Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:33/19.3BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:11/14/2019
Relator:VITAL LOPES
Descritores:DECISÃO ARBITRAL;
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário:1. Os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais arbitrais para os T. C. Administrativos, consistem na impugnação de tal decisão, consagrada no artº.27, com os fundamentos que se ancorem nos vícios de forma expressamente tipificados no artº.28, nº.1, do RJAT, correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos Tribunais tributários, nos termos do plasmado no artº.125, nº.1, do C.P.P.T., com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do artº.615, nº.1, do C. P. Civil.
2. Haverá omissão de pronúncia, susceptível de demandar a nulidade de sentença (artsº 125º do Código de Procedimento e Processo Tributário e 615º n.º 1 al. d) do Código de Processo Civil) sempre que o tribunal não tome posição sobre qualquer questão que devesse conhecer e que se não mostre prejudicada pelo conhecimento e decisão porventura dado a outras, nomeadamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1 – RELATÓRIO

CENTRO DE LINGUAS DE OLIVEIRA DE AZEMÉIS, vem, ao abrigo do disposto no artigo 27.º e 28.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (doravante RJAT), aprovado pelo D.L.n.º10/2011, de 20 de Janeiro, impugnar a decisão arbitral proferido no processo n.º302/2016 – T, pelo Tribunal Arbitral Singular constituído junto do Centro de Arbitragem Administrativa (doravante CAAD).

A Impugnante termina as alegações da impugnação formulando as seguintes Conclusões:
«
I. A presente impugnação estriba-se na alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, por se entender que a decisão arbitral impugnada incorreu em omissão de pronúncia;

II. A questão colocada ao Tribunal Arbitral não se referiu apenas ao enquadramento da Requerente no regime geral de IRC, quanto à isenção da sua actividade de prestação de serviços de ensino, e tributação da sua actividade de acordo com as normas do artigo 3.º, n.º 1 alínea a) e n.º 4 do CIRC;

III. A Requerente solicitou pronúncia arbitral, essencialmente, contra a não aplicação pela AT do disposto no artigo 54.º, n.º 3 do CIRC em relação a determinados rendimentos recebidos para a prossecução dos seus objectivos estatutários.

IV. Foi pedida pronúncia arbitral sobre a não inclusão no lucro tributável de € 75.000,00 de subsídio recebido em 2014 atribuído pela Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis, e de € 347,00 de quotas dos associados recebidas nesse mesmo ano.

V. E saber se tais rendimentos deveriam ter sido qualificados como rendimentos não sujeitos a IRC nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 54.º do CIRC.

VI. A questão cuja pronúncia se considera omitida foi apresentada e alegada nos artigos 19., e 24. a 30 da petição inicial de pronúncia arbitral.

VII. E foi expressamente impetrada decisão sobre esta matéria no pedido formulado no final do Requerimento Inicial.

VIII. A decisão arbitral não se pronuncia sobre a questão acabada de referir, apenas se pronunciando sobre o enquadramento geral da Requerente em sede de IRC, ou seja, sobre a sua sujeição ao regime geral deste imposto, nos termos do disposto no artigo 3.º,
n.º 1, alínea a) e n.º 4 do CIRC.

IX. A Decisão Arbitral impugnada incorreu, assim, em omissão de pronúncia de deve ser anulada.

X. E deve ser determinado o regresso do processo ao CAAD para que seja tomada a decisão omitida.
Como é de inteira JUSTIÇA!».

A entidade impugnada, Autoridade Tributária e Aduaneira, não apresentou contra-alegações.

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal foi notificado nos termos do disposto no artigo 146.º, n.º1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aplicável “ex vi” artigo 27.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), não tendo emitido pronúncia.

Colhidos os vistos dos actuais Senhores Juízes-Desembargadores Adjuntos, cumpre decidir.

2 – FUNDAMENTAÇÃO

De facto

Nos termos do art.º 663º, n.º6, do CPC, remete-se para a matéria de facto fixada na decisão impugnada.

De direito

Como se deixou consignado no acórdão desta secção proferido em 18/04/2018, no proc.º121/17.0BCLSB,

«O regime da arbitragem voluntária em direito tributário foi introduzido pelo RJAT, sendo que os Tribunais arbitrais têm competência para apreciar um conjunto vasto de pretensões, as quais vêm taxativamente elencadas na enumeração constante do artº.2, nº.1, do citado diploma. Mais se dirá que o Tribunal arbitral tem a obrigação de decidir em conformidade com o direito constituído e não com recurso à equidade (cfr.artº.2, nº.2, do RJAT).

Os princípios processuais inerentes ao processo arbitral vêm referidos e elencados no artº.16, do RJAT, e, genericamente, são os mesmos princípios que se aplicam a um processo de partes, de que é exemplo o processo civil.

No que toca à possibilidade de recorrer de uma decisão proferida por um Tribunal arbitral pode, desde logo, referir-se que esta é muito limitada.

Assim, quando se tiver em vista controlar o mérito da decisão arbitral, isto é, o seu conteúdo decisório, o meio mais adequado para colocar em crise a decisão arbitral será o recurso.

Com efeito, em conformidade com o que se dispõe no artº.25, nº.1, do RJAT, é possível recorrer directamente para o Tribunal Constitucional da parte da decisão arbitral que ponha termo ao processo e que recuse a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, bem como nos casos em que aplique uma qualquer norma jurídica cuja inconstitucionalidade seja levantada no decurso do processo.

Por outro lado, admite-se ainda a possibilidade de recurso com fundamento em oposição de acórdãos, isto nos termos do que determinam os nºs.2 e 3, do artigo em apreço. Este recurso é endereçado à Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sempre que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida estiver em oposição, relativamente à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido ou pelo Tribunal Central Administrativo ou Supremo Tribunal Administrativo. Neste caso, os trâmites do recurso a observar são os do regime dos recursos para uniformização de jurisprudência, aplicando-se o disposto no artº.152, do C.P.T.A.

Note-se que, em termos práticos, só há uma via de recurso: ou directamente para o Tribunal Constitucional, com fundamento em (in) constitucionalidade, ou directamente para o Supremo Tribunal Administrativo, em caso de oposição de acórdãos.

Pelo contrário, quando se pretenda controlar a decisão arbitral em si, nos seus aspectos de competência, procedimentais e formais, o meio adequado será já a impugnação da decisão arbitral (cfr.artºs.27 e 28, do RJAT).

Nos termos da lei, a regra é que é possível que a decisão do Tribunal arbitral seja anulada pelo Tribunal Central Administrativo competente. Esta impugnação - que em bom rigor se trata de um recurso - deve ser deduzida, sob pena de não admissão por intempestividade, no prazo de quinze dias contados da notificação da decisão arbitral, ou da notificação referida no artº.23.º, do diploma em apreço. Porém, neste último caso, a decisão arbitral terá que ter sido proferida por Tribunal colectivo, cuja constituição tenha sido requerida nos termos do artº.6, nº.2, al. b), do RJAT.

Já no que toca aos fundamentos da impugnação da decisão arbitral, vêm estes elencados no texto do artº.28, nº.1, do RJAT. São eles, taxativamente, os seguintes:
1-Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
2-Oposição dos fundamentos com a decisão;
3-Pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia;
4-Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artº.16, do diploma.

Ou seja, os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais arbitrais para os T. C. Administrativos, consistem na impugnação de tal decisão, consagrada no artº.27, com os fundamentos que se ancorem nos vícios de forma expressamente tipificados no artº.28, nº.1, e atrás elencados, correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos Tribunais tributários, nos termos do plasmado no artº.125, nº.1, do C.P.P.T., com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do artº.615, nº.1, do C. P. Civil.

E se algumas dúvidas pudessem subsistir sobre o que se vem de afirmar, elas dissipar-se-iam por força dos elementos sistemático, teleológico e histórico, considerando, por um lado, o regime jurídico dos vícios em causa, tal como disciplinado pelo C.P.P.T., e, por outro, a intenção do legislador expressamente manifestada na parte preambular do diploma em causa, quando e ao que aqui releva, refere que “(…) A decisão arbitral poderá ainda ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo com fundamento na não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, na oposição dos fundamentos com a decisão, na pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia ou na violação dos princípios do contraditório e da igualdade de partes (…)”. Assim manifestando o legislador, de forma inequívoca, uma enumeração taxativa dos fundamentos de impugnação das decisões arbitrais para os T. C. Administrativos (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/2/2013, proc.5203/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 21/5/2013, proc.5922/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/9/2013, proc.6258/12; Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, pág.234 e seg.)» (fim de cit.).

Como também tem sido entendimento deste Tribunal, a decisão arbitral poderá ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo com fundamento na pronúncia indevida. E no conceito de “pronúncia indevida”, para além do excesso de pronúncia, incluem-se as situações em que o tribunal arbitral funcionou de modo irregular ou em que excedeu a sua competência – vd., entre outros, o Acórdão deste TCA Sul, de 06/09/2016, tirado no proc.º09156/15.

Feitos os considerandos julgados pertinentes, é esta a nulidade invocada pela entidade impugnante: omissão de pronúncia. Vejamos.

Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al. d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra, os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por um lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr. Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).

No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr. Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.7029/13).

No regime de arbitragem voluntária em direito tributário, a nulidade da decisão arbitral derivada do vício de omissão de pronúncia está consagrada no artº.28, nº.1, al. c), do R.J.A.T. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/06/2014, proc.7084/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/03/2016, proc.8981/15).

Pois bem, conforme se alcança das alegações e conclusões da impugnação, o vício de omissão de pronúncia que vem imputado à decisão arbitral assenta na falta de conhecimento da questão da “não aplicação pela AT do disposto no artigo 54.º, n.º3 do CIRC em relação a determinados rendimentos recebidos para a prossecução dos seus objectivos estatutários”, considerando a impugnante que a questão omitida foi colocada ao tribunal arbitral, nomeadamente, nos artigos 19., e 24 a 30 da petição inicial de pronúncia arbitral.

Naqueles artigos da douta P.I. de pronúncia arbitral é dito o seguinte:
«19. Efectivamente, o rendimento a que se chegou sofreu uma significativa influência do subsídio recebido da Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis, que totalizou €75.000,00 em 2014.
«24. Nestes termos, o seu rendimento tributável deve ser considerado como rendimento da Categoria B do IRS e ser apurado como segue:

Resultado líquido contabilístico…………………………....43.130,15
A acrescer
Juros de mora……………………………………………….12.018,76
55.148,91

A deduzir
Quotas dos associados…………..347,00
Subsídios……………………..75.000,00 75.347,00
Prejuízo fiscal……………………………………………. 20.198,09

«25. Sendo este o seu verdadeiro resultado fiscal, conclui-se existir uma errada qualificação dos rendimentos, designadamente, no que respeita aos subsídios destinados a realizar os fins estatutários, cuja finalidade desvirtuaria.
«26. A ora Requerente sustenta que, não obstante a ela não se aplicar outra causa de isenção prevista no EBF, se aplicará a causa de não sujeição a IRC prevista no art.º54.º, n.º3 do Código do IRC, que dispõe que relativamente “às pessoas colectivas e outras entidades residentes que não exerçam a título principal, actividade comercial, industrial ou agrícola” “consideram-se rendimentos não sujeitos a IRC as quotas pagas pelos associados em conformidade com os estatutos, bem como os subsídios destinados a financiar a realização dos fins estatutários”.
«27.Compulsados os autos, e como se provará, verifica-se que se cumpre, quer o requisito legal na norma em causa relativo ao sujeito passivo (a requerente é uma pessoa colectiva residente que não exerce, a título principal, actividade comercial, industrial ou agrícola), quer o requisito relativo ao tipo de rendimento (estão em causa subsídios destinados a financiar a realização dos fins estatutários).
«28. Reunindo-se, assim, os pressupostos da aplicação do art.º54.º, n.º3 do CIRC, norma que deve ser aplicada à ora Requerente e, em consequência, os rendimentos recebidos a título de subsídio para cumprimento dos fins estatutários, bem como as quotas pagas pelos associados, deverão ser qualificados como rendimentos não sujeitos a IRC.
«29. Face ao exposto, considera que a matéria colectável não deverá ser corrigida em €58.543,76.
«30. De todo o acima exposto resulta a ilegalidade da liquidação, deduzida “contra legem” e, por isso, em violação do princípio da legalidade tributária, ínsito no art.º8.º da LGT, e um apuramento de base tributável que em muito excede o tributo devido da contribuinte, violando o desiderato do n.º3 do art.º54.º do CIRC…».

Por outro lado, na decisão arbitral impugnada em sede de aplicação do direito, pode ler-se, entre o mais que se dá por reproduzido:

«O objecto do litígio
A questão subjacente a estes autos consiste em saber qual o enquadramento da Requerente em sede de IRC, designadamente, se a sua base de incidência é o respectivo lucro ou o rendimento global.
(…)
Para este conjunto de sujeitos passivos, o CIRC prevê no seu artigo 3.º, n.º1 e n.º4, dois regimes para determinação da base de incidência do imposto, nos seguintes termos:
Artigo 3.º - Base do imposto

1 — O IRC incide sobre:

a) O lucro das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, das cooperativas e das empresas públicas e o das demais pessoas colectivas ou entidades referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo anterior que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola;

b) O rendimento global, correspondente à soma algébrica dos rendimentos das diversas categorias consideradas para efeitos de IRS e, bem assim, dos incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito, das pessoas colectivas ou entidades referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo anterior que não exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola;

(…)
4 — Para efeitos do disposto neste Código, são consideradas de natureza comercial, industrial ou agrícola todas as actividades que consistam na realização de operações económicas de carácter empresarial, incluindo as prestações de serviços.
Não parece oferecer dúvidas que as normas do n.º1 deste artigo prevêem duas situações diferentes de incidência de IRC: (i) incidência sobre o lucro, prevista na alínea a); (ii) incidência sobre o rendimento global, compreendida na alínea b).

Importa interpretar as normas deste artigo de modo a apurar em que casos é aplicado cada um deles. Crê-se que é justamente neste ponto que divergem as posições da Requerente e da Requerida. A Requerente considera que o critério distintivo é a natureza do fim da entidade em causa, designadamente se tem ou não fim lucrativo, sendo aplicado o regime de incidência sobre o rendimento global quando o sujeito passivo tenha por objecto actividade não lucrativa (vejam-se os artigos 4.º a 17.ºdo R.I.). Por seu lado, a AT defende que o enquadramento do sujeito passivo numa ou noutra modalidade de base de incidência, depende da origem dos respectivos rendimentos, sendo aplicável o regime do lucro quando estes resultem a título principal, de actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola (…).»

E mais adiante, depois de deixar consignado que «O critério é exclusivamente um; há que saber se o sujeito passivo em causa exerce a título principal actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, englobando nestas as prestações de serviços que se possam compreender nas operações económicas de carácter empresarial», e de indagar se a Requerente, ora Impugnante, «exerce ou não a título principal actividades de natureza comercial, industrial ou agrícola», escreve-se na decisão arbitral: «Há assim que concluir que em 2014 a Requerente exerceu, a título principal, actividade de prestação de serviços de natureza comercial, industrial ou agrícola e o seu lucro deve ser tributado em IRC, nos termos das normas do artigo 3.º, n.º1 alínea a) e n.º4 do CIRC, calculado nos termos deste Código».

Ora, basta uma leitura atenta do alegado nos artigos 25, 26 e 27 do douto Requerimento inicial de pronúncia arbitral para logo ficar evidenciado que a posição defendida de não sujeição a IRC dos subsídios percebidos da Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis assenta no pressuposto entendimento de que a Requerente é uma pessoa que não exerce a título principal, actividade comercial, industrial ou agrícola.

Já na decisão impugnada se entendeu, diferentemente, que a Requerente em 2014 exerceu a título principal, actividade comercial, industrial e agrícola e, como assim, os pressupostos de que a própria impugnante, na P.I., reconhecia depender a aplicação do art.º54/3 do CIRC (ou seja, a não sujeição a IRC dos rendimentos recebidos a título de subsídio para cumprimento dos fins estatutários, bem como as quotas pagas pelos associados), não se tiveram por demonstrados na decisão arbitral.

Se o ajuizado na decisão arbitral não se mostra correcto, tal poderá constituir erro de julgamento mas não inquina a decisão do vício mais gravoso da nulidade, lembrando-se que a divergência entre qualquer das partes e o tribunal arbitral sobre linhas de fundamentação jurídica, não são sindicáveis por este Tribunal.

Em suma, não se vê que a decisão arbitral impugnada tenha omitido pronúncia quanto à questão que a impugnante refere.

Atento tudo o que se vem de referir tem que improceder a impugnação da decisão arbitral.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em julgar improcedente a presente impugnação da decisão arbitral.

Custas pela Impugnante.

Registe e Notifique.

Lisboa, 14 de Novembro de 2019


Vital Lopes


Anabela Russo


Tânia Meireles da Cunha