Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04994/11
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:09/27/2011
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ACTO PROFERIDO PELO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL. DISPENSA/ISENÇÃO DA PRESTAÇÃO DE GARANTIA.
PRAZO.
PRESSUPOSTOS.
PROVA.
Sumário:1.O pedido de dispensa/isenção de prestação de garantia pelo executado deve ser formulado em requerimento próprio, dirigido ao órgão da execução fiscal e apresentado no mesmo prazo que o previsto para a prestação da garantia – 15 dias;

2. A prorrogação do prazo peticionada e deferida ao executado para a prestação de garantia não se comunica ao prazo para a formulação do pedido da sua dispensa/isenção, podendo esta contudo ser peticionada independentemente daquela prorrogação, no prazo de 30 dias a contar da ocorrência de facto superveniente e que constitua o fundamento desse pedido;

3. No pedido de dispensa/isenção de prestação de garantia, cabe ao executado a alegação e a prova do preenchimento dos pressupostos legais de que depende a sua concessão, sendo o mesmo de indeferir quando o executado, no seu pedido, não diz um palavra sobre a insuficiência ou inexistência de bens não ser da sua responsabilidade.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. A Exma Representante da Fazenda Pública (RFP), dizendo-se inconformada com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa - 4.ª Unidade Orgânica - que julgou procedente a reclamação deduzida por João ………………….., contra o despacho proferido em 1-3-2011 pelo Sr. Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças de …………, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


I. O presente recurso visa a decisão proferida no processo em referência, que julgou procedente a reclamação interposta por João ………………., e anulou o despacho de 2011/03/01, proferido pelo Sr. Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças de Lisboa.
II. De facto, os requisitos descritos no nº.4 do art. 52° da LGT são alternativos, no entanto, contrariamente ao que é referido na sentença ora recorrida, a informação referida em 'G'(factos provados), nunca considerou que a prestação de garantia causaria prejuízo irreparável para o requerente e reclamante nestes autos;
III. Salvo melhor opinião, na supra citada informação apenas se descreve doutrina e a argumentação do executado!
Jamais se disse ou se concluiu que efectivamente tal prejuízo se verificava;
IV. Na informação nº. 238/2011, a fls. 5 a 11 dos presentes autos, o órgão periférico regional refere expressamente que "a factualidade invocada pelo reclamante afigura-se muito parcimoniosa, tendo-se limitado a produzir considerações vagas e não concretizadas, como seja a de que a constituição de algumas garantias têm impacto directo na redução da sua liquidez financeira e, por consequência, na sua capacidade de assumir os seus compromissos, sem, contudo, demonstrar a irreparabilidade deste prejuízo." (negrito nosso)
V. Encontra-se provado nos autos que o reclamante possui bens susceptíveis de penhora: para além do vencimento mensal no montante (ilíquido) de € 2.552,52, é proprietário da fracção autónoma, designada pela letra 'R', inscrita na matriz predial da freguesia de Vila ……………… sob o art. ………, que não se encontra avaliada para efeitos de IMI;
VI. Embora os dois primeiros requisitos referidos no nº.4 do art. 52° da LGT sejam alternativos, a verdade é que estão ambos dependentes da verificação de uma condição de verificação obrigatória: "( . . . ) desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado." (negrito e sublinhado nossos)
VII. E O reclamante não logrou provar que a alegada insuficiência ou inexistência de bens não fosse da sua responsabilidade, ónus que sobre si recaía, nos termos do disposto no nº.1 do art. 74° da LGT;
VIII. Pelo que, não se encontram reunidos os pressupostos de que a lei faz depender a isenção de prestação de garantia, nos termos previstos no n°. 4 do art. 52° da LGT;
IX. A decisão recorrida olvidou completamente uma questão que é prévia à verificação dos requisitos elencados na referida disposição legal: a da intempestividade do pedido de dispensa de garantia, questão que foi devidamente suscitada quer na informação da qual faz parte o despacho reclamado, quer na Resposta da F.P.
X. O executado e ora reclamante foi notificado em 2010/11/22 para prestar garantia no valor de € 332.790,40, tendo solicitado em 2010/12/07, uma prorrogação de 30 dias do respectivo prazo, que lhe foi concedida (despacho de 2010/l2/13, notificado em 2010/l2/16) e requerido a respectiva dispensa em 2010/12/22, alegando para o efeito a insuficiência do seu património para assegurar a dívida exequenda e acrescido;
XI. Nos termos do disposto no nº.6 do art. 169° do CPPT, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº. 3-B/2010, de 28/04, não havendo garantia constituída ou prestada, nem penhora, é ordenada a notificação do executado para prestar a garantia referida no n.º 1 dentro do prazo de 15 dias;
XII. Prevendo o nº.6 do art. 199º do referido diploma, a ampliação daquele prazo até 30 dias, prorrogáveis por mais 30, em casos de circunstâncias excepcionais;
XIII. Por sua vez, o n°. 1 do art. 170° do CPPT estabelece um prazo de 15 dias para requerer a dispensa de garantia, contados a partir da notificação para a sua prestação, que não se suspende pelo facto de ter sido solicitada e deferida a prorrogação deste prazo.
XIV. Assim, carece o reclamante de razão já que foi notificado para prestar garantia em 2010/11/22 e veio requerer a respectiva dispensa em 2010/12/22, após o decurso do prazo legal previsto no nº.1 do art. 170°, que remete para o n°. 2 do art. 169°, ambos do CPPT;
XV. A ampliação do prazo para apresentar garantia não envolveu o alargamento do prazo para requerer a dispensa de prestação de garantia;
Com efeito, o reclamante não veio alegar qualquer facto superveniente que justificasse um prazo mais longo, de 30 dias após a sua ocorrência, nos termos do nº.2 do art. 170° do CPPT;
XVI. Os pressupostos em que assenta o pedido de dispensa - que o reclamante não possui património suficiente para solver a dívida e o acrescido e que não dissipou o seu património - não são de verificação superveniente, antes pelo contrário, o reclamante já os podia ter invocado quando foi notificado para prestar garantia, nos termos do nº.2 do art. 169° do CPPT;
XVII. A recusa da CGD em emitir a pretendida garantia, nunca poderia constituir de per si facto superveniente relevante para a apresentação do pedido de dispensa fora do prazo previsto no nº.1 do art. 170° do CPPT; para isso seria necessário que o reclamante tivesse demonstrado, no mínimo, a impossibilidade de prestação por qualquer meio das garantias para que fora notificado pela administração fiscal, ou que tal lhe causava prejuízo irreparável;
O que não aconteceu.
XVIII. É assim manifesto que aquele pedido é extemporâneo;
XIX. E o órgão periférico regional indeferiu o referido pedido com fundamento na intempestividade do mesmo (contrariamente ao que o reclamante sustenta nos arts. 57º e 70º da p.i. e que a FP rebateu nos arts. 10º e ss. da sua resposta), decisão que, no nosso entender, não merece qualquer censura, todavia, não obstante a extemporaneidade daquele pedido, por uma questão de cuidado e de dever de fundamentação, apreciou a sua viabilidade;
XX. A Mmª. Juiz do Tribunal a quo, não se pronunciou acerca desta guestão, que, no fundo, constituiu a principal razão para o indeferimento do pedido de dispensa de garantia;
XXI. Em nosso entender, esta omissão de pronúncia configura vício de violação de lei, gue pode consubstanciar nulidade, nos termos previstos a alínea d) do n°. 1 do art. 668° do CPC, aplicável aos autos ex vi alínea e) do art. 2° do CPPT;
XXII. A Mmª. Juiz a quo fez uma incorrecta interpretação da lei e a douta sentença recorrida violou o disposto nos arts. 668º, nº. 1, al. d), do CPC, ex vi alínea e) do art. 2° do CPPT, 52°, nº. 4 da LGT, 169°, nºs. 2 e 6 e 170°, nºs. 1, 2 e 3, ambos do CPPT.

Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de V. Exªs., deverá o presente recurso ser julgado procedente anulando-se a douta decisão em apreço, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


Também o recorrido veio a apresentar as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem:


a) No Recurso em apreço, a Fazenda Pública impugna a matéria de facto dada como provada, e erro de julgamento invocando que “contrariamente ao que é referido na sentença (...), a informação referida em «G» (factos provados), nunca considerou que a prestação de garantia causaria prejuízo irreparável para o requerente e reclamante”.
b) Embora ponha em causa a prova de um dos factos vertidos na matéria assente, a Fazenda Pública não impugna expressamente o seu teor, nos termos do disposto no artigo 685.º-B do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
c) De qualquer forma, não existe nenhum erro na apreciação da matéria de facto por parte do Tribunal a quo, designadamente na alínea H. dos factos provados, onde se refere a posição da Administração Tributária vertida na Informação n.º 138/2001 (alínea G dos factos provados) acerca da existência de prejuízo irreparável para o RECORRIDO caso não fosse dispensado da prestação de garantia.
d) Com efeito, na informação em causa, a Administração Fiscal invoca o modo como a doutrina considera que o interessado deve justificar a existência de prejuízo irreparável e conclui que "o executado alega o prejuízo irreparável uma vez que, face à prestação de um a garantia de carácter financeiro, que identifica como sendo penhora de vencimento e de saldos bancários, deixaria de poder fazer face aos seus compromissos imediatos, pondo em causa a subsistência do agregado familiar na medida das despesas fixas que descrimina".
e) Neste contexto, bem andou o Tribunal a quo ao considerar como assente que o órgão de Execução Fiscal entendeu "verificado que a prestação de garantia causaria prejuízo irreparável para o requerente".
f) E nem se diga - como faz a RECORRENTE -que o entendimento segundo o qual a Administração Fiscal não reconheceu a ocorrência de prejuízo irreparável sempre decorreria da informação n.º [283]/2011, a fls, 5 a 11.
g) É que essa informação, datada de 3 de Maio de 2011, e citada nas alegações da RECORRENTE não foi notificada ao RECORRIDO e é posterior ao acto objecto de reclamação judicial, não podendo, por razões evidentes, justificar o sentido da decisão que foi objecto da reclamação judicial apresentada pelo RECORRIDO.
h) E ainda que fosse esse o entendimento do órgão de execução, o mesmo não consta da informação subjacente ao despacho reclamado, pelo que, qualquer outra consideração ou fundamentação posterior, além de inválida, não podia - como não foi - ser considerada na sentença, sob pena de erro de julgamento.
i) Bem andou, portanto, o Tribunal ao quo ao formar a sua convicção nos factos dados como provados e, concretamente, na interpretação que fez do constante da Informação subjacente e contemporânea da decisão objecto de reclamação judicial.
j) A Fazenda Pública invoca, ainda, que a sentença padece do vício de omissão de pronúncia, quer porque não se pronunciou sobre a extemporaneidade do pedido que foi apresentado pelo reclamante, quer porque não se pronunciou sobre o argumento principal que foi utilizado pelo órgão de Execução para indeferir o pedido.
k) Porém, ao contrário do alegado pela RECORRENTE a extemporaneidade não foi causa de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, pelo que nunca constituiu questão decidenda.
I) Foi a própria Administração Fiscal que relevou a circunstância de o pedido de dispensa de prestação de garantia ser extemporâneo o que, destaque-se, o RECORRIDO contestou.
m) Aliás, nas conclusões da informação n.º 138/2011 (referida em G dos factos assentes), subjacente ao despacho reclamado, a Administração Fiscal indica que “não obstante a intempestividade do pedido, concede-se a apreciação em face do curto lapso temporal volvido propondo-se ( . . . ) o indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia por não se encontrarem verificados os pressupostos constantes do n.º 4 do art.º 52° da LGT, designadamente no que respeita aos requisitos da inexistência de bens susceptíveis de penhora e da irresponsabilidade do revertido pela insuficiência ou inexistência de bens que originou a diminuição ou o desaparecimento da garantia patrimonial da dívida executiva" (sublinhado nosso).
n) De onde resulta claro que o fundamento do indeferimento do pedido consistiu no alegado não preenchimento de alguns dos pressupostos (materiais) constantes do n.º 4 do art.º 52° da LGT, e não na apresentação intempestiva do pedido de dispensa de prestação de garantia, não havendo, por esse motivo, nada a julgar, a este respeito, pelo Tribunal a quo.
o) E o mesmo sucede quanto à alegada omissão de pronuncia por alegada não apreciação dos fundamentos invocados pela Administração tributária no sentido da inviabilidade do pedido.
p) A Administração tributária indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia com fundamento no facto de, alegadamente, "não se encontrarem verificados os pressupostos constantes do n.º 4 do artº 52º da LGT , designadamente no que respeita aos requisitos da inexistência de bens susceptíveis de penhora e da irresponsabilidade do revertido pela insuficiência ou inexistência de bens que originou a diminuição ou o desaparecimento da garantia patrimonial da dívida executiva".
q) Constata-se que, na sentença recorrida o Tribunal a quo não seleccionou os factos invocados a este respeito pelo ora RECORRIDO nem, tão-pouco, deu como provado se este demonstrou, ou não, a verificação desses pressupostos, tendo-se limitado a dar como provado que na decisão reclamada a Administração tributária não considerou que esses pressupostos se tivessem verificado.
r) Todavia, tal não implica qualquer omissão de pronúncia por parte do Tribunal a quo, já que como aquele Tribunal indicou, e foi expressamente reconhecido pela Fazenda Pública, "Resulta do transcrito no art. 52°, n° 4, da LGT que os requisitos nele previstos são alternativos. Para que possa ser dispensada a prestação de garantia basta que um deles se verifique, isto é, basta que seja demonstrada ou a existência de prejuízo irreparável ou a insuficiência de bens penhoráveis que não seja resultado de dissipação por parte do executado".
s) Assim, tendo o Tribunal a quo considerado que "a decisão reclamada, ao fundamentar-se na Informação referida em G dos factos provados, não considerou verificado o requisito de insuficiência de bens penhoráveis por não se demonstrar que tal situação não ficou a dever-se a dissipação por parte do Reclamante, mas considerou que a prestação de garantia lhe causaria prejuízos irreparáveis" ,a verdade é que só poderia ter decido, como decidiu, ou seja, que "(...) tratando-se de pedidos alternativos e reconhecendo-se que um deles se verifica, deveria o órgão de Execução Fiscal ter decidido dispensar o Reclamante da prestação de garantia".
t) A questão da verificação, ou não, da insuficiência de bens só seria de apreciar se o Tribunal a quo não tivesse, desde logo, considerado que o próprio órgão de execução fiscal reconheceu que se verificava o outro pressuposto- o que, como trás se indicou, não sucedeu.
u) Bem andou, portanto, uma vez mais o Tribunal a quo ao não apreciar os motivos invocados pelo órgão de execução para justificar o indeferimento e os factos invocados pela reclamante para contestar tal decisão em sede de reclamação judicial.
v) Em face do que acima se indicou, deverá ser negado provimento ao Recurso interposto pela Fazenda Pública, mantendo-se a sentença proferida pelo Tribunal a quo.

TERMOS EM QUE DEVE SER NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELA FAZENDA PÚBLICA, MANTENDO-SE A SENTENÇA PROFERIDA PELO TRIBUNAL A QUO.


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser concedido provimento ao recurso, por não se encontrar preenchido o estalão legal previsto no art.º 52.º da LGT, de que a falta de bens não seja da responsabilidade do executado, ainda que não tenha ocorrido a invocada omissão de pronúncia na sentença recorrida.


Por se tratarem de autos classificados de urgentes vêm os mesmos à Conferência sem a prévia recolha dos vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a conhecer: Se a sentença recorrida padece do vício formal de omissão de pronúncia conducente à declaração da sua nulidade; E padecendo, e declarando-se nula a sentença recorrida e conhecendo este Tribunal em substituição, se o reclamante alegou e provou a factualidade relativa a todos os pressupostos de que depende a concessão da dispensa/isenção de garantia.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A. Por ofício datado de 16-11-2010, o Reclamante foi notificado pelo Serviço de Finanças de …………. 2 para prestar garantia bancária no montante de €332 790,40, no âmbito da execução fiscal instaurada contra A… - Associação para o Desenvolvimento ………………., com o n° 3573200501074636 e contra si revertida - fls. 78;
B. Por ofício datado de 16-11-2010, o Reclamante foi notificado pelo Serviço de Finanças de ………………. 2 para prestar garantia bancária no montante de €60 052,95, no âmbito da execução fiscal instaurada contra ADE, - Associação para o Desenvolvimento ………………., com o n° ……………… e contra si revertida - fls. 80;
C. Com ofício datado de 7 de Dezembro de 2010, o Reclamante dirigiu ao Chefe do Serviço de ……………. 2, um requerimento em que solicitou a prorrogação do prazo para prestação das garantias com fundamento em aguardar que a Caixa Geral de Depósitos as emitisse - fls.84 e ss;
D. Por despacho de 13-12-2010, foi deferido o requerimento de prorrogação do prazo para prestação de garantia no processo de execução fiscal n°……….., no montante de €332790,40 - fls. 88;
E. Por ofício datado de 10 de Dezembro de 2010, o Gerente da Agência de …………. da Caixa …………………, informou o ora Reclamante de que a Caixa …………….. não iria emitir as garantias bancárias referidas em B e em C -fls. 90;
F. Na sequência da informação referida em E, Requereu o ora Reclamante, no processo de execução fiscal n° ……………….., a dispensa de prestação de garantia com fundamento na sua incapacidade patrimonial para a prestar e na verificação de um prejuízo irreparável, para si, em consequência da prestação da garantia - fls. 93 e ss;
G. Na sequência de tal requerimento foi elaborada a Informação de fls. 57 sobre a qual recaiu o despacho reclamado que indeferiu o pedido de dispensa de garantia "nos termos propostos” - fls. 56 e ss:
H. Na informação referida em G, considerou-se verificado que a prestação da garantia causaria prejuízo irreparável para o requerente.
Na mesma Informação conclui-se pela não verificação do requisito de manifesta falta de meios económicos por o Reclamante não ter demonstrado a inexistência de responsabilidade sua na insuficiência de bens penhoráveis - fls. 56 e ss.

A convicção do Tribunal quanto aos factos julgados provados resultou do exame dos documentos, não impugnados, e das informações oficiais constantes dos autos, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas supra.


4. Na matéria das suas conclusões IX a XXI das alegações do recurso, vem a ora recorrente assacar à sentença recorrida o vício formal de omissão de pronúncia, a existir, conducente à declaração da sua nulidade – bem como o respectivo e consequente pedido formulado a final, ainda que o apelide da sua anulação que não da sua nulidade, ...julgado procedente anulando-se a douta decisão em apreço...- porque o mesmo a ocorrer gerar, na realidade, a nulidade desta, nos termos do disposto nos art.ºs 668.º n.º1 alínea d), 660.º n.º2 e 713.º n.º2 do Código de Processo Civil (CPC), 143.º e 144.º do Código de Processo Tributário (CPT), e hoje dos art.ºs 124.º e 125.º do CPT, importa por isso conhecer, em primeiro lugar, desta invocada nulidade.

Aquela invocada nulidade só pode ocorrer, nos termos daquelas normas citadas em primeiro lugar, quando o Juiz deixe de pronunciar-se em absoluto de questão que deva conhecer, que por isso tenha sido submetida à sua apreciação e da qual não conheça, nem o seu conhecimento tenha sido considerado prejudicado pela solução dada a outra(s), como constitui jurisprudência abundante (1).

Como sabiamente invocava o Professor Alberto dos Reis - Código de Processo Civil Anotado, volume V, (Reimpressão), pág. 142 e segs - «Esta nulidade está em correspondência directa com o 1.º período da 2.ª alínea do art.º 660.º. Impõe-se aí ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras....
São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão».

Consubstancia, no caso, a recorrente, tal omissão de pronúncia, por a M. Juiz do Tribunal "a quo", na sentença recorrida, não ter conhecido ... A decisão recorrida olvidou completamente uma questão que é prévia à verificação dos requisitos elencados na referida disposição legal: a da intempestividade do pedido de dispensa de garantia, questão que foi devidamente suscitada quer na informação da qual faz parte o despacho reclamado, quer na Resposta da F.P.... A Mmª. Juiz do Tribunal a quo, não se pronunciou acerca desta guestão, que, no fundo, constituiu a principal razão para o indeferimento do pedido de dispensa de garantia ..., sendo assim esta a concreta “questão” que aponta como tendo sido omitido o seu conhecimento na sentença recorrida e que por si tenha sido articulada na respectiva resposta da Fazenda Pública na presente reclamação contra acto praticado na execução fiscal, sendo certo, na verdade, que o juiz deve conhecer na sentença, ...das questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não de todos os argumentos ou raciocínios expendidos pelo recorrente para sustentar a sua posição, nos termos do disposto no art.º 660.º n.º2 do CPC, tendo contudo, no caso, adianta-se desde já, a M. Juiz do Tribunal ”a quo” incorrido neste vício formal dos limites do conhecimento do objecto da reclamação, nela tendo conhecido de menos do que lhe cabia conhecer.

É que, como bem salienta a recorrente, tal questão da intempestividade da dedução do pedido de dispensa ou de isenção de prestação de garantia não deixou desde logo, de ser articulado pela mesma na sua resposta a tal pedido, como de fls 206 e segs dos autos se pode ver, sendo esse um dos fundamentos por que se opõe a que tal dispensa de prestação de garantia lhe seja concedida – cfr. seu art.º 10.º - constituindo a mesma, pois, uma questão a conhecer na sentença recorrida e da qual deveria extrair as devidas ilações jurídicas.

Porém, lendo e perscrutando a sentença recorrida, nela não se vê rasto de tal questão ter sido conhecida, antes se tendo limitado a um raciocínio de certo modo formal, ainda que lógico e coerente do ponto de vista da lógica jurídica, qual seja o de que se a lei prevê no citado art.º 52.º da LGT, diversos fundamentos para o executado obter a dispensa da prestação da garantia, em si alternativos que não cumulativos, basta o preenchimento de um só deles, ainda que outro ou outros não procedam, para que tal dispensa seja concedida, ao contrário do que diz ter entendido o despacho reclamado, que não obstante ter reconhecido a existência do preenchimento de um deles, não lhe concedeu tal dispensa mas antes a denegou, despacho que assim anulou.

Assim, a M. Juiz do Tribunal “a quo” não conheceu daquela questão e nem a mesma ficou prejudicada no seu conhecimento pela solução alcançada na decisão recorrida, pelo que a mesma padece do vício de omissão de pronúncia, conducente à declaração da sua nulidade, já que tal matéria não configura apenas uma mera argumentação mas sim uma verdadeira “questão” no sentido vertido nas normas dos art.ºs 668.º, n.º1, alínea d) e 660.º, n.º2 do CPC, tendo o juiz o dever de sobre ela se pronunciar, enquanto elemento integrador da contestação da parte contrária ao pedido formulado pelo ora recorrido e que a proceder, levaria à improcedência da reclamação.

No caso, não tendo a M. Juiz do Tribunal “a quo” conhecido e decidido da invocada e verdadeira questão, da intempestividade da dedução do pedido de dispensa da prestação de garantia, pelo ora recorrido formulado, que era susceptível de levar à improcedência do respectivo pedido, desta forma deixou de conhecer desta “questão”, enquanto factualidade enformadora com aptidão para conduzir à improcedência da presente reclamação, pelo que ocorreu a apontada omissão de pronúncia, assim não podendo deixar de proceder a matéria das conclusões do recurso atinente a este vício formal, sendo de declarar nula a sentença recorrida.


Procede assim, a matéria destas conclusões do recurso, sendo de declarar nula a mesma sentença.


5. Declarada nula a sentença recorrida que pôs termo ao processo, nos termos dos disposto no n.º1 do art.º 715.º do CPC (2), deve este Tribunal conhecer do objecto da apelação, em substituição do Tribunal “a quo”, já que os autos fornecem os necessários elementos para o efeito.

Neste conspecto, caberia a este Tribunal discriminar a matéria provada da não provada, que fosse relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito – cfr. art.ºs 123.º, n.º2 do CPPT, 511.º, n.º1 e 659.º, n.º2 do CPC – o que por economia de meios se faz por remissão para as alíneas A. a H. da sentença ora anulada e que nesta parte se repristina, por a mesma cumprir tal desiderato, em que da mesma as partes nem discordavam no presente recurso, não se alcançando necessidade de a mesma ser acrescida com qualquer uma outra.


5.1. E a primeira questão a conhecer no âmbito desta reclamação, consiste precisamente em saber se o pedido de dispensa/isenção de prestação de garantia formulado pelo reclamante o foi fora do prazo que a lei prevê para o efeito, porque a tê-lo sido, apenas haverá que declarar os respectivos efeitos, não havendo que conhecer do preenchimento dos respectivos pressupostos para a sua concessão, questão que, para além de ter sido suscitada na resposta da Fazenda Pública (como acima se invocou), também sempre seria de conhecimento oficioso por parte do tribunal, por contender com o exercício de um direito procedimental, dentro de um certo prazo legalmente fixado, e a vigência do princípio do inquisitório, quer para a AT quer para o tribunal, nos termos do disposto nos art.ºs 58.º e 99.º da LGT.

Nos termos do disposto nos art.ºs 52.º da LGT, 169.º e 170.º do CPPT, o prazo para o executado requerer a dispensa/isenção de garantia é o mesmo que dispõe para a prestação da garantia – 15 dias, prazo que é contado nos termos do Código Civil, art.º 57.º, n.º3 da LGT – que no caso desde logo não foi observado, mas veio o mesmo a requerer a prorrogação desse prazo para o efeito da prestação dessa garantia, como dos autos consta e que lhe foi deferido (3) – cfr. matéria provada das alíneas C. e D. – desta forma se colocando a questão de saber, se a prorrogação do prazo para o efeito da prestação da garantia também se comunica ao prazo para a formulação do pedido de dispensa da sua prestação, o que a Fazenda Pública entende não se comunicar.

A norma do n.º1 do art.º 170.º do CPPT dispõe que o pedido de dispensa da prestação da garantia seja efectuado no mesmo prazo do da sua prestação – 15 dias a contar da notificação para o efeito – não vindo a lei a dispor sobre a possibilidade da sua prorrogação, a não ser no caso do pagamento em prestações da quantia exequenda, na norma do n.º6 do art.º 199.º do mesmo CPPT, particularidade que a FP nem atentou e antes tratou como da mesma realidade se tratasse no presente caso.

Porém, foi tal pedido de prorrogação de prazo efectuado e deferido (legal ou ilegal, para o presente caso, desinteressa), será que o mesmo também vale para a formulação do pedido de dispensa/isenção da mesma garantia de molde a colocá-la no caso, ainda dentro do tempo em que o acto podia ser praticado?

A nossa resposta é negativa, ainda que por razões diversas das invocadas pela FP, por desde logo o que a lei prevê quanto à formulação do pedido de dispensa de garantia é apenas o prazo (15 dias) que não também as vicissitudes que com esta possam ocorrer, para além de que, para este pedido, dispõe a norma do n.º2 do mesmo art.º 170.º, disciplina própria quanto à sua prestação e que legalmente pode ocorrer sem ter em conta tal prazo inicial, mas um outro, próprio, cujo termo inicial se conta a partir da ocorrência de facto superveniente, e no prazo de 30 dias a contar de então, pelo que se entende que seja este o aplicável.

No caso, tendo o reclamante solicitado a prestação de garantias bancárias com que visava suspender a marcha processual das execuções fiscais em causa, tendo a entidade bancária não satisfeito essa pretensão, antes as indeferindo – cfr. matéria da alínea E. do probatório – e fundando o reclamante tal pedido de dispensa nesse não deferimento ou recusa da emissão de tais garantias – cfr. art.ºs 7.º e 8.º de tal pedido a fls 95 dos autos – foi por perda desse pressuposto de prestação da garantia que veio a peticionar tal dispensa, que assim surge como facto superveniente susceptível de integrar no citado n.º2, já que até então, teria legítimas expectativas na emissão dessas garantias e não necessitaria de peticionar a dispensa/isenção da sua prestação, pelo que o prazo para o efeito, de trinta dias, ao abrigo deste n.º2, se conta desde então, quando ocorreu o facto que desencadeou a necessidade desse pedido (10-12-2010), desta forma se não tendo completado até 23-12-2010, data em que veio a formular o mesmo pedido, o mesmo sendo de dizer que o mesmo foi formulado dentro do respectivo prazo legal, a contar de facto superveniente e nos termos do citado n.º2 do art.º 170.º do CPPT, sendo assim de julgar inverificada tal intempestividade da respectiva dedução desse pedido.


5.2. O despacho reclamado cujo texto integral consta de, entre lugares, a fls 56/61 dos autos, teve como pressupostos que o executado alegou o prejuízo irreparável, que comprovou a manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis mas que nada alegou ou provou quanto à insuficiência ou inexistência dos bens não seja da responsabilidade do executado requerente, como lhe cabia, pelo que o pedido não podia deixar de ser indeferido.

A norma do n.º4 do art.º 52.º da LGT, no que à dispensa/isenção de garantia diz respeito, coloca, quer nos casos de prejuízo irreparável para o requerente, quer nos casos de manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, que seja este a alegar e a provar a sua não responsabilidade em quaisquer uma destas situações, como nesta parte bem se pronuncia, desde logo, o despacho reclamado, citando, aliás, a propósito, jurisprudência dos nossos tribunais que no mesmo sentido têm decidido, como seja o acórdão do Pleno do STA de 17-12-2008, proferido no recurso n.º 327/03 (4).

Lendo e analisando o requerimento do pedido de dispensa/isenção de garantia, formulado pelo executado, cuja cópia consta de fls 93 a 103 dos autos, apesar de nele constar matéria em 43 artigos, nele omitiu por completo qualquer referência a factualidade susceptível de ser enquadrada nesta parte de tal estalão legal – que em qualquer dos casos a insuficiência ou a inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado – apenas se tendo limitado a articular a matéria relativa à sua insuficiência de património – art.º 10.º a 39.º - e à existência de prejuízo irreparável – art.º 40.º a 43.º - pelo que desde logo falha a alegação de que tal situação não tenha sido da sua responsabilidade, com a consequente dissipação dos seus bens de molde a colocar-se nessa situação, desta forma não podendo deixar de se manter o despacho reclamado, que é assertivo na falta do preenchimento deste pressuposto.

Na presente reclamação, veio o reclamante articular diversa factualidade tendente a tentar demonstrar que do alegado nesse pedido se deve concluir por tal insuficiência de bens não ser da sua responsabilidade – cfr. art.ºs 102.º a 122.º - sobretudo da sua interpretação ao nível jurisprudencial, mas que em nada beliscam a conclusão supra, da falta pura e simples, em tal pedido, de qualquer articulação no sentido do preenchimento do referido pressuposto, de nada servindo a invocação de inúmera jurisprudência que decidiu casos diversos e em que teceu considerações que se reconhecem como certeiras, como seja quanto à proibição da indefesa, que no caso manifestamente não aconteceu, mas sim foi o reclamante que, desde logo, nem alegou a factualidade susceptível de ser subsumida no citado pressuposto legal – desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado – pelo que a presente reclamação não pode deixar de improceder com a manutenção do despacho reclamado.


É assim de conceder provimento ao recurso e declarar nula a sentença recorrida e conhecendo em substituição, em julgar improcedente a reclamação.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em conceder provimento ao recurso e em declarar nula a sentença recorrida e conhecendo em substituição, em julgar improcedente a reclamação.

Custas pelo reclamante em ambas as instâncias.


Lisboa, 27 de Setembro de 2011
Eugénio Sequeira
Aníbal Ferraz
Pedro Vergueiro


(1) Cfr. entre outros, os acórdãos do STA de 2.10.1996 (ambos), recursos n.ºs 20472 e 20491.
(2) As normas invocadas deste Código reportam-se às introduzidas pela reforma introduzida pelo Dec-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, que entraram em vigor em 1-1-2008 e são aplicáveis aos processos iniciados desde então, como o presente.
(3) Despacho este de prorrogação do prazo cuja legalidade não se encontra em causa nestes autos.
(4)Na senda aliás, do acórdão deste TCAS de 7-12-2004, proferido no recurso n.º 248/04, da lavra do também ora Relator.