Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05770/12
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:09/18/2012
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:RECURSO DA DECISÃO DE APLICAÇÃO DE COIMA.
CÔMPUTO DO PRAZO.
TERMO INICIAL.
Sumário:1. A admissibilidade do recurso do despacho judicial que rejeita o requerimento de interposição devido a extemporaneidade não depende do valor da coima aplicada ao arguido, atento o disposto no artº.63, nº.2, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aplicável “ex vi” do artº.3, al.b), do R.G.I.Tributárias.

2. O requerimento de interposição de recurso deve ser apresentado no Serviço de Finanças onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação, no prazo de vinte (20) dias (contado da data de notificação da decisão de aplicação de coima e não do termo do prazo de pagamento voluntário da mesma coima), atento o disposto no artº.80, nº.1, do R.G.I.Tributárias, devendo o cômputo do referido prazo ser calculado nos termos do disposto no artº.60, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas (aplicável “ex vi” do artº.3, al.b), do R.G.I.T.), e não sendo tal prazo de natureza judicial, pelo que não se lhe aplicam as regras privativas dos prazos judiciais, como são as constantes dos artºs.144, nº.1, e 145, nº.5, do C.P.Civil, embora se suspendendo aos sábados, domingos e feriados.

3. A ser legítima a dúvida quanto ao termo inicial da contagem do prazo de interposição de recurso, face à eventual pouca clareza do texto da notificação, sempre incumbiria ao arguido, para mais representado por advogado, também o ónus de a ver esclarecida, elucidação esta de muito fácil obtenção, pois que a notificação indica de forma expressa o preceito legal aplicável (o artº.80, do R.G.I.T.) e deste resulta, de modo inequívoco, tanto o prazo como o termo inicial da sua contagem. Assim sendo, não lhe é lícito pretender, com fundamento na pretensa obscuridade da notificação, ter direito a um prazo mais alargado para recorrer do que aquele que a lei confere a todos os seus destinatários.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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“S…….. & P………., L.DA.”, com os demais sinais dos autos, deduziu apelação dirigida a este Tribunal tendo por objecto despacho proferido pela Mma. Juíza do T.A.F. de Leiria, exarado a fls.41 e 42 do presente processo de recurso de contra-ordenação, através do qual rejeitou o salvatério intentado pela arguida, devido a manifesta extemporaneidade.
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.47 a 49 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-A recorrente é notificada a 22 de Setembro de 2009 da decisão que aplica a coima no presente processo de contra-ordenação;
2-É-lhe concedido o prazo de 15 dias para efectuar o pagamento voluntário da coima, nos termos do nº.3, do artº.78, do R.G.I.T.;
3-E, no prazo de 20 dias subsequentes aos 15 dias, pode ainda efectuar o pagamento nos termos do nº.2, do artº.79, do mesmo diploma legal;
4-Ou, deduzir recurso judicial, nos termos do que dispõe o artº.80, igualmente do R.G.I.T.;
5-A 23 de Outubro de 2009, apresenta junto do Serviço de Finanças de Benavente, vários recursos judiciais, de entre eles, o presente, de cuja decisão se recorre;
6-Tem conhecimento, que tem sido entendimento desse Tribunal que as notificações efectuadas pelo Serviço de Finanças, não se mostram correctas;
7-E, por a culpa não ser imputável à recorrente, que segue exactamente os termos da notificação, têm os recursos sido admitidos, designadamente, e a titulo de exemplo o Recurso nº.1831/09.1BELRA; 1829/09.0BELRA e 1834/09.6BELRA;
8-Outros, nas mesmas circunstâncias, porque foram já decididos, tendo sido julgados procedentes por esse Tribunal Administrativo e Fiscal, como, os processos nº. 1836/09.2BELRA, nº.1827/09.3BELRA, nº.1835/09.4BELRA e nº.1830/09.3 BELRA;
9-No mesmo sentido, de que um prazo errado não pode funcionar contra o contribuinte, quando este tenha cumprido o prazo que lhe foi fixado, mesmo que já tenha passado o prazo legal;
10-Decidiu o recente Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 11 de Março de 2010, proferido no processo nº.1117/07, conceder provimento ao recurso, ordenando a devolução dos autos, ao tribunal da primeira instância;
11-Termos em que requer a V. Exª. seja o presente recurso admitido, bem como as respectivas alegações, por estar em tempo, decidindo a douta sentença do Tribunal “ad quem” pela procedência do recurso, na medida em que um prazo errado não pode funcionar contra o contribuinte, quando tenha este cumprido com o prazo que lhe foi fixado.
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O Digno Magistrado do M. P. apresentou contra-alegações (cfr.fls.59 e 60 dos autos) nas quais estrutura as seguintes Conclusões:
1-Ao invés do que advoga a recorrente, a notificação em análise não concebe nem con­cede um prazo de 35 dias para a interposição do recurso da decisão de aplicação da coima, mas, tão só, 20 dias, dado que a remissão operada no ponto nº.3, para o nº.1 dessa peça apenas respei­ta ao prazo de 20 dias estabelecido no artº.80, nº.1, do R.G.I.T., aí citado, e não ao modo da sua con­tagem;
2-Daí e como este prazo se conta a partir da data da notificação da decisão e não do ter­mo do prazo para o pagamento voluntário da coima, nenhuma censura merece, a nosso ver, a decisão sob recurso já que aplicou acertada e criteriosamente as atinentes normas legais à situa­ção em apreço, devendo a mesma ser mantida;
3-VOSSAS EXCELÊNCIAS, porém, melhor decidirão.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal teve vista do processo (cfr.fls.70 dos autos), emitindo douto parecer no qual pugna por que seja negado provimento ao recurso deduzido.
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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Este Tribunal dá como provada a seguinte matéria de facto:
1-No dia 1/5/2004, na Direcção de Serviços de Cobrança do I.V.A., quando se encontrava no exercício das suas funções, um funcionário da Administração Fiscal, verificou pessoal e directamente que a sociedade “S……… & P……., L.da.”, com o n.i.f. ………., enquadrada em I.V.A. no regime normal com periodicidade mensal, entregou a declaração periódica relativa ao mês de Novembro de 2003, mas não efectuou o pagamento do imposto sobre o valor acrescentado, previamente liquidado nos termos da lei e relativo ao mesmo período temporal, cujo prazo de entrega/pagamento voluntário teve o seu termo final em 12/1/2004 e sendo no montante global de € 1.608,57 (mil seiscentos e oito euros e cinquenta e sete cêntimos), tudo conforme auto de notícia de fls.5 e 6 do processo, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido;
2-O auto de notícia mencionado no nº.1 deu origem ao presente processo de contra-ordenação fiscal, cuja parte administrativa correu seus termos no Serviço de Finanças de ……….., tendo sido autuado em 26/5/2004 (cfr.documento junto a fls.4 dos presentes autos);
3-Em 21/9/2009, por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de B……., exarado a fls.24 dos autos e que se dá aqui por integralmente reproduzido, foi aplicada coima ao arguido no montante de € 321,71 (trezentos e vinte e um euros e setenta e um cêntimos), devido à prática da contra-ordenação negligente identificada no nº.1 supra, e p.p. nos artºs.27, nº.1, e 41, nº.1, al.a), do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (C.I.V.A.), 114, nº.2, e 26, nº.4, do R. G. I. Tributárias;
4-Em 22/9/2009, a sociedade arguida foi notificada do despacho de aplicação de coima identificado no nº.3, mais se fazendo referência, no ofício de notificação, ao prazo de vinte dias consagrado no artº.80, do R.G.I.T., como aquele em que deve interpor o recurso (cfr. documentos juntos a fls.25 e 26 dos presentes autos);
5-Em 23/10/2009, através de correio registado dirigido ao Serviço de Finanças de B………., foi remetida a petição de recurso interposto pelo arguido da decisão de aplicação de coimas (cfr.data de registo constante do documento junto a fls.33 dos autos).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto estruturada supra, no teor dos documentos referidos em cada um dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, o despacho recorrido rejeitou o recurso intentado pela arguida, devido a manifesta extemporaneidade.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.412, nº.1, do C.P.Penal, “ex vi” do artº.3, al.b), do R.G.I.T., e do artº.74, nº.4, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aprovado pelo dec.lei 433/82, de 27/10).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em síntese e como supra se alude, que foi notificado da decisão de aplicação de coima em 22/9/2009. Que apresentou o recurso junto do Serviço de Finanças de B…….. a 23/10/2009. Que um prazo errado não pode funcionar contra o contribuinte, quando este tenha cumprido o prazo que lhe foi fixado, mesmo que já tenha passado o prazo legal. Que se deve conceder provimento ao recurso e ordenar a devolução dos autos ao Tribunal da primeira instância (cfr.conclusões 1 a 10 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
O Digno Magistrado do M. P., nas contra-alegações, sufraga posição contrária pugnando pela manutenção do despacho recorrido.
Analisemos se a decisão recorrida padece de tal vício.
Antes de mais, dir-se-á que a admissibilidade do presente recurso não depende do valor da coima aplicada ao arguido, atento o disposto no artº.63, nº.2, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aplicável “ex vi” do artº.3, al.b), do R.G.I.Tributárias (cfr.Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Contra-Ordenações, Anotações ao Regime Geral, 6ª. edição, 2011, Áreas Editora, pág.536; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/7/2011, rec.314/11).
O requerimento de interposição de recurso deve ser apresentado no Serviço de Finanças onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação, no prazo de vinte (20) dias (contado da data de notificação da decisão de aplicação de coima e não do termo do prazo de pagamento voluntário da mesma coima), atento o disposto no artº.80, nº.1, do R. G. I. Tributárias, sendo o cômputo do referido prazo calculado nos termos do disposto no artº.60, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas (aplicável “ex vi” do artº.3, al.b), do R.G.I.Tributárias), e não sendo tal prazo de natureza judicial, pelo que não se lhe aplicam as regras privativas dos prazos judiciais, como são as constantes dos artºs.144, nº.1, e 145, nº.5, do C. P. Civil, embora se suspendendo aos sábados, domingos e feriados (cfr.Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág.535 e seg.; Isabel Marques da Silva, Regime Geral das Infracções Tributárias, Cadernos IDEFF, nº.5, 3ª. edição, 2010, Almedina, pág.145 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 1/6/2011, rec.312/11; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/7/2011, rec.314/11).
O fundamento para a rejeição, pelo Tribunal “a quo”, do recurso interposto da decisão administrativa de aplicação da coima consistiu na sua intempestividade, uma vez que, sendo o prazo para a interposição do recurso de 20 dias após a sua notificação (cfr.artº. 80, nº.1, do R.G.I.T.), prazo esse que não é um prazo judicial, embora se suspenda ao sábados, domingos e feriados (cfr.artº.60, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas), e tendo o arguido sido notificado da decisão em 22/9/2009, é manifesto que a impugnação da decisão que foi remetida pelo correio para o Serviço de Finanças de B…………. em 23/10/2009 ocorreu já depois do termo final do mesmo prazo.
Contra este entendimento reage o recorrente, que, não pondo em causa que recebeu a notificação em 22/9/2009, vem alegar, em síntese, que o prazo de 20 dias que nesta lhe era indicado para interpor recurso judicial se contaria após os 15 dias de que dispunha para efectuar o pagamento voluntário da coima, pelo que teria, assim, apresentado em tempo a sua defesa, tudo conforme resultaria do ofício de notificação da decisão administrativa de aplicação de coima.
Ora, embora a notificação da decisão administrativa da coima, efectivamente, não seja um modelo de clareza, nomeadamente no que respeita ao prazo para interposição do recurso, o certo é que, de forma alguma, como pretende fazer crer o recorrente, do seu texto resulta a indicação inequívoca de que o prazo de 20 dias para recorrer se inicia após o decurso do prazo de 15 dias para pagamento voluntário da coima (cfr.artº.79, nº.2, do R.G.I.T.). Com efeito, a remissão do nº.3 para o nº.1 do texto do ofício de notificação respeita apenas ao prazo para interposição do recurso judicial e não à forma do seu cômputo. Em conclusão, do mesmo documento pode retirar-se a referência ao prazo de vinte dias consagrado no artº.80, do R.G.I.T., como aquele em que se deve interpor o recurso (cfr.documento junto a fls.25 dos autos; nº.4 do probatório).
Por outro lado, a simples leitura do artº.80, nº.1, do R.G.I.T. (normativo expressamente indicado no nº.3 do texto da notificação como fundamento do recurso) pelo advogado que representa o arguido no processo, funcionalmente obrigado ao conhecimento da lei, permitiria a dissipação de qualquer dúvida, a qual parece nem se justificar, se atentarmos a que o próprio recorrente reconhece como inquestionável que o prazo legal de interposição do recurso, previsto no citado artº.80, nº.1, do R.G.I.T., é de 20 dias (conclusão 9 das suas alegações de recurso). Consideramos, assim, que a ser legítima a dúvida quanto ao termo inicial da contagem do prazo, face à eventual pouca clareza do texto da notificação, sempre incumbiria ao arguido, para mais representado por advogado, também o ónus de a ver esclarecida, esclarecimento este de muito fácil obtenção, pois que a notificação indica de forma expressa o preceito legal aplicável (o artº.80, do R.G.I.T.) e deste resulta, de modo inequívoco, tanto o prazo como o termo inicial da sua contagem. Assim sendo, não lhe é lícito pretender, com fundamento na pretensa obscuridade da notificação, ter direito a um prazo mais alargado para recorrer do que aquele que a lei confere a todos os seus destinatários (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/2/2010, rec.1181/09; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 1/6/2011, rec.312/11; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/7/2011, rec.314/11).
Em conclusão, o prazo para o arguido interpor recurso da decisão administrativa de aplicação da coima é de vinte dias, sendo calculado a partir da data da notificação da mesma decisão (cfr.artº.80, nº.1, do R.G.I.T.), mais devendo o cômputo do prazo fazer-se nos termos do artº.60, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas (aplicável “ex vi” do artº.3, al.b), do R.G.I.Tributárias), donde resulta que o prazo se suspende aos sábados, domingos e feriados.
“In casu”, efectuado o cômputo do prazo para interposição do recurso, conclui-se que o mesmo teve o seu termo final no pretérito dia 21 de Outubro de 2009 (quarta-feira). A decisão judicial que assim o considerou e, em conformidade, rejeitou por extemporâneo o recurso apresentado só em 23/10/2009 não merece, portanto, qualquer censura e devendo ser confirmada por esta instância judicial de recurso (procedência da excepção peremptória de caducidade do direito de acção).
Concluindo, sem necessidade de mais amplas ponderações, nega-se provimento ao presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, a qual não padece dos vícios que lhe são assacados, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
Após trânsito, comunique com cópia à Direcção de Serviços de Justiça Tributária da D.G.I.
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Lisboa, 18 de Setembro de 2012

(Joaquim Condesso - Relator)

(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)

(Aníbal Ferraz - 2º. Adjunto)