Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06608/13
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:10/03/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL.
VÍCIOS DE ACTIVIDADE CONTRAPÕEM-SE AOS VÍCIOS DE JULGAMENTO.
CONHECIMENTO EM SUBSTITUIÇÃO. ARTº.665, DO C.P.CIVIL.
ARTº.176, Nº.4, DO C.P.T.A.
FIXAÇÃO DE PRAZO PARA O CUMPRIMENTO DO DEVER DE EXECUTAR POR PARTE DA ENTIDADE DEMANDADA.
PEDIDO DE IMPOSIÇÃO DE UMA SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA.
ARTº.179, Nº.3, DO C.P.T.A.
CARIZ “INTUITO PERSONAE” DA SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA. EXIGÊNCIA DE NEXO DE CULPA.
EXECUÇÃO DE JULGADO. ARTº.100, DA L. G. TRIBUTÁRIA.
TEORIA DA RECONSTITUIÇÃO DA SITUAÇÃO ACTUAL HIPOTÉTICA.
JUROS INDEMNIZATÓRIOS. ARTº.43, Nº.1, DA L.G.TRIBUTÁRIA.
ERRO IMPUTÁVEL AOS SERVIÇOS.
ARTº.35, Nº.6, DA L.G.T. JUROS COMPENSATÓRIOS.
INDEMNIZAÇÃO POR PRESTAÇÃO DE GARANTIA BANCÁRIA INDEVIDA.
ARTº.53, DA L.G.T.
Sumário:1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).

2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma.

3. A sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso.

4. De acordo com o artº.665, do C. P. Civil, aplica-se no processo vertente a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, nos termos da qual os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, tudo ao abrigo do princípio da economia processual, o qual, no caso concreto, se sobrepõe à eventual preocupação de supressão de um grau de jurisdição.

5. Nos termos do artº.176, nº.4, do C.P.T.A., pode o autor na petição de execução de julgado, além do mais, pedir ao Tribunal para que fixe um prazo para o cumprimento do dever de executar por parte da entidade demandada, no mesmo sentido indo a norma constante do artº.179, nº.4, do mesmo diploma, especificamente no que respeita ao pagamento de quantias pecuniárias, assim se devendo concluir pela inclusão de tal prazo a fixar no leque de poderes que o Tribunal detém no que se refere à execução de sentenças de anulação de actos administrativos, espécie a que se reconduzem normalmente os processos de impugnação de actos tributários em que o sujeito passivo tem ganho de causa.

6. Uma das principais inovações introduzidas pela reforma do contencioso administrativo consistiu na instituição do poder de os Tribunais administrativos imporem sanções pecuniárias compulsórias aos titulares dos órgãos administrativos obrigados a cumprir determinações judiciais. O exame da figura revela a sua dualidade característica: trata-se, em primeira linha, de uma medida coercitiva, de carácter patrimonial, seguida de uma sanção pecuniária, em caso de incumprimento pontual. Não constitui, portanto, uma medida de cariz executivo, antes tendo por objectivo a prevenção do
incumprimento (cfr.artº.66, nº.3, do C.P.T.A.).

7. No que respeita à vertente de execução de sentenças, tal figura visa estimular o cumprimento voluntário e rápido da decisão judicial, resultando da lei que a sanção pecuniária compulsória deve ser imposta pelo Tribunal quando tal se justifique (cfr.artº.179, nº.3, do C.P.T.A.). A imposição da sanção depende de uma avaliação do juiz sobre a sua necessidade e adequação, quer no momento da pronúncia da sentença declarativa (em que será excepcional), quer no processo de execução. Estamos, portanto, perante uma faculdade de que o Tribunal dispõe para prevenir, quando tal se justifique, o eventual incumprimento do julgado.

8. Numa óptica subjectiva, a sanção pecuniária compulsória apresenta, no mundo administrativo, uma especificidade que se manifesta na circunstância de a lei não a fazer recair sobre o Estado ou os entes públicos, mas antes sobre os titulares dos órgãos incumbidos da execução (cfr.artº.169, nº.1, do C.P.T.A.). Tal implica uma identificação individual dos responsáveis pelo cumprimento das sentenças, situação que nem sempre é inequívoca ou fácil para o Tribunal (a sanção pecuniária compulsória é imposta “intuito personae”). A este propósito, suscita-se a questão de saber se, tratando-se de uma sanção, ainda que compulsória, deve relevar a culpa. Parece-nos que, tendo em consideração a incidência da sanção na esfera patrimonial de pessoas individuais, se deve exigir um nexo de culpa, o qual relevará, tanto para a imposição, como para a fixação do montante pecuniário concreto.

9. Nos termos do artº.100, da L.G.Tributária, em virtude da procedência total ou parcial de impugnação a favor do sujeito passivo, a A. Fiscal está obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio, tal dever compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, computados a partir do termo do prazo da execução da decisão. Em face de tal postulado, a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, tudo se passando como se o acto anulado não tivesse sido praticado, mais devendo a reintegração completa da ordem jurídica violada ser efectuada de acordo com a teoria da reconstituição da situação actual hipotética.

10. A reconstituição da situação hipotética actual justifica a obrigação de restituição do imposto que houver sido pago, tal como do pagamento de juros indemnizatórios, cuja atribuição ao sujeito passivo, nos termos da lei, não está dependente da formulação de pedido nesse sentido, posição esta que está de acordo com os efeitos consequentes que decorrem da anulação do acto tributário, tal como do facto do pagamento de juros não estar dependente de pedido (cfr.artº.100, da L.G.Tributária; artº.61, nº.3, do C.P.P. Tributário).

11. Os juros indemnizatórios correspondem à concretização de um direito de indemnização que tem raiz constitucional. Com efeito, no artº.22, da C.R.Portuguesa, estabelece-se que o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte a violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.

12. A obrigação de pagamento de juros indemnizatórios tem o seu fundamento no instituto da responsabilidade civil extracontratual do Estado, constituindo a contra face dos juros compensatórios a favor da Administração Fiscal e sendo tal matéria regulada pela lei em vigor à data do facto gerador da responsabilidade (cfr.artº.12, do C.Civil). Assim, a natureza dos juros indemnizatórios é substancialmente idêntica à dos juros compensatórios, sendo, como estes, uma indemnização atribuída com base em responsabilidade civil extracontratual. Os juros indemnizatórios vencem-se a favor do contribuinte, destinando-se a compensá-lo do prejuízo provocado por um pagamento indevido de uma prestação tributária (cfr.artº.43, da L.G.T.).

13. Os requisitos do direito a juros indemnizatórios previsto no artº.43, nº.1, da L.G.Tributária, são os seguintes:
a)Que haja um erro num acto de liquidação de um tributo;
b)Que o erro seja imputável aos serviços;
c)Que a existência desse erro seja determinada em processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial;
d)Que desse erro tenha resultado o pagamento de uma dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

14. A utilização da expressão “erro” e não “vício” ou “ilegalidade” para aludir aos factos que podem servir de base à atribuição de juros indemnizatórios, revela que se teve em mente apenas os vícios do acto anulado a que é adequada essa designação, que são o erro sobre os pressupostos de facto e o erro sobre os pressupostos de direito. Com efeito, há vícios dos actos administrativos e tributários a que não é adequada tal designação, nomeadamente os vícios de forma e a incompetência, pelo que a utilização daquela expressão “erro” têm um âmbito mais restrito do que a expressão “vício”. Na verdade, a existência de vícios de forma ou incompetência significa que houve uma violação de direitos procedimentais dos administrados e, por isso, justifica-se a anulação do acto por estar afectado de ilegalidade. Mas o reconhecimento judicial de um vício de forma ou incompetência não implica a existência de qualquer pecha na relação jurídica tributária, isto é, qualquer juízo sobre o carácter indevido da prestação pecuniária cobrada pela administração tributária com base no acto anulado, limitando-se a exprimir a desconformidade com a lei do procedimento adoptado para a declarar ou cobrar ou a falta de competência da autoridade que a exigiu.

15. Diz-nos o citado artº.43, nº.1, da L.G.T., que o erro de facto ou de direito, terá de ser imputável aos serviços, assim se afastando os casos de autoliquidação (cfr.v.g.artºs.82, al.a), e 83, nº.1, al.a), do C.I.R.C.). Nestes casos, tanto a determinação da matéria colectável como a liquidação são levados a cabo pelo próprio sujeito passivo, pelo que estará afastada, em regra, a possibilidade de existir erro imputável aos serviços.

16. O artº.35, nº.6, da L.G.T., estatui que se considera haver sempre retardamento da liquidação quando as declarações de imposto forem apresentadas fora dos prazos legais, para efeitos de liquidação de juros compensatórios.

17. Prevê o artº.53, da L.G.T., um direito de indemnização para os casos em que a prestação da garantia no âmbito de processo de execução fiscal seja de considerar total ou parcialmente indevida por ao contribuinte vir a ser reconhecida razão (cfr.artº.171, do C.P.P.T.). No aludido preceito (cfr.artº.53, da L.G.T.), atribui-se ao devedor que, para suspender a execução, tenha oferecido garantia bancária ou equivalente, o direito a ser indemnizado, total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação. A indemnização será total ou parcial conforme o vencimento que o interessado obtenha em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida (cfr.artº.53, nº.1, da L.G.T.). Se se comprovar que houve erro imputável aos servigos, essa indemnização será devida independentemente do período de tempo durante o qual a garantia tiver sido mantida (cfr.artº.53, nº.2, da L.G.T.). Se a anulação, total ou parcial, não tem por fundamento um erro daquele tipo (designadamente, se a liquidação for anulada por erro imputável ao próprio contribuinte ou por vício de forma ou incompetência) a indemnização só é devida se a garantia tiver sido mantida por mais de três anos (cfr.artº.53, nº.1, da L.G.T.). Por último, refira-se que o limite máximo para a indemnização a fixar nos termos do preceito sob exegese se encontra consagrado no nº.3, da norma.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
“CONSTRUTORA ................A, S.A.” E “A......... - ÁGUAS .........., EEM”, com os demais sinais dos autos, deduziram recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.149 a 156 do presente processo, através da qual julgou parcialmente procedente a execução de julgado de sentença exarada em processo de impugnação que decidiu anular liquidações de juros compensatórios de I.V.A. relativas a períodos de 2001 e 2002.
X
Os recorrentes terminam as alegações do recurso (cfr.fls.164 a 175 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-As recorrentes não se conformam com a sentença recorrida, tanto no que respeita ao segmento improcedente, como relativamente àquela parte da sentença que não precisa os valores a restituir e que não se pronuncia sobre os pedidos de fixação de prazo e de sanção pecuniária compulsória;
2-As recorrentes, no requerimento executivo peticionaram, designadamente, a restituição da quantia de, pelo menos, € 94.000,00 referente a juros compensatórios, juros de mora e demais acréscimos legais;
3-O recorrente não só requereu a restituição dos juros compensatórios, juros de mora e demais acréscimos legais como a condenação na restituição de um preciso montante;
4-Pedido com o qual a A.T. não se opôs, não tendo, inclusivamente, contestado o direito das exequentes na restituição da exacta quantia peticionada;
5-Até porque, o recorrente juntou aos autos prova do pagamento de, pelo menos, o referido valor a título de juros compensatórios, juros de mora e demais acréscimos legais;
6-Apesar disso, o Tribunal “a quo” limitou-se a condenar a A.T. a restituir os montantes pagos a título de juros compensatórios, juros de mora e demais acréscimos legais sem, porém, os quantificar;
7-Ora, a não quantificação dos valores a restituir também constitui uma omissão de pronúncia por parte do tribunal;
8-Omissão de pronúncia que não se compadece com a natureza do presente processo de execução, cujo objectivo primordial é dar cumprimento a uma decisão judicial prévia, que não fora voluntariamente cumprida, fixando-se os precisos termos em que a dita sentença deve ser cumprida e salvaguardando-se o recurso a todos os meios coercivos possíveis para a tutela do efectivo cumprimento da decisão;
9-Mais: as recorrentes, no requerimento executivo, peticionaram também (i) a fixação de prazo para cumprimento do dever de executar a decisão judicial exequenda bem como (ii) a fixação de uma sanção pecuniária compulsória pelos dias de atraso que, para além do prazo limite estabelecido, se possa vir a verificar na execução da decisão judicial;
10-Todavia, e uma vez mais, a sentença recorrida, não se pronunciou sobre os referidos pedidos efectuados pelas recorrentes;
11-Ora, nos termos do disposto no artº.179, do C.P.T.A., a decisão judicial proferida em execução de sentença deve fixar prazo para o cumprimento da decisão por parte da entidade administrativa, bem como, quando tal se justifique, sanção pecuniária compulsória;
12-Também nos termos do disposto no artº.95, nº.1, do C.P.T.A., aplicável “ex vi” do artº.146, nº.1, do C.P.P.T., segundo o qual “sem prejuízo do disposto no número seguinte, o tribunal deve decidir, na sentença ou acórdão, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (...)”;
13-Cumpria, assim, ao Tribunal recorrido quantificar os valores a restituir como apreciar e pronunciar-se sobre todos os pedidos efectuados pelo recorrente;
14-Pelo que, a sentença recorrida, por não ter quantificado os valores a restituir e ao não se ter pronunciado sobre todas as questões colocadas pelo recorrente, é nula nos termos do artº.668, nº.1, alínea d), do C.P.C., “ex vi” do artº.140, do C.P.T.A., e 146, nº.1, do C.P.P.T.;
Mais,
15-As recorrentes, no requerimento executivo, peticionaram a condenação dos executados no pagamento de juros indemnizatórios, tendo a sentença recorrida julgado este pedido improcedente;
16-Analisada a fundamentação cristalizada na sentença recorrida, as recorrentes ficam com dúvidas quanto à verdadeira motivação da improcedência do pedido formulado: se, por um lado, o indeferimento resulta do facto de o direito aos juros indemnizatórios não ter sido reconhecido na sentença executada (1.a hipótese), e/ou, se, por outro lado, aquele resultado (indeferimento) tem por fundamento uma análise própria e autónoma feita pelo Tribunal “a quo”, pela qual concluiu que não se verificam os requisitos dos juros indemnizatórios (2.a hipótese);
17-Na primeira hipótese, a fundamentação é incorreta e carece de base legal, visto que é consensual, na jurisprudência (entre outros, o Acórdão do Pleno do STA, de 10/03/2004, proferido no processo nº.0463/03) e na doutrina (Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, Volume I, 2006, p.479), que, de acordo com a legislação vigente (em particular, o nº.1, do artº.43, da LGT), o pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios (e de reconhecimento de erro imputável aos serviços) pode também ser formulado (e reconhecido) em sede do processo de execução de julgados;
18-E podendo este pedido ser formulado nesta fase, o Tribunal “a quo” não se pode furtar à análise sobre o preenchimento dos requisitos dos reclamados juros indemnizatórios, previstos no artº.43, nº.1, da L.G.T.;
19-Por conseguinte, não pode a sentença recorrida indeferir o pedido de condenação dos juros indemnizatórios com fundamento no (simples) facto de os juros indemnizatórios não terem sido atribuídos na sentença executada e ao fazê-lo, a sentença viola o disposto no nº.1, do artº.43, da L.G.T.;
20-Igual conclusão se tem de alcançar caso se conclua que a sentença recorrida funda (parcial ou, por maioria de razão, totalmente) a improcedência do pedido de juros indemnizatórios no facto de, na sequência de uma análise própria do citado artº.43, nº.1, da L.G.T., considerar que, no caso, não estão preenchidos os requisitos dos juros indemnizatórios;
21-Pois, no caso em apreço verifica-se o preenchimento dos requisitos dos juros indemnizatórios, uma vez que as recorrentes pagaram uma dívida tributária (pelo menos, os € 94.000,00 referidos no requerimento executivo) em montante superior ao legalmente devido (€ 0) e que esse pagamento é/foi tributário de um erro imputável aos serviços;
22-Da sentença recorrida parece resultar que, do conjunto destes dois requisitos, poderá apenas estar em causa o requisito do erro imputável aos serviços, por não ter “sido imputada à Administração qualquer ilegalidade”, o que é um pressuposto errado, porquanto a sentença executada julgou procedente a impugnação judicial intentada e anulou os actos de liquidação impugnados justamente com fundamento na ilegalidade dos mesmos;
23-Ilegalidade que, tendo por base um erro, não pode deixar de ser imputada a quem o praticou, ou seja, e porque não estamos aqui perante um caso de auto-liquidação, à própria A.T.;
24-Na verdade, foi a própria A.T. que se enganou ou, como é dito no recente Acórdão do TCA Norte, datado de 2.02.2012 (proferido no processo nº. 00233/06.6BEPNF), que "incorreu em erro ao considerar que estavam preenchidos os pressupostos de liquidação dos juros compensatórios";
25-Acresce que a ilegalidade que fundamentou a anulação dos actos de liquidação é uma ilegalidade material e que, de forma ostensiva, se subsume no conceito de erro imputável aos serviços;
26-Está, pois, preenchido este requisito dos juros indemnizatórios, assim como está também preenchido o outro requisito: pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido;
27-A sentença recorrida, ao decidir conforme decidiu, padece de erro de julgamento, violando o disposto no artº.43, nº.1, da L.G.T., razão pela qual deve a mesma ser revogada e substituída por uma outra que condene os executados no pagamento de juros indemnizatórios;
Mais,
28-As recorrentes, no requerimento executivo, peticionaram a condenação dos executados no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, mais precisamente, duas garantias bancárias;
29-A sentença julgou este pedido procedente mas apenas no que respeita à garantia referida no ponto 6 do probatório, por ter sido mantida por período superior a 3 anos (artº.53, nº.1, da L.G.T.); relativamente à garantia mencionada no ponto 7 do probatório, a sentença julgou o respetivo pedido improcedente por a garantia ter sido prestada por um período inferior a 3 anos, não se subsumindo, assim, no nº.1, do artº.53, da L.G.T., e, tendo presente a recusa do pedido de juros indemnizatórios, por considerar que não se verifica o requisito do erro imputável aos serviços, necessário para o enquadramento da questão à luz do nº.2 do mesmo artigo;
30-Verificando-se o erro imputável aos serviços também para efeito da indemnização por prestação de garantia bancária indevida, pelo que a mesma é devida;
31-Termos em que, e nos melhores de Direito, com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., e com base nos fundamentos expostos, deverá o presente recurso ser julgado procedente. Julgando-se nesta conformidade, será cumprido o direito e feita Justiça!
X
Contra-alegou a entidade recorrida (cfr.fls.183 a 190 dos autos), a qual pugna pela confirmação do julgado, sustentando, nas Conclusões:
1-Não corresponde à verdade que a douta sentença não procedeu à quantificação do valor referente aos juros compensatórios, juros de mora e demais acréscimos legais pagos em sede de execução fiscal;
2-A não menção de um valor numérico não implica que o valor não esteja quantificado, que aliás está;
3-O mesmo se diga quanto aos juros de mora a pagar sobre o montante referido, a sentença determina claramente o dia de início da sua contagem, não podendo obviamente quantificar o valor na medida em que a data do terminus - a execução espontânea da sentença - é-lhe impossível de determinar;
4-A sentença que imponha o cumprimento de deveres à Administração pode fixar oficiosamente (ainda que um prazo legal exista) um prazo para o respectivo cumprimento, bem como tem quando tal se justifique, o poder de impor sanção pecuniária compulsória destinada a prevenir o incumprimento, segundo o disposto no artº.169 (artº.44, do C.P.T.A.);
5-Sendo que, apesar dos executados não terem cumprido espontaneamente o julgado, quando do processo de impugnação, nada faz supor que, postos perante a presente decisão, continuem indiferentes ao seu cumprimento e, consequentemente, que para esse cumprimento seja indispensável aplicar a medida solicitada;
6-Por fim, no que respeita ao alegado erro de julgamento quanto aos juros indemnizatórios e à prestação de garantia indevida, este simplesmente inexiste;
7-Com efeito, sendo premissa de ambos o erro imputável aos serviços e este não se verificando, não se podem daí assacar outras consequências que não as retiradas pela douta sentença ora sindicada;
8-Nestes termos, e nos demais de direito, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas, deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se em vigor na ordem jurídica a douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, assim se fazendo Justiça.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.208 a 211 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.213 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.151 e 152 dos autos):
1-A liquidação em causa foi objecto de impugnação judicial que correu os seus termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria sob o nº...........5BELRA e diz respeito a juros compensatórios liquidados por atraso na liquidação do I.V.A. (01/05, 01/08, 01/09, 01/10, 01/12, 02/04 e 02/08), conforme resulta dos respectivos autos de impugnação aqui em anexo;
2-Por sentença proferida nos autos supra identificados, em 28/01/2011, transitada em julgado em 22/02/2011, foi determinada a anulação dos juros compensatórios impugnados (relativamente aos períodos 01/05, 01/08, 01/09, 01/10, 01/12, 02/04 e 02/08), no valor total de € 68.066,09 (cfr.documento junto a fls.50 a 54 do processo de impugnação apenso);
3-Na sentença foi reconhecida “…a impossibilidade de imputação de qualquer juízo de censura à actuação da impugnante em relação ao retardamento da liquidação de I.V.A. à taxa normal...” e “...a exclusão da culpa que é pressuposto da responsabilidade pelo pagamento de juros compensatórios…” (cfr.documento junto a fls.50 a 54 do processo de impugnação apenso);
4-Em 28/02/2011, a impugnante nos autos vem aos autos de impugnação a que supra nos vimos referindo requerer a remessa do processo ao órgão de administração tributária competente para a execução (cfr.documento junto a fls.60 do processo de impugnação apenso);
5-No âmbito do processo de impugnação supra a ali impugnante pagou custas judiciais no montante de € 342,65, sendo € 311,50 de taxa de justiça e € 31,15 de procuradoria (cfr.documento junto a fls.87 dos presentes autos; documento junto a fls.22 do processo de impugnação apenso);
6-No âmbito do processo executivo nº....................... foi prestada garantia bancária emitida pelo “Banco ........, SA.”, com o nº.05/280/30861, em 07/10/2005, para garantia do valor de € 129.070,08 (cfr.documento junto a fls.24 dos presentes autos; factualidade não contestada);
7-No âmbito do processo executivo nº.................. foi prestada garantia bancária emitida pelo “Banco........., SA.”, com o nº.GAR/..................., em 25/05/2007, para garantia do valor de € 9.722,70 que foi cancelada em Setembro de 2009 (cfr.documentos juntos a fls.25 e 57 dos presentes autos; factualidade não contestada);
8-A impugnante, aqui exequente, efectuou o pagamento dos montantes exigidos nos autos de impugnação supra e acrescido, em processo de execução fiscal, no montante total de € 141.999,36 (€ 133.474,74 e € 8.524,62) em 10/07/2009 (cfr.documentos juntos a fls.26 e 27 dos presentes autos; factualidade não contestada).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Dos autos não resulta provado que tenha sido efectuado às entidades aqui exequentes qualquer pagamento pela Administração Fiscal por conta das quantias exigidas dos autos. Dos factos com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do Tribunal no estabelecimento deste quadro factológico fundou-se, em primeira linha, no teor dos documentos citados nas alíneas supra, nomeadamente na sentença cuja execução se requer…”.
X
Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
9-As liquidações de juros compensatórios mencionadas no nº.1 do probatório, relativas aos períodos 01/05, 01/08, 01/09, 01/10, 01/12, 02/04 e 02/08, datadas de 12/4/2005, foram estruturadas em virtude da apresentação de declarações periódicas de substituição por parte da recorrente “Construtora ................., S.A.” em Março de 2005, tendo o sujeito passivo pago o imposto de I.V.A. devido em 4/4/2005, mais sendo aquelas estruturadas devido ao retardamento da liquidação do imposto e ao abrigo do artº.35, da L.G.T. (cfr. informação exarada a fls.9 e 10 de processo administrativo apenso; documentos juntos a fls.69 a 75 do processo de reclamação graciosa apenso);
10-No final da p.i. que originou o presente processo o recorrente formulou, além do mais, os pedidos de fixação de prazo para o cumprimento do dever de executar a decisão judicial exequenda e ainda a imposição de uma sanção pecuniária compulsória, a aplicar ao Sr. Director Geral dos Impostos e ao Sr. Chefe do Serviço de Finanças de ............, nos termos dos artºs.176, nº.4, e 169, do C.P.T.A., respectivamente (cfr.p.i. junta a fls.4 a 18 dos presentes autos);
11-O dispositivo da decisão recorrida tem o seguinte conteúdo:
“(…)
Nestes termos julgo a pretensão da requerente:
A) Procedente e condeno a A.T.
1-A restituir a quantia anulada na acção de Impugnação nº.225/06.5BELRA no montante de € 68.066,09 acrescido de todos os encargos legais pagos em execução fiscal em 10/07/2009;
2-Ao pagamento de juros de mora sobre a quantia a restituir contados desde 23/03/2011, data “terminus” para execução espontânea da sentença;
3-Ao pagamento da indemnização resultante da prestação da garantia bancária referida no ponto 6 do probatório, com o limite fixado no nº.3, do artº.53, da L.G.T.;
4-Ao pagamento das custas de parte conforme nota justificativa e discriminativa ao tempo remetida à A.T., no montante de € 342,65;
B) Improcedente quanto a:
1-Juros indemnizatórios;
2-Ao pedido de pagamento da indemnização resultante da prestação da garantia bancária referida no ponto 7 do probatório.
Por falta de fundamento legal. (…) (cfr.documento junto a fls.149 a 156 dos presentes autos).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada supra, no teor da informação e documentos referidos em cada um dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou parcialmente procedente a execução de julgado da sentença exarada no processo de impugnação judicial apenso, nos termos constantes do nº.11 do probatório, para onde se remete.
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Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente dissente do julgado alegando, em primeiro lugar e como supra se alude, que o Tribunal “a quo” se limitou a condenar a A.T. a restituir os montantes pagos a título de juros compensatórios, juros de mora e demais acréscimos legais sem, porém, os quantificar. Que a não quantificação dos valores a restituir constitui uma omissão de pronúncia por parte do Tribunal. Omissão de pronúncia que não se compadece com a natureza do presente processo de execução, cujo objectivo primordial é dar cumprimento a uma decisão judicial prévia, que não fora voluntariamente cumprida, fixando-se os precisos termos em que a dita sentença deve ser cumprida e salvaguardando-se o recurso a todos os meios coercivos possíveis para a tutela do efectivo cumprimento da decisão (cfr.conclusões 6 a 8 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar uma nulidade da sentença recorrida devido a omissão de pronúncia.
Dissequemos se a decisão recorrida padece de tal vício.
A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Esta peça processual pode padecer de vícios de duas ordens, os quais obstam à eficácia ou validade da dicção do direito:
1-Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação;
2-Por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artº.615, do C.P.Civil.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A. Sul, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A. Sul, 3/5/2011, proc.4629/11).
Trata-se, em qualquer caso, nesta nulidade, de falta de pronúncia sobre questões e não de falta de realização de diligências instrutórias ou de falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas. A falta de realização de diligências constituirá uma nulidade processual e não uma nulidade de sentença. A falta de avaliação de provas produzidas, tal como a sua errada avaliação, constituirá um erro de julgamento da matéria de facto. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e referir se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
Mais, a nulidade de omissão de pronúncia impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.608, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.577 e 578, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº. 133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac. T.C.A.Sul, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul, 18/9/2012, proc.3171/09; Jorge Lopes de Sousa, ob.cit., pág.912 a 914).
No caso “sub judice”, o que o recorrente pretende, se bem percebemos, é que o Tribunal “a quo” não quantificou os valores a restituir pela A. Fiscal e tal não se compadece com a natureza do presente processo de execução, cujo objectivo primordial é dar cumprimento a uma decisão judicial prévia.
Remetendo para o dispositivo da sentença recorrida, o qual se encontra reproduzido supra (cfr.nº.11 do probatório), deve concluir-se que do mesmo constam, na parte em que se julgou procedente o pedido, vectores de condenação perfeitamente quantificáveis.
Mas mesmo que esta quantificação não fosse possível, deve referir-se que tal matéria não se coloca no âmbito da validade formal da sentença. Ou seja, tal falta de quantificação poderá constituir um erro de julgamento, mas não implica a nulidade da sentença devido a omissão de pronúncia, desde logo porque não nos encontramos perante uma verdadeira “questão” conforme se alude acima.
Por outras palavras, a factualidade em exame poderia redundar na evocação de eventual erro de julgamento de direito da decisão recorrida, mas não no apelo à existência de uma nulidade da sentença devido a omissão de pronúncia.
Em suma, não se vê que a sentença recorrida tenha omitido pronúncia e, nestes termos, devendo improceder este fundamento do recurso.
Mais aduz o recorrente que no requerimento executivo, peticionou também (i) a fixação de prazo para cumprimento do dever de executar a decisão judicial exequenda bem como (ii) a fixação de uma sanção pecuniária compulsória pelos dias de atraso que, para além do prazo limite estabelecido, se possa vir a verificar na execução da decisão judicial. Todavia, a sentença recorrida não se pronunciou sobre os referidos pedidos efectuados pela recorrente. Ora, nos termos do disposto no artº.179, do C.P.T.A., a decisão judicial proferida em execução de sentença deve fixar prazo para o cumprimento da decisão por parte da entidade administrativa, bem como, quando tal se justifique, sanção pecuniária compulsória. Cumpria, assim, ao Tribunal recorrido pronunciar-se sobre todos os pedidos efectuados pelo recorrente (cfr.conclusões 9 a 13 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar mais uma nulidade da sentença recorrida devido a omissão de pronúncia.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal vício.
Antes de mais, remete-se para o exarado supra no que diz respeito aos contornos da nulidade da sentença devido a omissão de pronúncia.
Mais se dirá que a sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, o Mmº. Juiz “a quo” não se pronunciou sobre os dois pedidos formulados pelo recorrente no final da p.i. que originou o presente processo (fixação de prazo para o cumprimento do dever de executar a decisão judicial exequenda e ainda a imposição de uma sanção pecuniária compulsória, a aplicar ao Sr. Director Geral dos Impostos e ao Sr. Chefe do Serviço de Finanças de ..............., nos termos dos artºs.176, nº.4, e 169, do C.P.T.A., respectivamente - cfr.nº.10 do probatório). Donde se conclui que a sentença incorreu, neste caso, em omissão de pronúncia e, consequentemente, na nulidade a que se refere o artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, e artº.125, nº.1, “in fine”, do C.P.P.Tributário.
No entanto, a nulidade em análise não abrange o restante segmento decisório da decisão recorrida, visto que em nada contende com o mesmo (cfr.nº.11 da matéria de facto provada).
Em conclusão, deve julgar-se procedente o presente esteio do recurso e, em consequência, declarar a nulidade parcial da sentença recorrida (na vertente em que deixou de conhecer dos citados pedidos), ao que se procederá na parte dispositiva do presente acórdão.
Haverá, agora, que saber se, de acordo com o artº.715, do C.P.Civil (cfr.artº.665, do C.P.C., na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), se pode aplicar no processo vertente a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, nos termos da qual os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao Tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, tudo ao abrigo do princípio da economia processual, o qual, no caso concreto, se sobrepõe à eventual preocupação de supressão de um grau de jurisdição.
Pensamos que sim, sendo manifesta a desnecessidade de cumprimento do contraditório plasmado no artº.665, nº.3, do C.P.Civil.
Avancemos, portanto, para o conhecimento dos mencionados pedidos, começando pela fixação de prazo para o cumprimento do dever de executar a decisão judicial (cfr.artº.176, nº.4, do C.P.T.A.).
Nos termos do artº.176, nº.4, do C.P.T.A., pode o autor na petição de execução de julgado, além do mais, pedir ao Tribunal para que fixe um prazo para o cumprimento do dever de executar por parte da entidade demandada, no mesmo sentido indo a norma constante do artº.179, nº.4, do mesmo diploma, especificamente no que respeita ao pagamento de quantias pecuniárias, assim se devendo concluir pela inclusão de tal prazo a fixar no leque de poderes que o Tribunal detém no que se refere à execução de sentenças de anulação de actos administrativos, espécie a que se reconduzem normalmente os processos de impugnação de actos tributários em que o sujeito passivo tem ganho de causa (cfr.Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao C.P.T.A., Almedina, 3ª.edição, 2010, pág.1131; José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, Lições, 11ª. Edição, Almedina, 2011, pág.373 e seg.).
Pelo que, nos termos do artº.176, nº.4, do C.P.T.A., entende o Tribunal fixar em trinta dias o prazo de cumprimento do dever de executar que incumbe à Direcção-Geral dos Impostos, no que diz respeito ao pagamento dos montantes a que o recorrente tem direito, assim julgando procedente este pedido formulado pelo apelante no articulado inicial, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
Passemos ao exame do pedido de imposição de uma sanção pecuniária compulsória a aplicar ao Sr. Director-Geral dos Impostos e ao Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Abrantes, nos termos dos artºs.176, nº.4, e 169, do C.P.T.A. (cfr.artº.179, nº.3, do C.P.T.A.).
Uma das principais inovações introduzidas pela reforma do contencioso administrativo consistiu na instituição do poder de os Tribunais administrativos imporem sanções pecuniárias compulsórias aos titulares dos órgãos administrativos obrigados a cumprir determinações judiciais.
O exame da figura revela a sua dualidade característica: trata-se, em primeira linha, de uma medida coercitiva, de carácter patrimonial, seguida de uma sanção pecuniária, em caso de incumprimento pontual. Não constitui, portanto, uma medida de cariz executivo, antes tendo por objectivo a prevenção do incumprimento (cfr.artº.66, nº.3, do C.P.T.A.). Por isso mesmo, a correspondente figura de direito privado não está regulada no C.P.Civil, mas antes no C.Civil (cfr.artº.829-A, do C.Civil).
No que respeita à vertente de execução de sentenças, tal figura visa estimular o cumprimento voluntário e rápido da decisão judicial, resultando da lei que a sanção pecuniária compulsória deve ser imposta pelo Tribunal quando tal se justifique (cfr.artº.179, nº.3, do C.P.T.A.). A imposição da sanção depende de uma avaliação do juiz sobre a sua necessidade e adequação, quer no momento da pronúncia da sentença declarativa (em que será excepcional), quer no processo de execução. Estamos, portanto, perante uma faculdade de que o Tribunal dispõe para prevenir, quando tal se justifique, o eventual incumprimento do julgado.
Numa óptica subjectiva, a sanção pecuniária compulsória apresenta, no mundo administrativo, uma especificidade que se manifesta na circunstância de a lei não a fazer recair sobre o Estado ou os entes públicos, mas antes sobre os titulares dos órgãos incumbidos da execução (cfr.artº.169, nº.1, do C.P.T.A.). Tal implica uma identificação individual dos responsáveis pelo cumprimento das sentenças, situação que nem sempre é inequívoca ou fácil para o Tribunal (a sanção pecuniária compulsória é imposta “intuito personae”).
A este propósito, suscita-se a questão de saber se, tratando-se de uma sanção, ainda que compulsória, deve relevar a culpa. Parece-nos que, tendo em consideração a incidência da sanção na esfera patrimonial de pessoas individuais, se deve exigir um nexo de culpa, o qual relevará, tanto para a imposição, como para a fixação do montante pecuniário concreto (cfr.Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao C.P.T.A., Almedina, 3ª.edição, 2010, pág.1095 e seg.; José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, Lições, 11ª. Edição, Almedina, 2011, pág.380 e seg.).
Mais se dirá que a sanção pecuniária compulsória só é aplicável quando tal se justifique, pressupondo este critério de justificação um juízo de valor sobre o eventual incumprimento da decisão, juízo de ponderação esse assente em factos concretos que permitam concluir se o eventual incumprimento é, ou não, desculpável, o que se alcançará através de um juízo de censura à conduta processual e extraprocessual desenvolvida pela parte não cumpridora, juízo esse sempre fundado em razões objectivas, isto é, comprovadas nos autos (cfr.ac.T.C.A.Sul-1ª.Secção, 31/1/2008, proc.3362/07)..
Revertendo ao caso dos autos, é manifesto que não se encontram preenchidos os pressupostos para o Tribunal fazer uso desta figura, desde logo, porque não existe qualquer prova nos autos do nexo de culpa face aos incumpridores concretamente individualizados.
Face ao exposto, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente este pedido formulado pelo recorrente no articulado inicial, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
O apelante aduz, igualmente e como supra se alude, que no requerimento executivo peticionou a condenação dos executados no pagamento de juros indemnizatórios, tendo a sentença recorrida julgado este pedido improcedente. Que no caso em apreço se verifica o preenchimento dos requisitos dos juros indemnizatórios, uma vez que a recorrente pagou uma dívida tributária (pelo menos, os € 94.000 referidos no requerimento executivo) em montante superior ao legalmente devido (€ 0) e que esse pagamento é/foi tributário de um erro imputável aos serviços. Que a sentença recorrida, ao decidir conforme decidiu, padece de erro de julgamento, violando o disposto no artº.43, nº.1, da L.G.T., razão pela qual deve a mesma ser revogada e substituída por uma outra que condene os executados no pagamento de juros indemnizatórios (cfr.conclusões 15 a 27 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal pecha.
Nos termos do artº.100, da L.G.Tributária, em virtude da procedência total ou parcial de impugnação a favor do sujeito passivo, a A. Fiscal está obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio, tal dever compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, computados a partir do termo do prazo da execução da decisão (cfr.artº.43, da L.G.T.).
Em face de tal postulado, a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, tudo se passando como se o acto anulado não tivesse sido praticado, mais devendo a reintegração completa da ordem jurídica violada ser efectuada de acordo com a teoria da reconstituição da situação actual hipotética (cfr.Diogo Freitas do Amaral, A execução das sentenças dos Tribunais Administrativos, 2ª. edição, Almedina, 1997, pág.70; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.868 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, 6ª. edição, 2011, pág.526 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/1/2012, proc.5110/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/9/2013, proc.6718/13).
A A. Fiscal está, assim, obrigada a reconstituir a situação legal que hipoteticamente existiria se não houvera sido objecto de um acto lesivo ou de uma ofensa por si cometida contra os direitos e interesses protegidos dos administrados. Tal constitui uma simples explicitação do princípio geral de direito que nos diz que devem ser apagados todos os efeitos jurídico-práticos consequentes de um acto ilícito (cfr.artº.562, do C.Civil).
A reconstituição da situação hipotética actual justifica a obrigação de restituição do imposto que houver sido pago, tal como do pagamento de juros indemnizatórios, cuja atribuição ao sujeito passivo, nos termos da lei, não está dependente da formulação de pedido nesse sentido, posição esta que está de acordo com os efeitos consequentes que decorrem da anulação do acto tributário, tal como do facto do pagamento de juros não estar dependente de pedido (cfr.artº.100, da L.G.Tributária; artº.61, nº.3, do C.P.P. Tributário; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 11/2/2009, rec.1003/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/7/2006, proc.1258/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/1/2007, proc.205/04; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.869).
Haverá, agora, que saber se no caso “sub judice” são, ou não, devidos juros indemnizatórios.
Os juros indemnizatórios correspondem à concretização de um direito de indemnização que tem raiz constitucional. Com efeito, no artº.22, da C.R.Portuguesa, estabelece-se que o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte a violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.
A norma constitucional remete para o instituto da responsabilidade civil, pelo que serão aplicáveis as respectivas regras.
A obrigação de pagamento de juros indemnizatórios tem o seu fundamento no instituto da responsabilidade civil extracontratual do Estado, constituindo a contra face dos juros compensatórios a favor da Administração Fiscal e sendo tal matéria regulada pela lei em vigor à data do facto gerador da responsabilidade (cfr.artº.12, do C.Civil). Assim, a natureza dos juros indemnizatórios é substancialmente idêntica à dos juros compensatórios, sendo, como estes, uma indemnização atribuída com base em responsabilidade civil extracontratual.
Os juros indemnizatórios vencem-se a favor do contribuinte, destinando-se a compensá-lo do prejuízo provocado por um pagamento indevido de uma prestação tributária (cfr.artº.43, da L.G.T.; Jorge Lopes de Sousa, Juros nas relações tributárias, em Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, Lisboa, 1999, pág.155 e seg.).
Os requisitos do direito a juros indemnizatórios previsto no artº.43, nº.1, da L.G.Tributária, são os seguintes:
1-Que haja um erro num acto de liquidação de um tributo;
2-Que o erro seja imputável aos serviços;
3-Que a existência desse erro seja determinada em processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial;
4-Que desse erro tenha resultado o pagamento de uma dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (cfr.Jorge Lopes de Sousa, Juros nas relações tributárias, em Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, Lisboa, 1999, pág.158; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.530).
Embora não se refira expressamente, no artº.43, nº.1, da L.G.Tributária, que o acto viciado por erro deve ser um acto de liquidação, são os actos deste tipo os que provocam directamente o pagamento de uma dívida tributária e, por isso, terá de ser a actos de liquidação que se reporta esta disposição (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/1/2012, proc. 5110/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/9/2013, proc.6718/13).
A utilização da expressão “erro” e não “vício” ou “ilegalidade” para aludir aos factos que podem servir de base à atribuição de juros indemnizatórios, revela que se teve em mente apenas os vícios do acto anulado a que é adequada essa designação, que são o erro sobre os pressupostos de facto e o erro sobre os pressupostos de direito. Com efeito, há vícios dos actos administrativos e tributários a que não é adequada tal designação, nomeadamente os vícios de forma e a incompetência, pelo que a utilização daquela expressão “erro” têm um âmbito mais restrito do que a expressão “vício”.
Na verdade, a existência de vícios de forma ou incompetência significa que houve uma violação de direitos procedimentais dos administrados e, por isso, justifica-se a anulação do acto por estar afectado de ilegalidade. Mas o reconhecimento judicial de um vício de forma ou incompetência não implica a existência de qualquer pecha na relação jurídica tributária, isto é, qualquer juízo sobre o carácter indevido da prestação pecuniária cobrada pela administração tributária com base no acto anulado, limitando-se a exprimir a desconformidade com a lei do procedimento adoptado para a declarar ou cobrar ou a falta de competência da autoridade que a exigiu.
Trata-se de uma solução equilibrada, inclusivamente no domínio processual. Na verdade, perante o simples reconhecimento judicial de um vício de forma ou de incompetência fica-se na dúvida sobre se estavam reunidos os pressupostos de facto e de direito de que a lei faz depender o pagamento de uma prestação tributária. Se essa dúvida é um motivo suficiente para não exigir uma deslocação patrimonial do contribuinte para a Fazenda Pública (justificando a restituição da quantia paga) também, por identidade de razão, será suporte bastante para não impor uma deslocação patrimonial efectiva em sentido inverso (pagamento de uma indemnização).
Diz-nos igualmente a norma sob exame que o erro de facto ou de direito, terá de ser imputável aos serviços, assim se afastando os casos de autoliquidação (cfr.v.g.artºs.82, al.a), e 83, nº.1, al.a), do C.I.R.C.). Nestes casos, tanto a determinação da matéria colectável como a liquidação são levados a cabo pelo próprio sujeito passivo, pelo que estará afastada, em regra, a possibilidade de existir erro imputável aos serviços (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 5/5/1999, rec.5557-A; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/9/2011, rec.433/11; ac.T.C.A.Sul, 31/1/2012, proc.5110/11; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.530 e seg.).
“In casu”, haverá que saber se estão preenchidos os requisitos do direito a juros indemnizatórios previsto no artº.43, nº.1, da L.G.Tributária, e acabados de examinar.
Retira-se do probatório que as liquidações de juros compensatórios efectuadas ao abrigo do artº.35, da L.G.T., foram anuladas visto que não se encontravam reunidos os pressupostos para formular um juízo de censura à actuação do sujeito passivo. Portanto, não se podia falar de uma actuação culposa do sujeito passivo no caso concreto, requisito necessário para a liquidação de juros compensatórios (cfr.nºs.3 e 9 do probatório; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/12/2010, rec.587/10).
Teremos agora que examinar se nos encontramos perante situação em que se verifica um erro imputável aos serviços, enquanto pressuposto de pagamento dos juros indemnizatórios a favor do recorrente.
O Tribunal “a quo” entendeu que não.
Remetendo para o mencionado supra, o erro de facto ou de direito terá de ser imputável aos serviços enquanto pressuposto de pagamento dos juros indemnizatórios.
Revertendo ao caso dos autos, retira-se da factualidade provada que se verificou a apresentação de declarações periódicas de substituição por parte da recorrente “Construtora Abrantina, S.A.” em Março de 2005, tendo pago o imposto de I.V.A. devido em 4/4/2005, mais tendo as liquidações de juros compensatórios sido efectuadas em 12/4/2005, ao abrigo do artº.35, da L.G.T. (cfr.nº.9 do probatório).
No exame da presente situação deve recordar-se que o artº.35, nº.6, da L.G.T., estatui que para efeitos do presente preceito, se considera haver sempre retardamento da liquidação quando as declarações de imposto forem apresentadas fora dos prazos legais. Da análise do probatório conclui-se que nos encontramos perante situação de retardamento da liquidação, sendo que o sujeito passivo pagou o imposto em falta em momento anterior à emissão das liquidações de juros compensatórios (cfr.nº.9 da factualidade provada).
Salvo melhor opinião, o nexo de imputação do erro aos serviços da A. Fiscal não se verifica no caso concreto, pelo que falha um dos pressupostos de condenação da A. Fiscal no pagamento de juros indemnizatórios (cfr.artº.43, nº.1, da L.G.T.). Assim é, porquanto, o nexo de imputação do erro aos serviços da Fazenda Pública não pode ter cariz objectivo. Antes pelo contrário, tal nexo de imputação reveste cariz subjectivo, pelo menos a título de negligência.
Voltando ao caso dos autos, o sujeito passivo reconhece o erro na liquidação do I.V.A., assim tendo apresentado as declarações de substituição e pago o imposto devido em 4/4/2005, sendo que as liquidações de juros compensatórios, emitidas pela A. Fiscal, o foram com base nestes pressupostos e ao abrigo do citado artº.35, nº.6, da L.G.T. Em conclusão, não é imputável à Fazenda Pública o eventual erro de direito que minava a estruturação das ditas liquidações de juros compensatórios, assim não se verificando um dos pressupostos de condenação da A. Fiscal no pagamento de juros indemnizatórios.
Sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente fundamento do recurso e confirma-se este segmento da decisão recorrida.
Por último, o recorrente aduz que no requerimento executivo peticionou a condenação dos executados no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, mais precisamente, duas garantias bancárias. Que a sentença recorrida julgou este pedido procedente mas apenas no que respeita à garantia referida no ponto 6 do probatório, por ter sido mantida por período superior a 3 anos (artº.53, nº.1, da L.G.T.). Que relativamente à garantia mencionada no ponto 7 do probatório, a sentença julgou o respectivo pedido improcedente por a garantia ter sido prestada por um período inferior a 3 anos, não se subsumindo, assim, no nº.1, do artº.53, da L.G.T., e, tendo presente a recusa do pedido de juros indemnizatórios, por considerar que não se verifica o requisito do erro imputável aos serviços, necessário para o enquadramento da questão à luz do nº.2 do mesmo artigo. Ora, verificando-se o erro imputável aos serviços também para efeito da indemnização por prestação de garantia bancária indevida, pelo que a mesma é devida (cfr.conclusões 28 a 30 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo, supõe-se, consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal vício.
Prevê o artº.53, da L.G.T., um direito de indemnização para os casos em que a prestação da garantia no âmbito de processo de execução fiscal seja de considerar total ou parcialmente indevida por ao contribuinte vir a ser reconhecida razão (cfr.artº.171, do C.P.P.T.).
No aludido preceito (cfr.artº.53, da L.G.T.), atribui-se ao devedor que, para suspender a execução, tenha oferecido garantia bancária ou equivalente, o direito a ser indemnizado, total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação. A indemnização será total ou parcial conforme o vencimento que o interessado obtenha em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida (cfr.artº.53, nº.1, da L.G.T.). Se se comprovar que houve erro imputável aos serviços, essa indemnização será devida independentemente do período de tempo durante o qual a garantia tiver sido mantida (cfr.artº.53, nº.2, da L.G.T.). Se a anulação, total ou parcial, não tem por fundamento um erro daquele tipo (designadamente, se a liquidação for anulada por erro imputável ao próprio contribuinte ou por vício de forma ou incompetência) a indemnização só é devida se a garantia tiver sido mantida por mais de três anos (cfr.artº.53, nº.1, da L.G.T.). Por último, refira-se que o limite máximo para a indemnização a fixar nos termos do preceito sob exegese se encontra consagrado no nº.3, da norma (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.433 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.237 e seg.).
No caso “sub judice”, conforme se exarou supra, não se pode concluir pela existência de erro imputável aos serviços na estruturação das liquidações de juros compensatórios que originaram os processos de execução fiscal no âmbito dos quais foi prestada garantia pelo recorrente (cfr.nºs.6 e 7 do probatório).
Nestes termos, e porque somente a garantia identificada no nº.6 do probatório se manteve por período superior a três anos, deve julgar-se procedente o pedido de indemnização em relação a tal garantia, no montante de € 129.070,08 (que não em relação à garantia identificada no nº.7 da factualidade provada), assim se devendo confirmar a decisão da 1ª. Instância, também neste segmento (cfr.nº.11 do probatório).
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, concede-se parcial provimento ao recurso deduzido (no que se refere ao segmento de nulidade da decisão recorrida devido a omissão de pronúncia incidente sobre os pedidos também formulados no final do articulado inicial) e, nessa medida, revoga-se a decisão recorrida, a qual se confirma nos restantes segmentos, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em, CONCEDENDO PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO:
A-Declarar a nulidade parcial da decisão recorrida devido a omissão de pronúncia e, conhecendo dos pedidos em causa, julgar procedente o pedido de fixação de prazo nos termos do artº.176, nº.4, do C.P.T.A., o qual se fixa em trinta dias com vista ao cumprimento do dever de executar que incumbe à Direcção-Geral dos Impostos;
B- No mais, negar provimento ao recurso e confirmar o dispositivo da decisão recorrida o qual se dá aqui por reproduzido (cfr.nº.11 do probatório).
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Condena-se o recorrente e a entidade recorrida em custas, na proporção do decaimento.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 3 de Outubro de 2013


(Joaquim Condesso - Relator)
(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)

(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)