Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2648/10.6BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/27/2022
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRS. DISPENSA DA TRIBUTAÇÃO DE MAIS-VALIAS. HABITAÇÃO PRÓPRIA E PERMANENTE.
Sumário:Para que ocorra a dispensa de tributação de mais-valias obtidas na alienação de casa de habitação própria e permanente do contribuinte, é necessário a prova de que o reinvestimento ocorreu, no prazo legal, através da aplicação dos ganhos obtidos na aquisição de nova casa, a qual deve corresponder a habitação própria e permanente do contribuinte.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO

I- Relatório
F……………………….impugnou judicialmente o acto tributário de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) referente ao ano de 2006 e respectivos juros compensatórios, no montante total de €55.326,39.
O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls.210 e ss. (numeração do processo físico), datada de 11 de Abril de 2012, julgou a impugnação improcedente e absolveu a Fazenda Pública do pedido.
Inconformado com essa sentença, o Impugnante dela recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo, tendo sintetizado a sua alegação de fls. 247 e ss. (numeração do processo físico), com as seguintes conclusões:
«Face ao exposto a decisão afecta os direitos e interesses legítimos do impugnante da seguinte forma:
i) Prescreve a alínea a) do n°5 do art.°10° do CIRS, na redação dada pelo Decreto-Lei 361/2007, de 2 de Novembro que:
5- São excluídos da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, nas seguintes condições:
a)Se, no prazo de 24 meses contados da data de realização, o valor da realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, for reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel, de terreno para a construção de imóvel, ou na construção, ampliação ou melhoramento de outro imóvel exclusivamente com o mesmo destino situado em território português ou no território de outro Estado membro da União Europeia ou do espaço económico europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal; (Redação dada pelo Decreto-Lei 301/2007, de 2 de Novembro), (nosso negrito)
ii) Ora a letra da Lei é especifica quando utiliza o conceito de reinvestimento na aquisição da propriedade de outro imóvel, e não outro como o momento da celebração do contrato promessa, ou da tradição da coisa, ou da celebração da escritura do imóvel, ou do ato translativo da propriedade.
iii) A redação dada pelo Decreto-Lei 361/2007, de 2 de Novembro, visou, no essencial, dar execução à autorização legislativa constante do artigo 50° da Lei n°53 -A/2006, de 29 de Dezembro, revendo o regime de exclusão de tributação dos ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados à habitação própria e permanente do sujeito passivo e do seu agregado familiar, nos casos de reinvestimento na aquisição de outro imóvel.
iv) O recorrente cumpriu não só a legislação europeia, mas especificamente o ponto de vista estrito da Lei Portuguesa, porquanto realizou o investimento na compra de casa própria para habitação permanente antes dos 24 meses decorridos, a contar de alienação de 19/01/2000, como se passa a explicar.
v) O recorrente cumpriu o desiderato legal porquanto celebrou contrato promessa de compra e venda em 07 de Janeiro de 2008, conforme contrato promessa que se junta aos autos, caso o mesmo não esteja junto ao processo administrativo, onde deveria ter sido anexado.
vi) A conclusão de que o reinvestimento na aquisição da propriedade de outro imóvel é anterior à data da escritura assinalada na sentença, já decorria da análise atenta dos documentos, cujo teor foi dado como facto assente.
vii) No documento nos autos a folhos 76 a 83, que deu origem aos factos assetes E) e F), mais precisamente na escritura de compra e venda, mútuo com hipoteca e fiança, a folhas 49 frente (última linha) e 49 verso (primeiro §), pode ler-se que: "Da presente aquisição já foi feito o registo provisório, a favor do comprador, pela inscrição G - Apresentação oito, de onze de Janeiro de dois mil e oito", (nosso negrito e itálico);
viii) Por virtude da prática normal bancária do crédito habitação, este registo provisório é feito justamente por força do pedido de crédito pelo comprador, pressupondo a promessa de compra e venda deste;
ix) A demora que existe entre a celebração do contrato promessa e contrato definitivo resulta de um conjunto de vicissitudes de demora no processo de obtenção de documentos, disponibilidade dos cartórios notariais, etc...
x) O ora recorrente tomou a decisão e contratou e registo provisoriamente a sua intenção de reinvestimento na aquisição da propriedade de outro imóvel, ficando claramente demonstrada o reinvestimento de recorrente antes de decorridos os 24 meses contados da data de alienação.
xi) Com total respeito à Douta sentença, parece-nos ainda que o prazo de reinvestimento de 24 meses, referido no art.10° do CIRS, é um prazo que aponta para a obrigação de se fazer o reinvestimento no prazo de 2 anos fiscais, sendo que por não existir uma definição única de ano fiscal, que pode até ser diferente do ao civil, utilizou-se sempre preferencialmente o critério da contagem dos meses;
xii) Logo em Janeiro de 2009, Lei n°64-A/2008, de 31/12, esse mesmo prazo foi alargado para 36 meses posteriores, ou 12 meses anteriores, como bem refere a sentença.
xiii) O conceito de reinvestimento não se coaduna com uma interpretação restritiva formalista, mas antes à luz da aplicação dos artigos 18° CE, 39° CE e 43° CE - artigos 28° e 31° do acordo que institui o Espaço Económico Europeu, a coerência do sistema fiscal e a política de habitação.
xiv) Com a devida vénia, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 685-A do Código de Processo Civil, consideramos violada a norma jurídica do art. 10° n°5 do CIRS;
xv) No entender do recorrente, a norma que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas de acordo com um conceito de reinvestimento, que não se subjaz ao momento da escritura de compra e venda do imóvel, mas antes ao processo de reinvestimento que, no caso, foi anterior.
xvi) Objecto - Da violação da norma jurídica do art. 60° n°3 da LGT;
xvii) A entrega da declaração de substituição do IRS de 2008 do contribuinte iniciou-se pelo ofício 7118, conforme facto assente I) e no qual se refere que:
i) Através do ofício nº7118, de 24/07/2009 o Serviço de Finanças de Lisboa 3 comunicou ao impugnante que por não constar do seu cadastro que tenha tido domicílio no imóvel identificado em A), deveria regularizar a situação detectada com a entrega das declarações Modelo 3 de substituição dos anos de 2006 e 2008, no prazo de 15 dias, findo o qual sem a regularização mencionada, o procedimento prosseguiria para correcção dos valores declarados (cfr. doc. de fls.20 do PA).
xviii) A interpretação correta do destinatário normalmente diligente ou razoável -uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pelo ofício concreto, leva a crer que entregando esta declaração de substituição o procedimento não prosseguiria para a correção dos valores declarados, pois é justamente isto que refere o teor do ofício.
xix) A Douta sentença dá como facto assente M) que os ofícios 3574 e 4790 da AT, enviados através de cartas registadas com aviso de receção, foram devolvidos por não reclamados.
xx) Por culpa própria, o recorrente desconheceu o processo de audição prévia.
xxi) Podia e devia a AT, justamente à luz do conhecimento que teve que o contribuinte não conheceu os ofícios 3574 e 4790 da AT, ter informado o contribuinte de modo efetivo.
xxii) Porquanto o impugnante referiu em sede de impugnação à liquidação adicional de 2006, que apenas foi ouvido no âmbito da reclamação graciosa relativa à declaração de rendimentos do ano de 2008 e nunca para efeitos de nova liquidação de rendimentos relativo ao ano de 2006.
xxiii) Afirmando que "a liquidação em causa nos presentes autos foi efetuada porque não considerou a declaração de substituição apresentada pelo Impugnante - e que, de resto, ainda se encontra a ser analisada em sede de reclamação graciosa".
xxiv) Explicando que "trata-se tão-somente de uma liquidação eletrónica (automática) que não foi emitida pelo Serviço de Finanças Lisboa - 3, mas por parte dos serviços centrais da DGCI - Direcção Geral dos Impostos."
xxv) O impugnante, ora recorrente, atuou como destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada, mas não tinha conhecimento efetivo da decisão sobre a reclamação graciosa de 2006;
xxvi) A AT apercebendo-se, nada fez para alterar.
xxvii) A presente decisão trata de uma matéria, que contende com a tutela da manutenção de habitação própria do sujeito passivo e do seu agregado familiar, garantindo-lhe com isso o direito à habitação, que constitui imperativo constitucional, pelo que a moderna jurisprudência deve ter em conta o concreto da verdade material e não apenas a norma,
xxviii) E é justamente nesse sentido que se considera existir a preterição de uma formalidade essencial, porquanto o direito de audiência prévia dos contribuintes, resulta do princípio da participação destes na formação das decisões da Administração fiscal, consagrado hoje na Lei Geral Tributária, mas cuja previsão já se encontrava na Constituição da República Portuguesa (artigo 267°, nº5[C.R.P. - Artigo 267 ° (Estrutura da Administração) /5. O processamento da actividade administrativa será objecto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.]) e no Código de Procedimento Administrativo (artigo 8°[Código de Procedimento Administrativo Artigo 8º Principio da participação/ Os órgãos da Administração Pública devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito, designadamente através da respectiva audiência nos termos deste Código.]), não esquecendo que nos termos do n°3 do art. 268.° da CRP os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos.
xxix) Face à sua obrigatoriedade e à sua origem constitucional, o direito de audiência prévia não pode ser encarado como um mero formalismo, mas corno um direito efetivo dos contribuintes, gerador de efeitos.
xxx) A. própria resolução do Conselho de Ministros n.°18/93 que aprova a carta deontológica do serviço público e no que respeita aos deveres para com os cidadãos para se ler que "os funcionários devem desenvolver a sua atividade com grande qualidade, transparência e rigor, de modo que as decisões da administração sejam atempadas, devidamente ponderadas e fundamentadas", não podemos deixar de manifestar total estranheza pelo facto da AT neste caso ignorar a confusão do contribuinte e nada fazer para a alterar.
Por último.
xxxi) Corno é sabido, em direito fiscal, vigora o princípio da prevalência da substância sobre a forma, princípio que surgiu para evitar que o formalismo jurídico se tornasse um obstáculo a que fosse determinada com exatidão a situação patrimonial do contribuinte.
xxxii) Aplicando ao presente caso o referido princípio, concluir-se-á que, apesar do recorrente não ter recebido uma decisão, a verdade material é que o imóvel alienado constituía a habitação própria e permanente do Impugnante e que o imóvel único adquirido se destina a habitação própria e permanente.
xxxiii) Refere o Professor Rui Duarte Morais que: "o objetivo da lei é claro: eliminar obstáculos fiscais à mudança de habitação, em casa própria, por parte das famílias." (Rui Duarte Morais, Sobre o IRS, 2ª Edição, Almedina, Coimbra, 2008, p. 142);
xxxiv) Pelo que, com a devida vénia, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 685-A do Código de Processo Civil, consideramos violada a norma jurídica do art 60º, n.°3 do CIRS;
Termos em que, com o Douto suprimento de V. Exas., deverá julgar-se procedente o presente recurso e consequentemente, anular a liquidação adicional, com todas as consequências legais daí decorrentes, fazendo-se assim, como sempre, inteira JUSTIÇA»
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A Recorrida, Fazenda Pública, não contra-alegou.
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Por decisão da Juiz Conselheira Relatora, datada de 27 de Fevereiro de 2013, o Supremo Tribunal Administrativo julgou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso, declarando competente para esse efeito o Tribunal Central Administrativo Sul, ao qual o processo foi remetido, nos termos do disposto no artigo 18º, nº3 do CPPT.
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Recebidos os autos neste TCA-Sul, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de não dever ser concedido provimento ao recuso.
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Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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II- Fundamentação
1.De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:
«A) Em 19/12/2003, junto do Segundo Cartório Notarial de Faro, o procurador do Impugnante assinou o escrito denominado "Compra e Venda, Mútuo com Hipoteca, Aval e Mandato", mediante o qual declarou adquirir para este, pelo preço de 454.000,00€, o prédio urbano/ destinado a Habitação, sito em Vilamoura, Quinta de ………..a/ lote n° ……….. na freguesia de Quarteira/ Concelho de Loulé, inscrito na matriz sob o artigo 2503 (cfr. doc. de fls. 44 a 62 dos autos);
B) No mesmo documento referido na alínea antecedente, resulta que para financiamento do valor da aquisição o Impugnante obteve empréstimo bancário concedido pela Caixa ……………….., CRL, no montante integral da compra (cfr. doc. de fls. 44 a 62 dos autos).
C) Em 19/01/2006, junto do Cartório Notarial J……………..em Lisboa, o procurador do Impugnante assinou o escrito denominado "Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca", mediante o qual declarou alienar a D………………..e mulher, pelo preço de 750.000,00€, o prédio urbano, identificado em A) (cfr. doc. de fls. 63 a 71 dos autos).
D) Em 12/09/2007 o Impugnante procedeu à entrega da declaração de IRS do ano de 2006 apenas com o anexo G onde declarou como alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis no quadro 4 do anexo G a aquisição e a realização indicadas em A) e C), indicando também no quadro 5 do mesmo anexo, o valor de 750.000,00€ como valor de realização que pretende reinvestir sem recurso ao crédito (cfr. doc de fls. 72 a 75 dos autos).
E) Em 05/03/2008, junto do Cartório Notarial de ………………, em Lisboa, o Impugnante assinou o escrito denominado "Compra e Venda, Mútuo com Hipoteca e Fiança", mediante o qual declarou adquirir, pelo preço de 280.000,00€, a fracção autónoma, destinada a habitação, designada pelas letras "AC", 3° andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua …………, n°s 12, 14, 16 18, 18-A e 18-B e Travessa das ……………, n° 8, freguesia da …………….., concelho de Lisboa, inscrito na matriz sob o artigo ……….. (cfr. doc de fls. 76 a 83 dos autos).
F) No documento mencionado na alínea antecedente o Impugnante declarou ainda que a fracção adquirida se destina exclusivamente a sua habitação própria e permanente e que se confessa devedor ao "Banco …………….., SA" do montante de 251.100,00€ que recebeu deste a título de empréstimo para aplicação da referida aquisição (cfr. doc. de fls. 76 a 83 dos autos).
G) Em 14/04/2009 o Impugnante procedeu à entrega da declaração de IRS do ano de 2008 apenas com os anexos A e H (cfr. doc. de fls. 8 a 12 do PA).
H) Em 02/07/2009 o Impugnante procedeu à entrega de declaração de IRS de substituição do ano de 2008 com os anexos A, G e H, indicando no quadro 5 referente a reinvestimento do valor de realização de imóvel destinado a habitação própria e permanente, como ano de alienação o ano de 2006 e o campo 401 do quadro 4 e como valor reinvestido no segundo ano seguinte dentro dos 24 meses (sem recurso ao crédito) 280.000,00€, identificando no quadro 5B o imóvel objecto de reinvestimento como sendo da freguesia ………, ripo U, artigo ………. e fracção AC (cfr. doc. de fls. 87 a 93 dos autos).
I) Através do ofício n°7118 de 24/07/2009 o Serviço de Finanças de Lisboa 3 comunicou ao Impugnante que por não constar do seu cadastro que tenha tido domicílio no imóvel identificado em A), deveria regularizar a situação detectada com a entrega das declarações Modelo 3 de substituição dos anos de 2006 e 2008, no prazo de 15 dias, findo o qual sem a regularização mencionada, o procedimento prosseguiria para correcção dos valores declarados (cfr. doc. de fls. 20 do PA).
J) Em 24/02/2010, foi elaborada informação no Serviço de Finanças de Lisboa 3, no âmbito do processo de reclamação graciosa n°……………….., aí constando o seguinte:
"I- Introdução
Vem o contribuinte F……………….……………., NIF ………….., accionar o procedimento de reclamação graciosa, nos termos do artigo 68° e segs do CPPT, por via da entrega de uma declaração de substituição Modelo 3 de IRS do ano de 2008, com despacho de convolação datado de 2010-01-08, em virtude de ter efectuado a seguinte alteração:
• Inclusão do Anexo G, em que manifesta o reinvestimento, no montante de €280.000,00 relativamente a prédio urbano vendido em 2006.
(...)
iii) Os factos
(...)
4. Da declaração de 2006 verifica-se que o imóvel, sito em Vilamoura-LOTE 2.2.A/3 é o prédio urbano identificado pelo artigo matricial n°2503, pertencente à freguesia da Quarteira.
5. Analisando o sistema informático "Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes" não consta que o contribuinte tenha tido domicílio fiscal naquela morada.
6. De acordo com o n° 5 do artigo 10° do CIRS "São excluídos da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente ao sujeito passivo ou do seu agregado familiar, ..."
7. Não cumprindo o previsto no n° 5do artigo 10° do CIRS, em virtude de o imóvel própria e permanente, foi o contribuinte notificado para regularizar a situação detectada com a entrega das declarações de substituição dos anos de 2006 e 2008 através do ofício n°7118, de 2009, registado em 2009/09/21 e entregue em 2009/09/25.
8. Em 1/02/2010, vem o contribuinte acima mencionado em resposta ao oficio n° 7118, de 2009, juntar comprovativo de domicílio fiscal, requerendo que sejam consideradas as declarações entregues, referentes aos anos de 2006 e 2008.
III - Conclusão
Do elemento de prova enumerado no Ponto 8, conclui-se que, de acordo com o artigo 10° n° 6 a) do CIRS quando se trata de reinvestimento na aquisição de outro imóvel, o adquirente o não afecte à sua habitação ou do seu agregado familiar até decorridos seis meses após o termo do prazo em que o reinvestimento deva ser efectuado não haverá lugar ao beneficio do referido no ponto 6.
V - Proposta
Sendo assim, em face do exposto e dos fundamentos invocados, propõe-se o INDEFERIMENTO da presente reclamação graciosa." (cfr. fls. 61 a 63 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
K) Através do ofício n° 2525 de 05/03/2001, foi comunicado ao Impugnante o projecto de decisão mencionado na alínea antecedente, bem como o prazo de 10 dias para exercer o direito de audição prévia (cfr. doc. de fls. 64 do PA).
L) Em 23/03/2010 foi proferido o seguinte despacho pela Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa 3:
"Concordo. Vista a informação, e decorrido que está o prazo do exercício do direito de audição, sem que o mesmo se mostre exercido, convole-se em definitivo o INDEFERIMENTO da presente reclamação graciosa.
Notifique-se" (cfr. fls. 66 do PA).
M) Através dos ofícios n°s 3574 e 4790 de 2010, enviados através de cartas registadas com aviso de recepção, as quais foram devolvidas por não reclamadas, foi comunicado ao Impugnante o teor do despacho mencionado na alínea antecedente (cfr. fls. 71 a 74 do PA).
N) Em 28/06/2010 foi emitida em nome do Impugnante a liquidação de IRS do ano de 2006 com o n°………………………., no valor a pagar de 55.326/39€, com juros compensatórios incluídos no montante de 3.889,476, e com data limite de pagamento o dia 18/08/2010 (cfr. doc. de fls. 41 a 43 dos autos).
O) A presente impugnação foi apresentada em 15/11/2010 (cfr. fls. 2 e 3 dos autos).
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Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos e no processo administrativo.
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Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.»
X
Com as alegações de recurso, o recorrente juntou um documento, relativo a contrato de promessa de compra e venda da fracção em causa que alega ter celebrado.
Nos termos do artigo 651.º/1, do CPC, «As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância».
O recorrente não justifica a junção do mesmo apenas em sede de recurso. No entanto, está em causa elemento que possibilita a correcta instrução da causa, de acordo com uma das teses em confronto. Pelo que se impõe determinar a sua junção aos autos.
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Na conclusão vi), o recorrente invoca que celebrou contrato-promessa relativo à aquisição da fracção, objecto de reinvestimento, pelo que tal facto deve ser aditado ao probatório.
Compulsados os autos, impõe-se deferir o requerido, com o aditamento ao probatório da alínea seguinte:
P) Em 07.01.2008, o recorrente celebrou contrato-promessa de compra e venda da fracção referida na alínea E), supra – doc. junto com as alegações de recurso.
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Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
Q) Entre 2003 e 2006, o recorrente apresentou as moradas seguintes:
«Texto original»
R) Em 31.12.2005, o domicílio fiscal do recorrente que constava do cadastro era o seguinte: Rua ………….., n.º 31, 4.º Esq., 1150-278 Lisboa – fls. 31/35, do pat.
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2.2. De Direito.
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre os alegados erros de julgamento da sentença recorrida seguintes.
i) Erro de julgamento quanto à desconsideração do reinvestimento realizado na aquisição de habitação própria e permanente, porquanto terá sido ultrapassado o prazo legal de relevamento do mesmo [conclusões i) a xv)].
ii) Erro de julgamento quanto à desconsideração do vício da preterição do direito de audição prévia do contribuinte [demais conclusões do recurso].
2.2.2. No que respeita ao fundamento do recurso referido em i), o recorrente invoca que «cumpriu o desiderato legal porquanto celebrou contrato promessa de compra e venda em 07 de Janeiro de 2008, conforme contrato promessa que se junta aos autos, caso o mesmo não esteja junto ao processo administrativo, onde deveria ter sido anexado»; que
«a conclusão de que o reinvestimento na aquisição da propriedade de outro imóvel é anterior à data da escritura assinalada na sentença, já decorria da análise atenta dos documentos, cujo teor foi dado como facto assente».
A este propósito, escreveu-se na sentença recorrida o seguinte:
«[C]omo resulta dos autos (alínea F) dos factos assentes), para a aquisição do imóvel realizada em 2008, o Impugnaste recorreu ao crédito bancário no montante de 251.100,006, pelo que este montante nunca poderia ser considerado como reinvestimento do valor de realização. // Resta assim o diferencial de valor de 251.100,00€ para o valor de aquisição de 280.000,006, que se afira de um eventual reinvestimento parcial. // No entanto, como resulta da lei, só beneficiam da exclusão de tributação nos termos da alínea a) do n° 5 do artigo 10° do CIRS, as importâncias comprovadamente entregues a título de reinvestimento n té ao termo do prazo de 24 meses contados da data da realização, desde que tenha sido feita a respectiva menção na declaração de rendimentos, anexo G, quadro 5, campo 14,19 ou 24. // E o Impugnante alienou o imóvel gerador de mais-valias em 19/01/2006, tendo adquirido o novo imóvel apenas em 05/03/2008, ou seja, para além do prazo de 24 meses legalmente exigido, já que apenas para os prazos que ainda estivessem a correr em 01/01/2009 seria aplicável o novo prazo de 36 meses criado pela Lei n° 64-A/2008, de 31 de Dezembro». // E assim sendo, é forçoso concluir pela inexistência dos pressupostos legalmente estabelecidos para a exclusão da tributação das mais-valias obtidas com a alienação de imóvel».
Apreciação.
Recorde-se o normativo cuja aplicação está em causa nos autos.
Artigo 10.º (“Mais-valias”) do CIRS.
«1. Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário; // (…)
5 – São excluídos da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, nas seguintes condições:
a) Se, no prazo de vinte e quatro meses contados da data da realização, o valor da realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, for reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel, de terreno para a construção de imóvel, ou na construção, ampliação ou melhoramento de outro imóvel exclusivamente com o mesmo destino, desde que esteja situado em território português. // (…)».
A este propósito constitui jurisprudência fiscal assente a seguinte:
i) «Para que opere a exclusão tributária prevista no n° 5 do art. 10° do CIRS (exclusão da tributação do ganho obtido mediante a alienação onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo) a lei impõe que o respectivo ganho seja reinvestido, no prazo de 24 meses, na aquisição de um diferente imóvel e que este também tenha como destino a habitação do sujeito passivo ou do seu agregado familiar. // Para efeitos do disposto neste normativo, o conceito de habitação própria e permanente não equivale ao conceito de domicílio fiscal» (1).
ii) «Para que opere a exclusão tributária prevista no nº 5 do art. 10º do CIRS (exclusão da tributação do ganho obtido mediante a alienação onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo) é preciso que o ganho seja reinvestido, no prazo de 24 meses, na aquisição de um diferente imóvel e que este também tenha como destino a habitação do sujeito passivo ou do seu agregado familiar » (2)»
iii) «Estando em causa a interpretação de normas de exclusão de tributação, as mesmas devem ser interpretadas nos seus exactos termos, sem o recurso à analogia e evitando também a interpretação extensiva, tornando prevalente a certeza e a segurança na sua aplicação». (3)
iv) «A exclusão referida só vale pois para as mais-valias de imóveis destinados a habitação própria e permanente quando o reinvestimento se opera em imóveis com o mesmo destino. O imóvel “de partida” e o imóvel “de chegada” têm de ser destinados à habitação própria e permanente. Qualquer outro destino de ambos, ou só de um deles, destrói as condições de aplicação da exclusão de incidência – e mais-valia realizada no imóvel de “partida” será tributável» (4).
Os argumentos aduzidos pelo recorrente não logram rescindir o entendimento que fez vencimento na instância. A norma sobre a exclusão de tributação em exame é uma norma de incidência, a qual postula uma interpretação estrita do seu âmbito previsivo. Trata-se de isentar a tributação de mais-valias obtidas com a alienação de prédio destinado à habitação própria e permanente do agregado do contribuinte, na condição de que o montante ganho seja reinvestido na aquisição de outro imóvel que preencha a mesma afectação, ocorrida no prazo legal de 24 meses, o qual é indisponível (5). Deste modo, o contrato-promessa de compra e venda não releva para o preenchimento do conceito de reinvestimento do ganho, dado que não comprova a efectividade do mesmo; ou seja, o que importa é a destinação efectiva dos ganhos e não o compromisso de, em data posterior, efectuar a referida afectação. Cumpre notar também que o pressuposto relativo à habitação própria e permanente da fracção alienada não se comprova nos autos, dado que o recorrente no período em causa apresentava diferentes moradas, bem como declarou diferente domicílio fiscal (6). Mais se refere que perante o montante global de aquisição da fracção adquirida em 05.03.2008, de €280,000,00, a parte relativa a €251,100,00 foi financiada por empréstimo bancário (7), o que determina também a não aplicação da norma de isenção em causa, na proporção correspondente ao montante financiado por empréstimo bancário.
Por outro lado, seja a invocação do direito europeu, seja a invocação da prevalência da substância sobre a forma não logram subverter os dados de facto em apreço, dos quais resulta o seguinte: 1) o imóvel alienado em 2006 não se destina à habitação própria e permanente do contribuinte (8); 2) a efectivação do reinvestimento ocorreu para além do prazo de 24 meses, que deve mediar entre a alienação e a aquisição, associada ao reinvestimento, cuja verificação implica a demonstração da entrada e da saída da esfera patrimonial do impugnante, respectivamente, dos montantes correspondentes aos ganhos alegadamente reinvestidos (entre a primeira e segunda aquisições medeia um período superior a 24 meses - de 19.01.2006 a 05.03.2008); 3) parte do preço de aquisição da fracção, objecto de reinvestimento, no montante de €251,100,00 foi financiada por empréstimo bancário.
Estando em causa norma de isenção, correspondente a benefício fiscal, o ónus da prova da verificação dos seus pressupostos cabe ao contribuinte que a invoca. Ónus que no caso não foi observado.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento, pelo que deve ser confirmada, nesta parte.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.3. No que respeita ao fundameno do recurso referido em ii), o recorrente alega que: «que apenas foi ouvido no âmbito da reclamação graciosa relativa à declaração de rendimentos do ano de 2008 e nunca para efeitos de nova liquidação de rendimentos relativo ao ano de 2006»; que «considera existir a preterição de uma formalidade essencial, porquanto o direito de audiência prévia dos contribuintes, resulta do princípio da participação destes na formação das decisões da Administração fiscal, consagrado hoje na Lei Geral Tributária, mas cuja previsão já se encontrava na Constituição da República Portuguesa».
A este propósito, escreveu-se na sentença recorrida que «dúvidas não subsistem que tendo sido concedido o direito de audição prévia no âmbito do procedimento de reclamação graciosa, então, efectivamente, o Impugnante teve oportunidade de se pronunciar em fase prévia à liquidação, razão pela qual nos termos do disposto no artigo 60°, n° 3 da LGT nova audição seria dispensável».
Apreciação.
Está em causa nos autos a liquidação adicional de IRS do ano de 2006 com o n° 2010 5004566102 cuja data limite de pagamento foi o dia 18/08/2010 (alínea N).
Estabelece o artigo 60.º/3, da LGT, que: «[t]endo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais se não tenha pronunciado».
Do probatório resultam os elementos seguintes:
i) Através do ofício n° 2525 de 05/03/2010, foi comunicado ao Impugnante o projecto de decisão [de indeferimento da reclamação graciosa relativa à rectificação das declarações de IRS de 2006 e 2008], bem como o prazo de 10 dias para exercer o direito de audição prévia (alínea K).
ii) Em 23/03/2010 foi proferido o seguinte despacho pela Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa 3
"Concordo. Vista a informação, e decorrido que está o prazo do exercício do direito de audição, sem que o mesmo se mostre exercido, convole-se em definitivo o INDEFERIMENTO da presente reclamação graciosa.
Notifique-se" (alínea L).
iii) Através dos ofícios n°s 3574 e 4790 de 2010, enviados através de cartas registadas com aviso de recepção, as quais foram devolvidas por não reclamadas, foi comunicado ao Impugnante o teor do despacho mencionado [no sentido do indeferimento da reclamação graciosa] (alínea M).
iv) Em 28/06/2010 foi emitida em nome do Impugnante a liquidação de IRS do ano de 2006 com o n°……………….., no valor a pagar de 55.326/39€, com juros compensatórios incluídos no montante de 3.889,476, e com data limite de pagamento o dia 18/08/2010 (alínea N).
Em face dos dados coligidos nos autos, importa aferir se foi assegurado ao recorrente o direito à audição prévia antes da emissão da liquidação adicional contestada.
O contribuinte foi notificado para o exercício de audição prévia, no quadro do procedimento de rectificação das declarações de IRS de 2006 e 2008 (alíneas I), J) e K). A notificação em causa dava conta da intenção da Administração Tributária de corrigir as declarações de IRS de 2006 e de 2008, no sentido de não relevar o alegado reinvestimento dos ganhos obtidos em 2006 na aquisição da habitação própria e permanente, com a consequente tributação dos ganhos referidos no exercício de 2006. O teor da referida notificação é acessível a um destinatário médio, colocado na posição do recorrente. Perante a notificação referida, o impugnante não emitiu pronúncia sobre o projecto de decisão em causa (alínea L).
Donde se infere o seguinte: i) no quadro do procedimento de rectificação das declarações de 2006 e 2008, foi assegurado ao contribuinte o direito de se pronunciar sobre as correções que estiveram na base da liquidação adicional em apreço; ii) o contribuinte entendeu não exercer o direito referido; iii) tendo sido observado o direito de audição prévia do contribuinte, a repetição de idêntica diligência, em momento anterior à emissão da liquidação adicional de 2006 oferece-se redundante e desprovida de arrimo legal.
Ao julgar no sentido referido, a sentença sob escrutínio não merece censura, devendo ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)

(1.ª Adjunta – Hélia Gameiro Silva)

(2.ª Adjunta – Ana Cristina Carvalho)

(1) Acórdão do STA, de 14.11.2018, P. 01077/11.9BESNT 01448/17,
(2) Acórdão do STA, 17.09.2014, P. 0250/14. No mesmo sentido, v. Acórdão do STA, de 14.04.2010, P. 01125/09
(3) Acórdão do STA, de 18.01.2017; P. 0774/14
(4) José Guilherme Xavier de Basto, IRS, Incidência real e determinação dos rendimentos líquidos, Coimbra Editora, 2007, pp. 413/414.
(5) Neste sentido, v. José Guilherme Xavier de Basto, IRS, Incidência real … cit., p. 415.
(6) Alíneas I), Q), e R), do probatório.
(7) Alínea E), do probatório.
(8) Alíneas A) e C), do probatório.