Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:537/07.0BECBT
Secção:CT
Data do Acordão:03/11/2021
Relator:ANA CRISTINA CARVALHO
Descritores:GERÊNCIA EFECTIVA
DESPACHO DE REVERSÃO
FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal (n.º 1 do artigo 23.º da LGT).

II - Sendo o despacho de reversão um acto administrativo tributário, está sujeito a fundamentação (artigo 268.º n.º 3 da CRP; artigos 23.º n.º 4 e 77.º nº 1, da LGT).

III - A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos da responsabilidade subsidiária e com a referência à extensão temporal dessa responsabilidade que está a ser efectivada.

IV – Não está fundamentado o despacho de reversão se se verifica a omissão quanto à indicação de todos os pressupostos da responsabilidade subsidiária e a referência à extensão temporal dessa responsabilidade.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I- RELATÓRIO

A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Castelo Branco que julgou procedente a acção de oposição deduzida por A....., enquanto revertido, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ..... e aps, instaurado pelo Serviço de Finanças da Guarda, originariamente instaurada contra a sociedade P....., S.A, para a cobrança coerciva de dívidas de juros compensatórios (IR) e CA, no montante total de € 19 205,73, dela veio interpor o presente recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:

«(…) nos termos dos artigos 639.º e 640.º do Código de Processo Civil (anteriores artigos 685.º-A e 685.º.º-B):

a) Foram violados pela douta sentença os artigos os artigos 77° da LGT, 204° do CPPT, 191° e 196°, ambos do CPC, ao decidir julgar a oposição procedente com fundamento na “falta de fundamentação do despacho de reversão”

b) Estão em causa nos presentes autos dívidas de Contribuição Autárquica do ano de 1996, na importância de 19.173,766, concernentes à originária devedora “P....., S.A.”, NIPC ....., revertidas contra o oponente/recorrido A......

c) Na douta sentença parece confundir-se falta de fundamentação com eventual falta de comunicação dos fundamentos.

d) É que, ainda que o oponente não tenha sido notificado dos fundamentos de reversão, a verdade é que esses fundamentos estão alicerçados no despacho de reversão - cfr. consta do processo de execução fiscal e cfr. fls. 1 a 18 ora juntas, sobretudo fls. 13 a 18 ora juntas onde se encontra explicitada a fundamentação da reversão, elencada nos pontos 4o a 8o das presentes alegações, de direito, fáctica e cronologicamente sendo que a suficiência da fundamentação tem que ser analisada em função do que está declarado na informação subsequente ao exercício do direito de audição preparatória do despacho de reversão e no próprio despacho de reversão, e não apenas em relação ao que consta do “print ’ informático que consta dos autos e a fls. 18 ora juntas com a epígrafe “despacho (reversão)” e em relação ao que consta do acto de citação, tal como afirma o STA no seu aresto de 15/02/2012, proferido no Recurso n° 0872/11, ponto II do sumário.

e) Sendo que, na informação de 01/09/2006 - cfr. fls. 13 a 16 ora juntas - consta que A..... foi gerente da originária devedora “P....., S.A.”, de 06/11/1995 a 11/11/1996, estando em causa uma dívida de CA do ano de 1996, que o processo de falência da originária devedora foi mandado arquivar por insuficiência de bens que justificasse o prosseguimento do mesmo, que a dívida se encontra por pagar e não foi anulada, que o mandatário do oponente solicitou a confiança do processo não podendo alegar desconhecimento da fundamentação de reversão, concluindo-se no despacho de reversão de 12/09/2006 que “pelo facto gerador ser anterior a 1999-01-01, os administradores ou gerentes são subsidiariamente responsáveis e solidariamente entre si por todas as contribuições e impostos relativos ao período do exercício a seu cargo, face ao determinado no ponto 3.1 do ofício circulado n° 600434/20045, de 25/01 da DSJT e o artigo 13 do Código de Processo Tributário”.

f) Ora, a fundamentação do despacho de reversão está lá, existe e é suficiente, pois da informação de 01/09/2006 e do despacho de reversão de 12/09/2006 sobressai que a reversão ocorreu porque o ora oponente exerceu a gerência da primitiva executada entre 06/11/1995 e 11/11/1996, que a dívida é do ano do exercício da gerência, alicerçada ainda no facto de que a devedora originária não possuía bens susceptíveis de penhora, e que à data o regime substantivo de reversão vigente era o previsto no artigo 13o do CPT.

g) Assim, ainda que tal fundamentação não tenha sido levada ao conhecimento do oponente, acontece que, tal como antes referido, tal circunstância contende com a ausência de comunicação dos fundamentos da reversão, sendo que tal vício não é fundamento de oposição, mas sim de requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal suscitando a nulidade da citação, cfr., verbi gratia, os Acórdãos do STA de 10/10/2012 e 07/05/2014, proferidos, respectivamente, nos recursos n° 0467/11 e 0198/14.

h) Ora, a nulidade em causa, a existir, além de não ser de conhecimento oficioso - veja-se que o artigo 196° do CPC apenas prevê o conhecimento oficioso daquela que está prevista na 2a parte do artigo 191° do CPC, que nunca seria aqui aplicável, pois não está em causa citação edital nem a falta de indicação do prazo de defesa -, estando, pois, dependente de arguição pelo interessado no prazo para oposição - conforme sobressai da Ia parte do artigo 191° do CPC -, não poderá ser conhecida em sede de oposição à execução fiscal.

i) Por outro lado e sem nunca conceder, como também evidenciado e documentado nos autos, os processos executivos foram confiados à mandatária do ora oponente em 25/07/2006.

j) “A partir do momento em que o processo é formalmente confiado à parte, esta deve considerar-se notificada dc todos os actos processuais”, cfr. Acórdão do T.T. 2a Instância de 17.12.92 in CTF n° 370, p. 209/213.

k) Sem conceder, é ainda de evidenciar que o oponente não teve dificuldade nenhuma em se defender, identificando em concreto as dívidas de imposto em causa, alegando, além do mais, não ter culpa na insuficiência do património da originária devedora.

1) Ora, também se tem entendido que “Demonstrado no procedimento administrativo e pela análise dos termos da acção administrativa especial de impugnação de acto que o destinatário do mesmo o conheceu e compreendeu na sua integralidade, apercebendo-se e captando o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo seu autor, não ocorre ilegalidade por falta de fundamentação”, cfr, Acórdão do TCA Norte, de 16/12/2010, proferido no recurso n° 00206/08.4BEPNF.

m) No que se refere aos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, eles constam dos autos, tendo sido juntos quer pelo oponente/recorrido, quer pela fazenda, sendo ainda juntas 26 folhas a fim de evidenciar a argumentação fáctica e de direito desenvolvida.

Pelo que, com o mais que Vossas Excelências se dignarão suprir, deve ser dado provimento ao recurso e em consequência ser revogada a decisão recorrida.»


*


O Recorrido, não apresentou contra-alegações.

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Neste Tribunal Central Administrativo, o Exmo. Senhor Procurador–Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

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As partes foram notificadas nos termos e para os efeitos do disposto no artigo no artigo 665.º, n.º 3, do CPC.

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Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

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II – Delimitação do objecto do recurso

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas a questão que cumpre apreciar e decidir nos presentes autos as seguintes questões:

i) Saber se na sentença recorrida ocorreu erro de julgamento da matéria de facto ao não considerar os despachos proferidos previamente à citação;

ii) saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento ao julgar que a decisão pela qual a AT reverteu a execução fiscal contra o oponente enquanto responsável subsidiário pelas dívidas exequendas não está suficientemente fundamentada.


III - FUNDAMENTAÇÃO

III. 1 – Fundamentação de facto


É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

«a) A 27/05/1997 foi instaurado o PEF n.º ....., para cobrança de IR – Juros Compensatórios (cfr. informação de fls. 232 documento de fls. 233 v.)
b) A 30/09/1997 foi instaurado o PEF n.º .....para cobrança de dívida de IVA de 03T/97 (cfr. informação a fls.232 dos autos);
c) Em 02/10/1997 o PEF a que se refere a alínea anterior foi apensado ao PEF n.º ..... (cfr. informação a fls.232 dos autos);
d) A 27/08/1997 foi instaurado o PEF n.º .....para cobrança de dívida de IVA 1997 (cfr. informação a fls.232 dos autos);
e) Em 06/10/1997 o PEF a que se refere a alínea anterior foi apensado ao PEF n.º ..... (cfr. informação a fls.232 dos autos);
f) A 17/05/2002 foi instaurado o PEF n.º .....para cobrança de dívida de CA de 1999 (cfr. informação a fls.232 dos autos);
g) Em 19/10/2004 o PEF a que se refere a alínea anterior foi apensado ao PEF n.º ..... (cfr. informação a fls.232 dos autos);
h) A 24/02/2004 foi instaurado o PEF n.º .....para cobrança de dívida de CA de 1996 (cfr. informação a fls.232 dos autos);
i) Em 06/10/1997 o PEF a que se refere a alínea anterior foi apensado ao PEF n. ..... (cfr. informação a fls.232 dos autos);
j) A 20/07/2006 foi proferido despacho onde se determinou a preparação do PEF n.º .....para reversão contra o ora oponente, ordenando-se a sua notificação para audição prévia (cfr. documento de fls. 244 dos autos);
k) A 07/08/2006 foi exercido pelo oponente o seu direito de audição prévia à reversão (cfr. documento de fls. 20 dos autos);
l) A 14/09/2006 foi proferido o seguinte despacho (cfr. despacho de fls. 249 dos autos): “Face às diligências de folhas 23 e estando concretizada a audição dos responsável(veis) subsidiário(s) prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra A..... contribuinte n.º ..... (…) na qualidade de Responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada. Atenta a fundamentação infra, a qual tem de constar da citação, proceda-se à citação do(s) executado(s) por reversão, nos termos do art.º 160.º do CPPT para pagar no prazo de 30 (…) dias, a quantia que contra si reverteu sem juros de ora nem custas (…).
m) No mesmo despacho e no espaço identificado com “Fundamentação da reversão” nada consta (cfr. despacho de fls. 249 dos autos):
n) A 14/09/2006 foi emitido ofício citação dirigido ao agora oponente no PEF n.º ....., para cobrança das seguintes dívidas:

o) No ofício “citação (reversão)” no campo “Fundamentação da Reversão” nada consta (cfr. cópia de ofício a fls. 249 v.);
p) A certidão de dívida com o n.º ..... diz respeito a CA no valor de 19.173,76, relativo a 1996, e liquidada em 1999 (cfr. cópia de certidão de dívida a fls. 261);
q) O oponente fez parte do Conselho de Administração da devedora originária desde 09/01/1996 (cfr. cópia de certidão do registo comercial da sociedade “P....., S.A.”, a fls. 240 v. e ss. dos autos);
r) A sociedade obrigava-se pela intervenção de dois administradores (cfr. cópia de certidão do registo comercial da sociedade “P....., S.A.”, a fls. 240 v. e ss. dos autos);
s) Através da Ap. 27/970129 foi registada a cessação de funções do aqui oponente como administrador da devedora originária, com data de 11/11/1996, por renúncia (cfr. cópia de certidão do registo comercial da sociedade “P....., S.A.”, a fls. 240 v. e ss. dos autos);
t) O capital social da devedora originária não foi totalmente realizado (cfr. relatório e parecer do Conselho Fiscal, a fls. 127 dos autos, e depoimento da segunda e terceira testemunhas);
u) Não foi intentada nenhuma acção judicial para cumprimento do contrato de sociedade quanto às entradas dos sócios não foi (cfr. depoimento da segunda testemunha, que fez parte, ao tempo dos factos do Conselho de Administração);
v) A 22/04/1997 foi elaborado relatório de “Certificação Legal de Contas” do exercício de 1996 ficaram consignadas as seguintes reservas (cfr. “Certificação Legal de Contas”, a fls. 130 dos autos):
“6.1. Uma vez que não nos foi possível confirmar os resultados das contagens físicas de existências, não podemos emitir qualquer opinião sobre os saldos das contas de Existências e de Custo das Mercadorias Vendidas.
6.2. Ao contrário do ocorrido no exercício anterior, não foram capitalizados os resultados relativos ao período que decorreu entre 1 de Janeiro de 1997 e a data de início da exploração. A inconsistência referida, segundo n/ cálculos, tem como consequência uma subavaliação do Activo na rúbrica de Imobilizado Incorpóreo Líquido de cerca de 45.000 contos e um agravamento do prejuízo apresentado de igual montante.
6.3. As demonstrações financeiras de 1996 foram preparadas no pressuposto da continuidade das operações, o qual poderá não ser aplicável face ao grave desequilíbrio financeiro, à perda da totalidade dos capitais próprios e aos factos subsequentes mencionados no Relatório do Conselho de Administração (alienação do imóvel, cedência do equipamento em regime de locação financeira e encerramento do hipermercado no mês de Março de 1997).”
w) A impossibilidade de proceder à contagem física a que se refere o ponto 6.1 deveu-se ao facto do estabelecimento se encontrar fechado (cfr. depoimento da quarta testemunha);
x) Através da apresentação 43/971022 foi registada a sentença de declaração de falência, transitada em julgado a 13/10/1997 (cfr. certidão do registo comercial da sociedade devedora originária, a fls. 51 e ss. dos autos);

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Não há factos alegados que destacar como não provados.
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Os factos provados assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e não impugnados e do depoimento das testemunhas, nos termos indicados em cada alínea do probatório.
A primeira testemunha, que se identificou como representante de uma sociedade por sua vez sócia da devedora originária, deu um depoimento genérico, não sendo o mesmo incidente a factos, mas a conclusões e opiniões.
A segunda testemunha, que se identificou como tendo feito parte do Conselho de Administração da sociedade devedora originária, demonstrou ter conhecimento do dia-adia daquela, sendo o seu depoimento credível.
A terceira testemunha, que se identificou como tendo feito parte do Conselho de Administração da sociedade devedora originária, demonstrou ter conhecimento do dia-a-dia daquela, sendo o seu depoimento credível.
No que respeita à quarta testemunha o depoimento desta foi credível e ter conhecimento directo dos factos sobre os quais testemunhou).»
*

i) Do erro de julgamento da decisão relativa à matéria de facto

Por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada, alteram-se as alíneas j) e p) do probatório, ao abrigo do preceituado no artigo 712.º, nº 1, a) do CPC, (aplicável por força do disposto no artigo 6.º, n.º 4 da Lei n.º 41/2013 de 26/6), ex vi artigo 281.º do CPPT:
j) A 20/07/2006 foi proferido despacho onde se determinou, «Face às diligências de fls. 23», a preparação do PEF n.º ..... para reversão contra o ora oponente, «na qualidade de responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada. Face ao disposto nos normativos do nº 4 do Art.º 23º e do Artº 60º da Lei Geral Tributária, proceda-se à notificação do interessado para efeitos do exercício do direito de audição prévia» identificando a proveniência da dívida como sendo Contribuição Autárquica, o n.º das certidões de dívida e o valor da quantia exequenda mais se ordenando a sua notificação para audição prévia (cf. documento de fls. 244 e 307 dos autos);
p) Com o ofício de citação identificado na alínea o) foram remetidas ao oponente as respectivas certidões de dívida: certidão n.º 970158578 relativa a juros compensatórios respeitantes à liquidação n.º ..... de IRS/IRC de 1996 «porque, tendo sido notificado não satisfez o seu pagamento no prazo de cobrança voluntária que terminou em 12/2/1997»; certidão n.º ..... proveniente de dívida por Contribuição Autárquica do ano de 1996, indicando ainda as referidas certidões o ano da liquidação, o número do documento de origem, o termo do prazo para pagamento voluntário e a data a partir da qual são devidos juros de mora (cf. documentos que juntou com a petição inicial a fls. 18 e 19 dos autos).

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Na conclusão (m)), lida em conjugação com as conclusões c) a g) a recorrente impugna o julgamento da matéria de facto.

Alega a recorrente que na sentença parece confundir-se falta de fundamentação com eventual falta de comunicação dos fundamentos e ainda que o oponente não tenha sido notificado dos fundamentos da reversão, a verdade é que esses fundamentos estão alicerçados no despacho de reversão. A recorrente refere-se à informação datada de 1/9/2006, onde considera que se encontra explicitada a fundamentação da reversão (desenvolvimento nos artigos 4.º a 8.º das alegações para os quais remete na conclusão d). Considera que a suficiência da fundamentação tem de ser analisada em função do conteúdo da referida informação subsequente ao exercício do direito de audição preparatória do despacho de reversão e no próprio despacho de reversão e não apenas com relação ao que consta do “print informático”, bem como ao que consta do acto de citação.

Resulta da leitura das alegações de recurso que foi dado cumprimento ao ónus previsto no n.º 1 do artigo 640.º do CPC, conforme decorre dos artigos 4.º a 11 do corpo das alegações de recurso, por remissão da conclusão d).
Assim, por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada, removidas que foram as expressões conclusivas e omitidos os factos já constantes do probatório, adita-se a seguinte factualidade:
y) No processo de execução fiscal identificado em a), foi proferido despacho do seguinte teor: «uma vez que foram arquivados por insuficiência de bens os autos de falência do executado, conforme informação pelo ofício n.º ....., de 2004-03-03, providencie-se a reversão contra os responsáveis subsidiários, conforme prevê o art.º 159.º do CPPT e artigos 23.º e 24.º da LGT» com aposição de data de recebimento do despacho pelo escrivão de 14/7/2006 (cf. documento de fls. 243 verso e 306 dos autos que consta com a numeração no processo de execução fiscal a fls. 23);
z) Em 25/7/2006 o processo de execução fiscal e seus apensos foram confiados à mandatária do recorrido tendo esta procedido à sua devolução em 26/7/2006 (cf. documento de fls. 245 vs, 246 e 301 a 311 dos autos);
aa) Em 1/9/2006 foi prestada informação do seguinte teor: «1. Conforme informação de fls. 17 a 20, exerceu a gerência da sociedade «P....., S.A (…) Período de gerência 06/11/1995 a 11/11/1996 A...... (…) 2. As dívidas executivas reportam-se aos períodos e imposto a seguir discriminados (…) 3. De acordo com o ofício-circulado 60043/2005, de 25 de Janeiro - DSJT, no seu ponto 1.2 facto gerador de responsabilidade alínea a) refere o seguinte: dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste; alínea b), dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do cargo (...) A..... (…) 7. Alegam que não foram notificados da dívida exequenda. Conforme consta dos autos as notificações enviadas à sociedade foram recusadas, sendo que na mesma altura os processos foram avocados ao Tribunal Judicial da Comarca da Guarda (9/10/1997). Quanto à notificação dos responsáveis subsidiários, foi efectuada em 24/07/2006, para efeitos de audição prévia em sede de reversão. 8. Referem ainda «que a massa falida dispunha de bens suficientes para pagar as dívidas» e que desconhecem «se tais créditos foram reclamados, graduados e pagos», conforme consta dos autos de fls. 13 - ofício ..... de 03/03/2004 do Tribunal Judicial da Comarca da Guarda, o processo de falência foi mandado arquivar por insuficiência de bens para que justificasse o prosseguimento do mesmo. 9. Os processos foram devolvidos a este serviço de finanças através do oficio enunciado no ponto 8. (…) 12. Alega também que a reversão não se encontra fundamentada, consta dos autos, fls. 23, despacho do sr. Chefe do serviço de finanças de 17/07/2006 os fundamentos da respectiva reversão, aos quais o mandatário teve acesso, pois solicitou a confiança dos processos em 25/07/2006» - (cfr. documento de fls. 246 verso e 321 dos autos);
bb) Sobre tal informação, em 12/09/2006 foi proferido o seguinte despacho: «pelo facto gerador ser anterior a 1999-01-01, os administradores ou gerentes são subsidiariamente responsáveis e solidariamente entre si por todas as contribuições e impostos relativos ao período do exercício a seu cargo, face ao determinado no ponto 3.1 do ofício circulado n° 600434/20045, de 25/01 da DSJT e o artigo 13 do Código de Processo Tributário. No direito de audição todos os administradores invocam a prescrição e a caducidade dos impostos revertidos ao tempo da sua administração, porque a devedora principal não foi devidamente notificada, e como está em causa a falta de património da executada para solver as dívidas e a prescrição dos impostos revertidos, prossiga a execução para os administradores ao tempo da sua gerência» (cf. documento de fls. 248 verso e 322 dos autos).

III. 2 – Fundamentação de direito

A Administração tributária (AT) reverteu contra o recorrido o processo de execução fiscal para cobrança coerciva de dívidas de juros de mora e Contribuição Autárquica.

O executado por reversão deduziu oposição pedindo a declaração de nulidade do processo invocando que não está demonstrada a insuficiência de bens da sociedade devedora originária e que o despacho de reversão não está fundamentado.

O Juiz a quo julgou procedente «o vício de falta de fundamentação do despacho de reversão» e extinguiu o processo de execução fiscal, julgando prejudicadas as demais questões.

O discurso fundamentador da sentença foi o seguinte: «basta uma breve análise do despacho de reversão e do ofício citação para reversão, para constatar que nem uma só palavra é aduzida a título de fundamento da reversão que aqui nos ocupa, falta que não pode ser suprida por qualquer interpretação do Tribunal, sob pena de ilegítima interferência na actividade da administração. Isto é, não podemos em face do período das dívidas concluir que o regime da responsabilidade subsidiária aplicável era o constante da norma x ou y e afirmar que embora tal não tenha sido externado pela administração, foi essa a norma que esteve na base da decisão, por ser a norma aplicável, sendo certo que o OEF não externou qualquer base legal para a sua actuação.»

Contra tal decisão insurge-se a recorrente alegando que foram violados pela sentença recorrida os artigos os artigos 77.° da LGT, 204.° do CPPT, 191.° e 196.°, ambos do CPC, ao julgar a oposição procedente com fundamento na falta de fundamentação do despacho de reversão.

Vejamos o que se nos oferece dizer sobre o recurso que nos vem dirigido.

Embora inserido num processo de natureza judicial, o despacho de reversão tem a natureza de acto administrativo (cfr. art.º 120.º do CPA, na redacção então vigente), pelo que, são de considerar, em relação a ele, as exigências legais relativas à fundamentação dos actos (cf. n.º 3 do art.º 268.º da CRP).

A questão que importa apreciar e decidir é assim, a de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento relativamente à questão da fundamentação do despacho de reversão.

Sustenta a recorrente que na sentença recorrida «parece confundir-se falta de fundamentação com eventual falta de comunicação dos fundamentos». Mais alega que os fundamentos estão alicerçados no despacho de reversão que consta do processo de execução fiscal e dos autos, bem como na informação subsequente ao exercício do direito de audição preparatória do despacho de reversão e não por referência ao que consta no “print informático”, bem como ao que consta do acto de citação.

Efectivamente o despacho de reversão e o acto que o comunica são diferentes. O STA pronunciou-se sobre esta questão em inúmeros arestos, citando-se a título de exemplo o Acórdão proferido no processo n.º 0724/11 datado de 18/01/2012: «I – A suficiência da fundamentação tem que ser analisada em função do que está declarado no despacho de reversão e não apenas em relação ao que consta do acto de citação.

II – Os problemas existentes quanto ao incumprimento ou cumprimento defeituoso do dever de comunicação dos fundamentos não se podem reflectir na validade do acto comunicando.»

Importa ainda ter presente que a lei permite a fundamentação por remissão, podendo consistir em mera declaração «de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso, parte integrante do respectivo acto» (nº l do art. 125º do CPA). Admite-se assim, que a fundamentação por remissão assuma a forma de indicação do documento que passará a constituir, do mesmo modo, parte integrante da fundamentação, ponto é que tais elementos sejam comunicados ao interessado. Quando tal acontece, a validade da fundamentação do acto em causa depende da validade da fundamentação da informação de que aquele se apropriou.

No que se refere especificamente à fundamentação do despacho de reversão, dispõe o artigo 23.º, n.º 4 da LGT que «a reversão (...), é precedida (...) da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação».

A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos da responsabilidade subsidiária e com a referência à extensão temporal dessa responsabilidade que está a ser efectivada, devendo tais elementos constar na citação.

Feito o enquadramento legal, vejamos se o despacho de reversão está fundamentado.

Importa, desde logo, identificar o que constitui o despacho de reversão.

Das alegações de recurso resulta que a recorrente tem a pré compreensão do despacho de reversão como constituindo o teor do conjunto de documentos constantes do PEF e não como um único documento, que configura como um mero print informático.

Contudo, não se acompanha tal entendimento.

A utilização de modelos parcialmente pré configurados, na prática de actos em massa como sucede nas reversões, não deixa de constituir a materialização dos actos praticados pelo órgão da execução fiscal, a que se aplicam as exigências constitucionalmente consagradas relativas à fundamentação dos actos e à sua comunicação. Não sendo de desvalorizar, como o faz a recorrente, referindo-se ao despacho de reversão como um mero «print informático», na medida em que, dele resultam efeitos jurídicos relevantes na esfera jurídica do revertido, como o de investir o destinatário no dever de efectuar o pagamento da dívida.

Ora, os documentos a que a recorrente alude como constituindo a fundamentação da reversão constituem documentos preparatórios da decisão e não a decisão de reversão. Admite-se que tais documentos possam integrar a fundamentação do acto, desde que o despacho de reversão se lhes refira expressamente por remissão, o que não sucede no caso dos autos, excepto quanto ao despacho que consta da alínea y) da matéria de facto aditada, como veremos.

O despacho de reversão é o despacho que consta da alínea l) da matéria de facto que começa por referir que «DESPACHO Face às diligências de folhas 23, e estando concretizada a audição dos responsável(veis) subsidiário(s) prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra A..... contribuinte n.º ..... (…) na qualidade de Responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada. Atenta a fundamentação infra, a qual tem de constar da citação, proceda-se à citação do(s) executado(s) por reversão, nos termos do art.º 160.º do CPPT para pagar no prazo de 30 (…) dias, a quantia que contra si reverteu sem juros de ora nem custas (…)».

O documento que consta a fls. 23 do PEF constitui o despacho que consta da alínea y) da matéria de facto, como já referido, que a afirma a insuficiência do património decorrente do arquivamento do processo de falência por insuficiência de bens.

A importância do despacho de fl. 23 do PEF prende-se com a constatação de que, na vigência do CPT, conforme resulta do artigo 239.º, n.º 2, a reversão da execução fiscal contra os responsáveis subsidiários não podia ter lugar sem que antes ocorresse a prévia excussão do património do devedor originário e, se fosse caso disso, dos seus sucessores e dos responsáveis solidários, constituindo assim, pressuposto da reversão.

Quanto ao quadro legal da decisão de reversão, o referido despacho (constante da alínea y)) refere como fundamentos da reversão os artigos 159.º do CPPT e 23.º e 24.º da LGT.

Todos os outros documentos que a recorrente refere como integrando a fundamentação, não foram mencionados no despacho de reversão, nem foram notificados ao recorrido, pelo que, embora façam parte do processo de execução fiscal, não integram a fundamentação do referido despacho.

É o caso da informação na qual se identificam os administradores da sociedade executada principal, os respectivos períodos de exercício da gerência e que aprecia a pronúncia do recorrido no âmbito da audição prévia (cf. alínea aa)). Também é o caso do despacho que determinou que o processo de execução prosseguisse contra os administradores e que procede à rectificação do teor da referida informação, quanto ao regime aplicável à reversão determinando que, atenta a data em que se considera ter ocorrido o facto gerador da responsabilidade subsidiária, o regime aplicável ao caso era o artigo 13.º CPT e não o artigo 24.º da LGT (cf. ponto bb) do probatório).

Pretende a recorrente que tais documentos constituiriam a fundamentação do despacho de reversão. Contudo, para que assim fosse, era necessário que o despacho de reversão lhes fizesse referência, acolhendo o seu conteúdo por remissão. No caso em apreciação tal não sucedeu. Também não resulta dos autos que tais documentos tenham sido remetidos ao revertido como um anexo, como sucedeu com as certidões de dívida. Daqui resulta claramente que a fundamentação do despacho de reversão não acolhe o teor dos referidos documentos como fundamentação por remissão.

Na verdade, o despacho de reversão a que a recorrente alude como um «print informático» apenas se mostra fundamentado quanto à insuficiência do património da devedora principal, fundamentação esta feita, como se referiu, por remissão para o despacho de fls. 23 do PEF (cf. alínea Y) do probatório).

Não obstante mencionar «atenta a fundamentação infra», o espaço designado «FUNDAMENTOS DA REVERSÃO», reservado à indicação da fundamentação da reversão, está totalmente em branco, o mesmo sucedendo com o ofício de citação.

A fundamentação do despacho de reversão, tal como a fundamentação de todos os actos administrativos deve integrar o acto, ainda que por remissão, como já referimos.

A utilização de modelos parcialmente pré configurados na prática de actos em massa, como sucede nos despachos de reversões, não deixa de constituir a materialização dos actos praticados pelo órgão da execução fiscal, não constituindo um mero print informático, e assim sendo, aplicam-se-lhes as exigências constitucionalmente consagradas relativas à fundamentação dos actos e à sua comunicação.

Se a informação relativa aos factos que integram os pressupostos da reversão está dispersa por vários documentos, impunha-se ao órgão da execução a expressa remissão para o seu teor no despacho de reversão, ou o seu envio em anexo como sucedeu com o envio das certidões de dívida. A não ser assim, estaria o revertido obrigado a configurar as diversas hipóteses de reversão, defender-se tendo em conta cada uma delas, com prejuízo nítido para a sua defesa.

Do que se deixou dito se conclui que, nem a informação, nem o despacho supra referidos, foram acolhidos no despacho de reversão, nem foram comunicados ao revertido, pelo que, concluímos que, quanto aos pressupostos da reversão e sua extensão, o despacho apenas se encontra fundamentado quanto à insuficiência de bens.

Por fim, importa referir que também não se acompanha a recorrente quando alega que, «ainda que tal fundamentação não tenha sido levada ao conhecimento do oponente, a partir do momento em que o processo é formalmente confiado à parte, esta deve considerar-se notificada de todos os actos processuais».

A consulta do processo de execução fiscal pelo mandatário não constitui nem substitui a notificação pessoal do despacho de reversão.

O despacho de reversão destina-se a levar ao conhecimento do revertido os pressupostos da reversão e a extensão da responsabilidade e opera-se com o seu envio como anexo à citação, ou contendo a citação os elementos essenciais da reversão. A consulta do processo não constitui uma notificação pessoal por não substituir o exercício de uma actividade comunicativa especialmente dirigida ao interessado, como referem a doutrina e a jurisprudência do Tribunal Constitucional. Cita-se a título de exemplo o Acórdão do Tribunal Constitucional proferido no processo nº. 916/2007 datado de 11/2/2009 embora relativo à comunicação de acto em matéria tributária, para o efeito da questão apreciada é inteiramente aplicável: «(…) a tutela específica que é dada aos particulares, independentemente de estes tencionarem ou não recorrer para os tribunais judiciais dos actos que lhe sejam lesivos e que reputam inválidos, no que se refere ao efectivo conhecimento dos actos de que sejam destinatários. Na verdade, decorre do que dispõe o artigo 268.º, n.º 3, da Constituição que o conhecimento efectivo dos actos lesivos dos particulares, independentemente das suas intenções impugnatórias, merece tutela constitucional. A Administração deve preocupar-se com o efectivo conhecimento, por parte dos particulares, dos actos lesivos que lhes dirige. E essa preocupação traduz-se, entre nós, na necessidade de uma notificação do acto através de uma declaração que contenha os elementos essenciais do mesmo (sem os quais não se poderá sequer falar de um conhecimento efectivo do acto) e que seja, fora algumas excepções que adiante serão analisadas, eminentemente pessoal. A cognoscibilidade efectiva do acto notificando e a pessoalidade da notificação constituem dois requisitos que, como é bom de ver, se interligam de forma estreita. A necessidade de a notificação ser endereçada à pessoa do interessado explica-se pelo facto de se considerar que não preenche as exigências constitucionais aquela «notificação» que só acidentalmente permita o conhecimento do acto notificando. As palavras de Pedro Gonçalves (“Notificação dos Actos Adminis­trativos (Notas sobre a génese, âmbito, sentido e consequências de uma imposição constitu­cional)”, em Ab Vno Ad Omnes – 75 Anos da Coimbra Editora – 19201995, Coimbra, págs. 10911121, pág. 1115) são, a este respeito, claras quando escreve que O dever de notificar exige da Administração o exercício de uma actividade comunicativa especialmente dirigida ao interessado (…) O direito à notificação do acto administrativo não é apenas o direito de aceder a uma informação que é posta à disposição do interessado, que a pode procurar, mas o direito à recepção do acto na esfera da perceptibilidade normal do destinatário. (…)

V. A notificação há de ser um acto individual, regido pelo princípio da recepção: o direito à notificação do acto administrativo não é apenas o direito de aceder a uma informação que é posta à disposição do interessado, que a pode procurar, mas o direito à recepção do acto na esfera da perceptibilidade normal do destinatário. (…)»

Termos em que se mostra improcedente o recurso apresentado pela Fazenda Pública.

Vigorando o princípio da causalidade na determinação da responsabilidade pelas custas, conforme resulta do disposto no artigo 527.º do CPC, recai sobre quem lhe tiver dado causa.

No caso dos autos a responsabilidade pela tributação do processo deve recair sobre a Fazenda Púbica em ambas as instâncias porque ficou vencida no recurso nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.


IV - Conclusões

I - A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal (n.º 1 do artigo 23.º da LGT).

II - Sendo o despacho de reversão um acto administrativo tributário, está sujeito a fundamentação (artigo 268.º n.º 3 da CRP; artigos 23.º n.º 4 e 77.º nº 1, da LGT).

III - A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos da responsabilidade subsidiária e com a referência à extensão temporal dessa responsabilidade que está a ser efectivada.

IV – Não está fundamentado o despacho de reversão se se verifica a omissão quanto à indicação de todos os pressupostos da responsabilidade subsidiária e a referência à extensão temporal dessa responsabilidade.


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V - DECISÃO

Face ao exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso.

Lisboa, 11 de Março de 2021.

Custas pelo Recorrido, sem prejuízo da dispensa de taxa de justiça por não ter contra-alegado.

A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, as Senhoras Desembargadoras Ana Pinhol e Isabel Fernandes, integrantes da formação de julgamento, têm voto de conformidade com o presente Acórdão.