Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08773/15
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/05/2015
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:NULIDADE DA SENTENÇA DEVIDO A FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE FACTO E DE DIREITO.
ARTº.615, Nº.1, AL.B), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO DA DECISÃO JUDICIAL. REQUISITOS LEGAIS.
NULIDADES PROCESSUAIS SECUNDÁRIAS.
CONHECIMENTO IMEDIATO DO PEDIDO PREVISTO NO ARTº.113, Nº.1, DO C.P.P.T., É OBRIGATÓRIO.
ACORDO NO PROCESSO DE REVISÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL.
ARTº.86, Nº.4, DA L.G.T.
FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO. REQUISITOS.
FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DE APLICAÇÃO DE MÉTODOS INDIRECTOS.
Sumário:1. Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação. No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário.

2. A fundamentação de facto da decisão judicial deve incluir, não só a indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz, como a sua apreciação crítica, sendo caso disso, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido em que o foi e não noutro. Assim, a fundamentação de facto não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto, tudo dependendo do meio probatório em causa. Nos casos em que os elementos probatórios tenham um valor objectivo (como sucede, na maior parte dos casos, com a prova documental) a revelação das razões por que se decidiu dar como provados determinados factos poderá ser atingida com a mera indicação dos respectivos meios de prova, sem prejuízo da necessidade de fazer uma apreciação crítica, quando for questionável o valor probatório de algum ou alguns documentos ou existirem documentos que apontam em sentidos contraditórios. Já quando se tratar de meios de prova susceptíveis de avaliação subjectiva (como sucede com a prova testemunhal) será indispensável, para atingir tal objectivo de revelação das razões da decisão, que seja efectuada uma apreciação crítica da prova, traduzida na indicação das razões por que se deu ou não valor probatório a determinados elementos de prova ou se deu preferência probatória a determinados elementos em prejuízo de outros, relativamente a cada um dos factos face aos quais essa apreciação seja necessária.

3. Os desvios do formalismo processual previsto na lei constituirão nulidades secundárias, com o regime de arguição previsto no artº.199, do C.P.Civil. Neste caso, tratando-se de irregularidade anterior à decisão final, a sua arguição deve ser efectuada junto do próprio Tribunal recorrido, em consonância com o preceituado no citado artº.199, do C.P.Civil. Mais, as irregularidades não qualificadas como nulidades principais ou de conhecimento oficioso (cfr.artº.98, do C.P.P.T.) ficam sanadas com o decurso do prazo em que podem ser arguidas, o que significa que tudo se passa como se elas não tivessem sido praticadas. Por último, se o interessado, além de pretender arguir a nulidade processual, quiser também interpor recurso da decisão que foi proferida, deverá cumulativamente apresentar requerimentos de arguição da nulidade e de interposição de recurso, não podendo fazer a arguição da nulidade neste último.

4. O conhecimento imediato previsto no artº.113, nº.1, do C.P.P.T., é obrigatório, tanto no caso de estar em causa apenas resolução de questões de direito, como no caso de estar em causa também, ou exclusivamente, questões de facto, como se infere da redacção imperativa adoptada no mesmo preceito (“...conhecerá...”). No caso de estar em causa a resolução de questões de facto, o conhecimento imediato não deixa de ser obrigatório, mas a questão de saber se o processo fornece os elementos necessários envolve alguma subjectividade, a mesma que está ínsita na possibilidade de o juiz realizar ou ordenar todas as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade, conforme estatui o artº.13, nº.1, do C.P.P.T. De qualquer modo, só no caso de o juiz entender ser de realizar ou ordenar diligências de prova poderá deixar de conhecer imediatamente do pedido.

5. Na parte final do artº.86, nº.4, da L.G.T., estabelece-se que, se tiver havido acordo no processo de revisão da matéria tributável, o sujeito passivo não poderá impugnar a liquidação com fundamento em ilegalidade ocorrida no procedimento de avaliação indirecta (consequência do disposto no artº.92, nº.3, da L.G.T.). No caso dos autos, não podia o apelante impugnar a liquidação com fundamento em ilegalidade ocorrida no procedimento de avaliação indirecta, seja no que se refere à existência, ou não, dos pressupostos de utilização de métodos indirectos, seja no que diz respeito à própria quantificação da matéria colectável, visto que ambos os vectores serviram de fundamento ao pedido de revisão por si formulado, conforme se retira do nº.4 do probatório.

6. Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final.

7. Se a fundamentação não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº. 125, nº.2, do C.P.Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Em conclusão, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final.

8. Especificamente quanto à fundamentação da decisão de aplicação de métodos indirectos, deve levar-se em consideração o disposto no artº.77, nº.4, da L.G.T.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
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"v…………… - industria ……………………, l.da.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.223 a 245 do presente processo, através da qual julgou improcedente a presente impugnação tendo por objecto liquidações adicionais de I.V.A. e juros compensatórios, relativas aos anos de 2007 e 2008 e no montante total de € 157.533,95.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.264 a 269 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Contrariamente ao que veio a ser sentenciado pelo Tribunal "a quo", as constatações expostas na presente peça processual, conduzirão julga-se, à revogação da sentença sob recurso e à procedência da impugnação;
2- Com efeito, as liquidações impugnadas encontram-se eivadas de erro, por força de terem sido realizadas através do recurso a métodos indirectos, sem que aquele se encontrasse fundamentado quanto a um dos seus aspectos essenciais;
3- Qual seja, por ao arrepio dos termos legais e do que constitui jurisprudência pacifica e firmada, não se verificar demonstrada nos autos, a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável ("in casu" base tributável de IVA);
4-Verificando-se em consequência, errónea fundamentação do acto tributário;
5-Bem como a errónea quantificação das bases tributáveis de IVA;
6- A sentença recorrida, ao ter decidido como decidiu, carece de notório deficit de fundamentação, advinda das seguintes circunstâncias:
- Do Tribunal "a quo" não ter fundamentado a sua conclusão de ter a AT logrado demonstrar devidamente a sua decisão, quanto ao recurso a métodos indirectos para a determinação da matéria colectável;
- Em concreto, pela omissão das razões porque decide com base nas alegações da Fazenda Pública em detrimento dos fundamentos alegadas pela impugnante na p.i., e pela razão de apreço e adequação daquelas, e demérito destas;
- Porquanto não fundamenta em quaisquer factos ou provas concretas essa conclusão;
- Contrariamente ao sentenciado, a AT não demonstrou que o recurso a métodos indirectos, fosse a única forma de determinar as bases tributáveis de IVA;
- De resto, por nem ter procedido ao exame crítico das provas;
7- Ao ter dispensado (indevidamente) a prova testemunhal, mas não obstante decidindo sobre questões relativamente às quais esta seria essencial, omitiu-se na sentença ora em crise, factos essenciais com vista à boa decisão da causa;
8-Devendo face a todo o exposto, revogar-se a sentença recorrida, por erro de julgamento;
9- E ordenar-se a anulação integral das liquidações de IVA e dos respectivos juros compensatórios objecto de impunação;
10- E por tudo o exposto, tendo-se violado designadamente as disposições constantes dos normativos do n.º 1 do Art.125 do CPPT e das alíneas b) e d) do n.º 1 do Art.º 668, do CPC (aplicáveis ao processo fiscal, "ex­ vi" do Art.º 2 do CPPT), quando em conjugação com as dos Arts. 87 a 89 da LGT por remissão do Art. 90 do CIVA, Art.º 125 do CPA, dos Art.º 75 ,n.º 2, Art.º 77, nºs 1 e 4 e Art.º 91 da LGT;
11-Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores, decidindo como se conclui e vai pedido, concedendo provimento ao presente recurso, assim o julgamos, fareis uma vez mais JUSTIÇA !
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.282 e 283 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.225 a 232 dos autos - numeração nossa):
1-Em 2/12/2010, ao abrigo das Ordens de Serviço nºs. OI201002501, de 16/11/2010, e OI201100803, de 5/04/2010, foi iniciada uma ação de inspeção, de caráter geral, à impugnante relativamente aos exercícios de 2007, 2008 e 2009 (cfr.cópia do projeto de relatório de inspeção tributária (RIT) que consta de fls.44 a 65 dos presentes autos, o qual se dá por integralmente reproduzido);
2-Em 30/05/2011, foi concluído o projeto de RIT, no qual, para além do mais, consta que foram propostas correções em sede do IVA com recurso a métodos indiretos relativamente aos exercícios de 2007 e de 2008 (cfr.cópia do projeto de relatório de inspeção tributária (RIT) que consta de fls.44 a 65 dos presentes autos);
3-Em data não determinada, a sociedade impugnante foi notificada do RlT, no qual, para além do mais, consta que foram realizadas correções em sede do IVA com recurso a métodos indiretos relativamente aos exercícios de 2007 e de 2008, sendo, designadamente, referido o seguinte:
"(...)
Apesar da obrigatoriedade da existência de inventário permanente o sujeito passivo determina o custo das existências vendidas e consumidas pelo método do inventário intermitente.
Assim o CMVMC (Custo das Existências Vendidas e Consumidas) é apurado segundo a seguinte fórmula:
CMVMC = Existência Inicial + Compras +/- R. de Existências - Existências Finais

Procedeu-se então à análise da contabilidade da Vepelibérica tendo como objectivo a comprovação do correcto apuramento do CMVMC.
(…)
Pela análise do quadro anterior, constatam-se aumentos muito significativos do valor do inventário Final ao longo dos últimos exercícios.
De acordo com os cálculos efectuados no quadro supra verifica-se que o rácio Vendas/Compras se manteve estável ao longo dos últimos seis exercícios, já o mesmo não aconteceu com os rácios Vendas/Inventário e Compras/Inventário que sofreram alterações substanciais.
Ou seja, a relação entre Vendas e o Inventário tem-se alterado de forma acentuada ao longo dos exercícios mencionados no quadro. Em 2004 as Vendas anuais de Mercadorias eram mais de nove vezes superiores às existências de mercadorias em armazém, já em 2009 as Vendas Anuais de Mercadorias foram pouco mais do dobro do valor das existências de mercadorias em armazém.
Esta tendência de aumento de stock de mercadorias em armazém não foi verificada no sector de actividade onde o sujeito passivo está inserido, de acordo com os rácios da DGCI nomeadamente a duração média de existências - DMEMC do sector, que mantêm uma certa uniformidade ao longo dos exercícios, sendo o prazo médio de rotação de stock de aproximadamente 3 meses. Por sua vez o sujeito passivo tem aumentado consideravelmente este prazo, conforme valores do quadro seguinte. No exercício de 2005 o prazo médio de rotação de stocks do sujeito passivo era de 2,26 meses e no exercício de 2009 aproximou-se dos 7 meses. O que significa que o valor do Inventário de Mercadorias representa já aproximadamente metade das Vendas Anuais.
(…)
Por análise detalhada aos inventários finais dos exercícios de 2007, 2008 e 2009 verificou-se que existiam erros graves na sua elaboração, existindo artigos (referências) cujas quantidades não tinham qualquer correspondência com os valores existentes em stock, de acordo com a análise efectuada ao programa de gestão de stocks. O mesmo acontecendo relativamente à valorização dos próprios inventários, sendo os produtos valorizados a preços completamente desajustados do seu custo médio, alguns valorizados ao preço de venda outros valorizados a preços para os quais não foi dada qualquer justificação.
Junta-se em anexo 1 cópia de algumas páginas dos inventários a título exemplificativo.
Tendo em conta as incoerências verificadas nos Inventários, efectuou-se uma análise por referências, tendo sido solicitadas ao Sujeito Passivo as fichas de stocks de alguns produtos. Através desta análise verificou-se que:
• O sujeito passivo mudou de programa informático de gestão de stocks em Julho de 2008.
• Com esta alteração de programas em alguns dos produtos analisados, as quantidades e os preços de custo tinham sofrido alterações.
• Alguns produtos tinham entradas de stock efectuadas no mesmo dia e adquiridos ao mesmo fornecedor, uma parte sustentada por factura de compra e outra parte apenas pela Guia de Remessa. Questionou-se o sujeito passivo relativamente a esta situação, tendo o mesmo confirmado que algumas entradas de stock tinham apenas por base de registo a Guia de Remessa dado não existir factura de compra tendo em conta que são quantidades oferecidas pelo fornecedor.
• Estas entradas registadas com base nas Guias de Remessa e que a V……………..identificou como sendo ofertas, são valorizadas no programa de stocks ao mesmo preço das registadas com base na factura de compra e não a custo zero.
• As quantidades em stocks são alteradas com base em acertos de contagem efectuados no programa, nalguns dos produtos analisados de forma significativa.
(…)
Tendo em conta que as fichas de stocks dos produtos analisados revelaram a existência de movimentos de stocks injustificados, considerou-se que a análise se deveria estender ao maior número possível de produtos/referências.
Solicitou-se então cópia dos registos informáticos dos programas de gestão de stocks do sujeito passivo e procedeu-se à sua análise, tendo-se verificado o seguinte:
• Até Junho de 2008 o sujeito passivo utilizava o programa de gestão de stocks HES e a partir de Julho de 2008 passou a utilizar um outro programa GESPOS da SAGE, tendo-se detectado que a transferência de dados entre os dois programas não foi automática.
• No novo programa foram introduzidas quantidades que não tinham correspondência com as existentes em stock para as várias referências, o mesmo acontecendo com os preços de custo dos artigos. Constatando-se assim que o problema inicialmente detectado nas fichas de stock analisadas era extensível a grande parte dos produtos/referências.
• De acordo com a análise efectuada verificou-se que com a alteração de programa se registou uma diminuição significativa das quantidades existentes em stock de algumas referências/artigos, juntamos a título de exemplo listagem de alguns artigos nessa situação (Anexo 3).
• Existem entradas de stock em vários produtos/referências efectuadas por guias de remessa não tendo por base uma factura ou documento equivalente. No entanto muitas delas são introduzidas no programa com preço de aquisição igual às entradas por factura, apesar do seu custo de aquisição ser zero. Situação já detectada com a análise das fichas de stock inicialmente efectuadas comprovando-se assim a sua extensibilidade a vários artigos/produtos (referências).
• A par das saídas de stocks efectuadas por Factura ou Vendas a Dinheiro e Notas de Crédito a clientes, que foram consideradas correctas e justificadas, existem ainda saídas efectuadas com base em AS (Acertos de Contagem), TR (Transferências) e TRF (Transformação) que ocorreram ao longo dos exercícios de 2008 e 2009 que são muito significativas e para as quais não foi dada justificação.
• O novo programa permite efectuar alterações ao stock iniciai tal como acertos em qualquer momento, situação que verificamos ter ocorrido em várias referências.
Tudo isto denota a falta de credibilidade da informação e por essa via da contabilidade.
Verificamos ainda:
MBV (margem bruta das vendas de mercadorias) declarada inferior à do sector constante do sistema Informático da DGCI.
(…)
Margem Bruta praticada pelo sujeito passivo apurada por amostragem é superior à declarada e à dos rácios da DGCI.
Efectuou-se uma análise às Margens Brutas das Mercadorias, praticadas pelo sujeito passivo, tendo por base o preço constante do Inventário e o preço médio de venda obtido através do SAFT-Vendas do sujeito passivo, tendo-se verificado que as margens obtidas são superiores às declaradas (anexo 4).
Subdividimos esta análise pelas várias famílias de produtos identificadas nos balancetes analíticos do sujeito passivo, e que são: Aquecimento, Tintas CIN, Cerâmica, Sanitários, Stand (família generalista onde estão incluídas todas as referências não identificadas nas famílias já enunciadas), sendo que as margens obtidas são as constantes nos 2 quadros abaixo.
Apesar de considerarmos a amostra representativa não foram efectuadas correcções fiscais atendendo às margens reais encontradas pelo facto de serem margens muito elevadas e que poderão estar afectadas pelos erros de elaboração dos inventários já referidos. Remete-se assim para anexo 4 essas listagens.
(…)

Pela análise dos quadros anteriores verifica-se que produtos pertencentes à mesma família de produtos tem margens completamente díspares em anos consecutivos, como é o caso dos produtos da família Stand que na contabilidade do sujeito passivo tem uma margem bruta de 4,53% no exercício de 2007 e 24,79% em 2008, a família CIN cuja margem bruta é de 0,54% em 2007 e 39,99% em 2008, o mesmo acontecendo com a família Roca Cerâmica com margem bruta de 44,74% em 2007 e 32,08% em 2008.
Estas oscilações de margens brutas completamente desajustadas da realidade são reveladoras da debilidade do sistema contabilístico do sujeito passivo, no que ao apuramento do custo das mercadorias diz respeito o mesmo indiciando em relação às vendas das mesmas.
Nos exercícios de 2007 e 2008 não existia integração automática das Vendas na Contabilidade.
IVA
• Durante os exercícios de 2007 e 2008 existem vários períodos com crédito de IVA, o que não é usual no sector. Assim em 2007, o sujeito passivo apurou crédito deste imposto nos períodos: 0703, 0704, 0706, 0707, 0708 e 0709. E em 2008 nos seguintes períodos de 2008: 0802, 0803, 0804 e 0805.
• O valor de IVA pago nos exercícios analisados é diminuto em relação ao volume de negócios da empresa. Para esta conclusão tivemos em conta as vendas isentas efectuadas pelo sujeito passivo e o IVA dedutível correspondente a imobilizado.

Tendo em conta que:
• Os inventários têm cerca de 6000 referências.
• Os erros detectados nos inventários serem de tal ordem significativos, que impossibilitam uma análise credível.
• A análise efectuada ao programa de gestão de falhas revelar várias falhas.
(...)
• MBV de Mercadorias do sector superiores às da V………………..
• Margens reais superiores às evidenciadas na contabilidade.

Foi impossível efectuar uma quantificação exacta das correcções à matéria colectável, obrigando assim ao recurso a métodos indirectos.

Face aos factos enumerados, ou seja aos fortes indícios de existência de omissão de proveitos e imposto sobre o valor acrescentado (IVA), torna-se impossível a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável do Sujeito Passivo, relativa aos exercícios de 2007, 2008 e 2009, pelo que a mesma irá ser determinada com recurso à aplicação de métodos indirectos (...)"
(cfr.cópia do projeto de relatório de inspeção tributária (RIT) que consta de fls.44 a 65 dos presentes autos);
4-Em 29/08/2011, a impugnante apresentou pedido de revisão da matéria coletável em sede do IVA apurada pela AT com recurso a métodos indiretos relativamente aos exercícios de 2007 e 2008 que consta do RIT referido no ponto 3 que antecede, articulado em que defende a ausência de pressupostos para a tributação por métodos indirectos e o excesso de quantificação na aplicação dos mesmos ao caso concreto (cfr. documento junto a fls.67 a 92 dos presentes autos, o qual se dá por integralmente reproduzido);
5-Em 11/10/2011, 20/10/2011 e 27/10/2011, foram, nos termos dos artigos 91 e 92 da Lei Geral Tributária (LGT), realizadas reuniões entre o perito da Fazenda Pública, o perito designado pela impugnante e o perito independente, tendo sido elaborada a ata n.º 15/2011, que se encontra assinada pelos 3 peritos, na qual consta, para além do mais, o seguinte:

"(...)
Perante os novos valores propostos, muito embora o Perito do Contribuinte por informação do sócio gerente ainda os considere elevados, pois reafirma não ter omitido vendas mas tão só reconhece a existência de erros na elaboração dos inventários, foi promovido o acordo entre os Peritos.
• Por consenso entre os peritos intervenientes, são os seguintes os valores acordados no âmbito do IRC e IVA para os exercícios objecto de revisão:

2007
    2008
    2009
IRC- Resultado tributável fixado
197.271,85
202.095,97
116,660,11
IVA
53.504,10
88.306,91
0

(cfr.documento de fls.93 a 100 dos presentes autos em suporte físico; documento junto ao processo administrativo apenso);
6-Em 29/11/2011, foram emitidas pela AT as liquidações adicionais de IVA nºs. 11159640 e 11159642 relativas aos exercícios de 2007 e 2008, respetivamente, e as liquidações de juros compensatórios nºs. 11159641 e 11159643 referentes a 2007 e 2008, respetivamente (cfr.documentos juntos a fls.101 a 104 dos presentes autos, os quais se dão por integralmente reproduzidos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não se vislumbram outros factos alegados cuja não prova releve para a decisão da causa…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto resultou do exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos e do PAT constam, tudo conforme referido a propósito de cada um dos pontos dos factos provados…”.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar improcedente a impugnação pelo recorrente intentada, devido ao decaimento de todos os seus fundamentos.
X
Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar, que a decisão recorrida não fundamentou a sua conclusão de ter a A. Fiscal logrado demonstrar devidamente a sua decisão, quanto ao recurso a métodos indirectos para a determinação da matéria colectável. Que não efectua o exame crítico das provas (cfr.conclusão 6 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, se bem percebemos, uma nulidade da decisão recorrida devido falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal pecha.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.139 a 141; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.687 a 689; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36).
No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.357 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.871/10; ac.S.T.A-2ª.Secção, 13/10/2010, rec.218/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6406/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15).
Analisando, agora, a questão do exame crítico da prova, dir-se-á que a nulidade em causa (não especificação dos fundamentos de facto da decisão) abrange não só a falta de especificação dos factos provados e não provados, conforme exige o artº.123, nº.2, do C.P.P.T., igualmente podendo nela enquadrar-se a falta de exame crítico da prova, requisito previsto no actual artº.607, nº.4, do C.P.Civil (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.358; ac.S.T.A-2ª.Secção, 12/2/2003, rec.1850/02; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15).
Na realidade, a fundamentação de facto da decisão judicial deve incluir, não só a indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz, como a sua apreciação crítica, sendo caso disso, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido em que o foi e não noutro. Assim, a fundamentação de facto não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto, tudo dependendo do meio probatório em causa. Nos casos em que os elementos probatórios tenham um valor objectivo (como sucede, na maior parte dos casos, com a prova documental) a revelação das razões por que se decidiu dar como provados determinados factos poderá ser atingida com a mera indicação dos respectivos meios de prova, sem prejuízo da necessidade de fazer uma apreciação crítica, quando for questionável o valor probatório de algum ou alguns documentos ou existirem documentos que apontam em sentidos contraditórios. Já quando se tratar de meios de prova susceptíveis de avaliação subjectiva (como sucede com a prova testemunhal) será indispensável, para atingir tal objectivo de revelação das razões da decisão, que seja efectuada uma apreciação crítica da prova, traduzida na indicação das razões por que se deu ou não valor probatório a determinados elementos de prova ou se deu preferência probatória a determinados elementos em prejuízo de outros, relativamente a cada um dos factos face aos quais essa apreciação seja necessária (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.321 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 15/4/2009, rec.1115/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15).
Voltando ao caso concreto, conforme se retira do exame da decisão recorrida constante de fls.223 a 245 do presente processo e das referências supra exaradas à fundamentação da decisão de facto constante da mesma, deve julgar-se improcedente a alegação do recorrente, visto que o vício que consubstancia esta nulidade, conforme mencionado acima, consiste na falta de fundamentação absoluta (de facto ou de direito), não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outro lado, quanto ao exame crítico da prova, porque nos encontramos perante processo em que somente foi produzida prova documental, a revelação das razões por que se decidiu dar como provados determinados factos foi atingida com a indicação dos respectivos meios de prova.
Concluindo, improcede o presente esteio do recurso incidente sobre a alegada falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão recorrida.
Aduz, igualmente, o apelante que ao ter dispensado, indevidamente, a produção de prova testemunhal, não obstante ter decidido sobre questões relativamente às quais esta seria essencial, omitiu-se na sentença ora em crise factos essenciais com vista à boa decisão da causa (cfr.conclusão 7 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, supomos, uma nulidade processual secundária.
Vejamos se a decisão objecto do presente recurso sofre de tal vício.
Os desvios do formalismo processual previsto na lei constituirão nulidades secundárias, com o regime de arguição previsto no artº.199, do C.P.Civil. Neste caso, tratando-se de irregularidade anterior à decisão final, a sua arguição deve ser efectuada junto do próprio Tribunal recorrido, em consonância com o preceituado no citado artº.199, do C.P.Civil. Mais, as irregularidades não qualificadas como nulidades principais ou de conhecimento oficioso (cfr.artº.98, do C.P.P.T.) ficam sanadas com o decurso do prazo em que podem ser arguidas, o que significa que tudo se passa como se elas não tivessem sido praticadas. Por último, se o interessado, além de pretender arguir a nulidade processual, quiser também interpor recurso da decisão que foi proferida, deverá cumulativamente apresentar requerimentos de arguição da nulidade e de interposição de recurso, não podendo fazer a arguição das ditas nulidades neste último (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/5/2012, proc.5533/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/5/2013, proc.6018/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.6971/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/02/2015, proc.5326/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.86 e seg.).
“In casu”, o impugnante/recorrente não suscitou no processo, na altura e pelo modo devidos, a eventual nulidade processual que consistiria na não efectivação da diligência probatória de inquirição de testemunhas requerida na p.i. (não estando em causa, neste momento, o mérito de tal diligência). Concretizando, a fls.212 dos presentes autos foi exarado despacho a concluir que estes já continham toda a factualidade necessária à sua decisão conscienciosa, pelo que se prescindia da produção de prova testemunhal requerida pelas partes, mais se fazendo referência ao ditame previsto no artº.13, do C.P.P.T. Tal despacho foi notificado às partes, ao mesmo não tendo reagido (cfr.fls.213 e 214 dos autos).
Nestes termos, a eventual existência de uma nulidade secundária derivada da não realização da diligência probatória requerida pelo impugnante/recorrente deve considerar-se sanada de acordo com os trâmites mencionados supra.
E recorde-se que nos termos do artº.113, do C.P.P.T., se no âmbito do processo de impugnação a questão a apreciar for apenas de direito ou, sendo também de facto, se o processo fornecer todos os elementos necessários para a decisão, será ordenada vista ao Ministério Público, para se pronunciar expressamente sobre as questões de legalidade que tenham sido suscitadas nos autos ou para promover outras no âmbito das suas competências legais, após o que deverá o Tribunal conhecer logo do pedido (cfr.artºs.113, nº.1, e 121, do C.P.P.T.). O conhecimento imediato previsto neste artigo é obrigatório, tanto no caso de estar em causa apenas resolução de questões de direito, como no caso de estar em causa também, ou exclusivamente, questões de facto, como se infere da redacção imperativa adoptada no nº.1, deste artº.113 (“...conhecerá...”). No caso de estar em causa a resolução de questões de facto, o conhecimento imediato não deixa de ser obrigatório, mas a questão de saber se o processo fornece os elementos necessários envolve alguma subjectividade, a mesma que está ínsita na possibilidade de o juiz realizar ou ordenar todas as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade, conforme estatui o artº.13, nº.1, do C.P.P.T. De qualquer modo, só no caso de o juiz entender ser de realizar ou ordenar diligências de prova poderá deixar de conhecer imediatamente do pedido (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6393/13; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 14/5/2013, proc.6018/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc. 6971/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/02/2015, proc.5326/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.249 e seg.).
Arrematando, não se verificou (ou deve considerar-se sanada) qualquer nulidade processual secundária no âmbito do presente processo.
O apelante discorda do decidido aduzindo, ainda e conforme supra se alude, que as liquidações impugnadas se encontram eivadas de erro, por força de terem sido realizadas através do recurso a métodos indirectos, sem que se encontrasse demonstrada nos autos a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável de I.V.A. (cfr.conclusões 2, 3 e 5 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo percebemos, erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal vício.
Na parte final do artº.86, nº.4, da L.G.T., estabelece-se que, se tiver havido acordo no processo de revisão da matéria tributável, o sujeito passivo não poderá impugnar a liquidação com fundamento em ilegalidade ocorrida no procedimento de avaliação indirecta (consequência do disposto no artº.92, nº.3, da L.G.T.). Em consequência do acabado de referir, não podia o apelante impugnar a liquidação com fundamento em ilegalidade ocorrida no procedimento de avaliação indirecta, seja no que se refere à existência, ou não, dos pressupostos de utilização de métodos indirectos, seja no que diz respeito à própria quantificação da matéria colectável, visto que ambos os vectores serviram de fundamento ao pedido de revisão por si formulado, conforme se retira do nº.4 do probatório (cfr.artº.86, nº.4, da L.G.T.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 10/3/2011, rec.22/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/6/2015, proc.7452/14; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, Encontro da Escrita, 2012, pág.746 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.280).
Atento o referido, não podia o recorrente invocar na impugnação tais vectores que foram abarcados pelo acordo efectuado ao abrigo do artº.86, nº.4, da L.G.T.
Concluindo, nega-se provimento ao presente esteio do recurso e confirma-se a decisão do Tribunal "a quo", neste segmento.
Defende, ainda, o recorrente que se verifica uma errónea fundamentação do acto tributário (cfr.conclusão 4 do recurso). Com base em tal exposição pretendendo, supomos, concretizar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida, o qual se consubstancia no vício de forma de falta de fundamentação do acto tributário, matéria não abrangida pelo ditame do artº.86, nº.4, da L.G.T. (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, Encontro da Escrita, 2012, pág.749).
Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
A fundamentação dos actos tributários ou “praticados em matéria tributária” que “afectem os direitos ou interesses legalmente protegidos dos contribuintes” estava consagrada nos artºs.19, al.b), 21, 81 e 82, do C.P.Tributário (cfr.actualmente o artº.77, da L.G.Tributária).
Tal necessidade de fundamentação decorria já, quer do artº.1, nº.1, al.a) e c), do dec.lei 256-A/77, de 17 de Junho, quer do próprio artº.268, nº.3, da C. R. Portuguesa, na redacção introduzida pela Lei Constitucional nº.1/89 (cfr.Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1993, pág.936 e seg.; Vieira de Andrade, O Dever de Fundamentação Expressa dos Actos Administrativos, 1990, pág.53 e seg.).
A fundamentação é um conceito relativo que pode variar em função do tipo legal de acto administrativo que estamos a examinar.
Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final (cfr.ac.S.T.J.26/4/95, C.J.-S.T.J., 1995, II, pág.57 e seg.; A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª. edição, 1985, pág.687 e seg.; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, V, pág.139 e seg.). Quer dizer. Utilizando a linguagem de diversos acórdãos do S.T.A. (cfr.por todos, ac.S.T.A-1ª.Secção, 6/2/90, A.D., nº.351, pág.339 e seg.) o acto administrativo só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto. Mais se dirá que a fundamentação pode ser expressa ou consistir em mera declaração de concordância de anterior parecer, informação ou proposta, o qual, neste caso, constitui parte integrante do respectivo acto (é a chamada fundamentação “per relationem” - cfr.artº.125, do C.P.Administrativo).
Se a fundamentação não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº. 125, nº.2, do C.P.Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Em conclusão, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final (cfr.Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol.I, Almedina, 1991, pág.477 e seg.; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol.II, Almedina, 2001, pág.352 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária Anotada e comentada, 4ª. Edição, 2012, pág.675 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/12/2008, proc.2606/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/11/2009, proc.3510/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/3/2011, proc.4489/11).
Especificamente quanto à fundamentação da decisão de aplicação de métodos indirectos, deve levar-se em consideração o disposto no artº.77, nº.4, da L.G.T.
"In casu", a fundamentação do recurso à avaliação indirecta encontra-se devidamente explicitada no relatório de inspecção em termos que se afiguram claros, congruentes e suficientes, permitindo ao impugnante/recorrente apreender o “iter" cognoscitivo seguido pela Fazenda Pública (cfr.nº.3 do probatório).
Concretizando, a A. Fiscal logrou fundamentar devidamente a sua decisão quanto ao recurso a métodos indiretos para a determinação da matéria coletável do recorrente em sede de I.V.A. e quanto aos exercícios de 2007 e 2008, ao apontar irregularidades e insuficiências na sua contabilidade, sobretudo ao nível do custo das existências vendidas/ consumidas, dos inventários finais, das fichas de stock e da margem bruta de venda das mercadorias, vectores que prejudicaram a possibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável com base na contabilidade.
Sem mais, julga-se improcedente este alicerce da impugnação, confirmando-se a decisão recorrida, também neste segmento.
Por último, sempre se dirá que não vislumbra este Tribunal que a decisão recorrida tenha, alegadamente, violado o disposto nos artºs.75, 77, 87 a 89 e 91, todos da L.G.T., no artº.90, do C.I.V.A., e no artº.125, do C.P.A., violações estas que igualmente não são concretizadas pelo recorrente.
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 5 de Novembro de 2015



(Joaquim Condesso - Relator)

(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)