Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:8181/14.0BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:12/03/2020
Relator:MÁRIO REBELO
Descritores:INDEMNIZAÇÃO.
IVA.
Sumário:1. O pagamento de indemnização, incluindo lucros cessantes, poderá ter caráter remuneratório ou ressarcitório.
2. Apenas está sujeita a IVA a indemnização com função remuneratória.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:
RECORRENTE: Autoridade Tributária.
RECORRIDO: H............., Lda.
OBJECTO DO RECURSO:

Sentença proferida pelo MMº juiz do TT de Lisboa que julgou procedente a impugnação deduzida pela H............., Lda., contra as liquidações adicionais de IVA dos anos de 1995 e 1996, com os nºs ............ e ............ e das liquidações dos respectivos juros compensatórios, com os nºs ............, ............, ............ e ............ no valor de €55.045,43.
CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:

I- Como resulta da interpretação conjugada do art.º 16°, nº 6, alínea a) e arts 1°, n° 1, e 4°, n° 1, todos do CIVA, e tendo subjacente o conceito de indemnização, serão tributadas as indemnizações que correspondam, directa ou indirectamente, à contrapartida devida pela realização de uma actividade económica, isto é, que visem remunerar a transmissão de bens ou a prestação de serviços.

II - O mesmo não sucederá caso tais indemnizações visem sancionar a lesão de qualquer interesse sem carácter remuneratório porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano, caso em não são tributáveis em IVA, porquanto não têm subjacente uma transmissão de bens ou uma prestação de serviços.

III - Tendo presente o anteriormente expandido, entende esta RFP que, salvo o devido respeito, a douta sentença a quo baseou a sua fundamentação numa errónea valoração da matéria de facto assente nos autos, assim como numa incorrecta interpretação das normas legais aplicáveis, ao considerar que na sua globalidade a indemnização percebida pela Impugnante visava sancionar uma lesão de interesses materiais desta sem carácter remuneratório, por não remunerar qualquer operação, mas antes visarem a reparação de um dano.

IV - Motivo pelo qual, semelhante indemnização sempre estaria excluída do valor tributável do imposto, nos termos da sobredita alínea a) do n° 6 do art.º 16° do CIVA.

V - Ora, salvo o devido respeito, entende esta RFP que a douta sentença a quo não valorou o facto de a referida indemnização ter sido percebida na sequência de um procedimento de expropriação por utilidade pública.

VI - E que por tal facto, a indemnização em apreço não poderia visar sancionar uma lesão de interesses materiais da Impugnante sem carácter remuneratório, por não remunerar qualquer operação, na medida em que correspondem a uma contrapartida devida por uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

VII - É pois o que se verifica no caso em apreço, com a cessão (ainda que temporária) do imóvel por parte da Impugnante, na sua qualidade de arrendatária, por motivos de utilidade pública.

VIII - Sendo que é também esta a conclusão que se pode retirar do regime legal estabelecido no DL 438/91 de 09/11, o qual, no seu artigo 1° previa que: "Os bens imóveis e direitos a eles inerentes podem ser expropriados por causa de utilidade pública, compreendida nas atribuições da entidade expropriante, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização."

IX- E no n° 1 do art.º 29° do citado diploma: "O arrendamento para comércio, indústria ou exercício de profissão liberal, ou para habitação no caso previsto no n.º 2 do artigo 9.º bem como o arrendamento rural, são considerados encargos autónomos para efeito de indemnização dos arrendatários.”

X - Sendo que, nos termos do disposto no n° 4 do antedito preceito: "Na indemnização respeitante a arrendamento para comércio, indústria ou exercício de profissão liberal atender­se-á às despesas relativas à nova instalação, incluindo os  referenciais  de  renda  que  o arrendatário irá pagar, e aos prejuízos resultantes do período de paralisação da actividade, necessária para a transferência, calculada nos termos gerais de direito."

XI - E tratando-se de indemnização pela interrupção da actividade comercial, industrial, liberal ou agrícola, preceitua o n° 1do art.º 30° do diploma a que nos temos vindo a reportar que: "Nos casos em que o proprietário do prédio nele exerça qualquer actividade prevista no n.º 4 do artigo anterior, à indemnização correspondente ao valor do prédio acrescerá a que corresponder aos prejuízos da interrupção dessa actividade, calculada nos termos do mesmo preceito."

XII - Em face do regime legal antecedentemente exposto, dúvidas não subsistem quanto ao carácter não ressarcitório das indemnizações pagas em razão do Código das Expropriações, no sentido em que correspondem à contrapartida devida por uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

XIII - Neste mesmo sentido importa considerar o que vem estipulado na alínea a) do n° 2 do art.º 14° da Directiva IVA (à semelhança do respectivo artigo 25° para as prestações de serviços), no que concerne à indemnização por expropriação, nos termos da qual: "[...] são consideradas  entregas  de bens [...] a transmissão  da propriedade  de um bem,  mediante pagamento de uma indemnização, em virtude de acto das autoridades públicas ou em seu nome ou por força da lei."

XIV - Em face do exposto, verifica-se que a quantia paga em virtude de um acto de expropriação público não deverá ser considerada um ressarcimento de um dano emergente, uma vez que aquele valor mais não é do que a contraprestação efectiva de uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

XV - Mas, ainda que assim não se entenda e sem conceder, não se pode deixar de olvidar que do elenco de “prejuízos" como tal qualificados pela Impugnante, comporta algumas rubricas que, pela respectiva natureza, não constituem danos que se possam qualificar como emergentes.

XVI- Decorre do disposto no n° 1 do art.º 564° do Código Civil, que "o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência dessa lesão”

XVII - A prestação devida por danos emergentes ou prejuízos causados, por ter carácter indemnizatório, limita-se a repor a situação existente à data da ocorrência da lesão; sendo que o mesmo não sucede no caso dos lucros cessantes, os quais, por cobrirem prejuízos futuros, geram um enriquecimento na esfera do beneficiário.

XVIII - Ora, no caso em apreço, verifica-se que do total da indemnização mensal  pretendida pela Impugnante e deferida pelo organismo público competente - € 54.395,64 - uma parte do mesmo reporta-se a "lucros não auferidos mensal”, no valor de € 33.715,99.

XIX - Deste modo, quanto a esta parte da indemnização arbitrada, parece evidente que a mesma se destina a compensar os lucros cessantes, isto é, a repor o nível de rendimento que, por força do dano, a Impugnante deixou de obter.

XX - Assim, estamos neste caso perante o ressarcimento de lucros cessantes, com o objectivo de reparar uma lesão com carácter remuneratório, motivo pelo qual, esta parte da indemnização tem subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

XXI - E por assim ser, pelo menos esta parte da indemnização sempre estaria sujeita a tributação em IVA, nos termos dos art.ºs 16° e 4 o do CIVA.

XXII - Sendo certo que a natureza de lucros cessantes a atribuir a parte da indemnização arbitrada à Impugnante já resultava do teor da informação do organismo público que sustentou a decisão de pagamento, quando ali se sustentou que aquela visava ressarcir não só os danos emergentes, como também os lucros cessantes e bem assim, os prejuízos relativos à perda futura de clientela.

XXIII   - Assim e em face do antecedentemente exposto, não se vislumbram fundamentos que sustentem uma declaração de ilegalidade das liquidações de imposto impugnadas, motivo pelo qual deverão estas ser mantidas na ordem jurídica ou, caso assim não se entenda, sempre deverão as mesmas ser objecto de uma anulação apenas parcial, correspondente à parte da indemnização paga à Impugnante que não se reporta a lucros mensais não auferidos.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação totalmente improcedente, ou, caso assim não se entenda,

deve a mesma impugnação ser considerada parcialmente improcedente, na parte em que a indemnização arbitrada à Impugnante respeita ao ressarcimento de lucros cessantes e prejuízos relativos à perda futura de clientela, tudo com as legais e devidas consequências.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA

CONTRA ALEGAÇÕES.

O Recorrido contra alegou e concluiu:

I - As indemnizações em apreço, pagas à Recorrida, têm um carácter meramente ressarcitório, sancionam a lesão de um interesse, sem carácter remuneratório porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano, e portanto, não são tributáveis em IVA, na medida em que as mesmas não tem subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços;

II - Nos termos do n°3 do art.º 103° da CRP. "Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei.";

III - Não pode haver imposto cujo elemento constitutivo não esteja na lei;

Por tudo o exposto deve ser totalmente improcedente o recurso.

Assim se fazendo JUSTIÇA!

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela procedência do recurso.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao julgar procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IVA decorrente de indemnização paga à Impugnante pelo “Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa”, por ocupação e encerramento temporários do seu estabelecimento.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:

A) A Impugnante, nos exercícios de 1995 e 1996, tinha por objecto a actividade de restauração, com o Código de Actividade Económica (CAE) 55306, encontrando-se enquadrada, em sede de IVA, no regime normal de periodicidade mensal (cfr. relatório de inspecção de fls. 30 e 36 dos autos);

B) No âmbito do processo de expropriação desencadeado pela Declaração de Utilidade Pública Urgente referente à ligação subterrânea pedonal entre as estações do Rossio (CP) e dos Restauradores (Metropolitano de Lisboa), tornou -se necessário ocupar a frontaria do estabelecimento comercial da ora Impugnante, sito na Praça………….., n.º 16, em Lisboa, desde 27.11.1995, com o consequente encerramento do mesmo (cfr. documento de fls. 27 a 29 e relatório de inspecção de fls. 30 e 36 dos autos);

C) Por requerimento datado de 27.11.1995, a Impugnante solicitou ao Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa indemnização pela ocupação temporária da frontaria do estabelecimento da Impugnante, com o encerramento do mesmo, conforme mencionado na alínea anterior, pelo valor diário de Esc. 363.512$00 (€ 1.813,19), o qual apurou tendo por base os elemento do seguinte quadro:


«imagem no original»

 (cfr. documento de fls. 25-26 dos autos);

D) O pedido de indemnização solicitado pela Impugnante, nos termos expostos na alínea que antecede, foi deferido pelo Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa, com pagamento de um montante diário de 363.512$00 (€ 1.813,19)

(cfr. documento de fls. 27 a 29 dos autos);

E) A Impugnante recebeu do Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa, a título de indemnização solicitada nos termos referidos em C) supra, o valor de € 63.461,61 (Esc. 12.722.910$00) no ano de 1995, e o valor de € 275.604,91 (Esc. 55.253.824$00) no ano de 1996 (acordo- facto alegado nos artigos 1° e 3º da petição inicial e no artigo 5° da informação adaptada como contestação; cfr. documentos de fls. 19 a 24 dos autos);

F) Os Serviços de lnspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa procederam a uma acção de inspecção à Impugnante, relativa aos anos de 1996 e 1997 (cfr. relatório de inspecção de fls. 30 e 36 dos autos);

G) Da acção de inspecção referida na alínea anterior resultou um relatório de inspecção tributária, no qual, para o que aqui importa, foi efectuada uma correcção técnica, em sede de IVA, relativa ao ano de 1996, no montante de Esc. 7.182.247$00 (€ 35.824,90) (cfr. relatório de inspecção de fls. 30 a 36 dos autos);

H) Do relatório de inspecção referido supra consta, como fundamento da correcção efectuada, o seguinte:

 (...)

Verificou-se ainda que em 1996 o sujeito passivo recebeu do Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa uma indemnização no montante de 55 253 824.00, conforme extracto da conta 7691 Indemnizações de 1996 (anexo 3), paro a qual diz também não possuir controto.

Contactado o Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa foi-nos confirmado não existir nenhum acordo escrito assinado por ambas as partes, tendo-nos sido facultada uma informação interna (anexo 4) onde se encontram referidos os montantes de indemnização propostos e aceites pela gerência da empresa em análise.

De acordo com os recibos emitidos ao Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa esta indemnização deveu-se à ocupação temporária da frontaria do estabelecimento que implicou o encerramento do mesmo entre Janeiro e Abril de 1996 e tendo sido atribuída nos termos do no 3 do artigo 16 do Código das Expropriações. É ainda indicado que "'a ocupação foi efectuada no âmbito dos trabalhos paro as obras a que se referem as declarações de utilidade pública urgente, publicadas nos Diários da República, respectivamente n°s 175/94, 2a Série, de 31 de Julho, (4a Suplemento), e 189/94, 2a Série, de 17 de Agosto (2 a Suplemento;-, anexa-se recibo (anexo 5).

No entanto, no ponto 4 da informação interna acima referida, anexo 4, salienta-se que a indemnização acordada se destina a compensar os danos emergentes e lucros cessantes, bem como os correspondentes à previsível perda de clientela.

Não foram emitidas, pela empresa, facturas referentes aos valores desta indemnização, paga em três parcelas de 21 810 720.00, 11 268 872.00 e 22 174 232.00 em Março, Junho e Julho, respectivamente, tendo apenas sido emitidos os recibos de quitação.

(...)

Quanto à indemnização recebida do Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa o sujeito passivo além de não  emitir facturas,  conforme já  referido  no ponto 3.2.1, não  liquidou  IVA  referente  a  estas operações  pois,  de  acordo  com  a indicação fornecida pela entidade devedora, não se verificava sujeição por considerarem que a indemnização em causa não sancionava a lesão de um interesse com carácter remuneratório .

Tal situação não se verifica, pois, o sujeito passivo ao ter que encerrar o estabelecimento onde prestava serviços, sujeitos a IVA nos termos do artigo 4 do CIVA, recebeu a indemnização a fim de ser ressarcido dos proveitos que deixou de obter por ter deixado de exercer a sua actividade normal que consistia na prestação de serviços de restauração.

Face ao exposto o montante de 55 253 824.00 encontra-se sujeito a IVA, por não se enquadrar na exclusão do valor tributável previsto na alínea a) do nº 6 do artigo 16 do CIVA, deste modo considera -se que o valor tributável é o valor da indemnização, deduzido do imposto calculado à taxa aplicável à prestação de serviços, que neste caso é de 17% até Junho e de 12% a partir de 01/07/96, nos termos do no 2 do artigo 4º do Decreto-Lei 91/96 de 12/07.

Assim temos um valor de imposto em falta de 7182 247.00 (33 079 592.00 X 17/117 + 22 174 232.00 x 12/112), que não foi liquidado nos documentos emitidos ao Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa e consequentemente não foi entregue nos cofres do Estado, nos termos do artigo 26 do CIVA, nem no prazo estabelecido no artigo 40 do mesmo diploma, nem até à presente data."

(cfr. relatório de inspecção de fls. 30 a 36 dos autos);

I) Tendo verificado na referida acção de  inspecção  que  a  ora  Impugnante também recebeu no ano de 1995 valores  relativas  à  indemnização mencionada supram, paga pelo Gabinete do Nó  Ferroviário  de  Lisboa,  os serviços de inspecção procederam  a uma acção de inspecção à Impugnante relativa  ao  ano  de  1995, da qual  resultou  uma  correcção  técnica  ao IVA do referido ano, no montante de Esc. 1.848.628$00 (€ 9.220,92) (cfr. relatório de inspecção de fls. 30 a 36 dos autos);

J) Do relatório de inspecção resultante da acção de inspecção referida na alínea anterior consta, como fundamento da correcção ai efectuada, o seguinte:

"Verificou-se que em 1995 o sujeito passivo recebeu do Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa uma indemnização no montante de 12 722 910.00, conforme extracto da conta 7691 indemnizações de 1995 (anexo 1), para a qual diz não possuir contrato.

Contactado o Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa foi-nos confirmado não existir nenhum acordo escrito assinado por ambas as partes, tendo-nos sido facultada uma informação interna (anexo 2) onde se encontram referidos os montantes de indemnização propostos e aceites pela gerência da empresa em análise.

De acordo com os recibos emitidos ao Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa esta   indemnização deveu-se à ocupação temporária da  frontaria do estabelecimento que implicou o encerramento do mesmo entre Janeiro e Abril de 1996 e tendo sido atribuída nos termos do nº 3 do artigo 16 do Código das Expropriações. É ainda indicado que "a ocupação foi efectuada no âmbito dos trabalhos para as obras a que se referem as declarações de utilidade pública urgente, publicadas nos Diários da República, respectivamente n°s 175/94, 2° Série, de 31 de Julho, (4° Suplemento), e 189/94, 2a Série, de 17 de Agosto (2° Suplemento)", anexa-se recibo (anexo 3).

No entanto, no ponto 4 da informação interna acima referida, anexo 2, salienta-se que a indemnização acordada se destina a compensar os danos emergentes e lucros cessantes, bem como os correspondentes à previsível perda de clientela.

Não foram emitidas, pela empresa, facturas referentes aos valores desta indemnização, paga em três parcelas de 3 816 871.00, 3 816 871.00 e 5 089 168.00  em Dezembro  de  1995  tendo  apenas  sido  emitidos  os  recibos  de quitação.

(...)

Relativamente à indemnização recebida do Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa o sujeito passivo além de não emitir facturas, conforme já referido no ponto 2, não liquidou IVA referente a estas operações pois, de acordo com a indicação fornecida pela entidade devedora, não se verificava sujeição por considerarem que a indemnização em causa não sancionava a lesão de um interesse com carácter remuneratório.

Tal situação não se verifica, pois, o sujeito passivo ao ter que encerrar o estabelecimento onde prestava serviços, sujeitos a IVA nos termos do artigo 4 do CIVA, recebeu a indemnização a fim de ser ressarcido dos proveitos que deixou de obter por ter deixado de exercer a sua actívidade normal que consistia na prestação de serviços de restauração.

Face ao exposto o montante de 12 722 910.00 encontra-se sujeito a IVA, por não se enquadrar na exclusão do valor tributável previsto na alínea a) do nº 6 do artigo 16 do CIVA, deste modo considera-se que o valor tributável é o valor da indemnização, deduzido do imposto calculado à taxa aplicável à prestação de serviços, que neste caso é de 17%.

Assim temos um valor de imposto em falta de 1 848 628.00 (12 722 910.00 x 17/ 117), que não foi liquidado nos documentos emitidos ao Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa e consequentemente não foi entregue nos cofres do Estado, nos termos do artigo 26 do CIVA, nem no prazo estabelecido no artigo 40 do mesmo diploma, nem até à presente data.

Verificou-se falta de liquidação de IVA, no montante de 1 848 628.00, nos documentos emitidos ao Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa pela indemnização recebida pelo encerramento do estabelecimento motivado pela construção do interface entre as estações do Metro e da CP (ponto 3)." (cfr. relatório de inspecção de fls. 50 a 53 da reclamação graciosa apensa);

K) Em consequência d as correcções mencionadas em G ) e I) supra, foram emitidas as liquidações adicionais de IVA dos anos de 1995 e 1996, com os n.ºs ............ e ............, respectivamente, e as liquidações  dos respectivos juros compensatórios, com os n.ºs ............, ............, ............ e ............, no valor total de € 55.045,43 (Esc. 11.035.618$00), com data limite de pagamento voluntário fixada em 30.11.1998 (cfr. documentos de fls. 45-46 dos autos e fls. 85 a 92 da reclamação graciosa apensa);

L) Por requerimento datado de 22.09.1998, dirigido ao Ministério das Obras Públicas - Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa, a Impugnante solicitou a esta entidade que lhe fossem entregues os valores de IVA que lhe foram liquidados pela Administração Tributária, referente às liquidações identificadas na alínea  anterior, tendo em vista o pagamento desse IVA ao Estado (cfr. documento de fls. 43-44 dos autos);

M) A impugnante procedeu ao pagamento  do imposto liquidado identificado  na alínea  K)   supra  em  26.11.1998   (cfr.  documentos   de   fls.  45-46   dos  autos   e documentos e informação oficial de fls. 43-44, 85 a 92 e 93-94 da reclamação graciosa apensa);

N) Em 25.02.1999, a ora Impugnante deduziu reclamação graciosa contra as liquidações ora impugnadas, identificadas em K) supra, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 15 da reclamação graciosa apensa;

O) Não tendo sido proferida decisão na reclamação graciosa mencionada na alínea anterior, em 29.10.1999 deu entrada no Serviço de Finança& de Lisboa 9 a presente impugnação (cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos).

Factos não provados: não existem factos a dar como não provados com interesse para a decisão.

Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e da reclamação graciosa apensa, não impugnados, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

IMPUGNAÇÃO JUDICIAL

A Impugnante foi alvo de fiscalização relativa aos exercícios de 1996 e 1997 de que resultaram correções em sede de IVA por se considerar que a indemnização recebida do “Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa” devido a ocupação temporária da frontaria do estabelecimento que implicou o encerramento do mesmo entre janeiro e abril de 1996, atribuída nos ternos do art. 16º n.º 3 do Código das Expropriações está sujeita a IVA.  Esta indemnização, consta do RIT, destina-se a compensar os danos emergentes e lucros cessantes, bem como os correspondentes à previsível perda de clientela, pelo que não se enquadrando na exclusão do valor tributável previsto na alínea a) do n.º 6 do artigo 16º do CIVA, está sujeita a tributação.

O Impugnante deduziu reclamação graciosa, e após indeferimento tácito presumido apresentou impugnação judicial alegando, em síntese, a falta de fundamentação da liquidação e vício de violação de lei, uma vez que a indemnização recebida não está sujeita a IVA, além de que o imposto liquidado se baseia em presunções.

O MMº juiz "a quo" proferiu douta sentença julgando procedente a impugnação, alinhando, em síntese, a seguinte fundamentação: 

O IVA é um imposto que tributa  as transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional, a titulo oneroso, por um sujeito passivo, e que por força do disposto no artigo 4.º/1, do mesmo diploma são consideradas como prestações de serviços as operações efectuadas a titulo oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens.

Para efeitos do IVA, foi acolhido um conceito residual de prestação de serviços, sendo consideradas como tal as operações efectuadas a título oneroso que não constituam transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens.

Assim, uma atribuição patrimonial, qualquer que seja, terá, em princípio, subjacente uma prestação de serviços, se não for contrapartida da entrega ou importação de bens.

“O conceito de prestação de serviços em sede do IVA é de natureza económica, sendo mais abrangente do que a definição jurídica que é conferida ao contrato de prestação de serviços pelo artigo 1154.º  do Código Civil.

Todavia, o conceito de onerosidade sublinhado naquele artigo 1.0 do CIVA, e presente também nos artigos 2.0 e 4.0 da Directiva do IVA, é fulcral para a definição do âmbito de incidência do imposto, uma vez que, enquanto imposto geral sobre o consumo, o mesmo incide unicamente sobre a actividade econômica, entendida como "qualquer actividade de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas" .

Daqui resulta que a tributação de uma dada operação, em sede de IVA, é feita com base na existência de um contraprestação associada a uma transmissão de bens ou prestação de serviços, enquanto expressão da actividade econômica de cada agente econômico”.

E depois de recolher doutrina e jurisprudência em abono da sua fundamentação, concluiu:

“No caso em apreço, muito embora a Fazenda Pública pareça aceitar que as indemnizações sancionatórias da lesão de interesses, sem carácter remuneratório, não são tributáveis em IVA, é seu entendimento que a indemnização paga à Impugnante tem carácter remuneratório, porquanto visou ressarcir a Impugnante dos proveitos que deixou de obter por ter deixado de exercer a sua actividade normal, pelo que esta situação não pode deixar de ser sujeita a IVA, nos termos do artigo 4º  do CIVA.

Contudo, aplicando ao caso o que ficou dito sobre o critério identificador do conceito de indemnização remuneratória, não pode proceder este entendimento da Fazenda Pública.

Isto porque, como resulta evidenciado nos autos, a indemnização em apreço, paga à Impugnante, tem um carácter meramente ressarcitório, na medida em que  a mesma não tem subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços, ou seja, a indemnização visa sancionar uma lesão a  interesses  materiais  da Impugnante  sem  carácter  remuneratório,   porquanto  não  remuneram   qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano. No caso dos autos, visa ressarcir a Impugnante dos prejuízos derivados do encerramento do seu estabelecimento (cfr. alíneas 8) a E) do probatório).

De facto, não existe, in casu, uma relação sinalagmática subjacente à indemnização em causa. Não existe, assim, "qualquer interdependência entre a prestação indemnizatória e uma outra prestação à qual o lesado se encontre adstrito, uma vez que a obrigação nasce ex novo no momento em que é causado o dano", pelo que o pagamento da indemnização,  não pressupondo qualquer nexo sinalagmático com uma determinada transmissão de bens ou prestação de serviços, não tem caráter oneroso.

Sendo assim, toma-se evidente que os montantes recebidos pela Impugnante a título de indemnização, destinados a reparar o dano derivado do encerramento do seu estabelecimento,  não tendo associado qualquer transmissão de bens ou prestação de serviços, não podem estar sujeitos a IVA.”

A AT discorda. Fundamentalmente por entender que tendo subjacente o conceito de indemnização, serão tributadas as indemnizações que correspondam, directa ou indirectamente, à contrapartida devida pela realização de uma actividade económica, isto é, que visem remunerar a transmissão de bens ou a prestação de serviços.

Só assim não sucede caso tais indemnizações visem sancionar a lesão de qualquer interesse sem carácter remuneratório porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano, caso em não são tributáveis em IVA, porquanto não têm subjacente uma transmissão de bens ou uma prestação de serviços.

Entende que a douta sentença “a quo” não valorou o facto de a referida indemnização ter sido percebida na sequência de um procedimento de expropriação por utilidade pública.

E por isso,  corresponde a uma contrapartida devida por uma transmissão de bens ou prestação de serviços (Conclusões I a VII).

Ou seja, as quantias pagas em virtude de um acto de expropriação pública não deverão ser consideradas ressarcimento de um dano emergente, uma vez que aquele valor mais não é do que a contraprestação efectiva de uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

Mas ainda que assim não se entenda, só a indemnização  por danos emergentes ou prejuízos causados tem carácter indemnizatório, porque se limita a repor a situação existente à data da ocorrência da lesão.

O mesmo não sucede com a indemnização por lucros cessantes. Estes,  por cobrirem prejuízos futuros, geram um enriquecimento na esfera do beneficiário.

A indemnização arbitrada a título de lucros cessantes destina-se a repor o nível de rendimento que, por força do dano, a Impugnante deixou de obter com o objectivo de reparar uma lesão com carácter remuneratório, como tal, esta parte da indemnização tem subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços. E por assim ser, pelo menos esta parte da indemnização sempre estaria sujeita a tributação em IVA, nos termos dos art.ºs 16° e 4 o do CIVA.

A nosso ver a Recorrente não tem razão.

Comecemos por afirmar a competência deste TCA em razão da hierarquia, questionada pelo Recorrido nas doutas alegações, uma vez que resulta das conclusões de recurso a imputação de errónea valoração da prova pelo MMº juiz "a quo", o que em face do disposto no artº 280º/1 CPPT e art. 26º-b) do ETAF (a contrario)  defere competência a este TCA para a sua apreciação.

Prosseguindo, vejamos agora se ao caso “sub judice colhe aplicação” do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4539/91, de 9/11 que a AT entende ser aplicável. Se este Código fosse aplicável, em resultado da sua articulação com a alínea a) do n.º 2 do artigo 14º da Diretiva IVA, entender-se-ia por «entrega de bens» a transferência do poder de dispor de um bem corpóreo como proprietário. Entrega que  o n.º 2 al a) da mesma Diretiva considera extensível   a) A transmissão da propriedade de um bem, mediante pagamento de uma indemnização, em virtude de acto das autoridades públicas ou em seu nome ou por força da lei.

Todavia, as normas referidas pelo Exmo. Representante da Fazenda Pública relativas ao Código das Expropriações são inaplicáveis ao caso dos autos. Não houve qualquer expropriação ao Impugnante e as situações que o ERFP refere são aquelas que decorrem da caducidade do contrato de arrendamento por força da expropriação do prédio (art.º 29º) ou interrupção da actividade por força da expropriação (art. 30º).

Além disso, a fundamentação do acto constante do RIT não integrou a correção impugnada no contexto legal que o Exmo. Representante da Fazenda Pública agora lhe empresta, o que sempre redundaria na invocação de norma que a AT não convocou para tributação e que neste momento também não pode aplicar, sob cominação de fundamentação “a posteriori”, que é ilegal, como se sabe.

Porém, a referência ao quadro legal do Código das Expropriações releva na medida em que é o próprio n.º 4 do art. 16º a determinar que  a aplicação aos proprietários e demais interessados prejudicados pelas ocupações são devidas indemnizações nos termos gerais de direito[1].

Adiante.
O IVA é um imposto geral sobre o consumo que incide sobre uma atividade económica, ou seja, sobre operações que tendo enquadramento nos critérios de incidência objetiva do imposto previstos no art. 1.º do CIVA, preenchem os pressupostos do n.º 1 do art. 2.º do CIVA, nomeadamente atividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as atividades extrativas, agrícolas e as profissões liberais.
De acordo com o n.º 1 do art. 4.º do CIVA, são consideradas prestações de serviços, as operações efetuadas a título oneroso que não constituam transmissões, importações ou aquisições intracomunitárias de bens.
A qualificação de prestação de serviços ultrapassa a definição jurídica dada pelo art. 1154º do Código Civil e assume aqui natureza económica na medida em que abrange a transmissão de direitos, obrigações de conteúdo negativo e, ainda, a prestação de serviços coativa.
A tributação em sede de IVA de uma determinada operação é, deste modo, feita com base na existência de uma contraprestação associada a uma transmissão de bens ou uma prestação de serviços, enquanto expressão da atividade económica de cada agente.
Tendo presente as características do IVA, importa precisar o conceito de indemnização e as realidades que a mesma abrange, associado como está à responsabilidade civil, uma das fontes de obrigações presentes no Código Civil, que pode revestir natureza contratual ou extracontratual.
A primeira pressupõe a violação de obrigações que tenham a sua origem em contratos, negócios jurídicos unilaterais ou que resultam da própria lei; a segunda resulta da violação, ainda que lícita, de deveres de caráter genérico ou condutas que causam determinados danos a outrem.
O princípio geral da obrigação de indemnização enunciado no art. 562.º do CC determina que "(q)uem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não tivesse verificado o evento que obriga à reparação".
Por sua vez o n.º 1 do artigo 564º daquele diploma estabelece que o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência de lesão (lucros cessantes).
Assim,  a lei distingue entre (i) danos emergentes, ou seja prejuízos causados nos bens ou direitos existentes na data da lesão, e (ii) os lucros cessantes que abrangem os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito.
Como regra, a indemnização tem por objetivo reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (art. 562º do Código Civil). Ou seja, como princípio geral, a indemnização cumpre  o dever de reconstituir  a situação anterior à lesão, isto é, o dever de  reposição das coisas no estado em que estariam se não se tivesse produzido o dano (princípio da reposição natural)[2] o que se alcança não só por indemnizar o prejuízo causado, como também os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (art. 564º/ 1 do Código Civil).
Assim, o dever de indemnizar pelos benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão, vulgarmente designada por lucros cessantes, é uma forma de reparação do dano, assim repondo as coisas no estado em que estariam se não se tivesse produzido o dano.
Na verdade, a indemnização pelo lucro cessante corresponde ao período que medeia entre a prática do facto e a liquidação do dano.
Poderá haver dificuldades no cálculo dos lucros cessantes, mas essa dificuldade, a existir, não invalida o princípio subjacente de que a indemnização pelos lucros cessantes é uma atuação do dever de  reposição das coisas no estado em que estariam se não se tivesse produzido o dano.
Para efeitos do IVA, a tributação de uma determinada operação pressupõe a existência de uma contraprestação, associado a uma transmissão de bens ou a uma prestação de serviços, enquanto expressão da atividade económica de cada agente[3].
Para enquadramento da questão da sujeição ou não das quantias pagas a título de indemnização, há que ter em conta o principio subjacente do IVA, como imposto sobre o consumo, e que corresponde ao disposto na Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de novembro de 2006 (Diretiva IVA) no sentido de que o que o IVA pretende tributar é a contraprestação de operações tributáveis e não a indemnização de prejuízos, quando estes não tenham caráter remuneratório.
Assim, se as indemnizações apenas reparam a lesão de um interesse, sem caráter remuneratório, porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a ressarcir um dano, não são tributáveis em IVA, na medida em que não têm subjacente uma operação tributável. Isto quer a indemnização seja prestada para ressarcir danos emergentes quer lucros cessantes, porque, nos casos em que se justifica, é o resultado das duas que repõe as coisas no estado em que estariam se não se tivesse produzido o dano[4].
Pelo contrário, se a indemnização (com ou sem pagamento de lucros cessantes) tiver caráter remuneratório há uma operação económica subjacente que a torna sujeita a tributação, como regra geral.  
Ora, por força do disposto na alínea a) do n.º 6 do art. 16.º do CIVA, as quantias recebidas a título de indemnização declarada judicialmente, por incumprimento total ou parcial das obrigações são excluídas de tributação em IVA, no pressuposto legal de que a intervenção do Tribunal garante que os sujeitos passivos não configuraram uma retribuição sob a capa de uma indemnização.
Todavia, tem sido entendido que a referência à indemnização declarada judicialmente não deverá constituir um qualquer sinal de exclusividade, o que teria por consequência a sujeição a IVA das restantes indemnizações. Tal constituiria uma interpretação incorrecta, de um ponto de vista sistemático (atenta a contrariedade aos preceitos iniciais do Código), e frontalmente ofensiva das regras e princípios consagrados na Sexta Directiva, como é referido no Ac. do STA 0331/14 de 27-01-2016, infra mencionado.
Mas quando não são declaradas judicialmente, há que indagar quais as situações que em que a indemnização tem natureza e contornos ressarcitórios daquelas em que assume natureza retributiva.
O critério definido pela AT, neste contexto, é o de que a indemnização por lucros cessantes não tem caráter indemnizatório na medida em que estes, por cobrirem prejuízos futuros geram um enriquecimento na esfera do beneficiário. E por isso, “...estamos neste caso perante o ressarcimento de lucros cessantes, com o objetivo de reparar uma lesão com caráter remuneratório, motivo pelo qual, esta parte da indemnização tem subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços”, razão por que, pelo menos nesta parte, a indemnização sempre estaria sujeita a tributação em IVA, nos termos do art. 16º e 4º do CIVA (Conclusões XVII a XXI).
A nosso ver esta distinção não tem qualquer apoio legal, nem no âmbito do CIVA, nem de outro diploma legal que conheçamos. É certo que a indemnização poderá ter caráter remuneratório, e por isso está sujeita a tributação. Mas a tributação que houver resultará do seu caráter remuneratório  e não por decorrer de indemnização por lucros cessantes[5].
Dito de outra maneira, a indemnização por lucros cessantes poderá ter caráter remuneratório ou ressarcitório. Está sujeita a IVA se lhe for reconhecido caráter remuneratório, já assim não será quando tiver apenas função ressarcitória[6]
Com efeito, tem, o STA decidido serem tributadas as indemnizações que correspondam, directa ou indirectamente, à contrapartida devida pela realização de uma actividade económica, isto é, que visem remunerar a transmissão de bens ou a prestação de serviços.
Se as indemnizações sancionarem a lesão de qualquer interesse sem carácter remuneratório porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano, não são tributáveis em IVA, na medida em que não têm subjacente uma transmissão de bens ou uma prestação de serviços.[7]

Também o ac. do STA n.º 0331/14 de 27-01-2016, debruçando-se a questão da incidência do IVA sobre a indemnização paga pela seguradora à locadora e destinada à compensação do dano causado pela perda do bem fundamentou o seguinte[8]:  
 “Para uma correcta abordagem da questão decidenda importa apurar a natureza de tal indemnização: ou seja saber se é ressarcitória ou se é se remuneratória de transmissão de bens ou de prestação de serviços.
No que concerne à incidência do IVA sobre indemnizações a regra geral, nos termos do artº 16º, nº 6 do CIVA, é a de que são excluídas do valor tributável das operações aquelas que forem declaradas judicialmente por incumprimento total ou parcial de obrigações, dado não terem uma relação directa com a prestação.
A doutrina vem, contudo, afirmando que esta norma deverá ser interpretada de forma cautelosa, especialmente no domínio da responsabilidade contratual, na medida em que não se pode considerar que apenas as indemnizações em que houve um reconhecimento judicial expresso não são sujeitas a IVA.
Como referem Afonso Arnaldo e Pedro Vasconcellos Silva (“O IVA e as indemnizações”, Fisco, nº 107/108, p. 88.).), o conceito de indemnização encontra aí uma referência expressa, mas tal indicação não deverá constituir um qualquer sinal de exclusividade, o que teria por consequência a sujeição a IVA das restantes indemnizações. Tal constituiria uma interpretação incorrecta, de um ponto de vista sistemático (atenta a contrariedade aos preceitos iniciais do Código), e frontalmente ofensiva das regras e princípios consagrados na Sexta Directiva (Neste sentido também Clotilde Celorico Palma, Introdução ao IVA, Cadernos IDEFF, nº 1, 5ª edição, Almedina, pag. 196 e Ana Rita Costa Machado, IVA nas Indemnizações, edição da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Publicações on line, 2011, p. XV.).
Assim é também pacífico o entendimento de que, atentas as especificidades do sistema de IVA vigente na União Europeia, o desiderato tributário reside apenas em abranger as operações que são remuneradas através de uma contrapartida e não as meras compensações ressarcitórias. (A. Arnaldo e Pedro Vasconcellos Silva, ob. citada, pág. 88.).
Podendo considerar-se consolidado o entendimento de que as indemnizações, no caso de sancionarem a lesão de qualquer interesse sem carácter remuneratório, porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano, não são tributáveis em IVA, na medida em que não têm subjacente uma transmissão de bens ou uma prestação de serviços (Clotilde Celorico Palma, ob. citada, pag. 197, Patrícia Noiret da Cunha, CIVA, anotado, ISG, pag. 269).
Sendo este o entendimento da doutrina, que subscrevemos, no mesmo sentido se tem pronunciado a jurisprudência desta Secção de Contencioso Tributário, nomeadamente nos Acórdãos de 18.06.2008, recurso 1144/06, e de 31.10.2012, recurso 1158/11, em que igualmente se sumariou que, se as indemnizações sancionarem a lesão de qualquer interesse sem carácter remuneratório, não são tributáveis em IVA, na medida em que não têm subjacente uma transmissão de bens ou uma prestação de serviços”.
A jurisprudência do TJUE sem abordar, ou autonomizar, directamente a questão da tributação ou não da indemnização pelos lucros cessantes, pelo menos em dois acórdãos afirmou claramente o princípio de que a indemnização pelos benefícios que os sujeitos passivos deixaram de auferir não é alvo de tributação em sede de IVA”.
No processo C-215/94, 29 de Fevereiro de 1996 Jurgen Mohr  TJUE o seguinte:

Os artigos 6. , n. 1, e 11. , parte A, n. 1, alínea a), da Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, relativos, por um lado, à definição das prestações de serviços e, por outro, à constituição da base de tributação, devem ser interpretados no sentido de que o compromisso de abandonar a produção de leite, tomado por um produtor agrícola no âmbito do Regulamento n. 1336/86, não constitui uma prestação de serviços. Por conseguinte, a indemnização recebida para esse efeito não está sujeita ao imposto sobre o volume de negócios.

Com efeito, quando concede essa indemnização, a Comunidade não está na situação de um consumidor que remunera um serviço que lhe seria prestado por um produtor ao assumir esse compromisso, mas actua no interesse comum, que é o de promover o funcionamento correcto do mercado comunitário do leite.

E no acórdão de 18 de Dezembro de 1997- Landboden-Agrardienste GmbH & Co. KG contra Finanzamt Calau- Processo C-384/95- decidiu o seguinte (sumário):
Os artigos 6. n. 1, e 11. parte A, n. 1, alínea a), da Sexta Directiva 77/388 em matéria de harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, relativos, respectivamente, à definição das prestações de serviços e à constituição da matéria colectável, devem ser interpretados no sentido de que o compromisso assumido, por um produtor agrícola no quadro de um regime de subsídios nacional, de se abster de recolher, pelo menos, 20% das batatas cultivadas não constitui uma prestação de serviços na acepção da directiva. Por conseguinte, a indemnização recebida para esse efeito não está sujeita ao imposto sobre o volume de negócios.
Com efeito, para se inserir no sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, esse compromisso deve acarretar um consumo, ao passo que o produtor agrícola, ao assumir o referido compromisso, não fornece serviços a um consumidor identificável nem uma vantagem susceptível de ser considerada como um elemento constitutivo do custo da actividade de outra pessoa na cadeia comercial.

Neste contexto, e para concluir, da interpretação que  a jurisprudência e a  doutrina fazem da  alínea a) do n.º 6 do art. 16.º do CIVA, decorre que os montantes recebidos pela Impugnante a título de indemnização por danos emergentes e lucros cessantes quando visam reparar o dano resultante do encerramento do seu estabelecimento, não tendo associado direta, ou indiretamente, qualquer transmissão de bens ou prestação de serviços, não estão sujeitos a tributação em sede de IVA.

Portanto, a sentença decidiu bem; a Recorrente não tem razão.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAS em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente

Lisboa, 3 de dezembro de 2020.

(Mário Rebelo)

[Nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, o relator consigna e atesta que têm voto de conformidade as Exmas. Senhoras Desembargadoras Patrícia Manuel Pires e Susana Barreto que integram a presente formação de julgamento.]

 ___________

[1] Este Artigo 16.º dizia o seguinte:

Ocupação de prédios vizinhos

1 - A declaração de utilidade pública da expropriação confere à entidade expropriante o direito de ocupar prédios vizinhos nos termos previstos nos estudos ou projectos aprovados que servem de base à expropriação, bem como efectuar os trabalhos necessários ou impostos pela execução destes.

2 - Se o proprietário ou outros interessados forem conhecidos, serão previamente notificados da ocupação por ofício sob registo com a antecedência mínima de 15 dias, podendo qualquer deles exigir a realização de vistoria ad perpetuem rei memoriam, a qual terá lugar nos termos previstos no artigo 19.º e precederá sempre a ocupação.

3 - Aos proprietários e demais interessados prejudicados pelas ocupações são devidas indemnizações nos termos gerais de direito.

[2] Pires de Lima e A. Varela in Código Civil anotado, vol. I, anot ao art. 562º.
[3] Daí alguns autores defenderem que As indemnizações decorrentes da responsabilidade extracontratual, estarão, à partida, excluídas do âmbito do IVA, por não remunerarem qualquer operação tributável (assim, Filipe Duarte Neves, in Código do IVA Comentado e Anotado, 2012, pp. 311)
[4] Cfr. ac. do TCAS n.º 05144/11 de 31-01-2012 Relator:       PEDRO VERGUEIRO
Sumário:              II) As indemnizações estão fora do campo da abrangência do IVA e o devedor da indemnização não pode repercutir sobre o indemnizado o valor suportado, a qualquer título, em sede de IVA.
[5] Cfr. Mariana Gouveia de Oliveira e João Ascenso in “O IVA nas indemnizações: A Resolução de Contratos de Concessão”, Cadernos IVA 2017, pp.339 e segs.
[6] Cfr. Ac. do STA n.º  01729/10.0BELRS de 28-10-2020 Relator:      PEDRO VERGUEIRO
Sumário:              II - Com respaldo numa interpretação teleológica e sistemática do artigo 16.º n.º 6 alínea a) do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), conjugada com o disposto nos arts. 1.º n.º 1 al. a) e 4.º n.º 1 da mesma compilação, bem como, a configuração, mais difundida, do conceito de indemnização, estão excluídas do âmbito de incidência do IVA, para além das indemnizações que tenham sido declaradas judicialmente, as que tenham carácter meramente ressarcitório.
[7] Cfr. Ac. n.º 01158/11 de              31-10-2012 - Relator:      FERNANDA MAÇÃS      
Sumário:              I - Com base numa interpretação teleológica e sistemática do artº 16º, nº 6, alínea a), do CIVA, em conjugação com o disposto nos arts. 1º, nº 1, e 4º, nº 1, do mesmo normativo, e tendo presente o conceito de indemnização, serão tributadas as indemnizações que correspondam, directa ou indirectamente, à contrapartida devida pela realização de uma actividade económica, isto é, que visem remunerar a transmissão de bens ou a prestação de serviços.
II - Se as indemnizações sancionarem a lesão de qualquer interesse sem carácter remuneratório porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano, não são tributáveis em IVA, na medida em que não têm subjacente uma transmissão de bens ou uma prestação de serviços
III - No âmbito de um contrato de locação financeira, as indemnizações pagas pelas seguradoras e destinadas a compensar os danos causados pela perda dos veículos automóveis, em caso de acidente, porque não assumem a natureza de contraprestação pela transmissão de um bem ou prestação de um serviço (arts. 1º, n.º 1, 4º, n.º 1 e 16º, n.º 6, alínea a), do CIVA), nem visam suportar lucros cessantes das recorridas, devem considerar-se excluídas da incidência de IVA.
[8] Doutrina reiterada, entre outros, no ac. do STA n.º 0401/14.7BEPRT de 09-10-2019 Relator: NEVES LEITÃO