Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08750/15
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/05/2015
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:ACTO TRIBUTÁRIO E FACTO TRIBUTÁRIO. NOÇÃO.
I.R.C.
REGIME TRANSITÓRIO. ENCARGOS COM FÉRIAS E SUBSÍDIO DE FÉRIAS.
ARTº.12, Nº.1, DO DEC.LEI 442-B/88, DE 30/11.
PROVISÕES CRIADAS AO ABRIGO DO REGIME DO C.C.I.
ARTº.13, Nº.2, DO DEC.LEI 442-B/88, DE 30/11.
Sumário:1. O acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto. Essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas à incidência real, as quais definem os seus elementos objectivos. Só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto. A existência do facto tributário constitui, pois, uma condição “sine qua non” da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada.

2. Nos termos do regime vigente antes da entrada em vigor do C.I.R.C. (C. Contribuição Industrial), de acordo com o entendimento da Administração Fiscal, os encargos resultantes das férias constituíam custos de exercício relativos ao ano em que eram pagos. Com a entrada em vigor do C.I.R.C., tais encargos derivados do direito a férias passaram a ser considerados custos do exercício que deu causa à sua constituição, em sintonia com o disposto no regime legal do contrato de trabalho (cfr.artº.3, dec.lei 874/76, de 28/12). Atendendo a esta alteração legislativa e com vista a regularizar situações anteriores, isto é, encargos que se venceram durante o exercício de 1989, entendeu o legislador, para evitar uma drástica diminuição da base tributável, considerar apenas como custo para efeitos de determinação da matéria colectável do I.R.C. 25% do montante de encargos devidos por motivo do direito a férias (cfr.artº.12, nº.1, do dec.lei 442-B/88, de 30/11).

3. Ainda em sede de regime transitório, diz-nos o artº.13, nº.2, do mesmo dec.lei 442-B/88, de 30/11, que os saldos, existentes a 1 de Janeiro de 1989, das provisões criadas ao abrigo do regime anterior, fossem para cobrir perdas de créditos, fossem para cobrir perdas de valor de existências (cfr.artº.33, corpo e alíneas c) e d), do Código da Contribuição Industrial), transitariam como reposições para as contas de resultados, até equivalerem ao somatório dos custos admitidos no exercício a propósito de férias de anos pregressos, nos termos já referidos no citado artº.12, nº.1, do dec.lei 442-B/88, de 30/11.

4. A intenção do legislador, através da criação destas normas, foi a de provocar um esvaziamento, tão rápido quanto equilibrado, das provisões legalmente admitidas sob a égide do direito de pretérito (C.C.Industrial) e desse período advindas, sem óbvio prejuízo da sua utilização para o acautelamento dos riscos ou eventualidades que determinaram a sua constituição, tudo visando dar lugar a que fossem constituídas provisões enquadradas já no novo sistema do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas. Este regime legal transitório não era, no entanto, aplicável aos contribuintes que já na vigência do C. Contribuição Industrial e com a anuência da A. Fiscal consideravam os encargos derivados do direito a férias como custos do ano em que surgia o respectivo direito e não como provisões.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.74 a 84 do presente processo que julgou procedente a impugnação pelo recorrido, "G.. - Gás …………, S.A.", intentada, visando liquidação adicional de I.R.C., relativa ao ano de 1989 e no montante total de € 416.896,65.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.113 a 121 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-A sentença, do Tribunal a quo procedeu à errónea interpretação dos factos constantes dos presentes autos, e deu como assente a factualidade dos encargos com férias de 1989 terem sido integrados como custos no exercício de 1988, o que não se aplica no presente caso, e assim fazendo a aplicação do direito de forma errada, inquinando desta forma a validade substancial da sentença;
2-Primeiramente no presente caso, existindo dúvidas, falta de elementos susceptíveis de escrutinar com mais arrimo a decisão jurisprudencial, considerando que se trata de uma impugnação judicial parcial a uma liquidação adicional de IRC, caberia à impugnante trazer aos autos e elucidar qualquer situação menos objectiva, considerando que é a parte que vem sindicar a respectiva liquidação em apreço;
3-E portanto em caso de dúvida como coloca a sentença deveria soçobrar a pretensão da impugnante;
4-Não obstante este entendimento, vem a representante da Fazenda Pública apresentar a sua indignação sobre a procedência na decisão em primeira instância, considerando existir erro de julgamento consubstanciado no erro dos pressupostos de facto por ter sido considerado que no exercício contabilístico de 1988, as provisões efectuadas pela impugnante foram consideradas custos;
5-Neste sentido careceu a decisão jurisprudencial do assentamento em pressupostos de facto de acordo com a realidade material;
6-A contrario não existiria qualquer alteração/correção na rubrica "reposição de provisões" tal como indicado no documento 4, junto com a petição da impugnante;
7-Assim se escrutina das informações juntas por parte da Administração Tributária e que demonstram a posição assumida;
8-No mesmo sentido que é corroborada pela posição do Digno Magistrado do Ministério Público que no douto parecer inserto no autos perscrute a devida improcedência do pedido;
9-Cabe assim, destrinçar duas realidades subjacentes, a primeira converge sobre os encargos com as férias na aplicação do novo CIRC, não existindo qualquer impugnação por parte do contribuinte e a segunda sobre o regime de transição do Código de Contribuição Industrial e o entendimento deste sobre os encargos com as férias podendo o contribuinte integrar como provisão ou a custos;
10-É neste segundo ponto que não corroboramos o entendimento formado pelo douto Tribunal a quo na douta sentença e consideramos que foi consubstanciado em factos considerado na base da prova mas errados (nomeadamente o ponto 2);
11-Assim cremos que no exercício contabilístico de 1988 a impugnante processou os encargos por motivo de custos de férias para o ano de 1989, conforme prescrito pelo CCI, como provisão, isto é, inscreveu uma quantia certa, para uma situação futura certa, mas sobre um valor incerto e estimado (e não como custo como se encontra provado);
12-Sobre este mote e de acordo com o regime de transição relativo ao CIRC subscrevia o seguinte entendimento: "De facto, o artigo 13° n°2 alínea a) do D.L. 442-6/88 de 30 de Novembro estabelece que para calculo do montante a repor, ao abrigo da alínea a), será obtido pela aplicação da percentagem 25% (referida na parte final do n°1 do artigo 12° do referido D.L. 442-B/88), ao montante total pago em 1989 referente a encargos com férias de 1988 ou seja Esc.: 240.594.876$00 x 25% = Esc. 60.148.719$00.
A propósito passa-se a citar o comentário inserto na pág. 34, na anotação do art.° 12° efectuada no código do I.R.C. da D.G.C.I., ed. 1990: Se a empresa já vinha contabilizando na conta 65 os encargos com férias a pagar no ano subsequente sem que tenha sido considerada pela Administração Fiscal como provisão não dedutível não deverá fazer quaisquer correcções.";
13-Esta foi a reposição de provisão colocada na linha 22 e que a impugnante vem sindicar parcialmente;
14-Tendo sido esta a posição adotada pela AT e de acordo com a norma interpretativa 1/89 da comissão de normalização contabilística que veio considerar em relação aos contribuintes que no exercício de 1988, já tinham contabilizado como custos os respectivos encargos com férias a processar em 1989, não seria aplicável o regime exposto;
15-Logo, acordando a impugnante no ponto 17 da petição, em contabilizar a reposição de provisões, respondendo cabalmente as dúvidas suscitadas na sentença;
16-De outra forma nem a AT faria a correcção parcialmente sindicada, uma vez que se trata de uma posição firmada pela doutrina e seguida;
17-Neste sentido e estando a liquidação efetuada de acordo com as normas que regulam o regime transitório entre ambos os códigos (CCI vs CIRC) deve a pretensão da impugnante ser julgada improcedente de acordo com todos os entendimentos plasmados e expostos;
18-Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve ser a decisão revogada e substituída por Acórdão que declare a impugnação improcedente. PORÉM V. EX.AS, DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.
X
A sociedade recorrida produziu contra-alegações nas quais pugna pela improcedência do recurso e manutenção da decisão do Tribunal "a quo" (cfr.fls.122 a 144 dos autos), terminando com as seguintes Conclusões:
1-Tendo em conta a matéria de facto provada nos presentes autos, entende a ora recorrida que a sentença proferida pelo Tribunal a quo não merece qualquer reparo;
2-Desde logo porque, contrariamente ao que vem referido nas alegações de recurso, nunca recairia sobre a impugnante o ónus de demonstrar "todos os factos subjacentes";
3-Pois tratando-se de um ato de liquidação adicional de IRC, é sobre a AT que impende o ónus de provar os factos constitutivos do alegado direito a efetuar uma correção à matéria coletável declarada pela ora recorrida, conforme têm afirmado os Tribunais nacionais e resulta claramente do disposto no artigo 74 da LGT;
4-Razão pela qual, em estrito cumprimento dos arts.100, n°1, do CPPT e 121 do CPT, a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário deverá determinar a anulação do ato tributário, como bem decidiu o Tribunal a quo;
5-Mas não só: em substância, o que está em causa nos presentes autos é a interpretação do regime transitório contido nos artigos 12° e 13° do Decreto-Lei n°442-B/88, de 8 de Novembro, que permitiu aos sujeitos passivos "migrarem" das regras relevantes do Código da Contribuição Industrial para o Código do IRC;
6-Ao abrigo do art.12, n°1, do Decreto-Lei n°442-B/88, face à alteração do critério para considerar como custo do exercício os encargos com férias, a Lei determinou que os custos relativos aos direitos vencidos no exercício da entrada em vigor do IRC (1989) mas que fossem relativos a anos anteriores (i.e., gerados até 1988, inclusive) seriam considerados como custos nos quatro primeiros exercícios de aplicação desse imposto, na proporção de 25% por ano;
7-Ao mesmo tempo que estabeleceu (cf. art.13°, n°2, do Decreto-Lei n°442-B/88) que o saldo, em 1 de janeiro de 1989, das provisões relativas a (i) créditos de cobrança duvidosa e (ii) perdas de valor em existências, deveria ser "reposto" nas contas de resultados dos exercícios encerrados posteriormente àquela data (e como tal acrescido ao lucro tributável), num montante até à concorrência do somatório:
a. Da importância correspondente aos encargos devidos por motivo de férias considerada como custos nos termos do n°1 do artigo 12°; e
b. Da importância correspondente à constituição ou reforço das provisões para processos judiciais em curso e responsabilidades emergentes de acidentes de trabalho e doenças profissionais;
8-Deste modo, a única relação que a Lei estabelece entre o saldo das provisões do artigo 13 e os custos de 1989 inerentes a encargos com férias gerados em anos anteriores é a limitação quantitativa prevista no n°2: o saldo das provisões a "repor" em cada ano não pode exceder, nos primeiros quatro exercícios de vigência do IRC, o montante de 25% daqueles custos, porque é precisamente este montante de 25% daqueles custos que é dedutível;
9-Foi esta a forma que o legislador encontrou de neutralizar o efeito contabilístico e fiscal decorrente das novas regras de apuramento da matéria coletável ao abrigo do Código do IRC, evitando um acréscimo efetivo à matéria coletável "de supetão", como bem reconheceu a sentença recorrida;
10-Ora, o que a ora recorrida sempre sufragou e mantém é que os custos reconhecidos no exercício de 1989 e que dizem respeito a encargos com férias vencidos no exercício de 1989 mas gerados em exercícios anteriores ascenderam a 52.066.827$00;
11-Logo, nos exatos termos da Lei, a ora recorrida não poderia reconhecer esse valor na integralidade como custo em 1989 mas apenas 25% - i.e. 13.016.706$75 - cumprindo-lhe diferir os demais 75% do mesmo, em partes iguais, para os três anos subsequentes;
12-Razão pela qual solicitou a anulação da correção relativa à reposição em resultados do saldo das provisões, na medida da diferença entre o valor proposto pela AT e o montante devido, pelo valor de 47.132.012$00 [60.148.719$00-13.016.707$00];
13-Com efeito, se apenas 13.016.706$75 foram aceites como custo de 1989 (em virtude do diferimento para os três exercícios subsequentes do montante de 39.050.120$00), é absolutamente desprovido de fundamento legal que se procure ultrapassar esse limiar na reposição do saldo das provisões ao abrigo do artigo 13, n°2, do Decreto-Lei n°442-B/88;
14-A ultrapassagem desse limiar frustraria a neutralidade visada pelo regime transitório criado pelo legislador, ao "repor nas contas de resultados" um valor superior ao que é permitido deduzir como custos, o que colide frontalmente com a letra da Lei;
15-O montante equivalente a 25% dos custos inerentes a encargos com férias está identificado e determinou a limitação dos custos dedutíveis no exercício, para efeitos do n°1 do artigo 12 do Decreto-Lei n°442-B/88, a 13.016.717$00;
16-Donde decorre, inapelavelmente, que era o limite de 13.016.707$00, em cada exercício, o limiar do acréscimo de proveitos inerente à "reposição" de provisões, nos termos do art.13, n°2, do mesmo diploma;
17-No caso vertente, contudo, não só o acréscimo de proveitos inerente à "reposição" de provisões não respeitou tal limitação, contida no n°2 do artigo 13 do Decreto-Lei n°442-B/88, como nem tão-pouco surge identificado;
18-Ou seja, não só a AT não respeitou o limite da correção, como se "esqueceu" de a justificar;
19-O que, conforme se demonstrou, não encontra qualquer acolhimento na Lei, razão pela qual a correção efetuada pela AT é ilegal, e a sua anulação deve manter-se;
20-Termos em que, deverá ser negado provimento ao recurso interposto pela Representante da Fazenda Pública, e a sentença recorrida ser mantida, nos seus exatos termos, pois só assim se fará a costumada JUSTIÇA!
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do provimento do presente recurso (cfr.fls.175 a 177 dos autos).
X
Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A decisão recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.77 a 79 dos autos):
1-A impugnante, "G…….. - Gás …………., S.A.", com o n.i.p.c. ……………., foi objecto de uma acção inspectiva relativamente a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas e ao exercício de 1989, no termo da qual foram levadas a efeito diversas correcções aritméticas à sua matéria colectável, relativamente ao que tinha sido oportunamente declarado (cfr.informação exarada a fls.35 a 41 dos presentes autos; cópia do mapa de apuramento mod.DC-22 junta a fls.10 a 12 dos presentes autos);
2-Tendo a Administração Tributária verificado que no exercício de 1998 a impugnante integrara, como custos desse exercício, encargos com férias no montante de 188.528.049$00, a pagar em 1989, mas que neste ano de 1989 ela efectivamente despendera 240.594.876$00 a Administração Tributária acresceu à matéria tributável de 1989, 39.050.120$00, correspondentes a 75% da diferença entre aqueles dois valores [240.594.876$00 - 188.528.049$00 = 52.066.827$00 e 52.066.827$00 x 0,75 = 39.050.120$00], implicitamente mantendo como custo do exercício da impugnante, de 1989, àquele mesmo título, 13.016.707$00, ou seja, 25% de 52.066.827$00 (cfr. informação exarada a fls.35 a 41 dos presentes autos; cópia do mapa de apuramento mod.DC-22 junta a fls.10 a 12 dos presentes autos);
3-Paralelamente, a Administração Tributária efetuou uma outra correção, no montante de 60.148.719$00, acrescendo-os também à matéria coletável, e correspondente a 25% do valor dos encargos com férias de 1988, pagos no exercício de 1989 240.594.876$00 x 0,25 = 60.148.719$00 (cfr.informação exarada a fls.35 a 41 dos presentes autos; cópia do mapa de apuramento mod.DC-22 junta a fls.10 a 12 dos presentes autos);
4-Na elaboração do correspondente mapa de apuramento, de 1 de Abril de 1992, modelo DC 22, em fundamentação dessas correções, a Administração Tributária invocou a referida razão, quanto à correção do ponto 2 supra, e quanto à do ponto 3 supra, que se tratava de uma reposição de provisão nos termos do Código da Contribuição Industrial, correspondente à percentagem de encargos com férias de 1988, pagos em 1989 (cfr. cópia do mapa de apuramento mod.DC-22 junta a fls.10 a 12 dos presentes autos);
5-Com base nesse mapa e suas correções, a Administração Tributária elaboraria depois, em 1 de Junho de 1994, a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, relativa ao ano de 1989, com o n°………………, da qual resultou uma dívida a esse título de 83.580.274$00, incluindo derrama, e uma vez descontado o valor pago em cumprimento da liquidação originária (cfr.documentos juntos a fls.7 e 8 dos presentes autos);
6-Apesar de tal liquidação ter prazo de cumprimento com termo a 19 de Agosto de 1994, a impugnante foi dela notificada sendo-lhe indicado que o prazo de pagamento era de 30 dias, contados do terceiro dia posterior ao do registo postal, ocorrido em 5 de Agosto de 1994 (cfr.documentos juntos a fls.8 e 9 dos presentes autos);
7-A 5 de Setembro de 1994 a impugnante procedeu ao pagamento da descrita dívida de imposto (cfr.documentos juntos a fls.13 e 30 dos presentes autos; informação exarada a fls.35 a 41 dos presentes autos);
8-A 8 de Novembro de 1994 a impugnante apresentou a petição que originou os presentes autos (cfr.data de entrada aposta a fls.2 dos autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não há outra matéria provada, nem factos não provados, que relevantes sejam para a apreciação da causa, salvo que não resultou provado que:
1. A impugnante tivesse constituído em anos anteriores, e subsistentes em 1989, provisões para atender a encargos com férias desses anos mas que iria pagar em exercícios seguintes, ou que as tivesse constituído para atender à cobertura de créditos de cobrança duvidosa, ou à perda ou depreciação das suas existências…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…O Tribunal formou a sua convicção através da análise do teor de fls.7-13, onde de inclui a liquidação e sua notificação e o mapa de apuramento, em cotejo com a informação oficial elaborada e o teor daqueloutra de fls.65-66, relativa ao pagamento da dívida. Na medida em que a fidedignidade de tal documentação não foi posta em causa, nem dúvidas suscita acerca da sua correspondência com os originais, mereceu ser suporte demonstrativo dos factos nela contidos, nos termos em que lho reconhecem os arts.369° n°1, 371° n°1 do Código Civil, em conjugação, ainda, com a força probatória que o art.34° n°2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário lhe reconhece.
O facto não provado mereceu esse juízo negativo sobre a sua ocorrência por ser inexistente a prova sobre ele. Com efeito, no mapa de apuramento diz-se que se trata de uma reposição de provisões constituídas ao abrigo do regime de pretérito, mas não é indicada nenhuma provisão em concreto, muito menos qual o saldo remanescente que pudesse e devesse ser, até certo ponto, objeto da reposição em resultados operada, apenas é invocada a medida dessa reposição, "25% dos encargos com férias de 1988, pagos em 1989", desconhecendo-se assim qual a sua origem…”.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou procedente a impugnação, em consequência do que anulou a liquidação adicional objecto dos presentes autos, na parte em que repousou na consideração, como resultado do exercício, da percentagem de 25% dos encargos, incorridos em 1988, com férias dos seus trabalhadores, pagos em 1989, no montante de Esc.60.148.719$00/€ 300.020,55 (cfr.nºs.3 e 5 do probatório).
X
Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Alega o recorrente, em síntese e conforme se alude supra, que no exercício contabilístico de 1988 a impugnante/recorrida processou os encargos por motivo de custos de férias para o ano de 1989, conforme prescrito pelo C.C.I., como provisão, isto é, inscreveu uma quantia certa, para uma situação futura certa, mas sobre um valor incerto e estimado (e não como custo como se encontra provado). Que o montante a repor, ao abrigo da alínea a), do artº.13, nº.2, do dec.lei 442-B/88, de 30/11, será obtido pela aplicação da percentagem 25% ao montante total pago em 1989 referente a encargos com férias de 1988, ou seja, Esc. 240.594.876$00 x 25% = Esc. 60.148.719$00. Que foi esta reposição de provisão colocada na linha 22, do m/DC22, que a impugnante vem sindicar. Que estando a liquidação efectuada de acordo com as normas que regulam o regime transitório entre ambos os códigos (CCI vs. CIRC) deve a pretensão da impugnante ser julgada improcedente (cfr.conclusões 1 a 17 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Vejamos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Antes de mais, se dirá que o recorrente carece de razão ao aludir ao facto de no exercício contabilístico de 1988 a impugnante/recorrente ter processado os encargos por motivo de custos de férias para o ano de 1989, conforme prescrito pelo C.C.I., como provisão. Tal conclusão não é admitida pela impugnante no articulado inicial do processo. Por outro lado, à mesma conclusão não se chega em resultado do exame dos documentos juntos ao processo e que corporizam as correcções efectuadas pela A. Fiscal à matéria colectável de 1989 da impugnante, em sede de I.R.C. (cfr.cópia do mapa de apuramento mod.DC-22 junta a fls.10 a 12 dos presentes autos).
Avancemos.
O acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto. Essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas à incidência real, as quais definem os seus elementos objectivos (cfr.Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág.324; Nuno de Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1996, pág.57; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.269). Só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto. A existência do facto tributário constitui, pois, uma condição “sine qua non” da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/2/2013, proc.5713/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7073/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/3/2014, proc.7384/14).
Nos termos do regime vigente antes da entrada em vigor do C.I.R.C. (C. Contribuição Industrial), de acordo com o entendimento da Administração Fiscal, os encargos resultantes das férias constituíam custos de exercício relativos ao ano em que eram pagos (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/9/1993, rec.16222). Com a entrada em vigor do C.I.R.C. tais encargos derivados do direito a férias passaram a ser considerados custos do exercício que deu causa à sua constituição, em sintonia com o disposto no regime legal do contrato de trabalho (cfr.artº.3, dec.lei 874/76, de 28/12). Atendendo a esta alteração legislativa e com vista a regularizar situações anteriores, isto é, encargos que se venceram durante o exercício de 1989, entendeu o legislador, para evitar uma drástica diminuição da base tributável, considerar apenas como custo para efeitos de determinação da matéria colectável do I.R.C. 25% do montante de encargos devidos por motivo do direito a férias (cfr.artº.12, nº.1, do dec.lei 442-B/88, de 30/11; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.21 e seg.).
Por outro lado, ainda em sede de regime transitório, diz-nos o artº.13, nº.2, do mesmo dec.lei 442-B/88, de 30/11, que os saldos, existentes a 1 de Janeiro de 1989, das provisões criadas ao abrigo do regime anterior, fossem para cobrir perdas de créditos, fossem para cobrir perdas de valor de existências (cfr.artº.33, corpo e alíneas c) e d), do Código da Contribuição Industrial), transitariam como reposições para as contas de resultados, até equivalerem ao somatório dos custos admitidos no exercício a propósito de férias de anos pregressos, nos termos já referidos no citado artº.12, nº.1, do dec.lei 442-B/88, de 30/11.
Em suma e salvo melhor opinião, a intenção do legislador, através da criação destas normas, foi a de provocar um esvaziamento tão rápido quanto equilibrado, das provisões legalmente admitidas sob a égide do direito de pretérito (C.C.Industrial) e desse período advindas, sem óbvio prejuízo da sua utilização para o acautelamento dos riscos ou eventualidades que determinaram a sua constituição, tudo visando dar lugar a que fossem constituídas provisões enquadradas já no novo sistema do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas.
Este regime legal transitório não era, no entanto, aplicável aos contribuintes que já na vigência do C. Contribuição Industrial e com a anuência da A. Fiscal consideravam os encargos derivados do direito a férias como custos do ano em que surgia o respectivo direito e não como provisões (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 10/5/2000, rec.24833; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/7/2003, rec.1473/02; ac.T.C.A.-2ª.Secção, 19/6/2001, proc.4809/01).
Revertendo ao caso dos autos, a A. Fiscal efectuou a correcção à matéria colectável da sociedade impugnante/recorrida descrita no nº.3 do probatório, a qual consistiu em levar a resultados um valor determinado nos mesmos termos da correção identificada no nº.2 da factualidade provada, em 25% do total de encargos, em 1989, com férias do ano anterior. Todavia, se essa operação, formalmente, condiz com o estabelecido no art.13, nº.2, do dec.lei 442-B/88, de 30/11, não se enxerga é de que provisões, constituídas ao abrigo do Código da Contribuição Industrial, "maxime" para atender a depreciações ou dívidas em risco de incobrabilidade, retirou ela esse saldo. Mas mais, desconhece-se se apresentavam algum saldo, depois de utilizadas ao longo do ano de 1989.
Deste modo, a correção ora em apreço inverte os termos da norma (cfr.artº.13, nº.2, do dec.lei 442-B/88, de 30/11). Esta manda que se levem a resultados os saldos das referidas provisões antigas, depois de utilizados os montantes necessários para que foram constituídas, e que se levem a resultados até certo montante ou plafond, que indica como determinar. Inversamente, a Fazenda Pública determina este plafond em concreto, sem contudo indicar se existiam provisões nessa situação e, por outro lado, quais os saldos de provisões antigas com os quais procede ao movimento correctivo.
Concluindo, com o Tribunal "a quo", tal como surge evidenciada e fundamentada, esta correção não pode manter-se, pois não tem causa justificativa, que seria o remanescente dos saldos das provisões antigas (os quais não se sabe se existiam e não estão quantificados), não obedecendo, por isso, aos pressupostos fácticos da norma a que faz apelo (erro sobre os pressupostos de facto).
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Sem custas, devido a isenção subjectiva do recorrente.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 5 de Novembro de 2015



(Joaquim Condesso - Relator)

(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)