Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:580/18.4BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:08/22/2019
Relator:SOFIA DAVID
Descritores:IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO;
PROVIDÊNCIA CAUTELAR;
CRITÉRIOS PARA O DECRETAMENTO DE PROVIDÊNCIA CAUTELAR; PERICULUM IN MORA;
AVALIAÇÃO PECUNIÁRIA DOS DANOS;
FUMUS BONI IURIS;
FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO;
VÍCIO DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO;
RESCISÃO UNILATERAL DO CONTRATO DE ATRIBUIÇÃO DE APOIO FINANCEIRO;
DEVOLUÇÃO DE SUBSÍDIO;
DINHEIROS PÚBLICOS;
PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO;
PONDERAÇÃO DE INTERESSES.
Sumário:I - A impugnação da matéria de facto e a modificabilidade da mesma pelo tribunal superior não visa alterar a decisão de facto fundada na prova documental ou testemunhal apenas porque a mesma é susceptível de produzir convicções diferentes, podendo ser diversa a tomada no tribunal superior daquela que teve o tribunal da 1.ª instância. Diferentemente, este tribunal superior só pode alterar a matéria de facto porque as provas produzidas na 1.ª instância impunham, decisiva e forçosamente, outra decisão diversa da aí tomada;
II - Para o decretamento de uma providência cautelar exige-se a verificação cumulativa dois requisitos: o periculum in mora e o fumus boni iuris. Ou seja, terá de ficar indiciariamente provado nos autos que existe um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado, ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e, ainda, que é provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente;
III - Quando dos factos concretos alegados pelo Requerente se antever que uma vez recusada a providência será, depois, impossível, ou muito difícil, a reconstituição da situação de facto, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, ter-se-á por preenchido o requisito periculum in mora. Ainda aqui, o critério não é o da susceptibilidade ou insusceptibilidade da avaliação pecuniária dos danos, mas, sim, o da maior ou menor dificuldade que envolve o restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar;
IV - Quanto ao fumus boni iuris que ora se exige, encontra-se na sua formulação positiva, requerendo-se que haja uma séria possibilidade de procedência da pretensão principal, que seja
"provável" a aparência do bom direito. Por seu turno, esta apreciação deve ser feita em termos de summario cognitio, com base em juízos de verosimilhança, de mera previsibilidade ou razoabilidade, face aos factos e alegações (indiciários) que são trazidos pelo Requerente para os autos;
V - Mas ainda que se preencherem os dois requisitos referidos, haverá, depois, que ponderar os interesses em confronto, nos termos do n.º 2 do art.º 120.º do CPTA;
VI - A fundamentação do acto administrativo tem por finalidade dar a conhecer ao destinatário o percurso cognitivo e valorativo do autor daquele mesmo acto, de modo a permitir uma defesa adequada e consciente dos direitos e interesses legalmente protegidos do particular lesado. Para tanto, a fundamentação tem que ser suficiente, clara e congruente. Tem de permitir ao destinatário médio ou normal, colocado na posição do real destinatário do acto, compreender a motivação que subjaz ao raciocínio decisório. Não é necessário – desde logo porque iria contra os princípios de eficiência e celeridade administrativa – que em cada acto administrativo se proceda a uma fundamentação completa e exaustiva das razões de facto e de direito que motivaram a decisão;
VII – É muito provável a existência de um vício de falta de fundamentação num caso em que o acto que determina a rescisão unilateral do contrato de atribuição de apoio financeiro e ordena a devolução do apoio concedido remete para as “conclusões do controlo administrativo”, sem indicar quando, onde e em que termos ocorreu tal controlo, ou quais as suas conclusões, que justificam a decisão tomada, assim como, que é totalmente omisso quanto aos fundamentos de Direito e que é incompleto e obscuro nos fundamentos relativos às conclusões que retira quanto ao início e manutenção da actividade e da viabilidade da empresa;
VIII- Verifica-se a existência de periculum in mora quando se constata que para atingir a liquidez necessária para a devolução dos subsídios recebidos por uma empresa, esta terá de vender as máquinas que servem a produção dos bens, pondo fim ao seu modelo comercial, com a consequente insolvência e despedimento de trabalhadores;
IX – A circunstância de estarem em causa dinheiros públicos e de existir uma obrigação de devolução de montantes à União Europeia, não implica necessariamente a prevalência do interesse público
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I - RELATÓRIO
IFAP – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, interpôs recurso da sentença do TAF de Beja, que julgou procedente o pedido de suspensão de eficácia do despacho do Presidente do Conselho Directivo (CD) do IFAP, que determinou a rescisão unilateral do contrato de atribuição de apoio financeiro e ordenou a devolução do apoio concedido.

Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões: “A. O presente recurso jurisdicional vem interposto da douta sentença, datada de 18 de maio de 2019, proferida nos autos à margem identificados, a qual julgou procedente a presente providência cautelar dando por verificados ambos os requisitos previstos nos n°s 1 e n° 2 do artigo 120° do CPTA e, consequentemente determinou a suspensão de eficácia da decisão final proferida pelo IFAP, I.P. constante de ofício n° 5…/2018 DAI-UREC que havia determinado a rescisão unilateral do contrato de atribuição de ajudas, com a exigência de devolução das verbas indevidamente recebidas, no montante total de 178.144,45 EUR.
B. A decisão recorrida encontra-se ferida de error in judicando, determinada pela incorreta decisão sobre a matéria de facto e pela incorreta interpretação e aplicação das normas legais e processuais aplicáveis ao caso sub judice.
C. Importa, desde logo, salientar que, a sentença proferida, apesar de concluir pela «existência de imprecisões, incongruências e contradições entre os testemunhos (v.g. quanto ao número de trabalhadores, suas funções e vinculo; quanto à disponibilidade e/ou vendas de bombons aos hóspedes do Palacete e quanto ao que foi feito em termos de promoção da empresa até 2018) e entre estes e a prova documental, o que não foi ignorado, mas aceite e valorado, atenta a produção de prova apreciada no seu conjunto» (realçado nosso), dá como assente os factos G), H), I) e J), mas não o poderia ter feito, existindo erro notório na avaliação da matéria de facto considerada indiciariamente provada, propondo-se a eliminação dos factos G), H), I) e J) e aditamento do facto F.1) .
D. De facto, basta uma breve análise à prova documental existente no processo, isto é, ao DOC. 23 junto ao requerimento inicial para concluir que os factos G) e I) estão incorretos e deverão ser eliminados porque as máquinas de produção de chocolates não constituem os únicos ativos relevantes da Requerente e dispõe de meios financeiros que lhe permitam devolver o montante concedido pela Entidade Requerida.
E. Também o facto H) da matéria de facto dada como provada é falso, porque nenhuma testemunha disse que as máquinas «constituem o único meio de produção do produto (bombons industriais com recheio artesanal) da empresa Requerente», antes, pelo contrário, TODAS realçaram a possibilidade de produção artesanal dos bombons ainda que o processo pudesse ser mais moroso, e, como tal, deverá ser eliminado.
F. Relativamente ao facto J) o mesmo deverá ser eliminado porque como resulta do facto C) da matéria de facto assente e do teor do DOC. 5 junto ao requerimento inicial, o contrato de investimento foi celebrado em 2014 e de acordo com a cláusula 4ª, n° 1 do contrato, a data fim da execução material do projeto de investimento terminava a 30/06/2014. Logo, tratando-se o DOC. 23 de balancete de 2018, a conclusão do facto J) é conclusiva e tendenciosa porque não resulta do DOC. 23, nem dos depoimentos prestadas a aplicação do investimento, como pretende dar a entender o Tribunal a quo, num juízo conclusivo e tendencioso, mas apenas a enumeração de algumas despesas e receitas da requerente, salientando-se que a requerente não procedeu à junção aos autos do IRC de 2017 ou de 2018.
G. Acresce ao exposto que esta conclusão é contraditória com o referido no depoimento de J..., responsável pela contabilidade da empresa Requerente, que reconheceu o «significativo atraso verificado na concretização do projeto por referência à avaliação inicial feita no plano de negócio apresentado com a candidatura» e admitido pelo próprio Tribunal a quo (cfr. fls. 11 da sentença proferida, relativamente ao depoimento de J...).
H. Deste modo, o Tribunal a quo ignorou deliberadamente a seguinte matéria de facto, apesar da mesma ser referida posteriormente na argumentação de direito, a saber fls. 11 da sentença proferida, entendemos que a mesma deveria constar da matéria de facto dada como assente.
I. Face ao exposto, propõe-se que seja aditado o facto F.1) com o seguinte teor:
F.1) De acordo com o responsável pela contabilidade da empresa pese embora a atual situação de pré-insolvência da empresa Requerente (v.g.: face ao significativo atraso verificado na concretização do projeto por referência à avaliação inicial feita no plano de negócio apresentado com a candidatura; subsistindo face às entradas de dinheiro dos sócios; prejuízos acumulados, etc) existem já algumas evidências ao nível da faturação que permitem admitir como possível a alteração de tal situação, uma vez que os acordos comerciais entretanto fechados e a fechar, estão a dar uma perspetiva clara de recuperação e de arranque do modelo de negócio, cuja viabilidade económica dependerá das entradas futuras em resultado dos negócios que estão a ser fechados hoje e de não ter que proceder à devolução imediata do montante em causa nos autos (cfr. fls. 11 da sentença proferida, relativamente ao depoimento de J...).
J. Assim, o ora recorrente entende que o Tribunal “a quo’’ errou na apreciação da decisão da matéria de facto, ignorando deliberadamente o teor da totalidade dos documentos indicados na matéria de facto dada por provada, julgando incorretamente os factos G), H), I) e J) da matéria de facto dada como provada, face à errada apreciação da prova produzida a respeito de cada um deles, encerrando juízos conclusivos e, como tal, deverão ser eliminados e deverá ser aditado o facto F.1).
K. Quanto ao fumus boni iuris, a sentença proferida faz uma incorreta interpretação dos factos e do direito aplicável, porque resulta duma leitura sumária ao DOC. 5 junto ao requerimento inicial, facto dado como provado na alínea C) da matéria de facto dada como assente, as obrigações e prazos a que a requerente estava obrigada, cfr. a este propósito a cláusula 4ª do DOC. 5 junto ao requerimento inicial, da qual consta expressamente que a execução material da operação teve início em 01/01/2013 e fim em 30/06/2014, ocorrendo o termo da operação em 12/11/2018 e não março de 2019 como resulta da sentença proferida, razão pela qual a fundamentação da mesma é contraditória com a própria matéria de facto dada como assente e, como tal, deverá ser revogada.
L. Qualquer cidadão comum ao ler a decisão final compreende que o que está em causa são as obrigações do contrato e o cumprimento dos indicadores de realização material do projeto a que a beneficiária se propôs, metas e indicadores/aprovados em candidatura, não podendo ser abertos precedentes em tão sensível domínio.
M. Aliás, resulta da própria sentença proferida, que M..., sócio-gerente da empresa Requerente, prestou declarações sobre factos em que teve intervenção pessoal, sublinhando «que a procura de produto diferenciador - recheio dos bombons; marca e caixas para o mercado internacional - demorou mais tempo do que o previsto no plano de negócios inicialmente apresentado, aduzindo ainda que a opção pela disponibilização de bombons aos clientes do Palacete, e não a sua venda, pode não ter sido a melhor solução, mas que o esforço comercial - sobretudo em feiras de especialidade e internacionais - que tem vindo a ser desenvolvido, começa agora a dar sinais encorajadores em termos de resultados económicos» (realçado nosso, cfr. fls. 10 da sentença proferida relativamente à declaração de parte), ou seja, a própria requerente demonstra que compreendeu perfeitamente o fundamento de facto e de direito da decisão cuja suspensão requer!
N. Com efeito, conforme resulta das declarações de parte prestadas e dos depoimentos, as alegadas ilegalidades assacadas ao ato não se apresentam como ostensivas, antes obrigando o Tribunal a proceder a uma tarefa de escrutínio e a um trabalho de análise.
O. Quer isto dizer que o fumus boni iuris respeitante ao direito a exercer na ação principal não está evidenciado, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo.
P. O próprio responsável pela contabilidade da empresa confirmou o «significativo atraso verificado na concretização do projeto por referência à avaliação inicial feita no plano de negócio apresentado com a candidatura» e «estão a dar uma perspetiva clara de recuperação e de arranque do modelo de negócio», sendo evidente que a requerente violou os objetivos fixados por si própria para a operação em causa, a questão a ser decidida em sede principal é a consequência legal do referido atraso.
Q. Tendo em conta, quer a documentação junta pela requerente, quer os depoimentos prestados, quer a decisão final proferida pelo ora requerido, verifica-se que as alegadas “vicissitudes” relativas aos prazos de execução são da exclusiva responsabilidade da requerente e serão matéria para ser objeto de análise no âmbito de um processo principal e não no âmbito dos presentes autos cautelares, não se verificando o fumus boni juris.
R. Quanto ao periculum in mora, a requerente limitou-se a alegar meros prejuízos, não os provando nem densificando, ou seja, nem sequer alegou factos demonstrativos da sua verificação, limitando-se a referir que o ato suspendendo lhe irá causar graves prejuízos de difícil reparação.
S. Salvo melhor entendimento, na situação em apreço, mesmo considerando a matéria de facto dada como provada nas alíneas G) a L) da matéria de facto dada como assente, o Tribunal a quo não quantificou, nem densificou o impacto que a execução do ato teria na situação económica da ora recorrida, nem identificou em que medida torna impossível a execução do projeto, limitando-se a acolher os argumentos invocados pela recorrida, que mais não são do que meros juízos ou conclusões, recorrendo a generalidades e a conceitos indeterminados.
T. De acordo com o que consta na sentença recorrida, a avaliação dos prejuízos de difícil reparação deve ser efetuada com base num juízo de prognose assente na prova feita e na experiência comum, tendo por referência a possibilidade (ou impossibilidade, para efeitos de considerar irreparável) de reintegração natural e específica na esfera jurídica da requerente, caso a ação principal venha a ser julgada procedente.
U. Ora, neste caso, o montante em causa seria de novo devolvido à ora recorrida. Relembra- se que a recorrida conseguiu manter-se em funcionamento, conforme resulta da matéria de facto dada por provada, sem apresentar quaisquer receitas em 2015, 2016 e 2017, já antes da ordem de reposição, razão pela qual não existe nexo de causalidade entre os prejuízos que invoca e aquela ordem.
V. Face ao depoimento prestado pelo responsável pela contabilidade da empresa requerente no sentido de «que existem já algumas evidências ao nível da faturação que permitem admitir como possível a alteração de tal situação, uma vez que os acordos comerciais entretanto fechados e a fechar, estão a dar uma perspetiva clara de recuperação e de arranque do modelo de negócio», o Tribunal não podia concluir, sem qualquer outra prova adicional, que «a Requerente não tem ainda capacidade em termos de encomendas para realizar o capital reclamado» (cfr. fls. 11 da sentença proferida, sublinhado nosso).
W. Salienta-se que as alegadas evidências de faturação não foram também devidamente quantificadas, nem em sede documental como o teria legalmente de ser, nem em sede testemunhal.
X. Acresce ao exposto que resulta evidente de uma breve análise à prova documental existente no processo, DOC. 23 junto ao requerimento inicial, para concluir que os factos G) e I) são meramente conclusivos, existindo evidências de que as máquinas de produção de chocolates não constituem os únicos ativos relevantes da Requerente e que a mesma dispõe de meios financeiros que lhe permitam devolver o montante concedido pela Entidade Requerida, conforme resulta expressamente do referido documento, indicando-se sem carácter exaustivo, os seguintes:
- conta/rubrica 2, contas a receber e a pagar, com crédito de 315.631,10 EUR da página 1 do DOC. 23;
- conta/rubrica 27, outras contas a receber e a pagar, com crédito de 223.274,10 EUR da página 1 do DOC. 23;
- conta/rubrica 278, outros devedores e credores, com crédito de 218.279,24 EUR da página 1 do DOC. 23;
- conta/rubrica 4, INVESTIMENTOS, com crédito de 126.655,53 EUR da página 2 do DOC. 23;
- conta/rubrica 43, Activo fixos tangíveis, com crédito de 114.420,34 EUR da página 2 do DOC. 23;
- conta/rubrica 5, CAPITAL, RESERVAS E RESULTADOS, com crédito de 165.714,78 EUR da página 2 do DOC. 23;
- conta/rubrica 7, RENDIMENTOS, com crédito de 38.960,83 EUR da página 4 do DOC. 23;
- conta/rubrica 7633, Processos judiciais em curso, com crédito de 20.910,80 EUR da página 4 do DOC. 23.
Y. Como resulta do facto C) da matéria de facto assente e do teor do DOC. 5 junto ao requerimento inicial, o contrato de investimento foi celebrado em 2014 e de acordo com a cláusula 4ª, n° 1 do contrato, a data fim da execução material do projeto de investimento terminava a 30/06/2014.
Z. Também deveria a requerente ter junto um extrato bancário de uma conta, sendo certo que o ora requerido não sabe e não é obrigado a saber se a requerente tem contas bancárias com depósitos em seu nome ou conjuntas noutras instituições, nem foi indicado qualquer outro património (designadamente, imóveis ou veículos automóveis), o que facilmente se poderia concluir pela sua existência se a Requerente tivesse procedido à junção da declaração de IRC de 2017 e 2018 e declaração da Autoridade Tributária.
AA. A prova documental em falta nos presentes autos e supra melhor referida não é legalmente suscetível de substituição por prova testemunhal, principalmente quando, conforme resulta da própria sentença proferida pelo Tribunal a quo, na prova testemunhal existiram «imprecisões, incongruências e contradições entre os testemunhos (v.g. quanto ao número de trabalhadores, suas funções e vinculo; quanto à disponibilidade e/ou vendas de bombons aos hóspedes do Palacete e quanto ao que foi feito em termos de promoção da empresa até 2018) e entre estes e a prova documental, o que não foi ignorado, mas aceite e valorado, atenta a produção de prova apreciada no seu conjunto» (realçado nosso).
BB. Logo, tratando-se o DOC. 23 de um mero balancete de 6 meses de 2018, quando deveria ter procedido à junção aos autos do IRC de 2017 ou de 2018, não se pode concluir como o Tribunal a quo pela verificação do periculum in mora.
CC. Aliás, salienta-se que a requerente não logrou sequer provar a existência de arrendamento ou qualquer outro tipo de cedência do imóvel no qual está situada a fábrica, o que facilmente se poderia concluir pela sua existência se a Requerente tivesse procedido à junção da declaração de IRC de 2017 e 2018 e/ou declaração da Autoridade Tributária, sendo certo que outro entendimento resultaria na violação dos artigos 392° e ss. do Código Civil.
DD. Não o tendo feito, conclui-se que a requerente poderá também ser proprietária do imóvel no qual labora a fábrica e o valor do mesmo poderá ser suficiente para garantir a dívida no âmbito do processo de recuperação de verbas, sendo que sob pena de violação dos artigos 392° e 393° do Código Civil, o documento suscetível de fazer prova da propriedade do imóvel em questão seria a declaração de IRC de 2017 e 2018 e declaração da Autoridade Tributária, que não foi junta aos presentes autos pela requerente.
EE. Face à insuficiência de prova efetuada nos presentes autos não se pode legalmente concluir que o pedido de devolução do subsídio implique necessariamente «a venda forçada das máquinas de produção de chocolates da Requerente» e «rejeição das matérias-primas, ao encerramento do estabelecimento de produção de bombons, à extinção dos postos de trabalho, ao fecho da atividade, à perda de todo o investimento realizado e à insolvência da empresa Requerente».
FF. Aliás, face à inexistência de quantificação concreta e densificação das despesas e receitas TOTAIS da requerente, é o próprio tribunal a quo que fundamenta o periculum in mora com a não apresentação de resolução fundamentada pela ora recorrente, admitindo que o IFAP se conformou com o diferimento da execução do ato suspendendo.
GG. Salvo o devido respeito, tal é, desde logo, falso, além de ser um absurdo jurídico e uma tendenciosa inversão ilegal no ónus da prova.
HH. Face ao exposto, por partir de premissas erradas e porque não há identidade de situação, é ilegal e tendenciosa a conclusão do Tribunal de que o recorrente ao não apresentar resolução fundamentada «se conformou com o diferimento da execução do ato suspendendo».
II. Por outro lado, não sendo a não apresentação de resolução fundamentada critério para julgar verificado o periculum in mora, o próprio Tribunal admite que a avaliação dos prejuízos de difícil reparação é feita de forma deficiente ao escrever: “a parte e as testemunhas demonstraram a sua razão de ciência tendo sido igualmente valiosos para a determinação dos factos provados e não provados o confronto entre os diferentes depoimentos (a par da segurança no depoimento, das hesitações, da convicção, dos silêncios e da linguagem corporal adotada por cada uma das testemunhas), bem como a existência de imprecisões, incongruências e contradições entre os testemunhos (v.g. quanto ao número de trabalhadores, suas funções e vinculo; quanto à disponibilidade e/ou vendas de bombons aos hóspedes do Palacete e quanto ao que foi feito em termos de promoção da empresa até 2018) e entre estes e a prova documental, o que não foi ignorado, mas aceite e valorado, atenta a produção de prova apreciada no seu conjunto”.
JJ. Tal significa que nem o Tribunal, nem a requerente, nem as testemunhas concretizaram, de forma rigorosa e não contraditória, sem incongruências, os prejuízos irreparáveis que alegam.
KK. A este propósito salienta-se, inclusivamente, a questão dos trabalhadores da requerente, sendo certo que do DOC. 6 resulta que um dos contratos de trabalho é a termo certo e celebrado por 6 meses, o qual nos termos legais, neste momento, já não seria suscetível de renovação automática, tendo sido dito, conforme resulta da própria sentença, pela testemunha «A..., filho do sócio gerente da empresa Requerente e colaborador desta, na área comercial e de marketing, testemunhou sobre o projeto familiar e as sinergias existentes entre a empresa Requerente e o Palacete (v.g.: atividade, espaço, funcionários e publicidade)», ou seja, os funcionários da requerente também trabalham no Palacete!
LL. Deste modo, face à prova testemunhal produzida e sinergia existente entre a empresa requerente e o palacete, como se pode concluir necessariamente pela extinção dos postos de trabalho?
MM. Não resulta da matéria fáctica citada pela Tribunal a quantificação e/ou indicação de quaisquer prejuízos financeiros irreparáveis, limitando-se o Tribunal a quo nas alíneas G), H), I), J) e K) da matéria de facto dada considerada assente, a reproduzir meros juízos de valores e conclusões, sendo certo que os mesmos seriam apenas suscetíveis de prova através de prova documental e não de prova testemunhal.
NN. Relembra-se que resulta da factualidade assente, facto C) da matéria de facto assente, que o contrato foi celebrado em 28-01-2014, pelo que se a empresa subsiste, pelo menos desde a celebração do contrato «face às entradas de dinheiro dos sócios; prejuízos acumulados, etc», logo não existe nexo causal entre a alegada situação de pré-insolvência da requerente e a decisão suspendenda.
OO. Por último, refira-se ainda que não tendo a requerente junto uma certidão da AT com a lista de todos os imóveis propriedade da requerente, o ora recorrente desconhece, porquanto é facto pessoal da requerente e não é obrigado a conhecer, se este é de facto o único imóvel de que a requerente é titular, desconhecendo, inclusive, se existem rendimentos respeitantes a rendas do referido imóvel.
PP. Porém, da análise da providência em apreço e da própria sentença verifica-se que nada de concreto e quantificado foi alegado que permita concluir pelo “periculum in mora’’, limitando-se a requerente a alegar a existência de prejuízos de difícil reparação, que, salienta-se, já existiam antes da decisão proferida pelo IFAP, sem, no entanto, comprovar essa situação.
QQ. Efetivamente, o ora Recorrente, da documentação junta, não sabe se a requerente tem contas bancárias com depósitos em seu nome noutras instituições, nem foi indicado qualquer outro património (designadamente, imóveis ou veículos automóveis, ou rendimentos respeitantes a rendas de imóveis), o que facilmente se poderia concluir pela sua existência ou não se a requerente tivesse procedido à junção da declaração de IRC e/ou modelo 22.
RR. No entanto,, saliente-se ainda, que o alegado prejuízo não se traduz num prejuízo efetivo, pois caso venha a ser declarada improcedente a ação principal, o que só por mera hipótese de patrocínio se refere, sem conceder, esse montante ser-lhe-á restituído, sendo certo que também poderia a requerente, caso assim o entendesse, solicitar junto do IFAP o pagamento em prestações do valor em dívida ou dar como garantia do valor em dívida qualquer imóvel ou aval prestado pelos sócios da requerente.
SS. Neste sentido a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem ainda considerado necessário, para o decretamento da providência, a verificação da existência de nexo causal entre o dano e o ato suspendendo.
TT. Não basta portanto que a requerente alegue que irá ter um prejuízo. Esta tem de demonstrar que esse montante se irá efetivamente traduzir num prejuízo de difícil reparação, ou seja, que a reintegração da legalidade no plano dos factos se perspetiva difícil ou que os prejuízos que sempre se produzirão ao longo do tempo não serão integralmente reparáveis com tal reintegração, no caso do processo principal proceder, o que não sucede no caso sub judice.
UU. Salvo melhor entendimento, na situação em apreço, o Tribunal a quo, não quantificou o impacto que a execução do ato teria na situação económica da recorrida, nem identificou em que medida tornava impossível a execução do projeto.
VV. Ora o tribunal a quo não podia substituir-se à requerente e considerar verificados os prejuízos de difícil reparação.
WW. Face ao exposto, salvo o devido respeito, ao contrário do que julgou o Tribunal a quo, a requerente não fez pertinente prova, como legalmente lhe competia, para comprovar o alegado periculum in mora, razão pela qual o Tribunal a quo ao decidir pela verificação do periculum in mora, incorreu em manifesto erro de avaliação da matéria fáctica e erro de julgamento, por violação do disposto na parte inicial do n.° 1 do artigo 120.° do CPTA, não tendo ficado sequer indiciariamente provado o periculum in mora.
XX. Considerando que no âmbito do processo cautelar não foram alegados factos concretos e objetivos (conforme aliás resulta de forma contraditória da própria motivação do Tribunal), que permitam ao Tribunal recorrido fazer esse enquadramento, e dele retirar essa conclusão em termos de grande probabilidade, o tribunal a quo deveria ter indeferido a providência cautelar por falta de articulação de factos concretos que consubstanciem periculum in mora.
YY. Ora, conforme tem sido entendimento jurisprudencial, de que se cita a título exemplificativo, acórdão proferido, em 10/02/2003, pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no âmbito do Proc. n° 12518/03, «deve ser indeferida a providência cautelar de suspensão do procedimento, visto que os interesses susceptíveis de serem lesados não podem reportar-se a prejuízos simplesmente hipotéticos, abstractos ou eventuais».
ZZ. Efetivamente mostra-se necessária a existência de um receio fundado, bem como a verificação da existência de nexo causal entre o dano e o ato suspendendo, o que, salvo melhor opinião, não sucedeu no caso sub judice.
AAA. Assim, face ao exposto, manifestamos total desacordo com este entendimento porquanto o Tribunal a quo limitou-se a colher os argumentos expendidos pela ora Recorrida que contém afirmações ou juízos conclusivos decorrentes do uso de conceitos indeterminados, sem nunca contudo concretizar os específicos prejuízos que advirão para a Recorrida da prática do ato que pretende ver suspenso.
BBB. Em suma, para que se tenha por preenchido este requisito, não hasta um mero juízo de probabilidade, mostrava-se necessário comprovar a existência de um receio fundado.
CCC. Com efeito, a prova do fundado receio a que a lei faz referência deveria ter sido feita pela aqui Recorrida, a qual teria que invocar e provar factos que levassem a concluir que seria provável a constituição de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação, o que in casu não sucedeu na medida em que não basta um mero juízo de probabilidade, antes se exigindo a existência de um fundado receio.
DDD. Face ao exposto, a decisão ora recorrida enferma de erro de julgamento relativamente à interpretação e aplicação da primeira parte do n° 1 do artigo 120° do CPTA, não se mostra preenchido o requisito do “periculum in mora’’, uma vez que não se encontra objetiva e concretamente provado nos autos, nem é possível extrair qualquer ilação sobre a repercussão que terá na “vida” da empresa o pagamento da quantia a repor.
EEE. De igual modo, discordamos do entendimento vertido na sentença recorrida a propósito da ponderação entre o interesse privado e o interesse público, não tendo o Tribunal recorrido procedido à ponderação objetiva dos interesses públicos e privados em presença, limitando-se a dar primazia aos interesses privados, sendo evidente que os prejuízos atuais, graves e de difícil reparação que alegadamente se produzirão para a recorrida no caso de denegação da providência de suspensão de eficácia não devem prevalecer sobre os prejuízos para o interesse público que poderão advir da sua concessão.
FFF. Assim, o Tribunal a quo incorre igualmente em violação do disposto no n.° 2 do artigo 120.° do CPTA, porque, caso a providência cautelar viesse a ser decretada e a requerente estivesse efetivamente com graves dificuldades financeiras, se a ação principal viesse a ser declarada improcedente, como se nos afigura provável, o Instituto ver-se-ia na impossibilidade de repor a legalidade da situação, sendo que estão em causa dinheiros públicos, atribuídos por subsídios concedidos por Fundos da União Europeia, os quais, independentemente de obter o pagamento da quantia indevidamente paga através da Requerente, o Instituto terá sempre de suportar, nos termos legais, perante a União Europeia.
GGG. Resulta patente que a suspensão do prosseguimento da execução do ato suspendendo, nos termos requeridos, traduz grave prejuízo para o interesse público, designadamente, porque se a requerente não tem comprovadamente capacidade financeira e económica para pagar o valor em dívida/recuperação, tal provocará inevitavelmente um grave prejuízo económico para o IFAP e para o erário público, constituindo este facto uma lesão concreta do interesse público, quer a nível económico, quer a nível financeiro para o erário público.
HHH. Ora conforme já referimos, a reposição da quantia a efetuar pela requerente não é um prejuízo efetivo, porque, caso venha a ser declarada procedente a ação principal, o que só por mera hipótese se refere sem, no entanto, conceder, esse montante seria sempre restituído sem qualquer prejuízo para a requerente.
III. No entanto, sempre se disse que, caso venha a ser declarada procedente a ação principal, o que só por mera hipótese se refere, sem conceder, esse montante seria sempre restituído à ora recorrida, sendo que o contrário já não é verdade, porque se a ora recorrida estivesse efetivamente com graves dificuldades financeiras, o que como resulta da prova testemunhal produzida já sucede desde 2014, caso venha a ser declarada improcedente a ação principal, o Instituto ver-se-á na impossibilidade de repor a legalidade da situação, sendo que estão em causa dinheiros públicos atribuídos por subsídios concedidos por Fundos da União Europeia e que, em última análise, a República Portuguesa terá de suportar, a expensas dos contribuintes, a recuperação do valor em causa, ou seja, da totalidade dos 178.144,45 EUR.
JJJ. Desde logo refere-se que, recaía sobre a recorrida o ónus da prova, carreando para o processo elementos que permitissem ao Tribunal concluir como fez, o que não sucedeu.
KKK. No caso em apreço nos autos, estão em causa dinheiros públicos, atribuídos por subsídios concedidos por Fundos da União Europeia, pelo que o crivo do que pode justificar o incumprimento pelos beneficiários não pode deixar de ser rigoroso.
LLL. Com efeito, o primado do direito comunitário, previsto no Art° 8° da Constituição da República Portuguesa, e tal como tem sido definido de modo constante pela jurisprudência do Tribunal de Justiça (nesse sentido cita-se o Acórdão Van Gend en Loos, o Acórdão Costa/Enel e o Acórdão Simmenthal, e a nível nacional - Acórdãos do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, de 6/10/2005, 6/12/2005, 29/3/2007, proferidos no âmbito dos Proc.s n.° 2037/02, 328/02 e 61/05, respetivamente), impõe às autoridades que façam prevalecer o direito comunitário sobre o direito nacional, qualquer que seja a natureza da norma comunitária em apreço e a do direito nacional em questão, tornando o juiz nacional como o juiz comum do contencioso comunitário, o qual deverá assegurar na ordem interna o respeito por todas as normas e princípios do direito comunitário.
MMM. Ora, na situação em apreço, na ponderação entre interesse privado e interesse público, estando em causa ajudas comunitárias, salvo melhor opinião, deveria ter prevalecido o interesse público, nomeadamente através da recuperação de montantes indevidamente pagos, uma vez que, há sempre o risco de perda da quantia cuja devolução foi exigida.
NNN. Sobretudo, porque o Instituto está legalmente vinculado, através dum sistema de responsabilização financeira, a recuperar os montantes devidos a irregularidades, nos prazos legalmente estipulados, da ponderação de interesses em causa resulta que se deverá salvaguardar os interesses financeiros da União e do orçamento nacional relativamente aos interesses particulares em causa, negando provimento à presente providência cautelar, mal andou o Tribunal a quo, ao decidir em manifesta violação do disposto no n.° 2 do artigo 120.° do CPTA.
OOO. Face ao exposto, o entendimento do Tribunal ao julgar procedente o processo cautelar interposto pela ora recorrida, e em consequência determinar a suspensão da decisão final proferida pelo IFAP, I.P., não parece ter sido correta, razão pela qual, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser proferido acórdão levantando a suspensão da decisão final proferida pelo IFAP, I.P..
PPP. Neste segmento, em nosso entender, o tribunal a quo interpretou e aplicou incorretamente a lei aplicável, porque «na ponderação entre o interesse privado e o interesse público, estando em causa ajudas comunitárias é de prevalecer o interesse público, nomeadamente através da recuperação de quantias antecipadamente pagas, tanto mais que subsiste o risco de perda da quantia cuja devolução foi exigida.» (cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, 2° Juízo, 1a secção do contencioso administrativo, datado de 14 de julho de 2016, no âmbito do Proc. n° 13412/16, disponível em www.dgsi.pt).
QQQ. Face ao exposto, deve ser alterada a sentença recorrida, concedendo-se provimento ao presente recurso, por provado, uma vez que não se verificam os pressupostos exigidos pelo artigo 120° do CPTA para que a requerida suspensão de eficácia deva ser concedida e, em consequência, ser proferido acórdão levantando a suspensão da decisão final proferida pelo IFAP, I.P”.

O Recorrido nas suas alegações apresentou as seguintes conclusões: ” A) A Decisão recorrida, que decretou a providência cautelar, não merece qualquer reparo ou crítica, pelo que deve manter-se no ordenamento jurídico.
B) A Sentença recorrida não avaliou incorrectamente a prova apresentada, constante das Alíneas G) e I), uma vez que do balancete junto como Doc. 23 ao RI e do depoimento do Contabilista Dr. J... lhe foi possível retirar que (i) as máquinas de produção de bombons são o "único activo relevante" da RCC, (ii) que a Recorrida não tem outros meios financeiros que lhe permitam devolver o montante concedido, encontrando-se mesmo em situação de pré-insolvência.
C) A Sentença recorrida também não incorreu em qualquer erro de apreciação da prova produzida, ao concluir que as máquinas adquiridas constituem o único meio de produção (Alínea H) da matéria provada), uma vez que, em sede de declarações de parte, o Dr. M... confirmou que não obstante os bombons poderem ser feitos à mão, o projecto de produção de bombons do segmento de luxo da Requerente pressupõe que o recheio seja original e artesanal e que os bombons possam ser fabricados em larga escala, ou seja, através da utilização da maquinaria, sem a qual perderiam todos os seus clientes.
D) Também não ocorreu qualquer erro de apreciação relativamente ao facto provado e constante da Alínea J), se o representante da Requerente foi assertivo ao depor que o valor do apoio foi integralmente investido na adaptação da fábrica, na aquisição dos equipamentos para a produção de bombons, salários dos trabalhadores, aquisição de matérias-primas e promoção e divulgação do produto, a instâncias da Mandatária da RCC.
E) A matéria de facto considerada na Sentença recorrida não omite qualquer facto que fosse necessário à Decisão, não devendo por isso ser admitido o aditamento do ponto F.1 pretendido pelo IFAP, por se afigurar desnecessário à boa decisão da causa.
F) A Sentença recorrida não merece qualquer reparo quando conclui pela verificação do requisito fumus boni iuris, uma vez que é provável a procedência dos vícios assacados ao acto, entre os quais, a falta de fundamentação, a falta de indicação da data do acto e o erro sobre os pressupostos de facto e de direito, como o aliás já tinha concluído este Alto Tribunal no Acórdão proferido em 21.02.2019.
G) O IFAP não identifica em que erro de julgamento a Sentença recorrida alegadamente incorreu na apreciação do fumus boni iuris, limitando-se a alegar que o acto se encontra devidamente fundamentado, quando é patente que o mesmo encerra contradições no plano dos factos e é totalmente omisso na fundamentação de direito, não indicando uma única disposição contratual, legal ou regulamentar que habilitasse o IFAP a resolver unilateralmente o Contrato e, em consequência, a ordenar a restituição do apoio concedido à RCC.
H) A Sentença recorrida também não merece qualquer reparo quando conclui que se encontra verificado o requisito do periculum in mora, pois, a RCC não só alegou, como demonstrou, que a execução do acto suspendendo produziria uma situação de facto consumando ou de prejuízo de muito difícil reparação.
I) Com efeito, foi feita prova de que a Recorrida não tem meios financeiros que lhe permitam devolver o montante concedido pelo IFAP (alínea I), que as máquinas de produção de bombons são o seu único activo relevante, que a totalidade do apoio foi aplicada no projecto (alínea J) e que a Recorrida tem trabalhadores a seu cargo (alínea L).
J) Tais dados permitem concluir, com elevado grau de certeza, que, inexistindo por parte da RCC possibilidade financeira para devolver o montante do apoio ao IFAP, já utilizado na aquisição de maquinaria, a não suspensão do acto conduziria a uma cobrança coerciva por parte do IFAP, condenaria a RCC a vender os equipamentos de produção de chocolate, que constituem os seus activos e logo, a encerrar o seu estabelecimento, com necessária afectação dos postos de trabalho entretanto criados no interior do País.
K) Nessa medida, o IFAP não tem razão quando alega que não foram quantificados os prejuízos, ou que não foi densificado o impacto que a execução do acto teria na situação económica da recorrida, nem em que medida se tornou impossível a execução do projecto, se o fim provável da Recorrida, se não fosse o decretamento da providência, seria a apresentação à insolvência.
L) Quanto à ponderação de interesses públicos e privados, a Sentença recorrida também não merece qualquer reparo por não ter recusado a providência, desde logo, porque as invocadas razões de interesse público não se encontram minimamente densificadas, nem concretizadas por reporte ao concreto contrato de atribuição de apoio financeiro celebrado com a Requerente (pp. 17-18 da Decisão recorrida).
M) Com efeito, o IFAP não logrou demonstrar que a alegada possibilidade de redução ou suspensão dos pagamentos comunitários aos Estados-membros em causa decorresse da suspensão do acto aqui em causa ou que estivesse iminente, nem se pode aceitar que as regras comunitárias prevejam tal cenário, quando está em causa o exercício de um direito por um particular, com previsão constitucional nacional e comunitária, contra um acto inválido da Administração.
N) O receio do IFAP de poder vir a não receber o reembolso do apoio atribuído não constitui por si só um interesse superior quando comparado com os interesses invocados do lado da RCC e com os prejuízos irreparáveis que o não decretamento da providência poderia causar.”

O DMMP apresentou a pronúncia no sentido da procedência do recurso.
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo à conferência.

II – FUNDAMENTAÇÃO
II.1 – OS FACTOS
Na decisão recorrida foram dados por indiciariamente provados os seguintes factos, que se mantém:
A) Em 2013-02-28, a Requerente apresentou junto do Órgão de Gestão do Grupo de Ação Local (“GAL”) Monte (Monte - Desenvolvimento Alentejo Central, ACE), candidatura destinada a obter financiamento do IFAP no âmbito do PRODER - Ação 3.1.2 - Criação e Desenvolvimento de Microempresas, para se lançar na atividade de fabrico e produção de chocolates do segmento de luxo: cfr. doc. 3 junto com o Requerimento Inicial - RI, PA, declarações de parte e testemunho de J...;
B) Do pedido de apoio apresentado pela Requerente, ressalta, além do mais:
“... (2/2.3) não se identificam necessidades suplementares de formação especifica para a produção e comercialização de chocolates premium...(...) (4.1) ... está na fase de investimento inicial... (2) ... todo o packaging, imagem institucional, site, etc, serão desde logo definidos (...) (3). estratégia de diferenciação (3.2.1) Imagem Palacete na caixa ... (3.2.2.) Objetivos específicos (...) venda de produtos próprios e para terceiros (...) (3.3) ... escolha criteriosa do melhor e mais fiável produtor de formação de chocolate e recheios de alta qualidade (...) packaging de alta qualidade que permita diferenciação (...) com identificação clara do Palacete ... (3.10) ... Formação relacionada com formulações de chocolate é efetuada pela B... através da P... (...) Estudo de Viabilidade económica e financeira... (2.) Porque não fazer a própria formulação de chocolate? (...) é muito onerosa (..) Qual o racional para a escolha dos fabricantes de máquinas a adquirir? (...) a B... também fornece o recheio, incluindo bases de recheio em que basta juntar um único ingrediente para definir sabor, mantendo a boa textura e a consistência de base do recheio. O custo do recheio é sempre inferior ao preço do chocolate...”: cfr. doc. 3 junto com o Requerimento Inicial - RI e PA;
C) Em 2014-01-28, as partes acordaram entre si e assinaram o contrato de investimento referente à candidatura ao PRODER - Ação 3.1.2 - Criação e Desenvolvimento de Microempresas: cfr. doc. 5 junto com o RI, PA, declarações de parte e testemunho de J...;
D) Em 2018-01-19, na sequência de vistoria de controlo efetuada pela G..., foi reportado à Entidade Requerida que: “... atualmente o espaço encontra-se aberto, todos os equipamentos estão em bom estado apesar de apresentarem sinais de uso...” (...) "...a operação encontra-se em situação regular e o espaço está em funcionamento... ': cfr. doc. 22 junto com o RI, PA e declarações de parte;
E) Em 2018-05-30, a Requerente pronunciou-se em sede de audiência prévia, pugnando pela alteração da proposta de rescisão unilateral e de devolução da quantia referente ao apoio concedido: cfr. PA;
F) Ato suspendendo:
Em 2018-07-30, a Requerente foi notificada do ato suspendendo, que se transcreve:

(“texto integral no original; imagem”)






: cfr. doc. 1 junto com o RI e PA;
G) As máquinas de produção de chocolates, adquiridas há anos e em utilização, constituem os únicos ativos relevantes da Requerente, cujo valor de mercado atual não foi apurado: cfr. doc. 23 junto com o RI, PA, declarações de parte e testemunho de J...;
H) À exceção de uma máquina adquirida mais recentemente, as máquinas acima referidas foram adquiridas com o apoio concedido no âmbito da candidatura acima melhor identificada e constituem o único meio de produção do produto (bombons industriais com recheio artesanal) da empresa Requerente: cfr. doc. 23 junto com o RI, PA, declarações de parte e testemunho de J...;
I) A Requerente não dispõe de meios financeiros que lhe permitam devolver o montante concedido pela Entidade Requerida: cfr. doc. 23 junto com o RI, declarações de parte e testemunho de J...;
J) O investimento de €297.870,00 (= subsidio suspendendo, no valor de €178.144,45 + capitais próprios dos sócios) foi aplicado nas obras de adaptação da fábrica, na aquisição dos equipamentos para a produção de bombons, nos salários dos trabalhadores, na aquisição de matérias primas e demais matérias necessários à produção e na promoção e divulgação do produto: cfr. doc. 23 junto com o RI, PA, declarações de parte e testemunho de J...e de A...;
K) A Requerente está a consolidar um produto, imagem e marca própria, desenvolvendo ações e investimentos feitos na sua produção e promoção: cfr. declarações de parte e testemunho de J... e de A...;
L) A Requerente tem trabalhadores a seu cargo: cfr. doc. 6 junto com o RI, declarações de parte e testemunho de J...e de A...;
M) Em 2018-09-07, a Requerente intentou, neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, a presente providência cautelar: cfr. fls. 1 a 280;
N) Em 2018-10-17, a Requerente, ali A. intentou, neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, a ação principal a que os presentes autos se encontram apensos e que corre termos sob o n.° 648/18.7BEBJA: cfr. fls. 1507.

II.2 - O DIREITO
As questões a decidir neste processo, tal como vêm delimitadas pelas alegações e contra-alegações de recurso e respectivas conclusões, são:
- aferir do erro no julgamento relativamente aos factos G) e I), que são contrariados pelo doc. 23 junto com a PI, do qual decorre que as máquinas de produção de chocolate não são os únicos activos relevantes da Requerente, que lhe permitem devolver o montante concedido;
- aferir do erro no julgamento relativamente ao facto H), que é falso, porque de todos os depoimentos ouvidos resulta o contrário do indicado em tal facto;
- aferir do erro no julgamento relativamente ao facto J), que é uma conclusão tendenciosa, que é contrariada pelo facto C), pelo doc. 5 junto à PI e pelo testemunho de J...;
- aferir do erro no julgamento da matéria de facto, por dever ser aditado o facto F.1), com o seguinte teor, facto provado pelo testemunho de J... “F.1) De acordo com o responsável pela contabilidade da empresa pese embora a atual situação de pré-insolvência da empresa Requerente (v.g.: face ao significativo atraso verificado na concretização do projeto por referência à avaliação inicial feita no plano de negócio apresentado com a candidatura; subsistindo face às entradas de dinheiro dos sócios; prejuízos acumulados, etc) existem já algumas evidências ao nível da faturação que permitem admitir como possível a alteração de tal situação, uma vez que os acordos comerciais entretanto fechados e a fechar, estão a dar uma perspetiva clara de recuperação e de arranque do modelo de negócio, cuja viabilidade económica dependerá das entradas futuras em resultado dos negócios que estão a ser fechados hoje e de não ter que proceder à devolução imediata do montante em causa nos autos”;
- aferir do erro no julgamento de Direito na apreciação do fumus boni iuris, porque a decisão recorrida é contraditória quando indica o termo da execução da operação em Março de 2019, pois esse termo ocorreu em 12-11-2018, como decorre do facto C) e da cláusula 4ª do doc. 5 junto à PI, porque o A. e Recorrido compreendeu correctamente o acto que lhe foi dirigido e as razões porque decisão suspendenda foi tomada e porque o requerente incumpriu a obrigação contratual de manutenção do exercício da actividade, face ao incumprimento do plano empresarial e das metas materiais anuais estabelecidas;
- aferir do erro no julgamento de Direito, por inexistir periculum in mora, porque não estão provados e densificados os alegados prejuízos e porque o Tribunal julgou com base em meros juízos e conclusões, recorrendo a generalidades e conceitos indeterminados e não quantificou o impacto que a execução do acto teria para a situação económica do Recorrido, nem identificou em que medida se tornou impossível a execução do projecto, assim como, porque não concretizou específicos prejuízos;
- aferir do erro decisório por a decisão recorrida também ter errado na ponderação de interesses, porque o Recorrido não tem capacidade financeira e económica para pagar o valor em dívida e se a presente providência for concedida o IFAP nunca irá receber essa mesma quantia, que terá de devolver à União Europeia, assim como, porque estão em causa dinheiros públicos e ajudas comunitárias, que são valores que devem prevalecer sobre os interesses privados.

Nos termos dos art.ºs 636.º, n.º 2 e 640.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi do art.º 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), podem as partes, nas respectivas alegações, impugnar a decisão proferida sobre determinados pontos da matéria de facto.
Mas o artigo 640.º do CPC estabelece como ónus a cargo da parte que impugne a decisão relativa à matéria de facto, a necessidade de especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida, sobre os diversos pontos da matéria de facto impugnados.
Por seu turno, os art.ºs 640.º e 662.º do CPC, permitem a reapreciação e a modificabilidade da decisão de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância apenas nas situações em que o tribunal recorrido apresente um julgamento errado, porque fixou factos de forma contrária às regras da prova, ou os fixou de forma inexacta, ou porque os valorou erroneamente.
Aqui vale o princípio da livre apreciação da prova, remetendo-se para uma íntima convicção do julgador, formada no confronto dos vários meios de prova, que uma vez exteriorizada através de uma fundamentação coerente, razoável, plausível, que obedeça às regras da lógica, da ciência e da experiência comum, torna-se uma convicção inatacável, salvo para os casos em que a prova deva ser feita através de certos meios de prova, que apresentem uma determinada força probatória.

Nestes termos, a impugnação da matéria de facto e a modificabilidade da mesma pelo tribunal superior não visa alterar a decisão de facto fundada na prova documental ou testemunhal, apenas porque a mesma é susceptível de produzir convicções diferentes, podendo ser diversa a tomada no tribunal superior daquela que teve o tribunal da 1.ª instância. Diferentemente, este tribunal superior só pode alterar a matéria de facto porque as provas produzidas na 1.ª instância impunham, decisiva e forçosamente, outra decisão diversa da aí tomada (cf. art.º 662.º do CPC).
Portanto, para a modificação da matéria de facto é necessário que haja uma dada matéria de facto que foi identificada e apreciada pelo tribunal de 1.ª instância e que este tenha exteriorizado a sua convicção na fixação da matéria provada e não provada. Só depois, se face às provas produzidas e para as quais o Recorrente remete, se impuser forçosamente decisão diversa da tomada pela 1.ª instância, há que alterar aquela. Mas terá que se tratar de uma prova firme, indiscutível ou irrefutável, que necessariamente abala a convicção que o tribunal de 1.ª instância retirou da prova produzida.
Igualmente, a matéria de facto que se exige fixada e que pode justificar a alteração em sede de recurso é apenas a que releve para a decisão da causa e não qualquer outra que haja sido alegada pelo A. e R. Ou seja, ainda que seja alegada determinada matéria de facto e ainda que a mesma resulte provada nos autos, se a mesma for irrelevante para a decisão a proferir, não há-de ser tomada em consideração pelo juiz em sede de 1.ª instância e tal omissão também não conduz a um erro decisório.

Vem o Recorrente dizer que os factos G) e I) são contrariados pelo doc. 23 junto com a PI, do qual decorre que as máquinas de produção de chocolate não são os únicos activos relevantes da Requerente, que lhe permitem devolver o montante concedido.
Apreciado o indicado documento, verifica-se que, por si só, não infirma claramente o que ficou dado por provado. Isto é, não resulta do teor de tal documento, de uma forma clara, límpida ou necessária, que o A. e Recorrido tem outros activos líquidos que devam ser reportados como relevantes.
No que concerne à indicação no referido balanço de 2018 de vários créditos, a receber, trata-se de uma indicação que, em si mesma, não debilita a prova indiciária que fixou fixada, pois tais créditos têm de ser considerados atendendo, também, à sua solvabilidade, aos débitos e aos saldos da empresa.
Depois, a resposta aos indicados factos vem alicerçada no próprio doc. 23 e no testemunho de J.... Quanto à credibilidade deste testemunho foi fundamentada com clareza e lógica pela decisão recorrida.
Portanto, a alegação do Recorrente não procede quanto a este aspecto.

Vem o Recorrente invocar um outro erro no julgamento da matéria de facto relativamente ao facto H), que diz ser falso, porque de todos os depoimentos ouvidos resulta o contrário do indicado em tal facto.
Neste ponto ocorre um claro défice no cumprimento dos ónus processuais do Recorrente. O Recorrente aduz o invocado erro decisório limitando-se a concluir pela oposição dos testemunhos ouvidos. Assim, o Recorrente não cumpriu minimamente o ónus que lhe é imposto pelo art.º 640.º do CPC, pois não especificou os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida.
Portanto, esta alegação tem de ser rejeitada, pois o Recorrente não cumpriu os ónus legais que lhe incumbiam. Não indicou o Recorente quais as concretas passagens das gravações de cada uma das testemunhas ouvidas, que contrariavam o que foi dado por provado.
Depois, basta a leitura da motivação da decisão recorrida para se compreender que o Tribunal valorou os testemunhos ouvidos quando indicaram a importância das máquinas para a produção dos bombons.
No caso, está-se frente a prova indiciária, não a prova certa ou firme.
Está-se, ainda, a falar numa produção industrial de bombons, para venda em comércio de retalho, não para serem produzidos e consumidos em meio familiar, em número reduzido e de forma totalmente manual e artesanal. Logo, a invocação do Recorrente de que os bombons poderiam ser produzidos manualmente, sem máquinas, ainda que de forma mais morosa e não alcançando o mesmo resultado que através da produção com máquinas, é um facto que desinteressa para os autos. Nestes autos discute-se a necessidade de máquinas para uma produção de bombons em número relativamente elevado, por estes se destinarem a serem comercializados. Não está em causa nos autos a possibilidade de se fazer uma produção manual e artesanal de bombons, para consumo próprio ou familiar. Ou seja, é óbvio que os bombons de chocolate podem ser confeccionados apenas manualmente, sem uma única máquina. Porém, o que se discute nos autos não é uma confecção desse tipo, mas sim a necessária a uma produção industrial. Portanto, a resposta que foi dada ao facto H) tem de ser lida no contexto da realidade que se pretende fixar: a produção industrial, com alguma escala, de bombons, não a produção apenas manual dos mesmos, feita em número reduzido e de uma forma muito mais morosa.
Em suma, claudica manifestamente esta alegação, por ter por base uma consideração desajustada à realidade dos autos, que decorre de, abstractamente, se puderem confeccionar bombons apenas com recurso às mãos e não com recurso a máquinas.
Não é isso que se pretende apurar nos autos, mas, antes, se para o modelo de negócio do A. e Recorrente as máquinas eram imprescindíveis à correspondente produção de bombons.

Vem o Recorrente invocar um erro na fixação da matéria de facto relativamente ao facto J), porque considera que o mesmo é uma conclusão tendenciosa, que é contrariada pelo facto C), pelo doc. 5 junto à PI e pelo testemunho de J....
Mais uma vez o Recorrente incumpriu os ónus impostos pelo art.º 640.º do CPC, pois remete para o testemunho de J... sem indicar os concretos pontos do seu depoimento que contrariam o facto que ficou provado.
No restante, o facto C) em nada contraria o que fixou fixado em J).
O facto J) dá por assente realidades da vida, não conclusões.
O doc. 5 junto à PI, por si só, não infirma o que vem provado.
Sem embargo, o Recorrente também não esclarece minimamente porque tal documento contraria o facto J).
No demais, estando-se frente a uma providência cautelar, em que apenas se exige prova indiciária e não prova firme, não junção do IRC de 2017 e de 2018, não é razão bastante para se dever dar por não provado o facto J). Ou seja, no caso, para a prova dos rendimentos da empresa não é exigível a apresentação da cópia da correspondente declaração de IRC.

Vem o Recorrente invocar um erro decisório por não ter sido dado por provado com base no testemunho de J... que: “F.1) De acordo com o responsável pela contabilidade da empresa pese embora a atual situação de pré-insolvência da empresa Requerente (v.g.: face ao significativo atraso verificado na concretização do projeto por referência à avaliação inicial feita no plano de negócio apresentado com a candidatura; subsistindo face às entradas de dinheiro dos sócios; prejuízos acumulados, etc) existem já algumas evidências ao nível da faturação que permitem admitir como possível a alteração de tal situação, uma vez que os acordos comerciais entretanto fechados e a fechar, estão a dar uma perspetiva clara de recuperação e de arranque do modelo de negócio, cuja viabilidade económica dependerá das entradas futuras em resultado dos negócios que estão a ser fechados hoje e de não ter que proceder à devolução imediata do montante em causa nos autos”.
Carece esta alegação de razão de ser, primeiro, porque a afirmação que se quer que seja dada por provada não se reconduz a uma realidade fáctica, mas à opinião dada por uma testemunha, que era o responsável da contabilidade da empresa. Ou seja, o que se diz ser facto é, afinal, um juízo opinativo dado em audiência.
Assim, o indicado juízo foi ponderado como tal, pelo que se fez referência ao mesmo na motivação da matéria de facto, para justificar a credibilidade do testemunho.
Depois, o que se quer que seja dado por provado não se reconduz a nenhum facto essencial ou complementar que tenha sido alegado nem pelo A., nem pelo R. Ou seja, a afirmação que se quer que seja dada por assente não é um facto que tenha sido alegado nos autos por qualquer das partes.
Ao A. e ao R. cumpre alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir da acção e os fundamentos da defesa – cf. os art.ºs 78.º, n.º 2, al. f), 83.º, n.º 1, als. b) e c), 3, do CPTA, para a acção administrativa e 114.º, n.º 3, al. g) e 117.º, n.º 1, do CPTA, para o requerimento cautelar.
Por seu turno, para além dos factos articulados pelas partes, ao juiz apenas é lícito considerar os factos instrumentais, que resultem da instrução da causa, os factos complementares ou concretizadores dos factos já alegados e os factos notórios, ou que o Tribunal tenha conhecimento em virtude das suas funções – cf. art.º 5.º, n.º 2, do CPC.
Por conseguinte, não se pode imputar um erro à decisão recorrida, no seu julgamento da matéria de facto, por ser omissa relativamente a determinados factos, que se dizem essenciais para o bom conhecimento da causa, se as partes não cumpriram cabalmente o seu ónus do dispositivo e não alegaram especificadamente, em artigos individualizados, os tais factos que dizem que deviam ser dados por provados.
Em suma, também esta alegação improcede manifestamente.

Vem o Recorrente invocar um erro no julgamento de Direito na apreciação do fumus boni iuris porque a decisão recorrida é contraditória quando indica o termo da execução da operação em Março de 2019, quando esse termo ocorreu em 12-11-2018, como decorre do facto C) e da cláusula 4ª do doc. 5 junto à PI, porque o A. e Recorrido compreendeu correctamente o acto que lhe foi dirigido e as razões porque decisão suspendenda foi tomada e porque o requerente incumpriu a obrigação contratual de manutenção do exercício da actividade, face ao incumprimento do plano empresarial e das metas materiais anuais estabelecidas.

Determina o art.º 120.º, n.º 1, do CPTA, que para o decretamento de qualquer providência cautelar devem verificar-se de forma cumulativa dois requisitos: o periculum in mora e o fumus boni iuris. Ou seja, terá de ficar indiciariamente provado nos autos que existe um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado, ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e, ainda, que é provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
Quando dos factos concretos alegados pelo Requerente se antever que uma vez recusada a providência será, depois, impossível, ou muito difícil, a reconstituição da situação de facto, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, ter-se-á por preenchido o requisito periculum in mora.
Ainda aqui, o critério não é o da susceptibilidade ou insusceptibilidade da avaliação pecuniária dos danos, mas, sim, o da maior ou menor dificuldade que envolve o restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar.
Quanto ao fumus boni iuris que ora se exige, encontra-se na sua formulação positiva, requerendo-se que haja uma séria possibilidade de procedência da pretensão principal, que seja "provável" a aparência do bom direito. Por seu turno, esta apreciação deve ser feita em termos de summario cognitio, com base em juízos de verosimilhança, de mera previsibilidade ou razoabilidade, face aos factos e alegações (indiciários) que são trazidos pelo Requerente para os autos.
A falta de qualquer um daqueles requisitos faz logo claudicar a providência cautelar que tenha sido requerida
Mas ainda que se preencherem os dois requisitos referidos, haverá, depois, que ponderar os interesses em confronto, nos termos do n.º 2 do art.º 120.º do CPTA.

Feito este breve enquadramento, verifique-se do erro decisório por não estar verificado o fumus boni iuris.
Quanto à indicação do termo da operação em Março de 2019, é feita na decisão recorrida por reporte para a fundamentação do acto administrativo impugnado, que refere expressamente o “momento do termo da operação (27/03/2019)” – cf. 2.º parágrafo do ofício do IFAP ref. 005717/2018 DAI_UREC – junto como doc. 1 à PI.
Portanto, a contradição que possa existir reside no próprio acto impugnado, não na decisão recorrida, que se refere à indicada data de Março de 2019, explicitando que tal data consta da fundamentação do acto impugnado.

No que concerne à alegada completude e compreensibilidade plena do acto impugnado, também claudica esta alegação.
Por imposição do n.º 3 do art.º 268.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), os actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos devem ser expressamente fundamentados. Concretizando a imposição constitucional, o art.º 152º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) determina que a fundamentação deve ser expressa, através da sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir na mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, os quais ficarão a fazer, neste caso, parte integrante do respectivo acto (cf. também o artigo 153.º do CPA).
A fundamentação do acto administrativo tem por finalidade dar a conhecer ao destinatário o percurso cognitivo e valorativo do autor daquele mesmo acto, de modo a permitir uma defesa adequada e consciente dos direitos e interesses legalmente protegidos do particular lesado.
Para tanto, a fundamentação tem que ser suficiente, clara e congruente. Tem de permitir ao destinatário médio ou normal, colocado na posição do real destinatário do acto, compreender a motivação que subjaz ao raciocínio decisório. Não é necessário – desde logo porque iria contra os princípios de eficiência e celeridade administrativa – que em cada acto administrativo se proceda a uma fundamentação completa e exaustiva das razões de facto e de direito que motivaram a decisão.
O STA “vem, desde há muito, entendendo que a fundamentação é um conceito relativo, que varia consoante o tipo legal de acto administrativo em concreto, havendo que entender a exigência legal em termos hábeis, dados a funcionalidade do instituto e os objectivos essenciais que prossegue. Objectivos esses de habilitar o destinatário a reagir eficazmente pelas vias legais contra a respectiva lesividade, caso com a mesma não se conforme (objectivo endoprocessual) e de assegurar a transparência, a serenidade, a imparcialidade e reflexão decisórias (objectivos exa ou extra-processuais)” (In Ac. da 1.º Secção do STA Rec. 39.316, de 18-06-1996, n Apêndice ao DR de 23.10.1998, vol. III – Junho).
Nestes termos, apreciada a fundamentação do acto tal como decorre do facto F), afigura-se provável a existência de um vício de falta de fundamentação, por fundamentação insuficiente e contraditória, tal como se julgou na decisão recorrida.
Entre as razões de facto para a tomada da decisão suspendenda, refere-se as “conclusões do controlo administrativo”, sem se indicar quando, onde e em que termos ocorreu tal controlo, ou quais as suas conclusões, que justificam a decisão tomada. A simples referência à existência de certas conclusões de um alegado “controlo administrativo”, não permite a um destinatário médio compreender que controlo foi esse, quando ocorreu ou quais as conclusões ali formuladas.
Depois, a decisão suspendenda também não indica os fundamentos de Direito, sendo totalmente omissa neste aspecto.
Sem embargo, do teor da decisão suspendenda é ainda possível compreender que a prática do acto radica num alegado incumprimento por banda do requerente, ora Recorrido, em desenvolver e manter a actividade, demostrando a sua viabilidade efectiva, nos anos de 2015 a 2017, por não ter apresentado elementos que permitam validar a existência de receitas durante esses anos. Compreende-se, também, que os fundamentos de facto da decisão suspendenda basearam-se na “análise das demonstrações financeiras”, de onde “ressalta ainda, a inexistência de compras, de custos com matérias consumidas, não existindo inventários, nem de matérias primas, nem de produção”, apesar de existirem “depreciações relativas aos ativos tangíveis, nomeadamente equipamento básico, não havendo evidência da data de inicio de utilização”. Diz-se, também, que “As despesas com Fornecimento e serviços Externos são pontuais e não reflectem o normal exercício de uma atividade”.
Todavia, as últimas razões, por si só, não preenchem os requisitos exigidos para a fundamentação de um acto administrativo como o que ora está em causa. Atendendo à gravidade do acto, ou à sua onerosidade, exigia-se ao IFAP que indicasse, de forma completa, porque é que a não apresentação de receitas nos anos de 2015 a 2017 implica necessariamente que o A. e Recorrido não iniciou e manteve a sua actividade, ou em que termos isso implica a inviabilidade da empresa. Da mesma forma, cumpria ao IFAP explicitar a que anos se referem as tais demonstrações financeiras, porquanto se omite por completo essa indicação.
Depois, como acima assinalamos, a fundamentação do acto suspendendo é totalmente omissa quanto a razões de Direito.
A fundamentação adoptada é incompleta, obscura e incongruente, ficando-se sem saber quais as precisas razões de facto que motivaram o acto suspendendo. Quanto às razões de Direito, a fundamentação é totalmente omissa.
Com a fundamentação adoptada, o destinatário do acto – entendido enquanto destinatário médio ou homem médio - não ficará habilitado a conhecer o percurso cognitivo e valorativo do autor do acto e a construir uma defesa adequada e consciente.
A adopção de fundamentos que pela sua obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto equivale à correspondente falta fundamentação.
Assim, é provável que proceda o indicado vício de falta de fundamentação.

Afirma, ainda, o Recorrente que a decisão recorrida errou porque o acto não padece de qualquer irregularidade ou de um vício de violação de lei, porque o requerente incumpriu a obrigação contratual de manutenção do exercício da actividade, face ao incumprimento do plano empresarial e das metas materiais anuais estabelecidas.
Porém, apreciado o teor do acto suspendendo, verifica-se, que também será provável a procedência do indicado vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto.
Conforme decorre da matéria factual apurada, em 19-01-2018, na sequência de vistoria de controlo efectuada pela G... verificou-se que “espaço encontra-se aberto, todos os equipamentos estão em bom estado apesar de apresentarem sinais de uso…” (…) “…a operação encontra-se em situação regular e o espaço está em funcionamento…”.
As conclusões desse controlo contradizem, pois, a afirmação feita no acto sindicado.
Igualmente, como se aponta na decisão recorrida, ainda que a propósito do vício de falta de fundamentação, o teor da de controlo efectuada pela G..., “a par da existência dos contratos de trabalho e dos ativos indiciariamente assentes, contribui para o entendimento de que o ato suspendendo não fundamenta devidamente a invocada asserção de incumprimento da obrigação de manutenção de atividade, que terá justificado a decisão de rescisão unilateral do contrato celebrado e, bem assim a ordem de devolução do subsídio atribuído”.
Ou seja, frente aos factos indiciariamente provados há uma forte probabilidade de existir um erro nos pressupostos de facto, por o acto suspendendo se basear na circunstância de o A. e Recorrido não ter iniciado e mantido a sua actividade, quando essa actividade efectivamente ocorreu e mantém-se.
Na decisão suspendenda afirma-se que o A. e Recorrido não iniciou e manteve qualquer actividade. Depois, declara-se a inviabilidade da mesma com base na inexistência de receitas durante 3 anos e com base em demonstrações financeiras relativas a um ano, ou a anos, que se desconhecem quais sejam.
Neste enquadramento, é provável a existência do invocado erro nos pressupostos de facto, pelo menos no que se refere à afirmação da inexistência de qualquer actividade.
Quanto à invocada não apresentação das receitas de 2015 a 2017 por banda do A. e Recorrido, ou à prova da propriedade onde se situa a fábrica, ou ao respectivo contrato de arrendamento ou de cedência de instalações, trata-se de matéria que se relaciona com a prova e que não se reconduz a uma questão de erro decisório quanto à apreciação do requisito fumus boni iuris.
Mais se diga, que para a verificação de tal requisito basta uma probabilidade séria da procedência dos fundamentos aduzidos contra o acto impugnado, não se exigido um juízo de certeza quanto à ilegalidade de tal acto.
No que diz respeito ao alegado incumprimento por banda do A. e Recorrido da obrigação de manter a sua actividade ou, de alcançar as metas materiais anuais estabelecidas, é matéria que não ficou provada nos autos e que não afasta a provável ilegalidade do acto sindicado, por o IFAP ter prolatado um acto com uma fundamentação insuficiente e contraditória e que padece, também, muito provavelmente, de um erro nos pressupostos de facto.

Em suma, no caso está verificado o requisito fumus boni iuris, pelo que claudicam as alegações de recurso quando imputam um erro à decisão recorrida, por entender em tal sentido.

Vem o Recorrente invocar um erro no julgamento de Direito, por inexistir periculum in mora, porque não estão provados e densificados os alegados prejuízos e porque o Tribunal julgou com base em meros juízos e conclusões, recorrendo a generalidades e conceitos indeterminados e não quantificou o impacto que a execução do acto teria para a situação económica do Recorrido, nem identificou em que medida se tornou impossível a execução do projecto, assim como, porque não concretizou específicos prejuízos.
Esta alegação também claudica.
Conforme decorre dos factos G) a L), o A. e Recorrido, aplicou o subsídio que recebeu em obras de adaptação da fábrica, na aquisição dos equipamentos para a produção de bombons, nos salários dos trabalhadores, na aquisição de matérias-primas e demais materiais necessários à produção e na promoção e divulgação do produto. Também decorre daqueles factos, que as máquinas adquiridas são necessárias para a produção de bombons, que o A. e Recorrido tem trabalhadores a seu cargo, que está a lançar uma nova marca, que se está a consolidar e que não tem meios financeiros necessários para a devolução do subsídio que lhe foi atribuído. Igualmente, decorre dos factos provados que as máquinas de produção são os únicos activos de relevo do A. e Recorrido.
Diz o A. e Recorrido que neste enquadramento fáctico, para poder devolver o subsidio, terá que vender as máquinas de produção que são essenciais ao seu negócio.
Atendendo à realidade indiciariamente provada, a necessidade da venda destas máquinas, com o consequentemente comprometimento de todo o negócio, é algo provável ou quase seguro.
Assim, é também possível antever que se a presente providência for recusada será, depois, impossível, ou muito difícil, a reconstituição da situação de facto, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, pois nessa data as indicadas máquinas já terão sido vendidas e o negócio já terá colapsado, com a consequente insolvência do A. e Recorrido.
Ou seja, atendendo à factualidade apurada nos autos ter-se-á de acompanhar a decisão recorrida quando considerou verificado o periculum in mora por estar indiciariamente provada nos autos a existência da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.
Como acima dissemos, na apreciação deste critério não há que considerar a susceptibilidade ou insusceptibilidade da avaliação pecuniária dos danos, mas, sim, o da maior ou menor dificuldade que envolve o restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar.
Se para o alcançar da liquidez que se requer do A. e Recorrido tiverem de ser vendidas as máquinas de produção de bombons – tal como ficou provado - seguramente que o seu modelo de negócio irá colapsar. Tal colapso acarretará, muito provavelmente, a insolvência da empresa do A. e Recorrido. Por seu turno, tal insolvência implicará a despedida dos seus trabalhadores.
Ora, estas realidades, uma vez verificadas, não poderão, depois, vir a ser restabelecidas. No caso dos autos, está, portanto, verificado o periculum in mora necessário ao decretamento da providência.
Aceita-se que na decisão recorrida não se densificou e precisou com grande minúcia os danos que decorriam para o A. e Recorrido pelo facto de ter que devolver os subsídios concedidos. Aceita-se, ainda, que naquela decisão não indicou os concretos valores contabilísticos que a empresa exibe.
Sem embargo, dos factos G) a L) é possível concluir pela existência de prejuízos reais e actuais para o A. e Recorrido, tal como ora se indicou. Estes factos bastam para se poder concluir pela existência de prejuízos de difícil reparação ou irreparáveis, que preenchem o exigido periculum in mora.
No caso, está-se frente a uma providência cautelar que exige prova sumária e perfunctória. Aqui não se exige uma prova completa, segura ou plena.
Nestes termos, a factualidade provada deve ter-se por suficiente para a prova do indicado periculum, não sendo de exigir uma maior prova para o efeito.
Mais se indique, que a decisão recorrida não se baseou em meras conclusões, mas sim, nos factos que deu por provados de G) a L).
Assim, também a alegação do erro decisório por não estar verificado o requisito periculum in mora tem de claudicar.

Por último, diz o Recorrente que existe um erro decisório, por a decisão recorrida também ter errado na ponderação de interesses, porque o Recorrido não tem comprovadamente capacidade financeira e económica para pagar o valor em dívida e se a presente providência for concedida o IFAP nunca irá receber essa mesma quantia, que terá de devolver à União Europeia, assim como, porque estão em causa dinheiros públicos e ajudas comunitárias, que são valores que devem prevalecer sobre os interesses privados.
Quanto ao facto de estarem em causa dinheiros públicos e de existir uma obrigação de devolução de montantes à União Europeia, daí não deriva necessariamente que os interesses públicos sejam os prevalecentes.
Na ponderação de interesses do n.º 2 do art.º 120.º do CPTA há que avaliar, no mesmo patamar, os interesses em presença, públicos e privados, havendo que afastar-se a ideia de que o interesse público é prevalecente.
Como refere Vieira de Andrade, com o art.º 120.º, n.º 2, do CPTA, não se pretende “ponderar exclusivamente o interesse público com o interesse privado, mesmo que muitas vezes o interesse do requerido seja o interesse público e o interesse do requerente seja o interesse privado: o que está aqui em conflito são os resultados ou os prejuízos que podem resultar da concessão ou a recusa da concessão para todos os interesses envolvidos, sejam públicos, sejam privados.
Na realidade, o que está em causa não é ponderar valores ou interesses entre si, mas danos ou prejuízos e, portanto, os prejuízos reais, que numa prognose relativa ao tempo previsível de duração da medida, e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, resultariam da recusa ou da concessão (plena ou limitada) da providência cautelar” (in ANDRADE José Carlos Vieira de – A Justiça Administrativa, (Lições). 15a ed. Coimbra: Almedina, 2016. ISBN 978-972-40-6731-5, p. 323).
Assim sendo, atendendo a que o não decretamento da presente providência leva provavelmente ao encerramento da fábrica do A. e Recorrido e à consequente insolvência e que da parte do R. e Recorrente existe apenas uma possibilidade meramente hipotética e abstracta de redução ou suspensão de pagamentos comunitários, ter-se-á que concluir que estes prejuízos não são superiores aos prejuízos concretos que poderão verificar-se relativamente ao Recorrido.
Em suma, o presente recurso improcede, havendo de confirmar-se a decisão recorrida.

III- DISPOSITIVO
Pelo exposto, acordam:
- em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida;
- custas pelo Recorrente (cf. art.ºs. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.ºs 1, 2, 4 e 12.º, n.º 2 do RCP e 189.º, n.º 2 do CPTA).

Lisboa, 22 de Agosto de 2019
(Sofia David)
(António Vasconcelos)
(Mário Rebelo)