, vem o processo submetido à Secção de Contencioso Tributário para julgamento do recurso.


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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida:

A - Em 03/06/2008 foi instaurado no Serviço de Finanças de ... o processo de execução fiscal nº ... em nome de N... por dívida de IMI no montante de € 201,39 (cfr. fls. 1/2 do processo de execução fiscal em apenso).

B - Em 05/08/2013 foi registada na Conservatória do Registo Predial de ... a penhora efetuada em 06/07/2013 a favor da Fazenda Nacional para garantia do pagamento da quantia exequenda de € 1.096,67 como consta de fls. 15 do apenso).

C - No Serviço de Finanças de ... foi lavrado o termo de apensação com o seguinte teor “Aos vinte e dois dias do mês de Agosto de 2013 são considerados apensos os autos relativos aos processos executivos nºs......., de acordo com o disposto no artigo 179° do CPPT e se encontrarem englobados na mesma penhora (fase F500), ficando a dívida a prevalecer pela quantia exequenda total no montante de € 798,49 (setecentos e noventa e oito euros e quarenta e nove cêntimos).” (cfr. fls. 6 do apenso).

D - Em 09/10/2013 o ora reclamante foi citado nos seguintes termos:

“Assunto: CITAÇÃO PESSOAL - N° 2 ART. 193° CPPT/NOTIFICAÇÃO DE PENHORA

2ª Citação nos termos do nº 3 do art° 192° do CPPT (*)

PROC.EXECUTIVOS Nº ...

PROVENIÊNCIAS: IMI e Coimas em processos de CO

Pela presente, fica citado/notificado, nos termos do nº2 do artigo 193° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e do art. 36º da mesma Lei, da penhora electrónica efectuada por este Serviço de Finanças nos termos do nº 2 do art. 215º CPPT, sobre o prédio urbano a que corresponde o artigo matricial nº 3945, fracção "C", da freguesia de ..., nos processos em referência, que aqui correm termos, para cobrança da respectiva dívida, ficando ainda nomeado na qualidade de fiel depositário (art. 233° do CPPT e 843° do CPC).

Poderá, querendo, apresentar reclamação para o Tribunal Administrativo e Fiscal, nos termos do artigo 276° do CPPT, no prazo de 10 dias a contar da presente citação/notificação.

Caso ainda não tenha sido realizada anteriormente a citação deverá, no prazo de 30 dias a contar da presente citação, proceder ao pagamento da dívida e acrescido, ou, querendo, requerer o pagamento em prestações se legalmente aplicável (art. 196° CPPT), a dação em pagamento (art. 201º CPPT), ou ainda, deduzir oposição judicial (art. 204° CPPT).

Decorrido aquele prazo sem que tenha sido efectuado o pagamento, nem tenha sido deduzida oposição judicial com prestação de garantia (art. 169º CPPT), a execução prosseguirá para venda coerciva, sendo o montante resultante da mesma, aplicado nos processos executivos em causa.

Á data desta notificação o valor de quantia exequenda em dívida é de € 798,46 sendo o valor total de € 1.265,50 [Este valor não é definitivo, na medida em que os juros de mora continuam a vencer por cada mês de calendário ou fracção e as custas são liquidadas em função da fase processual. Sobre as coimas e multas não incidem juros de mora]” (cfr. teor de fls. 23 e assinatura do aviso de citação de fls. 27 do apenso).

E - Em 25/02/2015 foi proferido despacho pela chefe do serviço de finanças de ... a determinar a venda judicial do bem penhorado e melhor identificado na alínea antecedente, por leilão eletrónico (cfr. teor de fls. 35/37 do apenso).

F - Em 03/03/2015 foi o ora reclamante notificado do despacho que determinou a venda judicial e da nomeação de fiel depositário (cfr. teor de fls. 39 e assinatura do aviso de receção de fls.41 do apenso).

G - Em 10/08/2015 foi realizada a venda tendo o imóvel referido em D) sido vendido ao B..., SA pelo valor de € 59.400,00 como consta do auto de adjudicação lavrado em 24/08/2015 a fls. 127 do apenso.

H - Em 06/10/2015 foi enviada por fax dirigido à Chefe do Serviço de Finanças de ... a petição de anulação de venda como consta de fls. 158/169 cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

I - Em 09/10/2015 foi enviada através de registo postal dirigido à Chefe do Serviço de Finanças de ... a petição de anulação de venda como consta de fls. 101/138 cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

J - Em 16/11/2015 foi proferida informação na Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de ... defendendo a extemporaneidade do pedido de anulação da venda como consta de fls. 142/146 cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

K - Por despacho de 01/12/2015 da Diretora de Finanças de ... foi indeferido o pedido de anulação de venda (cfr. fls. 142)

L - Em 17/12/2015 foi o ora reclamante notificado do despacho mencionado na alínea anterior (cfr. teor de fls. 151 e assinatura do aviso de receção de fls. 151/verso).

M - Em 16/12/2015 foi enviada através de registo postal a notificação do despacho mencionado em K) à mandatária do ora reclamante (cfr. fls. 152).

N - Em 04/01/2016 deu entrada a petição de reclamação de fls. 5/8 e posteriormente aperfeiçoada a fls. 285/304.


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A convicção do tribunal formou-se com base na prova documental junta ao processo pelas partes e que não foi impugnada.

Não foi requerida pelas partes prova testemunhal.

Os factos acima elencados tiveram por base os documentos que os suportaram e que se encontram expressamente referidos em cada uma das alíneas do probatório.


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Não se mostra provado o teor da informação prestada pela funcionária da administração tributária invocada no artigo 5º e artº 9º da petição. Os reclamantes não juntaram documentos para a prova de tais factos (à exceção de um talão de atendimento com a data de 27/05/2015 mas sem qualquer valor probatório para o efeito) e não tendo arrolado testemunhas.

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2.2. De direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Ora, lidas as conclusões das alegações de recurso, resulta claro que está em causa saber se o Tribunal a quo errou ao confirmar a decisão do órgão da execução fiscal no sentido de o requerimento de anulação de venda ter sido apresentado fora do prazo legal, concretamente por ter sido ultrapassado o prazo de 15 dias a que alude a alínea c), do nº1 do artigo 257º do CPPT.

Vejamos o que se nos oferece dizer a este propósito.

Antes, porém, importa que deixemos devida nota daquele que foi o percurso argumentativo seguido na sentença recorrida.

Assim, pode ler-se na decisão proferida pela Mma. Juíza do TAF de Almada, além do mais, o seguinte:

“(…)

Dispõe o art. 257.° do Código de Procedimento e Processo Tributário sob a epígrafe “Prazos de anulação da venda”:

1- A anulação da venda só poderá ser requerida dentro dos prazos seguintes:

a) De 90 dias, (...);

b) De 30 dias, (...);

c) De 15 dias, nos restantes casos previstos no Código de Processo Civil.

2 — O prazo contar-se-á da data da venda ou da que o requerente tome conhecimento do facto que servir de fundamento à anulação competindo-lhe provar a data desse conhecimento, ou do trânsito em julgado da acção referida no nº 3.

3— (…)”.

Os reclamantes afirmam que o prazo de que dispunham para requerer a anulação da venda é de 15 dias nos termos do art. 257.°, n.° 1, alínea c) do CPPT.

Contudo, os reclamantes invocam que só em 21/09/2015 tiveram conhecimento da data da venda do imóvel, pelo que, consideram tempestiva a petição de anulação da venda que enviaram por fax em 06/10/2015.

Ao invés, a Fazenda Pública considera que o prazo de 15 dias deve ser contado da data da venda, e tendo esta sido efetuada em 10/08/2015 (em férias judiciais), o prazo para apresentação do pedido de anulação iniciou-se a 01/09/2015, pelo que a petição apresentada mostra-se intempestiva.

Os ora reclamantes afirmam que “ao serem notificados da venda, o requerente marido dirigiu-se ao Serviço de Finanças do ... (…) com o intuito de regularizar a situação tributária e impedir a venda do imóvel (…) como tal procedeu ao pagamento da totalidade os processos de execução fiscal nº … (…) e apesar de saber da existência de mais processos, a funcionária da autoridade tributária que o atendeu assegurou-lhe que uma vez pagos os processos que serviram de base à venda o processo ficaria resolvido e, consequentemente, a venda ficaria sem efeito” e invocam só ter tido conhecimento da venda do imóvel a 21/09/2015.

Nos termos do transcrito nº 2 do art. 257º do CPPT, a regra da contagem do prazo para a apresentação do requerimento de anulação da venda será a data da venda. Só não será desde essa data, caso o requerente tenha tido conhecimento do facto que servir de fundamento à anulação em data posterior, competindo-lhe provar a data desse conhecimento.

No caso em apreço os reclamantes pretendem que a contagem do prazo de 15 dias se faça a partir da data em que, segundo eles, tiveram conhecimento da venda.

No entanto, atendendo à regra do ónus da prova, nos termos do art. 342º do Código Civil, caberia aos reclamantes provarem os factos que invocam, designadamente a alegada informação prestada pela funcionária, não o tendo feito como referido a propósito dos factos não provados.

Na verdade do probatório supra resulta que o ora reclamante em 09/10/2013 foi citado, não só da instauração dos processos nº ... mas também da penhora eletrónica sobre o prédio urbano inscrito na matriz predial nº 3945, fração “C” da freguesia de ..., nos processos em referência (como resulta da alínea D) do probatório). Assim, o argumento apresentado pelos reclamantes no sentido de que, tendo sido pagos os processos nº …, teria a funcionária informado que uma vez pagos os processos que serviram de base à venda, o processo ficaria resolvido e consequentemente a venda ficaria sem efeito, só tendo tido conhecimento da venda na data de 21/09/2015 não colhe. A ser verdade que a funcionária prestou tal informação (facto não provado como já afirmámos), no entanto, o reclamante tinham conhecimento de que estavam inicialmente pendentes cinco processos executivos em relação aos quais foi efetuada a penhora do imóvel, e só tendo procedido ao pagamento da dívida exequenda de dois deles, necessariamente os restantes prosseguiriam seus termos.

Tendo dúvidas sobre o efeito do pagamento que efetuaram e das suas consequências relativamente à penhora do imóvel, uma vez que se tratava da casa de morada de família, deveriam, na dúvida, ter solicitado informação por escrito sobre a sua situação tributária.

Por outro lado quanto aos demais fundamentos que invocam na petição aperfeiçoada e à semelhança dos invocados na petição de anulação da venda, os reclamantes na verdade invocam factos relacionados com a penhora e seu eventual excesso, ora, não só sobre essa matéria não existiu pronúncia do órgão de execução fiscal que possa ser sindicada pelo tribunal nos termos do art. 276º do CPPT, como, o conhecimento da penhora e sua extensão ocorreu em 09/10/2013 (cfr. alínea D) do probatório), não tendo os reclamantes reagido contra a mesma.

O tribunal considera, face ao exposto, que os reclamantes não lograram provar o conhecimento da data da venda em 21/09/2015, razão pela qual se aplica a regra geral de contagem do prazo de 15 dias a partir da data da venda (cfr. conjugação da alínea c) do nº 1 do art. 257º do CPPT com o nº 2 da mesma disposição legal e com as regras do ónus da prova previstas no Código Civil).

Desta forma, o prazo de 15 dias conta-se a partir da data da venda (10/08/2015 – cfr. alínea G) do probatório) e coincidindo tal dia com férias judiciais, o prazo iniciou-se a 01/09/2015. Atendendo que a petição de anulação da venda foi enviada por fax em 06/10/2015 (alínea H) do probatório), verifica-se que a mesma ultrapassou largamente o prazo de 15 dias, sendo extemporânea.

Face ao exposto conclui-se que a decisão proferida pelo órgão de execução fiscal ao considerar a petição extemporânea não padece de qualquer ilegalidade, devendo por isso manter-se”.

Vejamos, então.

Fazendo apelo ao disposto no artigo 257º, nº1, alínea c) e nº 2 do CPPT, considerando que a data da venda ocorreu em 10/08/15 e que os Recorrentes não provaram que apenas tiveram conhecimento dessa data em 21/09/15, o TAF de Almada veio a confirmar o juízo de intempestividade da apresentação do pedido de anulação de venda.

As partes estão de acordo quanto ao prazo aplicável no caso, ou seja, o previsto na alínea c) do nº1 do artigo 257º do CPPT e até estão de acordo – pelo menos, em abstracto - quanto ao termo inicial de contagem desse prazo, ou seja, a data da venda.

O que opõe os Recorrentes, quer à decisão reclamada, quer à sentença do TAF de Almada, é o momento em que os executados tiverem conhecimento da venda, pois, como é bom de ver, a exigência do cumprimento do prazo de 10 dias contado do dia 10/08/15 (i.e, da data da venda) só fará sentido se o executado teve conhecimento que a venda se realizou nessa data. Dito de outro modo, haverá consequências a extrair, em termos de caducidade do direito de requerer a anulação da venda, da circunstância de o Requerente ter tido conhecimento da venda posteriormente à sua realização.

Com efeito, apesar de efectivamente a venda do imóvel penhorado ter tido lugar em 10/08/15, o que os Reclamantes alegavam é que não tiveram conhecimento de que a venda iria ter lugar nessa data e que apenas tomaram conhecimento que a venda se realizou naquela data quando, em 21/09/15, lhes foi comunicado pelo Serviço de Finanças do ... que o imóvel havia sido vendido e para procederem à entrega das chaves do imóvel.

Esta alegação dos Reclamantes, como está bom de ver, não serviu para convencer o Tribunal, pois que, como resulta da sentença, ficou por provar que, como invocavam, lhes teria sido transmitida uma informação, por parte de uma funcionária do Serviço de Finanças, no sentido de que, em face de um pagamento parcial efectuado na execução fiscal, a venda ficaria suspensa. E, sem esta prova, a Mma. Juíza a quo resolveu a questão da tempestividade da apresentação do pedido de anulação de venda em desfavor das pretensões dos ora Recorrentes.

Ora, em nossa opinião, a questão em análise terá que ser apreciada sob um diferente enfoque daquele que foi evidenciado na sentença.

Para tanto, será necessário ter presente algumas ocorrências processuais que não foram incluídas na matéria de facto e que passaremos a considerar, sendo que, para tanto, lançaremos mão da indicação pormenorizada que foi feita pela Divisão de Justiça Tributária, da Direcção de Finanças de ..., na informação aí prestada, em 16/11/15, a qual serviu de base ao despacho de indeferimento do pedido de anulação de venda, proferido em 11/12/15, pela Directora de Finanças.

Assim, em tal informação, junta a fls. 142 a 146 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, consta, além do mais, o seguinte:

“(…)

Por despacho de 25-02-15 foi determinado pela Chefe do Serviço de Finanças do ... a marcação da venda, determinando que a mesma seria realizada nos seguintes termos:

“1º Por leilão electrónico, conforme estipulado na Portaria 219/211 de 1 de Junho, devendo o mesmo decorrer entre o dia 2015-06-24 pelas 10:00 horas, e termina no dia 2015-07-09 às 10:00 horas (15 dias), sendo o valor de base a anunciar o correspondente a 70% do valor patrimonial determinado/ fixado nos termos do artigo 250º do CPPT.

2º Caso se verifique a inexistência de propostas no leilão electrónico, determino que a venda se realize por meio de proposta em carta fechada, a decorrer nos 15 dias seguintes ao termo do leilão. As propostas que sejam apresentadas presencialmente no Serviço de Finanças ou via CTT, terão de ser rececionadas até às 16:00 horas do dia anterior ao da abertura das propostas, sendo o valor base a anunciar o correspondente a 50% do valor base determinado/ fixado nos termos do artº 250º do CPPT.

3º Inexistindo propostas nas situações anteriormente referidas, determino que a venda se realize através da abertura de novo leilão electrónico, que decorrerá nos 15 dias seguintes ao termo da abertura das propostas, adjudicando-se o bem à proposta de maior valor.”

Deste despacho foi o executado notificado em 2015-03-03, através do ofício nº 2536 de 25-02-2015, do Serviço de Finanças do ....

Em 29-05-2015 o executado efectuou o pagamento parcial no montante de € 745,94, pelo que, nos termos do nº4 do artº 264º do CPPT a venda foi suspensa por um período de 15 dias.

Em 24-07-2015 (15 dias após a data inicialmente marcada de 09-07-2015, devido à suspensão de 15 dias entretanto verificada) procedeu o Serviço de Finanças à abertura da venda, tendo verificado que não existiam propostas, pelo que, nos termos do despacho de marcação da venda foi marcada nova venda, por propostas em carta fechada, para o dia 10-08-2015.

O Serviço de Finanças do ... procedeu, em 2015-08-10, à venda (com o nº 3697.2015.427) por proposta em carta fechada, do prédio urbano inscrito na respectiva matriz urbana da freguesia da ..., concelho do ..., sob o artigo 3945 fracção C.

Na data designada para a abertura das propostas verificou-se que a proposta de valor mais elevado, no valor de € 59.400,00 foi a apresentada pelo B..., tendo-lhe sido adjudicado o imóvel.

Em 24-08-2015 foi emitido o Auto de Adjudicação.

Através do ofício nº 9589 de 18-09-2015 do Serviço de Finanças do ... foi o executado notificado de que o imóvel havia sido vendido e de que deveria proceder à entrega das chaves do imóvel.

(…)”

Ora, a leitura das referidas ocorrências processuais, conjugadas com a matéria de facto constante da sentença e, tudo isto, devidamente concatenado com a alegação dos Reclamantes, ora Recorrentes, permite-nos perceber que a razão está do seu lado.

Vejamos.

Afirmam os Recorrentes que, quando tomaram conhecimento de que a venda se realizaria, por leilão electrónico, entre finais de Abril e inícios de Julho (o que se verificou através de ofício de Fevereiro de 2015), dirigiram-se, em Maio de 2015, ao Serviço de Finanças e aí efectuaram um pagamento parcial da dívida exequenda, no montante de € 745,94, concretamente da dívida correspondente a dois dos processos apensos ao principal.

De forma algo imprecisa, é certo, afirmam que a funcionária que os atendeu lhes terá dito que o “processo ficaria resolvido” e que, consequentemente, “a venda ficaria sem efeito”. Propuseram-se demonstrar tal circunstancialismo juntando a prova do dito pagamento parcial e a senha de presença no Serviço de Finanças, com data de 27/05/15.

Esta alegação, no que se refere às informações prestadas pela dita funcionária, não foi considerada provada pelo Tribunal a quo, com as consequências que já sabemos.

Contudo, tal alegação – que, não se desconsidera, é imprecisa e incipiente – não nos deve afastar daquilo que efectivamente foi sucedendo no processo de execução, onde se verificaram ocorrências que, bem vistas as coisas, explicarão a alegação aqui feita sobre o convencimento dos Recorrentes em resultado de uma informação que terá lhes sido prestada (desvalorizando, naturalmente, a imprecisão decorrente da falta de conhecimentos técnicos/ jurídicos susceptíveis de comprometerem a cabal apreensão de uma informação que possa ser prestada relativamente à tramitação da venda na execução fiscal).

Ora, referimo-nos aqui precisamente ao facto de, como os competentes serviços atestam, os executados terem efectuado um pagamento parcial da dívida exequenda, em Maio de 2015, pagamento este superior a 20% do total em dívida, o qual determinou, nos termos do disposto no nº4 do artigo 264º do CPPT, a suspensão do procedimento de venda do processo de execução fiscal, por um período de 15 dias.

Efectivamente, no âmbito da execução fiscal, foi pago o montante de € 745,94 e, nos termos do artigo 264º, nº4 do CPPT, a venda foi suspensa por um período de 15 dias. Ora, a esta suspensão se quereriam referir os Requerentes quando, repete-se, de forma algo imprecisa, se reportaram às informações da senhora funcionária das finanças.

Portanto, e até aqui o que temos é que a venda, por leilão electrónico, que devia decorrer até ao dia 09/07/15, foi suspensa por 15 dias.

Importa, então prosseguir, para percebermos se efectivamente os Recorrentes, em momento anterior a 21/09/15, souberam que a venda (entretanto suspensa) veio a ser realizada em 10/08/15.

E, aqui, teremos novamente que lançar mão das ocorrências processuais verificadas na execução fiscal, tal como atestadas pelos competentes serviços, as quais estão suportadas nos elementos constantes do PEF apenso.

Ora, o que os autos demonstram é que, findo aquele período de suspensão, de 15 dias, precisamente em 24/07/15, o Serviço de Finanças procedeu “à abertura da venda, tendo verificado que não existiam propostas, pelo que, nos termos do despacho de marcação da venda foi marcada nova venda, por propostas em carta fechada, para o dia 10-08-2015” (cfr. informação transcrita).

E, efectivamente, como atestam os competentes serviços, “O Serviço de Finanças do ... procedeu, em 2015-08-10, à venda (com o nº 3697.2015.427) por proposta em carta fechada, do prédio urbano inscrito na respectiva matriz urbana da freguesia da ..., concelho do ..., sob o artigo 3945 fracção C” (cfr. informação transcrita).

Ora, nada nos autos nos revela que esta última data da venda foi comunicada aos executados. Pelo contrário, o que os autos evidenciam é que, após a venda, “Através do ofício nº 9589 de 18-09-2015 do Serviço de Finanças do ... foi o executado notificado de que o imóvel havia sido vendido e de que deveria proceder à entrega das chaves do imóvel” (cfr. informação transcrita).

Como está bom de ver, o referido ofício de 18/09/15 é o que suporta a alegação dos Recorrentes no sentido de que apenas tiveram conhecimento da venda em 21/09/15.

Apesar do que até aqui vimos, isso não responde ainda à questão que aqui releva para efeitos de aferir da tempestividade do pedido de anulação de venda, pois, em tese, é defensável que o executado não tenha sido notificado desta nova data da venda, nem que tivesse que o ser, pois, em resultado do pagamento parcial e da suspensão da venda, por 15 dias, facilmente poderia ter concluído sobre a data da venda, considerando até o que lhe havia sido comunicado quanto ao teor do despacho de 25/02/15 e ao procedimento de venda que então se projectava.

Mas não é assim, como veremos.

Aqui chegados, e antes de avançarmos para a solução do caso concreto, importa reter o que, a propósito suspensão do procedimento da venda previsto no artigo 264º, nº4 do CPPT, e muito claramente, se deixou dito no acórdão do STA, de 17/09/14, no processo nº 936/14, em que foi Relator o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Francisco Rothes.

Assim, aí se lê, além do mais, o seguinte:

“Eis-nos, finalmente, chegados à questão central do recurso, que é a de saber se a suspensão do procedimento da venda prevista no n.º 4 do art. 264.º do CPPT impõe alguma comunicação ao Executado que tenha feito o pagamento por conta aí previsto, designadamente quanto ao período de suspensão, à sua cessação ou à data da venda após o seu termo.

(…)

Vejamos:

A Lei do Orçamento do Estado para 2012, aditou ao art. 264.º um n.º 4 do seguinte teor: «Sem prejuízo do disposto no n.º 2, o pagamento de um valor mínimo de 20 % do valor da dívida instaurada suspende o procedimento de venda desse processo de execução fiscal, por um período de 15 dias».

Ou seja, o legislador, por certo reconhecendo as dificuldades criadas pela crise económica, veio admitir um pagamento por conta com efeito suspensivo da venda. Ponto é que esse pagamento respeite os requisitos no n.º 2 do referido artigo (ou seja, que não seja inferior a 3 UC), e que corresponda no mínimo a 20% do valor em dívida (o que significa que esta possibilidade pode ser usada várias vezes).

Note-se que esse pagamento não suspende a execução fiscal, mas apenas o procedimento da venda. O que significa, para além do mais, que se a venda estava já marcada e se tinha já iniciado o prazo para apresentação de propostas, o pagamento por conta que respeite aqueles requisitos suspende o procedimento para a venda, que se retoma tão logo decorrido o prazo de 15 dias após o pagamento.

Decorrendo essa suspensão da lei, é defensável a tese sustentada pelas Recorrentes, de que não se impõe notificação alguma, quer relativamente à suspensão do procedimento da venda decorrente do pagamento previsto no n.º 4 do art. 264.º do CPPT, quer, na eventualidade da data para a venda ter já sido marcada, relativamente à data para a qual se transferirá a venda por força dessa suspensão.

Aliás, a Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) veiculou instruções nesse sentido, através do Ofício-Circulado n.º 60.089, de 2 de Maio de 2012, da Direcção de Serviços de Gestão dos Créditos Tributários (Que pode ser consultado, na íntegra, em http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/C7A4CAFF-67C9-4664-947C-ED936881C71F/0/of_circulado_60089.pdf.), onde salienta como efeitos daquele pagamento: «i) Nos casos em que a venda ainda não tenha sido publicitada, inibe a sua marcação e publicitação, por um período de 15 dias; ii) Nos casos em que a venda esteja marcada e publicitada mas ainda não esteja a decorrer o prazo para entrega de propostas, este prazo não poderá ser iniciado sem estarem decorridos 15 dias após o pagamento; iii) Nos casos em que já se iniciou o prazo para entrega de propostas, o pagamento suspende por um período de 15 dias, o procedimento de venda». Mais esclarece a ATA que «[n]os casos previstos no ponto iii) anterior face ao efeito suspensivo do pagamento do pagamento que cumpra os requisitos enunciados, fica inibida a apresentação de qualquer proposta nessa fase, mas mantém-se a venda publicitada no Portal, com a indicação do estado “venda suspensa até à data xxxx/xx/xx (correspondente ao 15.º dia após o pagamento) nos termos do n.º 4 do artigo 264.º do CPPT”. Em consonância, a data limite para apresentar propostas é alterada para o 15.º dia posterior à que estava prevista», e que «[f]indo o período de suspensão (e caso não se verifique novo pagamento por conta, de acordo com o n.º 4 do artigo 264.º), a venda volta automaticamente a estar activa, mantendo-se válidas as propostas apresentadas até à sua suspensão e permitindo a apresentação de novas propostas, durante o período de tempo (considerando os dias passados desde o início até à suspensão) que falta para perfazer o espectro temporal em que deve decorrer a venda».

É certo que estas instruções administrativas não se impõem à Executada e, muito menos, ao Tribunal (Cumpre ter presente que as instruções administrativas apenas são vinculativas para os serviços hierarquicamente dependentes do Serviço que as emitiu, tanto mais que o n.º 4 do art. 264.º do CPPT não dá abertura alguma, designadamente através da utilização de conceitos jurídicos indeterminados, para que a AT possa regulamentar o direito à suspensão do procedimento de venda. Por outro lado, as ordens internas da AT, seja qual for a forma que revistam – “despachos genéricos”, instruções, circulares ou outra – não são fontes de Direito Fiscal «porquanto a força vinculativa de tais diplomas se acha circunscrita a um sector da ordem administrativa. E essa mesma força vinculativa resulta tão-somente da autoridade hierárquica dos agentes de onde provêm, e dos deveres de acatamento dos subordinados aos quais se dirigem» (SOARES MARTÍNEZ, Direito Fiscal, 7.ª edição, pág. 111). Por isso, não vinculam os tribunais nem os particulares, apenas isentando estes de responsabilidade por actos praticados de acordo com estas instruções, quanto aos seus deveres fiscais acessórios (cfr. art. 74.º do CPT). A doutrina nelas veiculada apenas poderá convencer de que fazem a melhor interpretação da lei em razão da sua fundamentação.), mas a verdade é que as mesmas veiculam doutrina que subscrevemos, mas apenas para as situações nela previstas, que, como decorre do seu teor, são apenas aquelas em que a modalidade de venda é aquela que a lei actualmente estabelece como sendo a preferencial, ou seja, o leilão electrónico (n.º 1 do art. 248.º do CPPT). Foi essa a modalidade inicialmente escolhida pelo órgão da execução fiscal para proceder à venda (cfr. B.a dos factos provados).

Na verdade, nessas situações, a mera consulta no Portal das Finanças (www.portaldasfinancas.gov.pt), onde a Direcção-Geral dos Impostos disponibiliza a consulta dos anúncios de venda e da evolução do leilão (cfr. art. 3.º da Portaria n.º 219/2011, de 1 de Junho, que aprova os procedimentos e especificações técnicas a observar na realização da venda de bens penhorados em processo de execução fiscal através de venda judicial, na modalidade de leilão electrónico, prevista no art. 248.º do CPPT) permite saber qual o dia e hora do encerramento do leilão, até ao qual podem ser apresentadas as propostas de aquisição, e da decisão sobre a adjudicação dos bens (cfr. arts. 5.º, n.º 1, e 6.º, n.º 1, da referida Portaria).

Acontece, no entanto, que a modalidade da venda que ora está em causa não é o leilão electrónico, pois, nos termos do disposto no n.º 3 do mesmo artigo, em face da inexistência de licitações, o órgão da execução fiscal determinou que a venda passasse a ser efectuada mediante propostas em carta fechada (cfr. E.a e F dos factos provados).

Ora, esta modalidade de venda reveste algumas particularidades que imporão, ao contrário do que sucederia caso a modalidade de venda se mantivesse o leilão electrónico, a comunicação ao executado do dia e hora (o local, na falta de indicação em contrário, parece-nos poder considerar-se inalterado) para a abertura das propostas, a efectuar após o termo da suspensão do respectivo procedimento por força do disposto no n.º 4 do art. 264.º do CPPT. Procurando explicar:

Caso a modalidade para a venda se mantivesse o leilão electrónico, não se imporia qualquer notificação, sendo que a reactivação da venda se faria pelo mero decurso do prazo de 15 dias que a lei estabelece para suspensão do respectivo procedimento.

Mas, porque a modalidade da venda passou a ser a de propostas em carta fechada, pese embora a suspensão do procedimento da venda se tenha operado por força do pagamento por conta efectuado nos termos do n.º 4 do art. 264.º do CPPT em 3 de Maio de 2013 e tenha cessado 15 dias depois, tudo por força do disposto naquele preceito legal, a verdade é que (dando de barato que o local se manteria o anunciado) a Executada não podia adivinhar o dia e hora em que o órgão da execução fiscal se propunha proceder à abertura das propostas [tanto mais que o termo do prazo de suspensão, de acordo com a notificação feita à Executada recaía em dia não útil (cfr. G a G.b dos factos provados)].~

Por isso, nesta modalidade da venda, não será dispensável uma comunicação ao executado relativamente ao dia e hora para a abertura de propostas”.

Ora, recuperando tudo o que atrás dissemos sobre a evolução da tramitação dos autos de execução fiscal e tendo presente esta jurisprudência cujo sentido acolhemos na íntegra, somos levados a concluir que: por um lado, aos executados não foi dado conhecimento da nova data da venda marcada para o dia 10/08/15; por outro, que, tratando-se de venda a efectuar através de propostas em carta fechada, era obrigatória a sua comunicação; e, por fim, que efectivamente os executados só em 21/10/15 tomaram conhecimento que a venda foi realizada em 10/08/15.

Por conseguinte, dir-se-á, concluindo quanto à intempestividade do pedido de anulação de venda, que, ao contrário do decidido pelo órgão da execução fiscal e confirmado pelo TAF de Almada, o requerimento foi tempestivamente apresentado.

Na verdade, há que considerar que, dispondo os executados do prazo de 15 dias (artigo 257º, nº1, alínea c) e nº 2 do CPPT) para apresentar, junto do competente serviço, o pedido de anulação de venda, tal prazo foi observado, já que a petição foi apresentada em 6/10/15, precisamente o último dia em que podia ser apresentada.

Portanto, a sentença recorrida que confirmou o juízo de intempestividade sustentado no despacho reclamado errou no julgamento e, consequentemente, não pode manter-se.

Nesta conformidade, há que julgar procedente o recurso e revogar a sentença do TAF de Almada que constitui objecto do presente recurso jurisdicional.

Aqui chegados, uma questão se coloca de forma evidente.

É que, pelos específicos contornos da questão que aqui vinha suscitada, a análise e decisão sobre a tempestividade do pedido de anulação de venda, remete-nos, sem retorno, para a apreciação e decisão, a final, de um dos fundamentos do pedido de anulação de venda.

Vejamos, explicado detalhadamente o que pretendemos transmitir.

Lida a petição respeitante ao pedido de anulação de venda, na interpretação que dele fazemos, outra coisa não se pode concluir se não que (para além da invocação de um fundamento relativo à violação do princípio da proporcionalidade) os executados aí invocavam a preterição de formalidade consistente na não comunicação da nova data da venda.

É verdade, e não se desconsidera, que tal invocação não é expressamente apelidada de nulidade, nem é invocado o artigo 195º do CPC. Mas também é verdade que o Tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.

Ora, de volta ao requerimento de anulação da venda, quando os executados aí referem que (i) apenas com a notificação de Setembro de 2015 souberam da venda e de que o processo executivo prosseguiu os seus termos, que a (ii) venda do imóvel decorreu de um erro e que (ii) deve ser dada ao contribuinte um novo prazo para proceder ao pagamento da dívida, mais não estão que a invocar a preterição de uma formalidade, a omissão de uma actuação por parte dos serviços, que, de facto, influiu na venda cuja anulação pretendem.

Isto mesmo é, aliás retomado, em sede de recurso jurisdicional, como resulta do assim alegado: “os executados deveriam ter sido notificados do levantamento da suspensão e consequente agendamento da venda judicial; não o tendo sido, ficou limitado o exercício de direitos eventualmente capazes para pôr termo ao processo; a omissão da notificação da data da venda constitui indubitavelmente uma preterição de uma formalidade legal que os executados apenas tomaram consciência quando tiveram conhecimento da venda que não lhes foi anunciada”.

Ora, em bom rigor, a resposta a esta questão já foi dada por nós nas considerações que antecedem e que precederam a análise que agora efectuamos. Não há como evitar, in casu, que a análise e solução dada à questão da tempestividade, pela sua concreta motivação, responde, incontornavelmente, à apreciação da preterição de formalidade e às consequências daí decorrentes.

Na verdade, o resultado lógico e que, em termos jurídicos, decorre do exposto, só pode apontar num sentido, a saber: que a falta notificação da data da venda, na medida em que coarctou aos executados a possibilidade de saber até quando podiam proceder ao pagamento da dívida exequenda com vista a impedir a venda do imóvel penhorado (ou, até, se fosse o caso, saber até que momento podiam fazer um outro pagamento parcial e, assim, suspender a venda por mais 15 dias, ao abrigo do n.º 4 do art. 264.º do CPPT), constitui uma nulidade que, sendo susceptível de influir na decisão, ou seja, na venda, determina a anulação deste acto e, como consequência, a anulação da venda, como decorre do disposto nos arts. 195.º, n.º 1 - «Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa» - e do artigo 839.º, n.º 1, alínea c), do CPC - «1 - Além do caso previsto no artigo anterior, a venda só fica sem efeito: […] c) Se for anulado o acto da venda, nos termos do artigo 195.º”.

Portanto, como se vê, a resposta à questão da tempestividade do requerimento de anulação de venda condiciona, por si só, a sorte do fundamento da anulação da venda (na parte não relacionada com a violação do princípio da proporcionalidade). Atentas as especificidades do caso sub judice, a motivação subjacente à defesa da tempestividade do pedido e à anulação da venda, por preterição de formalidade essencial, encerra fundamentos que se sobrepõem ou, até, mais rigorosamente, que se equivalem.

Por conseguinte, fazendo apelo ao disposto no artigo 264º, nº4 do CPC e ao 195º e 839º, nº1, alínea c), do CPC, há que julgar procedente o pedido de anulação de venda, com as consequências expostas, tal como deixámos apontadas no parágrafo precedente.

3 - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e, em substituição, julgar procedente a nulidade correspondente à falta de notificação da data da venda, daí decorrendo, nos termos do artigo 195º, nº1 do CPC, a anulação dos termos subsequentes à preterição da formalidade omitida, com a consequente anulação da venda.

Custas pela Recorrida em ambas as instâncias.


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(Catarina Almeida e Sousa)

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(Bárbara Tavares Teles)

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(Pereira Gameiro)