Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:306/06.5BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:04/29/2021
Relator:HÉLIA GAMEIRO SILVA
Descritores:IMPUGNAÇÃO
DETERMINAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁRIA
MÉTODOS INDIRETOS IRC
ÓNUS DE PROVA – ARTIGO 74.º 3 E 75.º DA LGT
EXCESSO DE QUANTIFICAÇÃO
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO
Sumário:I A determinação da matéria coletável é, em regra, determinada com base em declaração do contribuinte, sem prejuízo do seu controlo pela AT (artigo 15.º n.º 1 do IRC).
II A lei é clara sobre a opção preferencial do legislador, e assume como ultima ratio, o recurso à avaliação indireta, admitindo-o apenas nas situações em que não seja de todo possível a quantificação direta e exata da matéria tributável, através dos dados declarados ou fornecidos pelo sujeito passivo.
III O sistema fiscal português assume, em primeira análise, como verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes, consagrando a norma citada uma presunção legal relativamente à de veracidade dos atos dos praticados pelos contribuintes, sejam as suas declarações apresentadas nos termos da lei; sejam os seus dados contabilísticos quando a contabilidade se mostre organizada de acordo com a legislação comercial e fiscal (artigo 75.º n.º 1 da LGT).
IV Na determinação da matéria tributável por métodos indiretos cabe ao sujeito passivo, o encargo de alegar e provar que a realidade é distinta, ou seja que o critério utilizado é ostensivamente desadequado e/ou inadmissível e, por conseguinte, que houve erro ou manifesto excesso da matéria coletável fixada (artigo 74.º n.º 3 da LGT),
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

C..., LDA., veio deduzir Impugnação Judicial contra as liquidações de IRC dos exercícios de 2001, 2002 e 2003, como os números 2005831... no valor de 194.354,70€; 20058310... no valor de 220.306,44€ e 200583101... no valor de 219.067,35€, respetivamente.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por decisão de 31 de maio de 2012, julgou procedente a impugnação e anulou as liquidações impugnadas.

Inconformada, a FAZENDA PÚBLICA, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

«4.1. - O presente recurso, visa reagir contra a decisão proferida pelo Tribunal "a quo", julgando procedente a impugnação deduzida, e em consequência, condenando a Fazenda Pública no pedido, defendendo que não se mostra provada a reunião dos pressupostos para o recurso à avaliação indirecta, apta a preencher o estabelecido no artº 87°, alínea b) da Lei Geral Tributária,

4.2. - Estão em causa as liquidações de IRC relativas aos exercícios de 2001 a 2003, efectuadas na sequência de procedimento de inspecção tributária, a qual originou a aplicação de métodos indirectos para a determinação da matéria tributável.

4.3. - A decisão ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, total e acertada aplicação das normas legais aplicáveis ao caso sub-judice e, bem assim, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante.

4.4. - Fundamenta-se tal entendimento, desde logo, pela adesão clara e inequívoca do Ministério Público à posição da Autoridade Tributária, emitindo parecer no sentido da improcedência da impugnação.

4.5. - Sai pois reforçada de forma inequívoca a indispensabilidade do recurso à utilização da avaliação indirecta tal como preconizada pelo artº 87º da Lei Geral Tributária.

4.6. - Até porque, como se retira dos elementos junto aos autos, nomeadamente do conteúdo do relatório elaborado pelos Serviços de Inspecção Tributária, foram detectados à a impugnante: (i) prejuízos consecutivos durante três anos; (ii) omissões de custos e compras; (iii) entradas e saídas de dinheiro, sem existência de documentos que permitissem quantificar com exactidão os valores em causa; (iv) falta de justificação para os reduzidos valores das "Margens de Comercialização" apresentados, (por comparação com as normalmente praticadas no mesmo sector de actividade).

4.7. - Como decorre da supra referida factualidade, face ao disposto nos artºs. 85° e 87°, aiª. e) da LGT, não merece reparo a utilização da avaliação indirecta como forma subsidiária de cálculo da matéria tributável.

4.8. - Pelo exposto, somos de opinião que o douto Tribunal "a quo" estribou a sua fundamentação em errónea apreciação dos factos relevantes ao proferir a sua decisão baseada na falta dos pressupostos para a aplicação da avaliação indirecta, violando assim o direito aplicável, no caso a errada interpretação do arl°. 87° da Lei Geral Tributária.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação improcedente.

Porém, V. Exas. decidindo, farão a costumada JUSTIÇA.»


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A recorrida, devidamente notificada para o efeito, não contra-alegou.

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A Exma. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal, nos termos do artigo 289.º, n. º1 do CPPT, veio oferecer o seu parecer no sentido da procedência do recurso.

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Com dispensa de vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Subseção do Contencioso Tributário para decisão.

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II - OBJETO DO RECURSO

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente a partir das alegações que definem, o objeto dos recursos e consequentemente o âmbito de intervenção do Tribunal “ad quem”, com ressalva para as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua apreciação (cfr. artigos 639.º, do CPC e 282.º, do CPPT).

Na situação sub judice as questões suscitadas pela recorrente (FP) consistem em saber se a sentença recorrida, errou no julgamento de facto e de direito ao julgar procedente a impugnação deduzida, decorrente de falta dos pressupostos para a aplicação da avaliação indireta com a consequente violação do artigo 87° da Lei Geral Tributária.

III – FUNDAMENTAÇÃO

A sentença recorrida considerou os seguintes factos provados:

«a) A 31/12/2001 a conta 2551 "Empréstimos" apresentava um saldo credor de 12.000.000 de escudos (cfr. cópia de extracto de conta a fls. 111 dos autos);

b) A 31/12/2002 a conta 2551 "Empréstimos" apresentava um saldo credor de 48.000,00 euros (cfr. cópia de extracto de conta a fls. 112 dos autos);

c) A 31/12/2003 a conta 2551 "Empréstimos" apresentava um saldo credor de 59.000,00 euros (cfr. cópia de extracto de conta a fls. 113 dos autos);

d) No dia 28/04/2005 foi ouvida em auto de declarações a gerente A... (cfr. cópia de termo de declarações, a fls. 62 a 65 dos autos);

e) A 22/06/2005 foi efectuado o Relatório de Inspecção Tributária, onde se concluiu pela correcção à matéria colectável relativa a IRC, com recurso a métodos indirectos, no valor de 480.457,26€, de 617.266,91€, e de 637.300,76€ (cfr. cópia de Relatório de Inspecção, de fls . 40 a 61 dos autos);

f) A 02/08/2005 foi recebido no serviço de Finanças Lisboa 4, pedido de revisão da matéria colectável (cfr. documento de fls . 142 a 154 dos autos) ;

g) A 07/ 10/2005 reuniram-se no âmbito do Procedimento de Revisão o perito da Fazenda Pública e o perito da ora impugnante, não tendo chegado a acordo (cfr. cópia de acta n.º 40/05,de fls . 208 a 218 dos autos).

h) A 02/11/2005 foi fixada a matéria colectável da impugnante, relativa aos exercícios 2001, 2002 e 2003, resultando num lucro tributável de 501.982,76€, 642.987,67€, e, 676.937,74€ respectivamente (cfr. documento de fls. 21 a 28 dos autos);

i) A 05/12/2005 foi efectuada liquidação de IRC da ora impugnante, relativa ao ano 2001, com o n.º 2005 831... (cfr. nota de liquidação, a fls. 29 dos autos);

j) A 05/12/2005 foi efectuada liquidação de IRC da ora impugnante, relativa ao ano 2002, com o n.º 2005 8310... (cfr. nota de liquidação, a fls. 32 dos autos);

k) A 05/12/2005 foi efectuada liquidação de IRC da ora impugnante, relativa ao ano 2003, com o n.º 2005 83101... (cfr. nota de liquidação, a fls. 35 dos autos);

l) Entre 17/11/2000 e 20/11/2000 R...esteve internado no Hospital de Santa Maria (cfr. cópia de documento, a fls . 156 e 157 dos autos);

m) Entre 24/05/2001 e 28/05/2001 R...esteve internado no Hospital de Santa Maria (cfr. cópia de documento, a fls . 158 e 159 dos autos);

n) A 16/01/2002 foi atestado por junta médica a incapacidade permanente global de 80%, de R..., desde 1999 (cfr. cópia de documento a fls. 166 dos autos);

o) Entre 06/04/2003 e 24/04/2003 R...esteve internado no Hospital de Santa Maria (cfr. cópia de documento, a fls. 160 e 161 dos autos);

p) Entre 02/06/2003 e 04/06/2003 R...esteve internado no Hospital de Santa Maria (cfr. cópia de documento, a fls. 162 e 163 dos autos);

q) Entre 12/04/2001 e 04/06/2001 A... esteve internada do Hospital de Santa Maria (cfr. cópia de documento a fls. 168);

r) A 29/12/2001 a impugnante comprou lagosta a 11.500$00 (cfr. cópia de factura a fls. 182 dos autos);

s) A 29/12/2002 a impugnante comprou lagosta a 55,00€ (cfr. cópia de factura a fls. 183 dos autos);

t) A 22/12/2003 a impugnante comprou lagosta a 48,00€ (cfr. cópia de factura a tis. 184 dos autos);

u) A 29/12/2001 a impugnante comprou lavagante a 8.500$00 (cfr. cópia de factura a fls. 185 dos autos);

v) A 31/12/2002 a impugnante comprou lavagante a 40,00€ (cfr. cópia de factura a fls. 186 dos autos);

w) A 10/02/2003 a impugnante comprou lavagante a 40,00€ (cfr. cópia de factura a fls. 187 dos autos);

x) A 14/11/2001 a impugnante comprou lagostins a 11.000$00 (cfr. cópia de factura a fls. 188 dos autos);

y) A 21/12/2002 a impugnante comprou lagostins a 89,00€ e a 68,00€ (cfr. cópia de factura a fls. 189 dos autos);

z) A 26/10/2002 a impugnante comprou lagostins a 72,00€ (cfr. cópia de factura a fls. 190 dos autos);

aa) A 13/12/2003 a impugnante comprou lagostins a 72,00€ (cfr. cópia de factura a fls. 191 dos autos);

bb) A 28/07/2001 a impugnante comprou ananás a 1.200$00, e manga a 650$00 (cfr. cópia de factura a fls. 192 dos autos);

cc) A 06/11/2002 a impugnante comprou ananás a 5,30€, e manga a 3,00€ (cfr. cópia de factura a fls. 193 dos autos) ;

dd) A 25/07/2003 a impugnante comprou ananás a 7,50€, e manga a 3,80€ (cfr. cópia de factura a fls. 194 dos autos) ;

ee) A 03/11/2000 foi emitida Licença de Utilização para Serviços de Restauração ou de Bebidas, à entidade exploradora C..., Lda., sendo atribuída uma capacidade máxima de 76 lugares (cfr. cópia de alvará, a fls. 207 dos autos)


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Os depoimentos das testemunhas mostraram-se vagos, imprecisos e com conhecimento indirecto dos factos, pelo que não foram valorados como produção de prova.

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A matéria de facto provada resulta da análise crítica dos documentos juntos aos autos, e no PAT, que não foram impugnados, conforme indicado em cada alínea do probatório.»

»«




De Direito

Conforme resulta dos autos, a impugnante, aqui recorrida, foi objeto de uma ação de inspeção, movida pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças de Lisboa, face à qual foram efetuadas correções à matéria coletável em sede de IRC com recurso a métodos indiretos nos exercícios de 2001 a 2003 de que resultaram as liquidações adicionais números 2005831..., 20058310... e 200583101... no valor total de € 633.728,49.

Em sede de aplicação de direito a sentença recorrida, concedeu provimento à impugnação, e determinou a anulação das referidas liquidações por considerar não ter ficado demonstrada a prova da verificação dos pressupostos para recurso á avaliação indireta.

Inconformada a recorrente (FP) vem alegar que tais pressupostos se retiram dos elementos junto aos autos, nomeadamente do conteúdo do relatório elaborado pelos serviços de inspeção tributária.

Na apreciação do processado, damos conta que, não obstante tenha sido levado ao probatório que em 22/06/2005 foi efetuado o Relatório de Inspeção, onde se concluiu pela correção à matéria coletável relativa a IRC, com recurso a métodos indiretos (ponto e)) nada se refere quanto às razões que conduziram os serviços de inspeção a esta conclusão.

Tendo presente que o relatório constitui o instrumento de suporte à respetiva analise inspetiva e que dele decorrem fundamentos ou motivações que levaram à decisão, e, sendo certo que, as informações prestadas pela inspeção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objetivos, nos termos da lei, conforme decorre do n.º 1 do artigo 71.º da LGT, importa antes de mais coligir a informação que dele resulta.

Assim ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, acorda-se em aditar ao probatório os seguintes factos, por se considerar relevante e, por resultarem provados, nos termos que se seguem:

ff) Consta do relatório a que se refere o ponto e) deste probatório que “… por despacho do Sr. Chefe de Divisão datado de 21-02-2005 exarado na ordem de serviço n.º OI200501074 emitida em 17-02-200, com Cod Pnait 222,1, foi determinada a realização de uma acção inspectiva à firma “C..., Lda.”, NIPC 5... relativamente aos exercícios de 2001,2002 e 2003, tendo em vista o controle das suas obrigações fiscais em sede de IVA, IRS, e IRC, com especial atenção ao confronto no que se refere aos valores comunicados pela UNICRE com os constantes na contabilidade do sujeito passivo e respetivas declarações tributárias.
(…)

1 – Caracterização do sujeito passivo

1.1. Características gerais

A “C..., Lda.” encontra-se enquadrada em IRC no regime geral de tributação pelo exercício de cervejaria, a que corresponde o CAE 055402, da área do Serviço de Finanças de Lisboa-4º, e em sede de IVA, no regime normal de periodicidade mensal.

Nos exercícios em análise, a empresa desenvolvia a actividade em instalações arrendadas pertencentes ao sócio gerente, estando aberta ao público das 12h00 à 1h00, durante todo ano à excepção do mês de Agosto, e durante a semana encontra-se encerrada às terças-feiras, sendo as tarefas diárias asseguradas pela sócia gerente e por mais 20 empregados. A capacidade ddo estabelecimento é de cerca de 100 lugares sentados, rodando pelos menos duas vezes por dia.

(…)

1.2. - Organização Contabilística/Fiscal/Análise Documental

APRECIAÇÃO GLOBAL:

· O Sujeito passivo utiliza o sistema centralizador fazendo passar pela conta "Caixa" todas as receitas e despesas, e revela as suas operações activas e passivas de acordo com o prescrito no POC, sendo a contabilização das operações efectuadas em suporte informático.

· Os documentos recepcionados pela empresa são classificados e lançados nas respectivas contas sendo posteriormente arquivados em pastas de acordo com a seguinte divisão: - Diários de Caixa e Operações Diversas.

· O sujeito passivo não possui qualquer controlo dos pagamentos efectuados a "dinheiro contado" a alguns fornecedores, como por exemplo a "G..., Lda." a quem foi pago ao longo do ano de 2001, 37.908.000$00 (€ 189 084,30), e só em Dezembro deste ano, foi pago 17.199.000$00 (€ 85 788,24).

Questionada a gerente sobre o motivo deste procedimento, afirmou e consta do Termo de Declarações, que não possui qualquer controle, e que era esse o procedimento adoptado pelo sócio gerente, relativamente a alguns fornecedores. (Anexo I).

· Na sequência da informação solicitada pela Direcção de Serviços de Estudos, Planeamento, e Coordenação da Prevenção Tributária, através do processo 8.1.10/04 de 2004.02.04, relativamente ao volume de transacções realizadas pela "C..., Lda.", no ano de 2001, pagas através de cartão de crédito ou de débito, efectuou-se o cruzamento entre os valores comunicados pela UNICRE e os que se encontram contabilizados nas declarações tributárias, não se tendo detectado divergências dignas de registo.

É de realçar que o sujeito passivo não utiliza o diário de Bancos e por conseguinte não se encontram reflectidos na contabilidade os movimentos bancários. No entanto, o sujeito passivo possui os extractos bancários, com base nos quais se detectou o confronto entre os valores declarados pela UNICRE e os contabilizados pelo sujeito passivo (Anexo II).

Acresce que o sujeito passivo contabiliza os proveitos na sua globalidade, estando neles incluídos não só os proveitos resultantes dos pagamentos efectuados através dos cartões de créditos ou débito da UNICRE como também os da AMERICAN EXPRESS CARD, cujos saldos foram controlados através das declarações enviadas pelas respectivas entidades, sendo o remanescente constituído pelas prestações de serviços pagos em "dinheiro contado" de difícil controle, devido ao modo como a contabilidade se encontra organizada (Anexo III).

· A empresa apresentou nos exercícios em análise os seguintes lucros, a saber:

2001 - € 21 525,50

2002 - € 25 720,76

2003 - € 39 636,98

No entanto, e tal como atrás se referiu, o sujeito passivo não contabilizou, os custos e perdas financeiras, resultantes das comissões pagas à UNICRE e AMERICAN EXPRESS CARDS nos exercícios de 2001, 2002 e 2003, relativas às transacções cobradas através de cartão de crédito ou débito.

Ora, se o sujeito passivo nos três exercícios em análise, tivesse contabilizado como devia as comissões atrás referidas (Anexo II), em vez de lucro tributável teria apurado prejuízos para efeitos fiscais, ou seja:
ANO
LUCRO TRIBUTÁVEL DECLARADO
COMISSÕES NÃO CONTABILIZADAS (2)
PREJUIZOS PARA EFEITOS FISCAIS (3)=(2)-(1)
2001
€21 525,50
€ 50 178,40
€ 28 652,90
2002
€ 25 720,76
€ 52 812,97
€ 27 092,21
2003
€ 39 636,98
€ 50 841,42
€ 11 204,44
(…)

(…)

IV - MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

Os factos anteriormente descritos nomeadamente:

1. Prejuízos consecutivos durante três anos sem razão que justifiquem essa situação o que por si só é suscetível de aplicação de métodos indiretos nos termos da al, e) do Artº 87º da LGT

2. Omissão de custos e compras.

3. Margens muito reduzidas para o sector e abaixo das efetivamente praticadas.

4. Entradas e saídas de dinheiro por parte do sócio sem documentos comprovativos

põem em causa o montante de vendas declarado, constituindo indícios seguros que a contabilidade não reflecte a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido, pelo que não sendo possível comprovar e quantificar directa e exatamente os elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável dos exercícios em analise esta será determinada através de métodos indirectos nos termos do Artº 52º do CIRC, conjugado com o Artº 87º da LGT., (…)”

V - CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

1 – Critério de calculo do imposto

Com base no anteriormente exposto, sabendo que existem omissões de compras e omissões de vendas e na impossibilidade de quantificar com exactidão estes valores, consideramos que:

a) - Margem Bruta Comercial Ponderada

Atendendo às limitações acima referidas, procedeu-se ao cálculo da margem de comercialização dos produtos vendidos mais representativos com a colaboração do sócio gerente na escolha dos produtos, bem como dos respectivos coeficientes de ponderação, tendo-se obtido as seguintes margens ponderadas, conforme o anexo VIII:

2001 -108,33%

2002 -119,84%

2003 -127,14%

b) - Bónus

Para cálculo das referidas margens, não foram levados em consideração os Bónus obtidos nas aquisições de Cervejas, Refrigerantes, Águas.

c) - Cerveja

Solicitou-se ao fornecedor a conta corrente com os montantes, consumos e ofertas que serviu no essencial para consolidar a margem determinada já que não se tomou em linha de conta essas ofertas.

d) - Quebras

Atribuiu-se às quebras globais uma margem de 15% , a qual acabará por se traduzir numa mais elevada, porquanto na determinação das margens de comercialização dos exercícios em análise, foram aceites as alegações do sujeito passivo, designadamente, que:

=> num quilograma de presunto "P..." resultam cerca de 200 gramas de desperdícios."'
=> uma garrafa de Whisky dava para 8 doses bem aviadas, (quando, normalmente uma garrafa de whisky dá para doze doses).
=> que num ananás se aproveitam apenas 4 fatias.

Os valores apurados foram de:
Anos
CMVC
Quebras de 15%
2001
1 439 663,85
215 949,58
2002
1 502 428,68
225 364,30
2003
1 462 302,14
219 345,32

CMVC (corrigido) / 2001 - (l 369 062,64 + 70 601,21) = € l 439 663,85

e) - Autoconsumo Externo

Segundo os responsáveis da empresa os empregados não comem as refeições que habitualmente são servidas no estabelecimento. São efectuadas compras específicas de peixe e carne para o efeito. Solicitou-se a composição de um prato tipo a preço de custo para se quantificar o auto consumo mas os responsáveis da empresa não satisfizeram o pedido

De acordo com a ARESP - Associação da Restauração e Similares de Portugal, e a FESAHT — Federação dos Sindicatos de Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal, o direito à alimentação é computado pelos valores seguintes, que ficam a fazer parte de papéis de trabalho:

Refeições completas por mês

2001- €39,90
2002- €42,00
2003- €43,50

Como é óbvio, estes valores são manifestamente insuficientes para custear as refeições completas por mês, pelo que se considerou para o cálculo do Auto Consumo o subsídio de alimentação pago aos funcionários e agentes da Administração Pública, que nos exercícios em análise eram os seguintes:

Subsídio de Alimentação - Diário

2001- €3,39- Portaria n.º 80 72001 de 8 de Fevereiro
2002 - € 3,49 - Portaria n.º 88 / 2002 de 28 de Janeiro
2003 - € 3,58 - Portaria n.º 303 / 2003 de 14 de Abril

De seguida determinou-se o Auto Consumo Externo, com base nos seguintes cálculos:

Ano: 2001

Feriados: 15 dias
Descanso Semanal: 48 dias
Mês de Férias (Agosto ) : 31 dias
Totalizando 94 dias, assim teremos (365-94) = 271 dias de trabalho efectivo

Auto Consumo Externo = 21 empregados x 271 dias x 2 refeições x € 3,39 = € 38 605,76

Ano: 2002

Feriados : 14 dias
Descanso Semanal: 48 dias
Mês de Férias (Agosto ) : 31 dias
Totalizando 93 dias, assim teremos (365-93)= 272 dias de trabalho efectivo

Auto Consumo Externo = 21 empregados x 272 dias x 2 refeições x € 3,49 = € 39 869,76

Ano: 2003

Feriados: 14 dias
Descanso Semanal: 48 dias
(Agosto): 31 dias
Totalizando 93 dias, assim teremos (365-93)= 272 dias de trabalho efectivo

Auto Consumo Externo = 21 empregados x 272 dias x 2 refeições x € 3,58 = € 40 897,92

Resumindo:

(em euros)
Anos
Autoconsumo Ext.
2001
38 605,76
2002
39 869,76
2003
40 897,92

f) - Custo Das Mercadorias Vendidas

Ao custo das mercadorias vendidas e consumidas declarado, acrescemos o valor das aquisições intracomunitárias não declaradas pelo sujeito passivo, no montante de € 70 601,21 conforme se encontra descrito na página 6 do presente projecto de relatório.

g) - Custos Financeiros

Aos custos financeiros declarados pelo sujeito passivo, acrescemos o valor de € 50 178,40, referente a comissões Unicre/American Express Card não contabilizadas, conforme descrito no ponto l do capítulo III, página 3.

h) - Tabaco

Desprezaram-se as compras e vendas do tabaco atendendo a que são pouco significativas e a margem de lucro encontra-se fixada.

2 - CORRECÇÕES EM SEDE DE IRC

2.1 – Exercício de 2001

CÁLCULOS:


2001
PresumidoDeclaradoCorreção a efetuar
Prestações Serviços
€ 2 468 936,59
€ 1 867 699,72
€ 601 236,87
Custo Merc.Vend.(Aq.Int. Com.)
€ 70 601,21
Custos Financeiros (Com Unicre)
€ 50 178,40
Correcção ao resultado liquido (Prest. Serviços – (CMV-C.Financ)
€ 480 457,26
Lucro Tributável
€ 21 525,50
€ 480 457,26
Lucro Tributável Presumido
€ 501 982,76

2.2 – Exercício de 2002

CÁLCULOS:


2002
PresumidoDeclaradoCorreção a efetuar
Prestações Serviços
€ 2 719 848,65
€ 2 049 768,77
€ 670 079,88
Custos Financeiros (Com Unicre)
€ 52 812,97
Correcção ao resultado liquido (Prest. Serviços – (CMV-C.Financ)
€ 617 266,91
Lucro Tributável
€ 25 720,760
€ 617 266,91
Lucro Tributável Presumido
€ 624 987,67

2.3 – Exercício de 2003

CÁLCULOS:


Prestações de Serviços Presumidas = Custo das vendas x (1+1,2714) =

= € 1 202 058,41 x 2,2714

= € 2 730 356,59
2003
PresumidoDeclaradoCorreção a efetuar
Prestações Serviços
€ 2 730 356,59
€ 2 042214,41
€ 688 142,18
Custos Financeiros (Com Unicre)
€ 50 841,42
Correcção ao resultado liquido (Prest. Serviços – (CMV-C.Financ)
€ 637 300,76
Lucro Tributável
€ 39 636,98
€ 637 300,76
Lucro Tributável Presumido
€ 676 937,74
(…)”

gg) Por despacho do Diretor de Finanças de Lisboa, proferido em de 02.11.2005, foram mantidos os valores fixados pelos serviços de Inspeção tributária e sendo os valores de IRC Os seguintes:
2001
€ 501 982,76
2002
€ 642 987,67
2003
€ 676 937,74
Cfr. fls. 26/27 dos autos

hh) Do despacho a que fizemos referência na alínea anterior consta, na parte da fundamentação da decisão, o seguinte:

C. Decisão
Quanto aos pressupostos de aplicação do método de avaliação indirecta
Pelo exposto e pelos elementos constantes do processo, Relatório da Inspecção Tributária, Pedido de Revisão e as posições dos Peritos intervenientes no Debate Contraditório, que aqui se dão como inteiramente reproduzidos, os quais foram abordados supra, conclui-se que durante os exercícios de 2001, 2002 e 2003 o sujeito passivo não elaborou a sua contabilidade de acordo com a normalização contabilística conforme refere o artigo 17º, com observância do disposto no artigo 115º ambos do CIRC, bem como com o disposto no artigo 44º do Código do IVA, nomeadamente no que respeita aos registos das contas de Disponibilidades, Fornecedores, Sócios e Custos e Perdas Financeiras, uma vez que:

· Conta de Disponibilidades, apenas é movimentada a conta de Caixa, não utilizando o sujeito passivo o diário de Bancos, pelo que não são aqui reflectidos os movimentos bancários tais como as receitas cobradas através de cartões de débito e crédito, bem como as transferências bancárias efectuadas para pagamentos a fornecedores. O sujeito passivo não utiliza a Conta Bancos, no entanto é possuidor de contas bancárias em seu nome, conforme fotocópias de extractos bancários que constituem o anexo II do Relatório;

· Conta de Fornecedores, onde se verificou a falta de registo de facturas de compras, no ano de 2001, constando os respectivos pagamentos dos recibos de extractos bancários em nome da sociedade. Este cenário implica divergências nos valores das existências e consequentemente no apuramento do custo das mercadorias vendidas e consumidas;

· Conta de Sócios cujos saldos reflectem entregas dos sócios à empresa, mas cujos movimentos não se encontram suportados por documentos válidos;

· Não foram contabilizados os Custos e Perdas Financeiras resultantes das Ccomissões pagas à UNICRE e AMERICAN EXPRESS, relativas às transacções cobradas através de cartão de crédito ou débito. Se estes valores tivessem sido registados na contabilidade o sujeito passivo teria apurado prejuízo para efeitos fiscais nos anos de 2001, 2002 e 2003.

· Situações estas que não foram validamente postas em causa, quer no pedido de revisão quer no debate entre os peritos.

· Nem o sujeito passivo, nem o perito por si nomeado vieram destruir os argumentos constantes no relatório dos Serviços de Inspecção, mantendo-se os mesmos sem contestação.

· Os métodos indirectos estão, assim, plenamente justificados.

· Conclui-se, assim, que se encontram verificados indubitavelmente os pressupostos de aplicação do método de avaliação indirecta para a determinação do lucro tributável nos termos dos artigos 52º e 54º do Código do IRC, e do imposto em falta, nos termos do artigo 84º do CIVA, relativamente aos exercícios de 2001, 2002 e 2003, de conformidade com o disposto nos Artºs 87º e 88º da LGT e no Artº 84º do CIVA.

· Quanto à quantificação

· Justificada a determinação da matéria tributável/imposto por métodos de avaliação indirecta, cabe ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação, em conformidade com o disposto na parte final do nº 3 do Artº 74º da LGT.

· A quantificação foi efectuada com base:
• na margem bruta comercial ponderada, tendo em conta os produtos mais vendidos;
• na percentagem para quebras;
• no custo das mercadorias vendidas corrigidas; e
• no auto consumo externo.

Tendo em consideração todos os elementos apresentados é indubitável que estão reunidos os pressupostos para a avaliação indirecta, nos termos da alínea b) do artigo 87º e alíneas a) e b) do artigo 88º da LGT. No que respeita à quantificação não foram apresentados nem pelo sujeito passivo nem pelo seu perito elementos concretos que permitam pôr em causa os valores apurados pelos Serviços de Inspecção Tributária, confirmados pelo Perito da Fazenda Pública, e que permitam fazer prova do excesso na quantificação.

(…)”

ii) Da decisão houve pedido de revisão da matéria coletável conforme resulta da Ata b.º 40/05 (Procºs 518 a 523/2005) – cfr. fls. 208 e seguintes dos autos

jj) Do laudo do perito da Fazenda Pública consta, designadamente o seguinte:

“(…)

Face aos argumentos acima apresentados pelo sujeito passivo, formulam-se as seuintes considerações:

1º Na petição é referido que por motivos de saúde dos sócios gerentes, a gestão do negócio era assegurada por procuradores seus - vide art 46º da petição -, o que se conclui que a actividade foi exercida normalmente. Aliás, essa situação também foi referida no Relatório da Inspecção;

2º Não está demonstrado que a zona do Intendente poderá, neste caso, ser considerada como causa directa para a rentabilidade negativa gerada na actividade da empresa;

3º Também é referido na petição que o estabelecimento presta serviços de qualidade, onde inevitavelmente se exige um controle das compras, da formação dos preços, obtendo assim bons resultados - vide art. 12º da Petição. Quanto aos bons resultados, verifica-se que a contabilidade não reflecte resultados positivos, o que contraria a lógica dessa afirmação;

4º No relatório foi referido que não há entrega efectiva de meios monetários por parte do sócio à sociedade, mas sim um mero movimento contabilístico para anular o saldo credor da conta "Caixa" - até porque não há provas desse suposto empréstimo, o que indicia que a contabilidade não reflecte a verdadeira situação dos fluxos financeiros, e consequentemente a mesma não merece crédito;

5º Também é verdade que devido à falta de contabilização das comissões pagas à Unicre e American Express Carás o resultado do exercício foi positivo no final de cada exercício (lucro viciado). Isto é, se os referidos custos tivessem sido contabilizados a empresa apresentaria prejuízos nos três exercícios consecutivos - vide pag. 5 do relatório -. Esta situação não foi explicada pelo sujeito passivo, remetendo-se ao mero lapso;

6º A atribuição de 15% a título de quebras em existências é bastante razoável, na medida em que a actividade exercida consiste em "Cervejaria e Marisqueira", em que os produtos adquiridos não sofrem grandes "transformações" e também com poucas "incorporações". Ao contrário, numa actividade de "restaurante" haveria confecção de pratos, de acordo com as ementas estabelecidas, onde de facto são incorporados os mais variados ingredientes, o que poderá justificar eventualmente uma maior quebra nos produtos;

7ª Compreende-se que poderá haver quebras em existências relativamente a Mariscos e Pregos, na ordem dos 25% e 20%. Porém, também não está demonstrado nem comprovado, por parte do sujeito passivo, que aqueles indicadores representam efectivamente as quebras verificadas. Trata-se também de mera afirmação;

8º Quanto às quebras em "Presuntos P...", o sujeito passivo não tem razão, uma vez que na determinação da margem de comercialização ponderada foi tida em consideração a quebra de 200 gramas em cada quilograma vendido;

9º Quanto à variação de preços de compra (quer ao longo do ano quer entre fornecedores diferentes para o mesmo produto), bem como, a comparação não ter sido realizada com os mesmos produtos, aquando da amostragem realizada pelos Serviços de Inspecção Tributária, verifica-se que os preços de venda foram fornecidos pelo sócio gerente e que estão associados às compras para cada momento, por um lado, e, por outro, a indicação dos produtos teve a colaboração do sócio gerente. E se houve alguma troca nos produtos, o resultado encontrado na amostragem não deverá ser muito diferente daquela que foi achado.

10º Aliás, os exemplos trazidos para o processo assentam em comparação entre fornecedores diferentes para o mesmo produto, mas reportando sempre aos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de cada ano. Ora, se os preços de venda foram facultados pelo sócio gerente, e relativamente aos quais foram considerados como praticados em cada "época", é sinónimo de que a formação dos preços de venda depende do custo dos produtos adquiridos - vide art.11º da Petição onde se refere a política da formação dos preços -. Não se concebe nesse ramo de actividade que os preços de venda praticados sejam inferiores aos de compra. Também não está comprovado através de registos credíveis que esse fenómeno "anormal" tivesse verificado;

11º Assim, analisando o mapa da amostragem de 2003, verifica-se que relativamente ao ano de 2003 e com referência a "Lagostim " foi considerada a factura de compra de Setembro de 2003 do fornecedor "F ………..", sendo o preço de custo de 27,50 € e o preço de venda de 58,03 €. Baseando nos elementos carreados para o processo de Pedido de Revisão, constata-se que para o produto "Lagostim" foi apresentada a factura de compra de Dezembro de 2003 do fornecedor "A...", sendo o preço de custo de 72,00 €. Porém, no Inventário Físico das Existências à data de 30-12-2003, verifica-se que o "Lagostim" do fornecedor "A..." foi, valorizado a €57,00 Kg. o que se conclui, à priori, que o sujeito passivo também compra por este preço, que é bastante inferior aquele de € 72,00. Pois, como ficou demonstrado que os seus argumentos também não são consistentes no sentido de contrariar o procedimento adoptado pela Inspecção;

12º Não se consegue alcançar a seguinte afirmação proferida na Petição: "Os valores tomados pela Inspecção para a totalidade das compras de cada um dos exercícios em causa estão errados";

13º Não é verdade esta afirmação proferida: "A incorporação de ingredientes complementares (sal, azeite, alhos, mostarda, piri-piri etc,) não foi tida em consideração pela Inspecção aquando da determinação das margens de comercialização ponderada". Analisando os mapas elaborados pelos Serviços de Inspecção Tributária, se verificará que os ingredientes utilizados para a preparação dos produtos (caso de gamba tigre e gamba à Aguillo) foram de facto considerados para o efeito;

14º Como foi referido no Relatório que a acção inspectiva levada a cabo pelos Serviços de Inspecção Tributária, e no âmbito do princípio da colaboração previsto no art. 59º da LGT, teve a necessária colaboração do sujeito passivo, motivo pelo qual se tornou possível conhecer o peso relativo dos produtos vendidos - vide pag. 9 do relatório -. De salientar que para efeitos de cálculo das margens ponderadas, não foram levados em consideração os Bónus obtidos, nem das ofertas dos fornecedores.

15º Relativamente a projecção feita pelo sujeito passivo sobre as receitas proporcionadas pelos clientes com base nos serviços prestados presumidos, quer sob a forma de gastos individualizados por cada cliente em função de cada produto específico, quer sob a forma de gasto global por cada cliente, é de salientar que o nº de clientes - 41.192 - não corresponde à realidade, senão vejamos.
Seguindo o mesmo raciocínio do sujeito passivo, utilizando o número por si indicado, e tomando em consideração
os serviços prestados declarados pelo sujeito passivo (contabilizado), obtém-se o seguinte resultado:
    2001
    - 1.867.699,72: 41.192 = 45,34 €
    2002
    - 2.049.768,77:41.344=49,57€
    2003
    - 2.042.214,41: 41.344 = 49,39 €
O valor encontrado por cliente também não é aceitável, donde se conclui que o
nº de clientes servidos 41.192 (152 clientes x 271 dias), como se pretende
justificar,
não corresponde à realidade.

16º Por outra via, ou seja com base nos custos das mercadorias vendidas e consumidas (depois de corrigidos pela Inspecção para a determinação dos serviços prestados presumidos), obtém-se o seguinte resultado:
    2001
    - 1.185.108,51: 41.192 = 28,77
    2002
    - 1.237.194,62: 41.344 = 29,92 €
    2003
    - 1.202.058,41: 41.344 = 29,07€

Mais uma vez fica demonstrado que o número de clientes indicado - 41.192 - pelo sujeito passivo não é credível.

17º No decurso da acção inspectiva a gerente Dona A... afirmou em Termo de Declarações que o estabelecimento servia 270 refeições por dia o que conduz ao universo de 73.710 clientes (270 clientes x 271 dias). Ao dividir o montante total dos serviços prestados presumidos -2.468.936,59 - por 73 710 clientes resulta em média €33,74 por cada refeição, valor este aproxima-se dos € 25,00 por pessoa, que foi referido na Petição;

18º Daqui se conclui que os argumentos utilizados pelo sujeito passivo não permitem contrariar os critérios utilizados pela Inspecção Tributária para a determinação dos serviços prestados presumidos. Por outro lado, o sujeito passivo também não apresentou quaisquer elementos novos que pudessem rebater as margens ponderadas calculadas pelos Serviços de Inspecção Tributária.
- Assim, atendendo a que não foram trazidos novos elementos para o debate contraditório que pudessem constituir prova bastante para rebater ou refutar os fundamentos invocados e critérios utilizados pela Inspecção Tributária para aplicação de "Métodos Indirectos", sou de opinião que as correcções levadas a cabo em sede de IRC e IVA estão plenamente justificadas»

(…)”

Tudo conforme fls. 212 e seguintes dos autos.

Estabilizada que está, a matéria de facto, prosseguimos para análise das conclusões recursivas.

Antes de prosseguir damos conta de termos tido conhecimento que a questão aqui suscitada foi já objeto do acórdão proferido neste TCA, em 27/11/2014, no processo n.º 06332/13, sendo as mesmas, as partes no processo, a realidade fática (inclusive o relatório da inspeção tributária em que procedeu ás respetivas correções), os exercícios a que a reporta, diferindo somente o tipo de imposto, ali foi apreciado O IVA e aqui o IRC.

Termos em que, por economia de meios e, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito (cfr. artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil), acolhemos toda a argumentação jurídica aí expendida, que seguiremos de perto, com as adaptações indispensáveis à situação em analise.

Diz-se ali:

“(…)

Está em causa a tributação por métodos indirectos, ao abrigo do disposto nos artigos 87.º/1/b) (1), e 88.º/a) (2), da LGT.

Pontos firmes sobre a matéria são os seguintes:

i) «Encontram-se preenchidos os pressupostos para o lucro tributável ser apurado por métodos indirectos quando através da contabilidade da contribuinte, mercê das suas omissões, deficiências ou irregularidades, não é possível apurar os reais custos e nem os reais proveitos; // [e]m sede de impugnação judicial, actualmente, no âmbito da vigência da LGT e do CPPT, cabe à Administração Fiscal assentar os pressupostos que levaram à tributação, em juízos de probabilidade, necessariamente elevada, e ao contribuinte, que alegue e prove factos (através de prova concludente) que ponham em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou o juízo de probabilidade elevado feito pela Administração para prova da existência do facto tributário» [Ac. do TCAS, de 20.12.2012, P. 4785/11].

ii) «O recurso ao método de avaliação indirecta só é legalmente possível quando o apuramento da matéria colectável através de correcções técnicas se revele, de todo, impraticável, pois que a fixação da matéria tributável por tais métodos deve revestir a natureza de ultima ratio fisci e exigir uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização (3). // O artº.87, al.b), da L.G.Tributária, cuja redacção foi estabelecida pela Lei 30-G/2000, de 29/12, prevê a possibilidade de avaliação indirecta da matéria tributável quando se verifica a falta dos elementos necessários para comprovar e quantificar directa e exactamente a matéria tributável, pelo que a avaliação directa é impossível. Esta impossibilidade, porém, só pode resultar das anomalias e incorrecções taxativamente indicadas nas várias alíneas do artº.88, da L. G. Tributária (cfr.artº.81, nº.1, da L.G. Tributária)» [Ac. do TCAS, de 15.05.2012, P. 2956/09].

iii) «Como se constata pelas situações descritas no artº.87, da L.G.Tributária, o que releva para determinar o impedimento não é uma impossibilidade absoluta de avaliação directa da matéria tributável, mas sim a impossibilidade de tal avaliação no momento em que ela deve ser efectuada (impossibilidade relativa), assim se fazendo cessar a presunção de veracidade dos elementos declarativos e de escrita do sujeito passivo e incidindo sobre a A. Fiscal o ónus da prova de tal factualidade (cfr.artºs.74, nº.3, e 75, nº.1, da L.G.T.)» [Ac. do TCAS, de 15.05.2012, P. 2956/09].

iv) Importa pois apurar se a AT cumpriu com o ónus da demonstração dos pressupostos de facto que a habilitam à tributação por métodos indirectos.

(…)” – fim de citação.

Como vimos, no salvatério vem alegado, em suma, que o tribunal a quo estribou a sua fundamentação em errónea apreciação dos factos relevantes ao proferir decisão baseada na falta dos pressupostos para a aplicação da avaliação indireta, violando assim o direito aplicável, no caso a errada interpretação do artigo 87° da Lei Geral Tributária. – concl. 4.8.

Para assim concluir, argui a recorrente que “…se retira dos elementos junto aos autos, nomeadamente do conteúdo do relatório elaborado pelos Serviços de Inspecção Tributária, foram detectados à a impugnante: (i) prejuízos consecutivos durante três anos; (ii) omissões de custos e compras; (iii) entradas e saídas de dinheiro, sem existência de documentos que permitissem quantificar com exactidão os valores em causa; (iv) falta de justificação para os reduzidos valores das "Margens de Comercialização" apresentados, (por comparação com as normalmente praticadas no mesmo sector de actividade).” - concl. 4.6

Dito isto, importa recordar o que decorre da análise levada a efeito pelos SIT, transcrita no RIT [ponto ff)] do probatório, por nós aditado - Ponto 1.2- Organização Contabilística/Fiscal/Análise Documental - Apreciação Global), relativamente a cada uma das questões suscitadas na conclusão recursiva que acabamos de citar que:

- Quanto a “Prejuízos consecutivos durante três anos” (i), diz-se no RIT, que não foi encontrada razão que justifique essa situação, o que por si só, é suscetível de aplicação de métodos indiretos nos termos da al, e) do Artigo 87º da LGT.

- Relativamente a “omissões de custos e compras” (ii), resulta da dita apreciação global enunciada no RIT, que: “[O]o sujeito passivo utiliza o sistema centralizador fazendo passar pela conta “Caixa” todas as receitas e despesas,” diz- se ainda que o mesmo “-… não possui qualquer controlo dos pagamentos efectuados a "dinheiro contado" a alguns fornecedores, como por exemplo a "G..., Lda." a quem foi pago ao longo do ano de 2001, 37.908.000$00 (€ 189 084,30), e só em Dezembro deste ano, foi pago 17.199.000$00 (€ 85 788,24).” Sendo que o próprio gerente, questionado sobre este procedimento, afirmou e consta do Termo de Declarações, “ … que não possui qualquer controle, e que era esse o procedimento adoptado pelo sócio gerente, relativamente a alguns fornecedores.”

- No que respeita a “entradas e saídas de dinheiro, sem existência de documentos que permitissem quantificar com exatidão os valores em causa” (iii), foi assinalado pelos SIT a “entradas e saídas de dinheiro, efectuadas pela gerência, sem documento comprovativo” e bem assim que os movimentos da conta “2551 – Empréstimos” apresentava nos anos de 2001, 2002 e 2003 saldos credores, tendo concluído os SIT, que não se tratava de verdadeiros empréstimos feito à sociedade, por os mesmos não se encontrarem titulados nem ter sido detetado qualquer documento de suporte comprovativo de eventuais movimentos bancários.

- E por fim, quanto a margens reduzidas (iv), indica o RIT que: as margens da empresa foram comparadas com as margens brutas de comercialização normalmente praticadas no sector de atividade em questão (cervejaria/marisqueira) donde resultou que as margens praticadas pela recorrente/impugnante eram notoriamente inferiores à média, para o ramo de mercado, e, não obstante tenha sido questionada a gerência, não foi apresentando qualquer justificação lógica para “margens tão reduzidas”, sendo que as margens obtidas n RIT, foram encontradas através do confronto entre os preços de compra (2001/2/3) constantes das faturas de aquisição, tendo sido aceite como bons os “… os coeficientes indicados pelo Sr. Ramiro (sócio gerente da empresa)” os quais foram confrontados simplesmente com as vendas evidenciadas nos talões de máquina referentes aos anos mais próximos.


Ora, como sabemos e resulta do artigo 75.º n.º 1 da LGT, o sistema fiscal português assume, em primeira análise, como verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes, consagrando a norma citada uma presunção legal relativamente à de veracidade dos atos dos praticados pelos contribuintes, sejam as suas declarações apresentadas nos termos da lei; sejam os seus dados contabilísticos quando a contabilidade se mostre organizada de acordo com a legislação comercial e fiscal.

Contudo esta presunção de verdade não é absoluta, já que cessa, nas situações previstas no n.º 2 da norma citada, nomeadamente quando:
(a) as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo;
(b) o contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária, salvo quando, nos termos da lei, for legítima a recusa da prestação de informações;
(c) a matéria tributável do sujeito passivo se afastar significativamente para menos, sem razão justificada, dos indicadores objetivos da atividade de base técnico-científica previstos na lei (LGT);
(d) os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos, sem razão justificativa, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89.º-A da LGT.

Em sede de IRC e no que toca aos métodos de determinação da matéria coletável, diz-nos o artigo 16.º n. º1 do CIRC (na redação à data dos factos) que “[A]a matéria coletável é, em regra, determinada com base em declaração do contribuinte, sem prejuízo do seu controlo pela administração fiscal.” e o n.º 3 que “[A]a determinação do lucro tributável por métodos indiciários só pode verificar-se nos termos e condições previstos na secção V.”

Donde se infere que a lei é clara sobre a opção preferencial do legislador, já que assume como ultima ratio, o recurso à avaliação indireta, admitindo-a apenas nas situações em que não seja de todo possível a quantificação direta e exata da matéria tributável, através dos dados declarados ou fornecidos pelo sujeito passivo.

Neste sentido diz-nos Lima Guerreiro, in LGT, anotada, Rei dos Livros, pag. 355, que “o recurso à avaliação indirecta – por indícios, presunções ou estimativas – é excepcional e está sujeito a uma regra de tipicidade, só podendo fazer-se nos casos e condições expressamente previstos na lei, associados geralmente a uma intensa violação pelo contribuinte dos seus deveres de cooperação para com a Administração Tributária, ou em caso de razões acidentais que inviabilizem o apuramento da matéria tributável real do contribuinte”.

Dito isto, regressemos às regras de determinação do lucro tributável por métodos indiciários previstas na secção V., do código do IRC, para onde nos remete o n.º 3 do artigo 16.º, supra enunciado, dando conta que o n.º 1 do artigo 52.º, aí ínsito, nos remete para os artigos 87.º a 89.º da LGT (A aplicação de métodos indiretos efetua-se nos casos e condições previstos nos artigos 87.º a 89.º da Lei Geral Tributária).

Salientamos que, in casu, o relatório de inspeção, também enuncia este caminho jurídico dizendo que “… não sendo possível comprovar e quantificar directa e exatamente os elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável dos exercícios em analise esta será determinada através de métodos indirectos nos termos do Artº 52º do CIRC, conjugado com o Artº 87º da LGT.” – ponto ff) do probatório.

Para o que aqui releva, preceituava o artigo 87.º da LGT, (na redação à data dos factos), que a avaliação indireta só pode efetuar-se em caso de: (b) Impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável de qualquer imposto; (c) A matéria tributável do sujeito passivo se afastar, sem razão justificada, mais de 30% para menos ou, durante três anos seguidos, mais de 15% para menos da que resultaria da aplicação dos indicadores objetivos da atividade de base técnico-científica referidos na presente lei; (e) Os sujeitos passivos apresentarem, sem razão justificada, resultados tributáveis nulos ou prejuízos fiscais durante três anos consecutivos, salvo nos casos de início de atividade, em que a contagem deste prazo se faz do termo do terceiro ano, ou em três anos durante um período de cinco;

Regressamos agora ao discurso fundamentador acolhido pelo RIT de molde a perceber se, como pretende a FP, se apresentam devidamente identificadas situações capazes de mostrar “… provada a reunião dos pressupostos para o recurso à avaliação indirecta, apta a preencher o estabelecido no artº 87°, alínea b) da Lei Geral Tributária.” – concl. 4.1.

Relembramos, neste contexto, que de acordo com as regras sobre o ónus da prova referidas no artigo 74.º da LGT tendo a AT recorrido à avaliação indireta compete-lhe, como estatui o n.º 3 da norma indicada, a “verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação.”

Ora, lido o relatório de inspeção, em concreto no ponto IV, forçoso se torna concluir que toda a situação ali relatada conflui no sentido da verificação dos pressupostos do recurso aos métodos indiretos, situação que a recorrida não logrou inverter.

Termos em que procedem as conclusões recursivas que vimos apreciando, não padecendo, as liquidações impugnadas, do vício que lhes vem assacado.

Ao decidir em sentido discrepante, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, pelo que deve ser revogada.

Em consequência, revoga-se a sentença recorrida, impondo-se, impondo-se, contudo, sem prejuízo do conhecimento das questões que ali se deixaram prejudicadas.


»«

Do conhecimento em substituição

Antevendo esta possibilidade, este Tribunal notificou as partes para efeitos do disposto no artigo 665, nºs 2 e 3 do CPC., sem que alguma, quanto ao mesmo, se tenha pronunciado.

Assim e porque se verifica que existem, nos autos, elementos que nos permitem conhecer dos demais fundamentos da impugnação, avançamos no sentido da respetiva apreciação.

Vejamos, então, não perdendo de vista o articulado inicial.

Lido os fundamentos de impugnação, se bem depredemos, são de dois tipos, os vícios que veem assacados às liquidações, uns de caracter substancial, relacionados com o apuramento da matéria coletável por métodos indiretos e que invocam excesso de quantificação da matéria coletável (I) sendo os restantes de procedimento.

Vejamos então:

I – Do Excesso de quantificação da matéria coletável

A Impugnante vem invocar que a quantificação que procedeu a inspeção tributária está errada, afirmando que a mesma parte de pressupostos errados de indicadores cuja base não se vislumbra e de informações, no mínimo, sem fundamento, ou até, impossíveis.
Para assim concluir refere que a Inspeção Tributária assumiu, nomeadamente que:
1. O estabelecimento comporta cerca de “100 lugares sentados, rodando pelo menos duas vezes dia”, quando na realidade a capacidade é de apenas 76 lugares - ponto 32 da p.i.
2. O espaço reservado a clientes compõe-se de duas salas, estando a do piso superior encerrada, durante várias semanas, sem que fosse necessário instalar qualquer cliente - ponto 33 da p.i.
3. É errado inferir-se da afirmação da gerente, A..., que o estabelecimento serve 270 refeições diárias, que se trata sempre de refeições completas, uma vez que tal numero apenas poderá ser atribuído a numero de registos diários, onde se incluem vendas isoladas de águas, imperiais, cafés, etc. - ponto 35 da p.i.
4. Quanto à comparação de preços com vista ao apuramento das invocadas margens brutas, a AT não justifica os respetivos critérios usados na seleção de faturas de compra nem os termos de comparação - ponto 38 da p.i.
5. Também não resultam do relatório os coeficientes de ponderação, nem algo que permita perceber a respetiva base - ponto 39 da p.i.

Estas questões foram, também já apreciadas acórdão de 27/11/2014, que, como dissemos, aqui seguimos, já que, são também de igual teor as alegações da p.i., assim, por facilidade economia processual e, por não vislumbrarmos motivo para discordar da apreciação que ali foi utilizada, acompanhamos e parcialmente transcrevemos:

“(…)

Constitui jurisprudência assente a de que: «[s]endo característico das situações apontadas por lei como de impossibilidade de avaliação directa da matéria tributável o aparecimento de dúvidas sobre a quantificação real, inerentes e consequentes da utilização de métodos indirectos, que, actuando indicadores, sempre e só podem alcançar um valor aproximado do que provavelmente a matéria tributável efectiva terá tido, só é viável e legalmente sustentável uma decisão no sentido da anulação do acto tributário impugnado, por alegado erro em sede de quantificação da matéria tributável, caso o impugnante, sem reticências ou necessários reparos, demonstre, comprove, a ocorrência de “erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada”. // Assim, não aproveita ao impugnante uma actuação processual e, sobretudo, probatória, direccionada e orientada pelo, simplista e preguiçoso, objectivo de suscitar dúvida, ainda que fundada, sobre a quantificação do facto tributário. É imprescindível um desempenho pautado pela concreta e circunstanciada alegação de factos que, uma vez provados, sejam idóneos a comprovar, a demonstrar, com uma certeza adequada e passível de ampla aceitação, a aduzida errónea ou excessiva quantificação da matéria tributável» [Ac. do TCAS, de 18.10.2010; P. 04334/10].

Está em causa a determinação por métodos indirectos do IVA em falta nos exercícios de 2001, 2002 e 2003. Trata-se de um estabelecimento que exerce a actividade de cervejaria e marisqueira, situado próximo da Av. ……………, em Lisboa.

A AT, com a colaboração do sócio gerente da empresa, procedeu à escolha dos produtos vendidos mais representativos e dos coeficientes de ponderação. Ponderou as quebras para aquele sector de atividade; considerou os autoconsumos externos; integrou os custos das mercadorias vendidas. A explicitação dos critérios usados decorre do laudo do perito da Fazenda Pública apresentado em sede de comissão de revisão. Aí se consigna a explicitação do método de apuramento das refeições vendidas, bem como do método de apuramento das compras efectuadas [alíneas hh) a kk)]. Perante a posição assumida pela Fazenda Pública nos autos, a impugnante não aduziu (e não comprovou) factos concretos que permitam concluir que a realidade económica, patrimonial e contabilística da empresa fosse outra, diversa da que resulta do relatório de inspecção. É que, recorde-se, «não aproveita ao impugnante uma actuação processual e, sobretudo, probatória, direccionada e orientada pelo, simplista e preguiçoso, objectivo de suscitar dúvida, ainda que fundada, sobre a quantificação do facto tributário. É imprescindível um desempenho pautado pela concreta e circunstanciada alegação de factos que, uma vez provados, sejam idóneos a comprovar, a demonstrar, com uma certeza adequada e passível de ampla aceitação, a aduzida errónea ou excessiva quantificação da matéria tributável».”

Como dissemos, a fundamentação que serviu de base à impugnação de IVA é oportuna para aquela que nos cumpre conhecer (IRC 2001, 2002, 2003) com a ressalva de que no nosso caso “… a explicitação do método de apuramento das refeições vendidas, bem como do método de apuramento das compras efectuadas …” se encontram consignadas nos pontos ff) e jj) do probatório por nós aditado.

Assim, e por considerarmos, que foram indicados e especificados pela AT, os critérios utilizados na determinação da matéria tributável por métodos indiretos, pelo que, caberia àquele a quem o método é oposto, neste caso ao impugnante, aqui recorrida, o encargo de alegar e provar que a realidade é distinta do resultado a que se chegou, ou seja que o critério utilizado é ostensivamente desadequado e/ou inadmissível e, por conseguinte, que houve erro ou manifesto excesso da matéria coletável assim fixada (artigo 74.º n.º 3 da LGT), o que, como é bom de ver, o impugnante não logrou fazer, pelo que improcede, sem mais, este fundamento impugnatório.

II – Da Falta de fundamentação da decisão de fixação da matéria coletável.

Alega a Impugnante que na fundamentação da matéria coletável o Diretor de finanças corroborou as posições da Inspeção Tributária e do perito indicado para o processo de revisão pelo que o respetivo despacho padece dos vícios já referidos e, designadamente, de falta de fundamentação.

Adiantamos que, também aqui a argumentação deduzida se encontra condenada ao insucesso.

Na verdade, decorre desde logo do artigo 92. º n.ºs 6 e 7 da LGT que, “[N]na falta de acordo no prazo estabelecido no n.º 2, o órgão competente para a fixação da matéria tributável resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos.” e “[S]se intervier perito independente, a decisão deve obrigatoriamente fundamentar a adesão ou rejeição, total ou parcial, do seu parecer”.

Ora como ressalta do acórdão que vimos seguindo e decorre do probatório (ponto hh), por nós aditado), é óbvio, que a decisão da matéria coletável contém claramente as razões que possibilitam a preensão do iter cognoscitivo e valorativo que esteve na base da decisão que conduziu à utilização de métodos indiretos e, consequentemente, à fixação da matéria tributável, por essa via.

Com efeito ressalta da leitura do referido despacho a falta de credibilidade e de aderência à realidade evidenciada na contabilidade da impugnante, nos exercícios em causa, face ao desrespeito pelas regras da normalização contabilística, nomeadamente no que respeita aos registos das contas de Disponibilidades, Fornecedores, Sócios e Custos e Perdas Financeiras. Sendo certo que se mostra clara e facilmente entendível o caminho seguindo quanto à quantificação da matéria tributável/imposto por métodos de avaliação indireta, face à ponderação dos elementos considerados relevantes para aquele sector de atividade.

Resulta, do que se deixou dito que não resulta provada a existência do vício que vimos de apreciar.

Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente imputação.


»«

Atenta a lisura do comportamento processual das partes e considerando a complexidade do processo, determina-se que haja lugar à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, prevista no art.º 6.º, n.º 7, do RCP.

III - DECISÃO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes desta 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e conhecendo em substituição julgar improcedente a impugnação.

Custas pela recorrida, em 1.ª instância, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que exceda os 275.000,00 €

Registe e Notifique.

Lisboa, 29 de abril de 2021

[A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Senhoras Desembargadoras Ana Cristina Carvalho e Ana Pinhol]


Hélia Gameiro Silva

(com assinatura eletrónica)