Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:50/14.0BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:07/08/2021
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:COMPENSAÇÃO – ENCARGOS
INSPECÇÃO DE JOGOS
Sumário:I - A “contrapartida anual” prevista no DL nº 275/2001, de 17/10, reconduz-se a uma prestação de natureza patrimonial.
II - O DL n° 422/89, de 2/12 (Lei do Jogo), bem como o DL nº 275/2001, de 17/10, não enfermam de inconstitucionalidade orgânica e/ou material.
III - A “compensação de encargos para o serviço de Inspecção de Jogos” prevista no art. 13° do DL n° 129/2012, de 22/6, integra-se na apontada contrapartida financeira.
Votação:MAIORIA - RELATORA POR VENCIMENTO
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


I - RELATÓRIO

E....., S.A. deduziu impugnação judicial contra o pagamento efetuado no mês de outubro de 2013 relativo a “compensação dos encargos com o funcionamento dos serviços de Inspecção de Jogos”, no valor de € 303.322,78.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por sentença proferida a fls. 190 e ss. (numeração do SITAF), datada de 03 de outubro de 2017, julgou a acção improcedente.

A impugnante interpôs recurso jurisdicional. Alega nos termos seguintes:
«Ia) Na presente impugnação judicial, foi contestada a liquidação efectuada pelo Turismo de Portugal, IP, referente à compensação exigível às empresas concessionárias das zonas de jogo referente a despesas suportadas com os serviços de acção inspectiva e de combate ao jogo ilícito, ou a autoliquidação feita pela impugnante e ora recorrente;
2a) A referida compensação está prevista na Lei Orgânica do Turismo de Portugal, IP, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 129/2012, de 22/6 - artº 13º;
3a) A referida compensação é um tributo e, dentro da classificação de tributos estabelecida na Lei Geral Tributária, teria, em princípio, a natureza de uma taxa, assentando “na prestação concreta de um serviço público” (nº 2 do artº 4o da LGT).
4a) Na presente impugnação, a ora recorrente considera ilegais as liquidações efectuadas pelo Turismo de Portugal, IP, em primeiro lugar, por haver uma desproporcionalidade intolerável entre o serviço prestado e o valor exigido de compensação, transformando, assim, a referida taxa num verdadeiro imposto;
5a) Na verdade, não existe qualquer dado ou elemento comprovativo do efectivo custo suportado pela entidade pública ou da efectiva vantagem para o particular, pelo que, não havendo qualquer relação entre o custo ou a vantagem e o quantitativo exigido, estamos perante um imposto;
6a) Enquanto imposto, teria a referida compensação de ser criada por Lei da Assembleia da República ou por Decreto-Lei autorizado, o que não aconteceu, pelo que há uma violação do princípio da legalidade;
7a) Na presente impugnação, a ora recorrente considerou - e considera - também ilegal a liquidação efectuada pelo Turismo de Portugal, IP, na medida em que não está acompanhada de qualquer fundamentação;
8a) Na referida impugnação, a ora recorrente considerou - e considera - também ilegal a liquidação efectuada pelo Turismo de Portugal IP, na medida em que o seu valor é determinado através da multiplicação das despesas suportadas pelo Turismo de Portugal, IP, no ano anterior, por um factor a fixar anualmente pelo membro do Governo responsável pela área de Turismo (artº 13º da Lei Orgânica do Turismo de Portugal, IP);
9a) Ora, na medida em que não é conhecida a despesa suportada no ano anterior com a inspecção, nem o factor de multiplicação, a referida liquidação é ilegal;
10a) Na presente impugnação, não está em causa qualquer questão sobre a validade do contrato de concessão celebrado entre a impugnante e o Estado, concessão essa de exploração da zona do jogo do Estoril;
11a) O contrato de concessão estabelece, apenas, a obrigação da concessionária pagar tal compensação, mas o seu concreto valor, a determinação do seu quantitativo não consta de tal contrato;
12a) A ora recorrente, na presente impugnação, não contesta a validade de qualquer cláusula do contrato de concessão, mas sim a liquidação efectuada pelo Turismo de Portugal, IP, por ela violar o disposto na lei, concretamente, o artº 13º da Lei Orgânica do Turismo de Portugal;
13a) Como é entendimento jurisprudencial e doutrinário firmado, para além da bilateralidade, um tributo para ser taxa não pode ser desproporcionado (“intoleravelmente” desproporcionado), isto é, tem que haver um equilíbrio entre o quantitativo exigido pelo ente público e o custo em que este incorre;
14a) Ora, constata-se que não há qualquer relação entre o valor cobrado pelo Turismo de Portugal IP e o serviço prestado, na medida em que aquele valor é fixado com base num coeficiente, aleatório, fixado casino a casino;
15a) Deste modo, a compensação é um imposto é, como tal, inconstitucional porque os Decretos-Leis nºs 275/2001, de 17/10 e 129/2012, de 22/6, que criaram esse tributo, fizeram-no sem autorização do Parlamento, em violação dos artºs: 103º, nº 1 e 165º, nº 1, i), da Constituição;
16a) A liquidação ou a autoliquidação ora impugnada é também ilegal porque, determinando o nº 2 do artº 13º do Decreto-Lei nº 129/2012, de 22/6, que a compensação é determinada tendo em conta a despesa suportada pelo ente público com as acções de inspecção, nunca a impugnante foi notificada do valor de tais despesas;
17a) A liquidação ou a autoliquidação ora impugnada, é também ilegal, na medida em que o Decreto-Lei n.º 129/2012, estabelece que a compensação é determinada através da aplicação de um factor a ser fixado anualmente pelo membro do Governo, sendo que a impugnante nunca foi notificada de tal factor, nem sabe se ele existe.
18a) A douta sentença recorrida fez, assim, salvo o devido respeito, uma errada interpretação e aplicação dos princípios constitucionais e do artº 13º do Decreto-Lei nº 129/2012.
19a) Sendo que a douta sentença recorrida fez também, mais uma vez, salvo o devido respeito, uma errada interpretação, ao considerar que não tendo a recorrente impugnado a carta enviada pelo Turismo de Portugal, IP, em 3/8/2007, que fixou o valor da compensação a pagar mensalmente, essa fixação consolidou-se;
20a) É que decorre do artº 102º, nº 1, a), do CPPT, que o prazo para a impugnação se conta do termo prazo para o pagamento voluntário das prestações tributárias, no caso, tal prazo era o dia 10 de Outubro de 2013, pelo que a presente impugnação foi apresentada no momento e na sede própria.


X

O Instituto do Turismo de Portugal, I.P., apresentou contra-alegações ao recurso interposto, expondo conclusivamente o seguinte:
«1. Os encargos com o exercício da ação inspetiva nos casinos e com o combate aos jogos ilícitos de fortuna ou azar de base territorial encontram-se previstos no Decreto Regulamentar, no contrato de concessão e na lei como uma contrapartida contratual.
2. A referida compensação não corresponde a uma “prestação concreta de um serviço público” em benefício do particular ou a solicitação deste; não corresponde à utilização de um bem do domínio público; nem muito menos se pode admitir que tal compensação possa ser considerada como o correspetivo devido pelo particular pela remoção de um obstáculo jurídico.
3. Não é a previsão legal de uma taxa, mas sim o facto de ter assinado o contrato de concessão da zona de jogo do Estoril com o Estado concedente que obriga a recorrente a pagar a comparticipação nos encargos com o funcionamento do SRIJ.
4. O contrato de concessão da exploração de jogos de fortuna ou azar celebrado entre a recorrente e o Estado Português é um contrato administrativo.
5. Não se pode enquadrar a comparticipação nas despesas com o SRIJ na figura de uma taxa, pois não se está perante um serviço público em que a recorrente tenha beneficiado de uma vantagem no exercício da sua atividade por causa de uma ação administrativa, nem foi esse exercício que causou um acréscimo de despesa ao Estado, já que esta foi corolário, isso sim, da celebração do contrato de concessão.
6. Que não é uma taxa bem o sabe a recorrente, que não prova existir: (i) um ato de liquidação; (ii) uma autoliquidação; (iii) orientações genéricas emitidas pelo recorrido; (iv) prévia reclamação graciosa, pelo que lhe estava vedada o recurso direto à presente impugnação.
7. O Decreto-Lei n.º 275/2001, de 17 de outubro, o Decreto-Lei n.º 129/2012, de 22 de junho, e o Decreto Regulamentar n.º 56/84, de 9 de agosto, não criaram a compensação de encargos do SRIJ, sendo que o 1.º diploma referido prevê as condições acordadas para a prorrogação dos contratos de concessão, o 2.º diploma corresponde à lei orgânica do Instituto do Turismo de Portugal, I.P. e refere as contrapartidas contratuais por ser esta entidade quem as cobra e o 3.º diploma corresponde a um regulamento administrativo que contém as normas jurídicas (caderno de encargos) que enformaram o concurso público e a atribuição da concessão da exploração da zona de jogo do Estoril, em regime de exclusivo.
8. O Decreto n.º 14.643 de 1927 revela que nunca foi intenção do legislador configurar aquela comparticipação das concessionárias das zonas de jogo como um tributo, mas apenas e tão só como uma obrigação financeira contratual a que ficavam sujeitos os adjudicatários nos concursos para atribuição das referidas concessões. De igual modo assim foi configurada pelas subsequentes legislações que lhe sucederam.
9. Não se está perante qualquer tributo, uma vez que não há qualquer ato da administração que tenha beneficiado patrimonialmente a recorrente e, por outro lado, também não foi o exercício livre de qualquer atividade da recorrente ou das demais concessionárias das zonas de jogo, que provocou qualquer acréscimo de custos na Administração, e, por último, muito menos foram os diplomas que regeram ao longo do tempo os Estatutos da entidade fiscalizadora que previram essa obrigação.
10.Nos termos do contrato de concessão, o SRIJ fiscaliza apenas os casinos e não todo o jogo ilícito. Não se aceita, por isso, a qualificação da fiscalização operada pelo SRIJ exclusivamente sobre as concessionárias das zonas de jogo como um serviço público de inspeção e de combate ao jogo ilícito, designadamente o que ofende o exclusivo da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (Euromilhões, “raspadinha”, Totobola, Placard, entre outros).
11. Se, como pretende a recorrente, se estivesse perante um tributo, no que não se concede, esse tributo só poderia ser uma taxa, (i) só seriam chamadas a pagar essa comparticipação as contrapartes do Estado nos contratos de concessão, (ii) face ao incontornável sinalagma da compensação de encargos e (iii) o valor da comparticipação seria considerado adequado, por cumprir com os princípios da equivalência e da proporcionalidade, uma vez que a base da sua quantificação é somente o custo do funcionamento do serviço.
12.E mesmo neste cenário, nenhuma ilegalidade ou inconstitucionalidade haveria, sendo que, em qualquer caso, não haveria nunca montante algum a devolver à recorrente, pois, por força do contrato de concessão, a quantia devida a título de comparticipação nos encargos do SRIJ foi deduzida à contrapartida anual devida, que agora, por força de uma eventual ilegalidade daquela, a consumiria.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, foi regularmente notificado e pronunciou-se pela improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

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II- Fundamentação.

A sentença recorrida assentou na seguinte fundamentação jurídica:

«A) A impugnante é concessionária da exploração de jogos de fortuna ou azar, na zona de jogo permanente do Estoril, por força do contrato de concessão celebrado em 17.06.1985, publicado no ..... - por acordo.

B) O contrato referido em A) foi objeto de revisão integral e prorrogação em 14.12.2001, publicada no ....., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido - por acordo e cfr. fls. 60 dos autos.

C) Da cláusula 3.a do contrato referido em A) resulta que:

“A concessionária aceita todas as obrigações impostas pela legislação em vigor, designadamente, as estabelecidas nos Decretos-Leis n.ºs 422/89, de 2 de Dezembro e 184/88 de 25 de Maio, e legislação complementar, bem como pelos Decretos-Leis nºs 274/88 de 3 de Agosto e 275/2001 de 17 de Outubro, e pelo Decreto Regulamentar n º 29/88 de 3 de Agosto” — por acordo e cfr. fls. 60 dos autos.

D) Da cláusula 4.a do contrato referido em A) resulta que a ora Impugnante se obriga a:
“1) Prestar uma contrapartida inicial [...]
2) Para além da contrapartida referida no número anterior, prestar, em cada ano, contrapartida no valor de 50% das receitas brutas declaradas dos jogos explorados no casino, todavia, em caso algum a contrapartida prestada nos termos deste número poderá ser inferior aos valores indicados no anexo ao Decreto-Lei n.º 275/2001, de 17 de Outubro [...].
A contrapartida referida neste número realiza-se pelas seguintes formas:
a) Através do pagamento do imposto especial sobre o jogo, nos termos da legislação em vigor;
b) Através do pagamento das importâncias que à concessionária couberem para compensação do Estado pelos encargos com o funcionamento da Inspecção-Geral dos Jogos, nos termos legalmente estabelecidos; // [...]
g) Através do pagamento da diferença entre o total da contrapartida anual e os valores apurados nos termos das alíneas a) a f)” — por acordo e cfr. fls. 60 dos autos.».

E) O mesmo contrato de concessão foi ainda objeto de um aditamento em 17.10.2003, publicado no ..... – por acordo.

F) Por carta datada de 03.08.2007, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, a Entidade Impugnada, Turismo de Portugal, IP, informou a Impugnante que, na sequência da transferência das atribuições e competências da ex-Inspecção-Geral dos Jogos para o Turismo de Portugal, IP, o pagamento da compensação dos encargos com o funcionamento do Serviço de Inspecção de Jogos, passaria a ser efetuado para o NIB (número de identificação bancária) ali indicado – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial.

G) Ato impugnado: Por carta datada de 22.12.2008, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, a Entidade Impugnada, informou a Impugnante da “Quota-                      -parte a suportar pelas empresas concessionárias das zonas de jogo”, a título de “Encargos com o funcionamento do Serviço de Inspecção de Jogos”, expondo, além do mais, que:
1. […] que face à actualização da proporção da comparticipação da zona de jogo de Vidago – Pedras Salgadas de 0,549096841 para 0,6 nos Encargos com o funcionamento do Serviço de Inspecção de Jogos, com efeitos reportados a Janeiro de 2008, resultou uma comparticipação de 309.193,55 €, apurando-se, como consequência, uma diferença a favor dessa concessionária de 5.593,96 €.
2. Torna-se necessário repercutir essa diferença na comparticipação referente ao mês de Dezembro, pelo que o valor a pagar até ao dia 10 de Janeiro de 2009 é de 303.599,59 €.
3. Informa-se, ainda, que pelo facto de a zona de jogo de Tróia iniciar a comparticipação nos referidos encargos a partir de Janeiro do próximo ano, e mantendo-se os mesmos pressupostos de 2008, isto é, a mesma despesa e o mesmo factor, o valor do duodécimo da comparticipação dessa concessionária, para o ano de 2009 é de 303.322,78 €.  – cfr. doc. 2 junto com a petição inicial.

H) Ato impugnado: Em 10.10.2013 a Impugnante efetuou, por transferência bancária a favor do Turismo de Portugal, IP, para o NIB referido na alínea F), supra, o pagamento da quantia de € 303.322,78, referente à compensação das despesas com o serviço de inspecção de Jogos, relativa ao mês de outubro de 2013 – cfr. doc. n.º 3 junto com a petição inicial.

I) A impugnante veio deduzir a presente impugnação em 09.01.2014 – cfr. fls. 3 dos autos (suporte físico).


*

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afetar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.

Motivação de facto:

A decisão da matéria de facto provada efetuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados, referenciados em cada uma das alíneas do probatório e bem assim com base na posição assumida pelas partes nos autos.

II.2. De Direito

Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida julgou improcedente a presente impugnação judicial.

Para tal, apresentou a seguinte fundamentação, em síntese:

«Resumindo, estando em causa o cumprimento de uma obrigação decorrente de um contrato de concessão, na qual a Impugnante assentiu, assim se obrigando ao respetivo pagamento, e não, como pretende fazer crer, um imposto, falece a arguição da violação do princípio da legalidade e inconstitucionalidade decorrente da alegada violação dos art.ºs 103.º, n.º 1, e 165.º, n.º 1, i), da CRP, cujo conhecimento fica prejudicado atenta a natureza contratual da prestação aqui em causa.»

Inconformada, a impugnante veio interpor recurso da referida decisão.

As questões suscitadas pela recorrente no presente recurso foram já apreciadas e decididas por Acórdão no Supremo Tribunal Administrativo, no recurso n.º 01357/17, datado de 23/01/2019, e no recurso nº 01671/13.3BESNT 0351/18, datado de 30/01/2019, respectivamente, sendo que não se vê agora que devam ser decididas de modo diferente, quer porque estamos perante idêntica situação de facto, quer porque há que fazer apelo às mesmas normas legais que regulam a matéria.

Além disso, as conclusões apresentadas neste recurso são semelhantes às que foram apresentadas naqueles recursos, demandando, por isso, idêntica solução.

Assim, iremos citar (excerto) do Acórdão do STA proferido no recurso n.º 01357/17, datado de 23/01/2019, disponível em www.dgsi.pt:

«3.2. A sentença recorrida veio a julgar improcedente a impugnação das mencionadas liquidações (ou autoliquidações) correspondentes às ditas prestações mensais (Certamente por lapso induzido pelo supra referenciado lapso da impugnante, no segmento inicial do Relatório da sentença, mencionam-se os meses de Abril, Maio e Junho de 2014, sendo que nas alíneas H), I) e J) do Probatório, se referem já os meses de Março, Abril e Maio.) relativas à “compensação de encargos com o funcionamento dos Serviços de Inspecção de Jogos”, bem como o acto (que a sentença também menciona como acto impugnado) a que se refere a al. G) do Probatório, considerando o seguinte:

a) Quanto às ilegalidades por violação dos princípios da legalidade tributária e por inconstitucionalidades orgânicas e materiais dos normativos legais invocados:
— A prestação exigida à impugnante (compensação de encargos com o funcionamento dos serviços de Inspecção de Jogos) é liquidada com vista a perfazer a contrapartida prevista no n° 2 da cláusula 4ª do Contrato de Concessão (ou seja, por conta da contrapartida anual), então é esta compensação que a impugnante impugna, na parte em que a mesma respeita aos meses de Março a Maio de 2014, em conformidade com o valor que lhe foi notificado pelo Turismo de Portugal, IP, em carta datada de 3/08/2007.

— A chamada “contrapartida anual” exigida às empresas concessionárias das zonas de jogo é composta por 50% das receitas brutas dos jogos explorados no Casino, tem um «mínimo» fixado no DL nº 275/2001 e é paga através, ao menos em parte, da “compensação dos encargos com o funcionamento dos serviços de Inspecção de Jogos, sendo que o valor da mesma está previsto no art. 13° do DL n° 129/2012, de 22/6.

— As cartas referidas nas als. F) e G) do Probatório visam a concretização da cobrança da compensação em causa, comunicando, designadamente, o respectivo valor mensal a partir de 2009 em face da actualização da proporção da comparticipação de uma das zonas de jogo (Vidago-Pedras Salgadas), bem como comunicar o procedimento com vista ao cumprimento da referida obrigação contratual, de acordo com as normas legais aplicáveis.

— Porque as prestações em causa foram fixadas no âmbito de um contrato celebrado com a concessionária, concorrendo para o cômputo da contrapartida anual, previstas no contrato de concessão no qual a impugnante é parte e cujas cláusulas aceitou, não há qualquer imposição mas, antes, um verdadeiro contrato de concessão, consensual entre as partes, não se verificando, assim, relativamente a tais liquidações (ou autoliquidações), as invocadas ilegalidades, por violação dos princípios da igualdade tributária, da capacidade contributiva e da proporcionalidade. Ou seja, a quota-parte a suportar pela impugnante a título de encargos com o funcionamento do Serviço de Inspecção de Jogos, no quantitativo e na forma como foi calculado, resulta do estipulado nas cláusulas do contrato de concessão, que remetem para o disposto no art. 13° do DL n° 129/2012, de 22/06 (antes previstas no art. 18° do DL nº 141/2007, de 27/04), sendo a compensação em causa identificada como parte da contraprestação que a impugnante se obrigou a pagar, atenta a sua qualidade de “concessionária”.

— Acrescendo que, mesmo que não pagasse as ditas compensações, sempre a impugnante pagaria, por imposição do contrato de concessão, a contrapartida de 50% das receitas brutas dos jogos explorados no casino, com respeito pelos mínimos constantes do Anexo ao DL n° 275/2001, de 17/10 (Este diploma autorizou a prorrogação dos prazos dos contratos de concessão da exploração dos jogos de fortuna ou azar nos casinos das zonas de jogo do Algarve, Espinho, Estoril, Figueira da Foz e Póvoa de Varzim, alterou o regime contratual da concessão de jogo da Figueira da Foz e introduziu um regime especial de deduções nas contrapartidas anuais de exploração a liquidar pelas concessionárias das referidas zonas de jogo.), o que na prática levaria a ter de pagar a mesma importância que agora pretende ver discutida.
E neste contexto, a sentença concluindo que não estamos perante um imposto, conclui pela improcedência da arguição atinente à violação do princípio da legalidade, bem como da invocação de inconstitucionalidade por violação dos arts. 103°, n° 1, e 165°, n° 1, d) da CRP, cujo conhecimento julgou prejudicado, dada a natureza contratual das prestações aqui em causa.
b) Quanto à também invocada ilegalidade decorrente de não terem sido comunicados nem o valor da despesa suportada no ano anterior com os Serviços de Inspecção, nem a razão de ser do respectivo factor de multiplicação:

A fixação deste valor mensal a pagar por conta desta compensação aqui em causa (e com base na qual foram feitos os sucessivos pagamentos desta componente da contrapartida anual prevista no n° 2 da cláusula 4ª do contrato de concessão, incluindo os relativos aos meses de Março a Maio de 2014, aqui impugnados) não foi impugnada em sede e no momento próprios, resultando tal fixação consolidada para devidos efeitos legais, maxime para efeitos do apuramento da prestação contratualizada, a que se refere.

Ora, dado que esse valor resulta de cálculos que integram quer o montante da despesa suportada com a inspecção, quer o respectivo factor de multiplicação, e não tendo sido requerida em tempo a respectiva fundamentação (caso a impugnante a tivesse considerado inexistente ou insuficiente), nem sido impugnado o acto (notificação) que contém a respectiva fixação, tendo a impugnante vindo a pagar o valor em causa desde então, não pode agora vir impugná-lo atenta a respectiva consolidação na ordem jurídica.


3.3.
Discordando do assim decidido, a recorrente alega que a questionada compensação (relativa a despesas suportadas com os Serviços de Inspecção) que, em princípio, se reconduziria a uma taxa (por assentar “na prestação concreta de um serviço público” — n° 2 do art. 4° da LGT), acaba por se transmutar num verdadeiro imposto, dado que há, no concreto caso, uma manifesta “desproporcionalidade intolerável” entre o serviço prestado e o valor exigido de compensação, sendo que nem sequer existe qualquer dado ou elemento comprovativo do efectivo custo suportado pela entidade pública ou da efectiva vantagem para o particular.
Daí que, enquanto imposto, teria a dita compensação de ser criada por Lei da AR ou por DL autorizado, o que não aconteceu, pelo que, considerando a respectiva liquidação, ocorre violação do princípio da legalidade tributária.

Mais alega que as liquidações são também ilegais porque:

— não estão acompanhadas de qualquer fundamentação;

— apesar de o respectivo valor dever ser determinado através da multiplicação das despesas (suportadas com a inspecção, pelo Turismo de Portugal, IP, no ano anterior) por um factor a fixar anualmente pelo membro do Governo responsável pela área de Turismo (art. 13° do DL nº 129/2012, de 22/6), não são conhecidos o quantitativo de tais despesas nem o factor de multiplicação, ou, pelo menos, nunca a impugnante foi notificada do valor de tais despesas ou da fixação do apontado factor.


4.
Atendendo, pois, ao teor das Conclusões do recurso importa, antes de mais, apreciar esta questão da natureza da “compensação de encargos”, relativamente à qual foram impugnadas, como se disse, as liquidações referentes aos meses de Março, Abril e Maio de 2014.
Vejamos.

4.1.
Considerando a evolução histórica da regulamentação jurídica das concessões do jogo, constata-se que apesar de a respectiva exploração (do jogo) não se reconduzir a uma actividade de interesse público, ela tem sido objecto de intervenção legislativa por parte do Estado, com vista à regulação (sobretudo através do instrumento jurídico da “concessão”) dos vários sectores em que aquela se desenvolve, bem como à diminuição do interesse pelo jogo ilícito e clandestino.
Sendo que relativamente a determinadas zonas de jogo (na qual se inclui a zona aqui em causa) vigora um sistema de concessão em que a remuneração do Estado é materializada em contrapartida financeira assente, além do mais, numa percentagem das receitas brutas das concessionárias, resultando, como sublinha João Taborda da Gama (Em parecer emitido em 14/7/2016 e que veio a ser junto a outros processos em recurso neste STA (em que se apreciavam questões relativas ao imposto sobre o jogo ou às contrapartidas previstas como encargo das concessionárias de exploração de zonas de jogo) nomeadamente ao processo nº 2224/13.1BEPRT (1457/15), no qual foi proferido acórdão, em 5/12/2018, em julgamento ampliado com a intervenção de todos os juízes desta Secção de Contencioso Tributário, realizado ao abrigo do disposto no art. 148º do CPTA.), que o respectivo «ordenamento jurídico do jogo (composto por contratos, leis e diplomas regulamentares) estabelece, para a maioria das concessões, as regras de cumprimento dessa contrapartida, selecionando um conjunto de obrigações parcelares, pecuniárias ou em espécie, cujo cumprimento é imputável no cumprimento da parcela global. Temos assim dois níveis: (i) o primeiro nível, de âmbito fragmentário e especial, em que um conjunto de obrigações (tributos, obrigações de
facere de índole turística, etc.) é cumprido; e (ii) um segundo nível, em que é computado o valor pecuniário do cumprimento das obrigações parcelares para o cumprimento da macro-obrigação de contrapartida, apurando-se um saldo devedor (remanescente) ou um saldo credor (crédito de contrapartida).
E no âmbito do primeiro nível estão estipuladas legal e contratualmente variadas formas de realização das contrapartidas anuais, que variam de concessionária para concessionária:
a) ...

b) um outro modo de cumprimento previsto nos contratos/decretos regulamentares é através da tomada em consideração do valor pago pela compensação de encargos para o Serviço de Inspecção de Jogos e para a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE). Esta modalidade de cumprimento encontra-se prevista para os casinos do Estoril, Espinho, Póvoa de Varzim, Figueira da Foz, Algarve e Tróia.»

Esta “compensação de encargos” integra-se, pois, na apontada contrapartida financeira, afastando-se da figura da taxa (e/ou do imposto).

É que, como também o Prof. Vieira de Andrade pondera (Cfr. o parecer emitido em Fevereiro de 2017, também junto ao supra citado processo nº 2224/13.1BEPRT (1457/15).), a concessão da exploração de jogos de fortuna e azar haveria de operar-se num contrato pré-regulado por lei «(não constituindo a prestação de um serviço público), mediante uma contrapartida patrimonial muito forte, dado o alto potencial lucrativo da actividade (exercida em exclusivo territorial), com receitas consignadas ao desenvolvimento do turismo. E, neste contexto, também a necessária tributação desta actividade concessionada, enquanto actividade económica, haveria de ser especial: opta-se, desde sempre, no que respeita à exploração do jogo, pela substituição dos impostos regulares (hoje, IRC, IVA, Imposto de selo) por um imposto de regime especial, também com receitas consignadas ao desenvolvimento do turismo.»

Mas, no entanto, cada uma das prestações financeiras (a contrapartida patrimonial fixada no contrato de concessão do direito e o imposto estabelecido pela lei) «tem a sua estrutura específica, independentemente da finalidade comum e das suas interconexões práticas: uma, a contrapartida, tem natureza administrativa e contratual, outra, o imposto, tem natureza tributária e legal.»

E neste entendimento as contrapartidas pecuniárias (quer a inicial, quando prevista, quer a anual) não terão natureza tributária mas, antes, patrimonial, reconduzindo-se à «contraprestação devida pela atribuição do direito de explorar, em exclusivo a concessão numa zona territorial pré-determinada», independentemente até de o pagamento do imposto de jogo contribuir, juntamente com outros pagamentos, para a realização e preenchimento da contrapartida anual (casos há, aliás, em que não há que pagar qualquer contrapartida anual, mas somente imposto de jogo).

E nem a circunstância de no Decreto nº 14.643, de 3/12/1927 (diploma que inicialmente regulou a actividade do jogo) se considerar na epígrafe que antecede os arts. 44º e seguintes, a menção «Imposto sobre o jôgo. Sua consignação», não obstante o art. 45º se reportar ao pagamento das contrapartidas, nem a circunstância de os valores destas poderem ser consignados às mesmas entidades e finalidades do imposto de jogo, tem a virtualidade de determinar a mutação da natureza jurídica da prestação financeira patrimonial em prestação tributária. Estas obrigações financeiras (contrapartidas financeiras mínimas ou de natureza não pecuniária devidas como contraprestação pela concessão da exploração de jogos de fortuna ou azar, bem como o modo de pagamento das mesmas – cfr. o art. 11º, nº 4 e) da Lei do Jogo — e assumidas pela concessionária por efeito da concessão) têm fundamento diferente do imposto e constituem receitas de natureza patrimonial.

Acresce que, como igualmente se acentua neste último parecer citado, a distinção entre ambas as figuras também não é afectada pelo facto de existir uma pré-fixação legal dos montantes e das formas de cálculo e de pagamento: tal prática é frequente nos contratos de concessão, «cujas bases contratuais são, em regra, estabelecidas na lei» e «a obrigação de pagamento destes montantes não nasce coactivamente da lei, mas do contrato de concessão, dado que só existe, a título de remuneração do exclusivo concedido, para as empresas que aceitam, nas condições estabelecidas na lei, ser concessionárias do Estado na exploração do jogo», sendo normal «que a contrapartida pela outorga de um direito de exclusivo para a exploração de um bem ou de um serviço seja calculada a partir de uma percentagem da receita das concessionárias», sendo que também as «receitas patrimoniais podem em regra ser consignadas a finalidades específicas de interesse público - as limitações orçamentais à consignação reportam-se, essencialmente, ao domínio dos impostos» (aliás, relativamente à contrapartida, prevêem-se casos em que o pagamento do imposto do jogo se soma integralmente ao pagamento da contrapartida anual, e casos em que o pagamento deste é deduzido no cálculo da contrapartida anual, o que bem mostra que imposto e contrapartida não são a mesma coisa e não têm, por isso, de ser da mesma natureza).

Neste contexto, e dado que o modo de cálculo da contrapartida também não altera a sua natureza jurídica de prestação contratual, também fica desprovida de relevância a argumentação da recorrente no que respeita à unilateralidade da própria contrapartida mínima, pelo que, neste contexto, dando resposta àquela primeira questão suscitada no recurso, conclui-se agora que a “compensação de encargos para o Serviço de Inspecção de Jogos”, aqui impugnada, se reconduz a uma prestação de natureza patrimonial.


4.2.
Daí que (considerando as demais questões suscitadas no recurso), não podendo essa contrapartida, incluindo a parte em que é integrada pela dita “compensação de encargos para a Inspecção de Jogos”, assumir natureza unilateral e/ou coactiva, então, mesmo por referência ao enquadramento legal sustentado pela recorrente (que faz equivaler a uma taxa a dita compensação de encargos com os Serviços de Inspecção, acabando, aliás, por lhe conferir natureza de imposto, face a uma invocada “desproporção intolerável”), também não pudessem proceder a impugnação, e consequentemente o recurso, quer face à inexistência dos pressupostos para a qualificação como imposto e como taxa, quer face à não verificação das ilegalidades imputadas às liquidações em apreço, alegadamente decorrentes da violação dos princípios e normas constitucionais invocados [inconstitucionalidade orgânica (por inexistência de autorização legislativa da AR) e inconstitucionalidade material (por violação dos princípios da capacidade contributiva e da tributação do rendimento real), do DL n° 422/89, de 2/12, do DL n° 275/2001, de 17/10 e do DL nº 129/2012, de 22/06.

Aliás, neste âmbito, mesmo na perspectiva da recorrente, sempre o recurso teria que improceder, atendendo à jurisprudência, com a qual se concorda, firmada no acórdão deste STA, de 5/12/2018 [em julgamento ampliado com a intervenção de todos os juízes desta Secção de Contencioso Tributário, realizado ao abrigo do disposto no art. 148º do CPTA, no processo nº 2224/13.1BEPRT (1457/15) e para o qual se remete ao abrigo do disposto no nº 5 do art. 663º do CPC], sendo que, naquela perspectiva da recorrente, as questões suscitadas no presente recurso também seriam substancialmente idênticas às que foram objecto de tal julgamento ampliado, mediante o qual se visa, precisamente, «garantir a uniformidade de jurisprudência perante a possibilidade de decisões de sentido divergente ou, pelo menos, com variação substancial do tratamento das questões submetidas e de fundamentação da decisão (…)».

5.
Quanto à questão atinente à também invocada ilegalidade das liquidações por violação do disposto no nº 2 do art. 13º do DL nº 129/2012, de 22/6 (Diploma que aprovou a Lei Orgânica do Turismo de Portugal, I.P.), já que alegadamente terão sido operadas sem que fossem conhecidas as despesas no ano anterior e sem que tivesse sido fixado o factor aplicável também por referência ao ano anterior:

Atentando no teor das Conclusões 7ª a 9ª, 16ª e 17ª, bem como o teor das próprias alegações do recurso que as suportam (cfr., nomeadamente os arts. 21º, 39º e 40º das alegações), constata-se que, neste âmbito, a recorrente acaba por invocar apenas uma alegada falta de notificação de um factor considerado na liquidação (alega que «nunca foi comunicado qual o valor da despesa nem o factor a confirmar pelo Governo»), mas não a inexistência da própria fundamentação das liquidações (aliás, nesta parte, apenas alega, genericamente, a ilegalidade da liquidação por não estar acompanhada de qualquer fundamentação - Conclusão 9ª).
Aliás, ao referenciar os actos impugnados, a sentença também incluiu, precisamente, o especificado na alínea G) do Probatório, juntamente com as liquidações especificadas nas alíneas seguintes H) a J).

Ora, é sabido que uma coisa é a falta de fundamentação do acto e outra coisa diferente é a falta de notificação da fundamentação ( Sobre a distinção entre acto de notificação e acto notificado, cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6ª edição, volume I, anotação 3 a) ao art. 37º, pp. 349 a 351.), sendo que a irregularidade da notificação, tal como a própria falta de notificação, não relevam para efeitos da validade do acto, mas apenas para efeitos da sua eficácia (cfr. art. 36º, nº 1 do CPPT), podendo, contudo, as deficiências do acto de notificação (mas já não as que eventualmente sejam atinentes ao próprio acto notificado) ser sanadas nos termos do disposto no art. 37º do mesmo Código.

Assim, independentemente, (i) quer da argumentação da sentença [no sentido de que, por não ter sido impugnada, em sede e momento próprios, ficou consolidada (nomeadamente para efeito do apuramento da respectiva prestação contratualizada) a fixação do valor mensal a pagar por conta da compensação — € 303.322,78 — mencionado na carta do Turismo de Portugal, I.P., datada de 03/08/2007, e com base na qual foram efectuados os sucessivos pagamentos desta componente da contrapartida anual prevista no nº 2 da cláusula 4ª do contrato de concessão, incluindo os relativos aos meses de Março a Maio de 2014, identificados nas als. H), I) e J) dos factos provados], também o recurso terá que improceder nesta parte, (ii) quer da eventual relevância da factualidade especificada nas als. F) e G) do Probatório (a qual apontaria, no entendimento do MP, para a improcedência da própria alegação de falta de fundamentação, face à informação, por parte do Instituto de Turismo de Portugal I.P., da não alteração dos pressupostos atinentes ao ano de 2008, bem como dos ajustamentos a que o factor aplicado fora sujeito), o recurso terá de improceder também nesta parte.


6.
Neste contexto e pelo exposto, improcederá a alegação respeitante às ilegalidades das liquidações, por violação dos princípios e normas constitucionais invocados [inconstitucionalidade orgânica (por inexistência de autorização legislativa da Assembleia da República e inconstitucionalidade material (por violação dos princípios constitucionais da igualdade tributária, da proporcionalidade, da capacidade contributiva e da tributação do rendimento real), do DL n° 422/89, de 2/12, do DL n° 275/2001, de 17/10 e do DL nº 129/2012, de 22/06 e improcederá, igualmente, a alegação respeitante à ilegalidade das liquidações por violação do disposto no nº 2 do art. 13º deste último Diploma referido (DL nº 129/2012, de 22/6).»

Concordando-se, assim, com o que ali se deixou escrito, também agora se decidirá de igual forma negando-se provimento ao recurso e confirmando-se a sentença recorrida, com a presente fundamentação.

Fica, assim, prejudicada qualquer outra questão.


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Uma pequena nota final relativamente à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, nº 7 do RCP, tendo em consideração que o valor da causa foi fixado em € 303.322,78.

No caso concreto, ponderado o comportamento processual das partes litigantes, a complexidade do processo, e atendendo a que as questões decidendas não exigiram do julgador especiais e diversos conhecimentos técnicos e jurídicos, consideramos ser de dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 7, do RCP.


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III – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes da 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao presente recurso, e em consequência, manter a sentença recorrida, com a presente fundamentação.

Custas pelo recorrente, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 7, do RCP.

Registe e notifique.

                                                             Lisboa, 8 de Julho de 2021

A Relatora por vencimento

       (Lurdes Toscano)  

O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, tem voto de conformidade com o presente Acórdão a Desembargadora Maria Cardoso e tem voto de vencido o Desembargador Jorge Cortês.


Voto de vencido

Voto vencido, por considerar que a impugnação deveria ser julgada procedente.

A recorrente invoca que a liquidação em apreço é ilegal, por um lado, na medida em que, sendo o seu montante determinado através da multiplicação das despesas suportadas com as acções de inspecção pelo Turismo de Portugal, IP, no ano anterior, por um factor a fixar anualmente pelo membro do Governo responsável pela área de Turismo (artigo 13.º da Lei Orgânica do Turismo de Portugal, IP, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 129/2012, de 22 de Junho), nenhum destes elementos lhe foi dado a conhecer nem especificamente sabe se foi fixado o factor de multiplicação de acordo com o mesmo preceito. Por outro lado, a recorrente questiona a natureza de contrapartida da prestação em causa, bem assim como a sua equivalência ou a sua proporcionalidade.

No que se refere ao primeiro aspeto, o Acórdão convoca o entendimento jurisprudencial segundo o qual os administrados têm o ónus de requerer a fundamentação em falta que não seja tornada acessível no acto de notificação (artigo 286.º, n.º 3, da CRP). Salvo o devido respeito, o problema não é o da completude da notificação e da bondade da aplicação ao caso concreto de tal jurisprudência.

Na situação em exame, a impugnada comunicou, no essencial, à recorrente o seguinte:
“Informa-se, ainda, que pelo facto de a zona de jogo de Tróia iniciar a comparticipação nos referidos encargos a partir de Janeiro do próximo ano, e mantendo-se os mesmos pressupostos de 2008, isto é, a mesma despesa e o mesmo factor, o valor do duodécimo da comparticipação dessa concessionária, para o ano de 2009 é de 303.322,78 €.”

Ou seja, para além de não indicar o valor da despesa a que se refere ou os “encargos com o exercício da ação inspetiva” (parte inicial do n.º 1 do citado artigo 13.º), a impugnada informou que não foi fixado um factor para o ano de 2013, por despacho do membro do Governo responsável pela área do turismo. Informou, antes, que os elementos adoptados foram os fixados em ano anterior ao início da vigência da lei cuja aplicação está em causa (o acto legislativo é de 2012 [Decreto-Lei n.º 129/2012] e os elementos invocados pela impugnada reportam-se a 2008).

Ora, o factor de multiplicação tem de: i) ser fixado anualmente; ii) esta fixação anual tem de ter “em conta o montante despendido em anos anteriores”; iii) e a sua fixação anual é da competência do membro do Governo responsável pela área do turismo (artigo 13.º/2, do Decreto-Lei n.º 129/2012, citado).

Esta tripla exigência não é despicienda. Releva no plano da actualidade da compartição em causa, obrigando a Administração a uma ponderação anual da sua equivalência e proporcionalidade.

Em síntese, ao desconsiderar o disposto na norma do n.º 2 do artigo 13.º do Decreto-Lei nº 129/2012, de 22.6, a entidade impugnada incorreu no vício de violação da lei.

No que se refere ao segundo aspecto, o montante em causa decorre do contrato de concessão, mas o seu regime e conteúdo decorre da lei. Com efeito, das bases da concessão da zona de jogo do Estoril (artigo 6.º do Decreto-Regulamentar n.º 56/84, de 9 de Agosto[1]) resulta que «[a] contrapartida referida na alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º realiza-se pelas formas seguintes: // (…) // b) Através do pagamento das importâncias que à concessionária couberem para compensação do Estado pelos encargos com o funcionamento da Inspecção-Geral de Jogos, nos termos legalmente estabelecidos» (itálico nosso). Idêntico regime decorre do clausulado do contrato de concessão de exploração da zona de jogo em causa (alíneas C) e D), do probatório). Logo, a prestação do montante em causa tem de observar o disposto no artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 129/2012, de 22.6.


Jorge Cortês

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[1] Diploma que estabelece as bases da concessão da zona de jogo do Estoril.