Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09473/16
Secção:CT
Data do Acordão:10/13/2016
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:NOTIFICAÇÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO. ARTIGOS 36.º E 37.º DO CPPT.
Sumário:1) O acto de notificação do acto tributário, sendo uma formalidade exterior, instrumental e posterior (complementar) ao acto praticado, mas também requisito de eficácia deste, tem como escopo, transmitir o conhecimento ao contribuinte de que foi praticado um acto em matéria tributária susceptível de afectar a sua esfera jurídico-patrimonial e os seus fundamentos, assim como facultar-lhe o exercício dos meios de defesa que a lei lhe propicia.
2) A notificação, sendo exterior e posterior ao acto praticado, mas também requisito de eficácia deste, visa, por um lado, dar a conhecer ao contribuinte que foi praticado um acto em matéria tributária que afecta a sua esfera jurídica (anunciando-lhe a obrigatoriedade de realização do pagamento do imposto apurado, quando se trate de um acto de liquidação de imposto), por outro, propiciar-lhe o exercício dos meios de defesa que a lei lhe faculta.
3) Nesta medida se compreende a exigência de indicação na notificação do autor do acto e da qualidade em que decidiu, dos meios de defesa e do prazo para reagir, para além da decisão e seus fundamentos.
4) No caso, apenas foi notificada aos contribuintes a demonstração de compensação operada na sequência da liquidação em causa nos autos, pelo que a comunicação do teor e fundamentos do acto tributário em apreço não foi observada.
5) O disposto no artigo 37.º/1 e 2, do CPPT, não é de aplicar aos casos em que, como sucede no litígio sub judice, não ocorreu efectiva comunicação do acto de liquidação, pelo que não existe acto de comunicação ou de notificação do acto tributário, com requisitos omitidos, susceptível de ser sanado, através dos mecanismos legais em apreço.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACÓRDÃO

I- Relatório

A Fazenda Pública interpõe o presente recurso jurisdicional da sentença proferida a fls. 190/208, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra a “demonstração de compensação”, relativa a IRS de 2000.
Nas alegações de recurso, a recorrente formula as conclusões seguintes:
1) O presente recurso visa a decisão proferida no processo em referência, que julgou procedente a presente impugnação judicial, e como tal, decidiu pela anulação da liquidação adicional de IRS do exercício de 2000.
Sendo que a liquidação em crise teve na sua génese acção inspectiva interna efectuada pela Direcção de Finanças de Lisboa - Inspecção Tributária aos Impugnantes M... e A... (doravante designados por Recorridos), no âmbito da qual foram concretizadas correcções meramente aritméticas à matéria colectável do exercício de 2000, no valor de €1.130.596,68.
2) A douta sentença ora objecto de recurso, pautou-se por aferir apenas da caducidade do direito à liquidação que julgou como verificada e é sobre esta que o presente recurso versa.
3) Pelo que, em 23/02/1988 adquiriu por arrematação dois imóveis, os quais se encontravam sujeitos a SISA, porém, beneficiaram de isenção de acordo com o art.º 11º, n.º 3 do CIMSISSD.
Com a aquisição dos preditos imóveis, o Impugnante conferiu-lhes um destino diferente ao afectá-los ao seu património individual, nunca tendo os mesmos sido objecto da inventariação final no âmbito da actividade comercial por si desenvolvida.
Posteriormente, por escritura pública lavrada em 12/09/2000, os Impugnantes alienaram os imóveis pelo preço de Esc.: 253.214.285$00.
4) Foi emitido o projecto de Relatório, onde foram devidamente explanadas e explicitadas as razões de facto e de direito que conduziram às correcções à matéria colectável o qual foi notificado aos Sujeitos Passivos para exercerem o direito de audição, nos termos do artº 60º do RCPIT e 60º da LGT» que veio a ser exercido.
5) Tendo, os Recorridos sido, legalmente notificados da liquidação decorrente das correcções, através da nota de compensação identificada pelo n.º …, emitida em 08/11/2004, a que corresponde a nota de cobrança identificada pelo n.º … e respeitante ao IRS do exercício de 2000.
A predita liquidação, conforme se pode comprovar pelos autos, foi notificada por carta registada simples, com o n.º de registo ….
6) Ora, vem a ser essa a situação em apreço: não há qualquer registo que os Impugnantes tenham apresentado qualquer pedido, nos termos e para efeitos do artº 37º do CPPT.
7) O documento de compensação investe os ora Recorridos na obrigação de
efectuar o pagamento da dívida tributária, sobre o qual foi contado o prazo para apresentar a impugnação judicial. Sendo que o valor da dívida foi apurada tendo em conta os montantes já pagos resultantes das liquidações anteriores que haviam sido efectuadas para o mesmo exercício.

8) A douta sentença do tribunal a quo sustenta que a liquidação de IRS, respeitante ao ano de 2000 não foi efectuada a coberto de correio registado com aviso de recepção e no prazo de 4 anos contado da data do facto tributário. Dispõe o art.º. 38º, nº l do CPPT que «as notificações são efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação destes para assistirem ou participarem em actos ou diligências.
9) Já o n,º 3 do mesmo artigo expressa que as notificações não abrangidas no nº l, bem como as relativas às liquidações de tributos que resultem de declarações dos contribuintes ou de correcções à matéria tributável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição, são efectuadas por carta registada.
10) No caso vertente, a liquidação resultou das correcções levadas a cabo na acção
inspectiva de carácter interno, cujo projecto de Relatório foi objecto de
notificação aos Impugnantes, para estes, querendo, exercer o direito de audição, o qual até foi exercido.

11) Assim, ao contrário do perfilhado na douta sentença que, sem mais, declara a exigência de a notificação carecer de ser efectivada por carta registada com aviso de recepção ou então através de notificação pessoal, a verdade é que decorre do disposto no artº 38º, n.º 3 do CPPT» levando em linha de conta a prévia notificação já concretizada das correcções da matéria tributável para efeitos de direito de audição, a notificação da liquidação deverá ser legalmente cumprida por mera carta registada.
12) Por outro lado, tendo em conta a lei vigorante à data em que a notificação foi efectuada - 2004 - concretamente o artigo 38º, nº 3 do CPPT, visto que a mesma foi originada após notificação das correcções da matéria tributável para efeitos do exercício do direito de audição, deveria ser efectuada por carta registada simples» o que vale por dizer que a douta sentença não tem razão quando afirma que a lei estabelecia a obrigação da notificação ser feita por carta registada com A/R.
13) O prazo de caducidade, contado nos termos legalmente definidos, terminou em 31/12/2004, sendo que a notificação foi emitida em 08/11/2004.
14) Sobre esta matéria, a posição sufragada na nossa jurisprudência vai no sentido de que “os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados (cfr. art. 36 nº l do CPPT), dispõe-se no art. 38º do mesmo diploma da forma como devem ser feitas as notificações, devendo ser feitas por carta registada com aviso de recepção, entre outras e em princípio, as notificações de actos de liquidação de tributos que concretizem uma alteração da situação tributária, mas as notificações das liquidações de IRS a partir de 1.12001, data da entrada em vigor da Lei nº 30-G/2000, de 29,12, que deu nova redacção ao nº 3 do art. 139 do CIRS, redacção essa que foi mantida no art 149 nº 3 do CIRS, na redacção dada pelo DL nº 198/2001, de 3.7, são excepção a essa regra devendo ser feitas por carta registada, o mesmo sucedendo, a partir de 1.1.2005, data da entrada em vigor da Lei nº 55-B/2004, de 30,12, com essas e todas as notificações de liquidações que resultem de declarações dos contribuintes ou de correcções à matéria tributável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição como refere Jorge Lopes de Sousa na anotação 3 ao art. 38, a págs. 345 e 346 in CPPT anotado e comentado 2006, I Volume. Mais aí se refere que relativamente às notificações de alterações à matéria colectável se trata também de actos susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes, pois condicionam o ulterior acto de liquidação, pelo que terão de ser efectuadas através de carta registada com aviso de recepção, como, aliás, está expressamente previsto no nº 2 do art. 149º do CIRS (por remissão para o art. 66 nº 1) e esta notificação da matéria colectável não dispensa a ulterior notificação do acto de liquidação que vier a ser efectuado, também através de carta registada com aviso de recepção (cfr. neste sentido o ac. do STA de 15J 1.2000 no rec. 25233), excepto as relativas a correcções à matéria tributável que foram objecto de notificação para efeitos do direito de audição", sublinhado nosso).
15) Na mesma senda, o acórdão do STA, proferido em 14/02/2013, no âmbito do processo n.º 0.1137/12, tem o seguinte entendimento:
"A regra no domínio das notificações relativas a IRS é que estas sejam efectuadas por mera carta registada (cfr. o n.º 3 do artigo 149.º do CIRS), apenas se efectuando através de carta registada com aviso de recepção as notificações a que se refere o artigo 66.º (do CIRS), ou seja, as notificações referentes a actos de fixação ou alteração da matéria tributável do imposto previsto no artigo 65º daquele Código.
Tratando-se de uma liquidação adicional de IRS a forma a observar para a notificação da respectiva liquidação há-de ser a mesma que a lei estipula para o imposto a que respeita, ou seja, no caso, a forma legal de "carta registada".
Em conformidade com o disposto no art. 45º, nº l, da LGT, "O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro", sendo que nos impostos periódicos, o prazo se conta a partir do termo daquele em que tivesse ocorrido o facto tributário (nº 4).
Sobre a forma de notificação das liquidações em IRS, a regra geral é a de que as notificações por via postal devem ser feitas no domicilio fiscal do notificando, por carta registada, considerando-se a notificação efectuada no 3º dia posterior ao do registo ou no l º dia útil seguinte a esse, caso esse dia não seja dia útil".
16) Assim, e pelos factos supra expostos, afigura-se-nos que, a liquidação adicional de IRS do exercício de 2000, deverá ser mantida na esfera jurídica da Recorrida.

X
A fls. 238/246, os recorridos proferiram contra-alegações, pugnando pela manutenção do julgado.
Formulam as conclusões seguintes:
1) O Recorrido marido adquiriu, por auto de arrematação datado de 23.02.1988 decorrente do processo de execução fiscal n.21231/1982 e apensos, instaurado na Repartição de Finanças de ..., que beneficiaram de isenção nos termos do artigo 11º, n.º3 do CIMSISSD.
2) Destino diferente acabaria por lhes ser atribuído, tendo sido afectados ao património individual dos Recorridos, nunca tendo sido objecto de inventariação final no âmbito da actividade comercial por si desenvolvida.
3) Neste âmbito, foi movida acção de inspecção ao Recorrido, através da Ordem de serviço n.º … de 30.06.2004, tendo o mesmo sido notificado para exercício do direito de audição em 05.07.2004 através do ofício nº 17387, direito de audição que seria efectivamente exercido em 16.07.2004 e tendo os Recorridos posteriormente sido notificados, por carta registada com aviso de recepção, das conclusões do Relatório de Inspecção tributária contendo correcções meramente aritméticas à matéria tributável, nomeadamente um acréscimo ao rendimento tributável no valor de €1.130.596,68.
4) Todavia, como se pode concluir da documentação junta aos autos, e como bem concluiu o Tribunal a quo, a AT nunca viria a notificar os Recorridos de qualquer liquidação adicional de IRS na sequência deste Relatório de Inspecção, notificando-os apenas de uma "Demonstração de Compensação" identificada com o nº … e de uma "Demonstração de Liquidação de Juros" identificada com o n.º….
5) A utilização da palavra "compensação" três vezes, todas em maiúsculas - "DEMONSTRAÇÃO DE COMPENSAÇÃO", "NR. COMPENSAÇÃO" e "DATA COMPENSAÇÃO" - e a realização de um desconto entre um crédito a favor dos Recorridos contra o Estado e uma quantia que surge no documento como um crédito do Estado não deixam qualquer margem para dúvidas quanto à natureza jurídica do acto administrativo notificado aos Recorridos por meio destes documentos.
6) Os Recorridos foram, assim, confrontados com uma compensação sem qualquer fundamentação e dada como facto consumado, sem terem sido notificados da liquidação que lhe terá dado origem e do respectivo prazo de pagamento voluntário.
7) É pacífico quer na doutrina, quer na jurisprudência, a compensação de dívidas de tributos por iniciativa da AT, regulada pelo artigo 89.º do CPPT, corresponde a um modo de cobrança coerciva das dívidas fiscais que pressupõe a existência de uma instância executiva, bem como o esgotamento de todas as possibilidades de impugnação administrativa e judicial do acto de liquidação e de oposição à execução que a lei concede ao executado.
8) Uma dívida tributária alvo de compensação deve obrigatoriamente ser certa, líquida e exigível, sendo que apenas assumirá essa natureza após a compleição de um processo de liquidação - que deve ser notificado nos termos do artigo 36.º do CPPT - e após o termo do respectivo prazo para pagamento voluntário.
9) No caso em apreço, não foram os Recorridos notificados de qualquer liquidação adicional de IRS, não existindo pois qualquer dívida certa, líquida e exigível passível de ser compensada, nem tendo sido, consequentemente, fixado um prazo de pagamento voluntário da mesma, ou o prazo para o exercício das garantias ao seu dispor, não concordando - como não concordam - com o imposto apurado.
10) A realização de uma compensação nestas condições viola flagrantemente os requisitos do artigo 89.º do CPPT, sendo manifestamente ilegal por violação de lei.
11) Procura, ainda assim, a RFP dar uma dupla função à nota de compensação notificada aos Recorridos, tentando atribuir-lhe também a funcionalidade de notificação de liquidação adicional de IRS.
12) Ora, nos termos Acórdão do Tribunal Constitucional n.º72/09, de 11 de Fevereiro de 2009, processo nº 916/07, disponível em www.tribunalconstitucional.pt. decidiu-se "Julgar inconstitucional, por violação do artigo 268.º, n.º 3 e n.º 4 da Constituição da República, a norma contida no artigo 63.º do Código de Processo Tributário, quando interpretada no sentido de que uma declaração que não comunique de forma autónoma e individualizada o acto notificando, tornando excessivamente oneroso o acesso à justiça administrativa, deve, ainda assim, ser configurada como notificação" (sublinhado nosso), sendo que o artigo mencionado é repetido ipsis verbis no actual Código de Procedimento e Processo Tributário, no seu artigo 35º, mantendo-se desta forma não só a norma como a sua ratio legis, e assim, de igual modo, a valia e pertinência desta declaração de inconstitucionalidade.
13) Deste modo, mantem-se que os Recorridos nunca foram notificados de qualquer liquidação adicional de IRS relativa ao ano 2000.
14) Sendo que tal notificação deveria sempre ser realizada de forma autónoma e individualizada, nunca podendo a AT considerar que através de uma nota de compensação possa estar a notificar um contribuinte tanto da própria compensação, como de uma liquidação adicional de IRS, sob pena de inconstitucionalidade por afronta ao artigo 268.º nº 3 e n.º 4 da CRP.
15) Argumenta ainda a RFP que se deve ter como sanada a falta de liquidação ou a sua imperfeição mediante o não recurso, pelos Recorridos, ao artigo 37.º do CPPT, o que não procede de maneira alguma.
16) Se é certo que este dispositivo legal prevê uma faculdade a favor dos sujeitos passivos notificados por forma a obterem, em caso de omissão, a fundamentação legalmente exigida, a indicação dos meios de reacção contra o acto notificado e outros requisitos legalmente previstos para esse acto mediante norma tributária, nunca poderá o mesmo ser transformado num expediente para relevar as omissões da AT.
17) Sendo que, no caso apreço, não estão os Recorridos perante uma notificação deficiente ou insuficiente de liquidação adicional de IRS, face à qual estes devessem lançar mão do mecanismo do artigo 37.º do CPPT de forma a poder exercer, de forma esclarecida, o seu direito de impugnação, mas perante uma situação em que a AT pura e simplesmente não procedeu à notificação de qualquer liquidação adicional.
18) Não seria portanto possível, nem faria qualquer sentido, que os Recorridos recorressem ao mecanismo do artigo 37.º do CPPT para que lhes fosse fixado um prazo de pagamento voluntário de uma liquidação que nunca lhes foi sequer notificada, quando ainda para mais a respectiva "dívida" já se lhes estava a ser cobrada coercivamente através de compensação de créditos por iniciativa da AT ilegal que, esta sim, lhes foi notificada.
19) De qualquer forma, ainda que os Recorridos de alguma forma lançassem mão deste mecanismo, seriam sempre notificados da liquidação adicional em falta após o decurso do respectivo prazo de caducidade.
20) O direito à liquidação do imposto caduca se a liquidação não for notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos contados, no caso de impostos periódicos, a partir do termo do ano em que ocorreu o facto tributário, nos termos do artigo 45º da LGT.
21) A presente liquidação refere-se a IRS do ano de 2000, pelo que o prazo de caducidade do respectivo direito decorreu de 31.12.2000 a 31.12.2004. sem que tivesse ocorrido qualquer evento susceptível de o suspender nos termos do artigo 46.9 da LGT.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr. fls. 262/264 no qual termina pugnando por que se conceda provimento ao recurso.
Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão.
X
II- Fundamentação.
2.1.De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:
A) Por auto de arrematação datado de 23.02.1988, decorrente do processo de execução fiscal n.º … e apensos, instaurado na Repartição de Finanças de ..., M... um prédio urbano sito em ..., Freguesia do ..., concelho de ... descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 822, inscrito na matriz predial urbana, sob os artigos 3695, 4270 e 4271 e um prédio misto sito no Bairro da ..., Freguesia do ..., concelho de ... descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 823, inscrito na matriz predial urbana, sob os artigos 4272, 4273 e 4274 e parte rústica inscrita na matriz predial rustica sob o artigo 24 da Secção C da mesma freguesia; (cfr. doc. 4 junto com a petição inicial)
B) Em 18.01.2000, os impugnantes na qualidade de vendedores, celebraram um contrato de Promessa de Compra e Venda e Acordo Extrajudicial com as empresas “A..., SA.”, “E..., Lda.”, e “T..., Lda.”, e ainda com H... e sua mulher M...;(cfr. doc. 9 junto com a petição inicial)
C) A celebração deste contrato tem a finalidade de vender à sociedades os imóveis descritos em A) e pôr termo à ação judicial que corria termos na 11.ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, proc.º …/8, da 2.ª Secção em relação ao terceiros outorgantes H... e sua mulher M...(cfr. doc. 9 junto com a petição inicial).
D) Em 12.09.2000 foi celebrada uma escritura de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca entre os impugnantes, como vendedores e, as sociedades G..., Lda., F... SA., como compradoras dos imóveis descritos, em A) (cfr. doc. 10 junto com a petição inicial).
E) Através do oficio n.º … de 17.02.2004, a Inspeção Tributária de Lisboa notificou os impugnantes para apresentar os documentos suporte relativos a contas correntes e respectivos registos que relevassem a contabilização dos proveitos, respeitantes à alienação dos imóveis acima identificados (cfr. doc. 13 junto com a PI).
F) Em 19.03.2004, o impugnante respondeu ao referido ofício, conforme documento 14, junto com a PI e que se dá por inteiramente reproduzido.
G) Através da Ordem de serviço n.º… de 30.06.2004, a inspeção tributária de Lisboa moveu uma ação de inspeção ao impugnante, cuja notificação para o exercício do direito de audição, com o projecto de correções, ocorreu em 05.07.2004, através do ofício n.º 17387(cfr. doc. 15 junto com a PI).
H) Em 16.07.2004 o impugnante deu entrada nos serviços de inspecção tributária da Direção de Finanças de Lisboa, do documento referente ao exercício do direito de audição, cujo teor se dá por reproduzido (cfr. doc. 16 junto com a PI).
I) Os impugnantes foram notificados das conclusões do Relatório da Inspeção tributária contendo as seguintes correções:
«(…) II - Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria colectável.
Da verificação tributária efectuada, constatamos que o sujeito passivo em causa, se encontra colectado pela actividade de MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA – CAE 70310, tendo auferido no exercício de 2000 rendimentos derivados da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis – Cat. C, cujo valor de realização foi de €1.263.027,52, referente à alienação do Prédio Urbano, sito em ..., ... inscrito na respectiva matriz sob os artigos nºs, 3695 e 4271 e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o II D, 43 459 e do prédio Misto, sito no Bairro da ..., freguesia do ..., Concelho de ..., inscrito na matriz sob Artigo nº. 24 – Secção C, e descrito na mesma Conservatória sob o Art.º, 40 415, conforme escritura lavrada no … CN LISBOA, em 12-09-2000 – não declarou o citado ganho na declaração de IRS de 2000. (ANEXO I)
De referir que estes imóveis foram adquiridos em auto de arrematação, datado de 23/02188 através da Repartição de Finanças do Concelho de ..., pelo valor de €132.430,84, conforme fotocópia do mesmo, constante do processo. (ANEXO II)
Os imóveis em causa encontravam-se sujeitos a SISA, mas beneficiaram de isenção nos termos do nº. 3 do Art. 11º do CIMSISSD.
O Contribuinte foi notificado pelo n/oficio n.º, … de 17/02/2004, para esclarecer a situação da alienação dos Imóveis, tendo vindo alegar que, embora a transacção tenha beneficiado de isenção de sisa, lhe deu destino diferente, afectando-o ao seu património individual.
Refere-se que no acto público da aquisição dos Imóveis o SP demonstrou pública intenção de o afectar à actividade, confirmada pela alegação de que exercia a actividade de compra e venda de imóveis, para beneficiar da isenção de sisa, ao abrigo do n.º 3 do art.º 11º, do citado Código.
Salienta-se ainda que tendo os imóveis sido adquiridos para revenda, se o Contribuinte os tivesse afectado ao seu património individual, deveria ter procedido ao pagamento da sisa, efectuando os respectivos registos contabilísticos, procedimentos que segundo o próprio contribuinte, não efectuou.
Assim, os rendimentos auferidos consubstanciam rendimentos da categoria C, nos termos da alínea 1) do n.º2 do artigo 4.º do CIRS e como tal são sujeitos à tributação em sede de IRS, de acordo com as regras estatuídas no IRC por remissão do art.º 31º do CIRS.
(…)
Conclusões/propostas
Pelo exposto, propomos que se proceda à correcção oficiosa do Anexo B 1 da Modelo 3, como a seguir se discrimina:

Ano de RealizaçãoValor de RealizaçãoAno de AquisiçãoValor de Aquisição
2000€1.263.027,521988€132.430,84

O que resulta um acréscimo ao valor do rendimento tributável de:

€ 1.263.027,52- €132.430,84 = €1.130.596,68
(…)
IV – Direito de Audição
(…)
2 - Em nosso entender e pelos motivos expostos no ponto II deste relatório, º facto tributário acima descrito, enquadra-se como rendimento da referida Categoria C, uma vez que o S.P. quer na data de aquisição do móvel (23/02 /88) quer na data da alienação do mesmo (12/09/2000) exerceu uma actividade conexa com a compra e venda de imóveis.
3 - O facto de não registar a aquisição do imóvel nos livros de escrituração atrás referidos, é uma omissão de valores e não uma declaração/intenção de afectar o bem para fins particulares, isto porque, voltamos a frisar, no momento de aquisição do imóvel, houve uma intenção, inequívoca, de o afectar à actividade, perfeitamente confirmada com o recurso ao disposto no n.º 3 do art.º 11º do CIMSISSD, normativo só aplicável a quem, exercendo a actividade de comprador de prédios para revenda, preten da revender o imóvel adquirido.
(…)»
(cfr. doc. 17 junto com a PI)

J) Na sequência da ação inspetiva, os impugnantes foram notificados de uma “Nota de Compensação”, para o pagamento de IRS de 2009, no montante de €538.738,75, com data limite de pagamento 15.12.2004 (cfr. doc. 1 junto com a PI).
K) Na sequência da ação inspetiva, os impugnantes foram notificados de uma “Nota de Demostração de Liquidação de Juros Compensatórios”, no montante de €89.860,45; (cfr. doc. 2 junto com a PI).
L) O impugnante cedeu a A..., o armazém do sítio de ... freguesia de ..., profissional de Industria Hoteleira, para realizar três festas de casamento com grande quantidade de pessoas (cfr. depoimento da testemunha A...).
M) Pela cedência do armazém o sr. M... nunca cobrou nada (cfr. depoimento unânime das testemunhas).
N) O Impugnante afetou o imóvel misto ao seu património individual e nunca à sua atividade comercial (cfr. depoimento da testemunha C...).
X
Em sede de fundamentação da decisão da matéria de facto, consignou-se:
«III.I – Factos não Provados
Não se provaram outros factos com relevância para a presente decisão.
MOTIVAÇÃO
A matéria de facto, dada como assente nos presentes autos, foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida, segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito e, a formação da convicção do tribunal, para efeitos da fundamentação dos factos, atrás dados como provados, está referida no probatório com remissão para as folhas do processo onde se encontram bem como da prova testemunhal produzida, em sede de inquirição das testemunhas arroladas pela impugnante.
Prova testemunhal:
A testemunha A..., profissional de Indústria Hoteleira, afirmou ao tribunal que o impugnante é seu cliente. Organizava festas desde 1976. Confirmou que o terreno sito em ..., freguesia do ... tinha instalações armazéns e que ali realizou umas três festas de casamento. Fornecia todos os materiais e coordenava tudo. Confirmou que cedeu ao Sr. M... os materiais para festa de fim de ano que não pode ser ele a fazer.
Afirmou ao tribunal que o Sr. M... não cobrava nada pelo armazém e que não se dedicava a organizar festas.
A testemunha J..., comerciante de indústria de carnes e amigo do impugnante, confirmou que foi à festa de casamento da sua sobrinha P..., e que nesse dia chovia dentro do armazém porque estava degradado.
Confirmou que o espectáculo com artista F... era para angariar receitas para o ....
Confirmou ainda que esteve presente numa festa de fim de ano de amigos em que o Sr. M... também estava. Afirmou que não ter conhecimento que o Sr. C... tenha cobrado qualquer importância.
Afirmou que o Sr. M... nunca cobrou nada quando cedia o pavilhão e que a sua atividade era vender carros da Mitsubishi.
Afirmou que foi a três ou quatro festas nesse armazém. Afirmou que se um amigo pedisse o armazém, o Sr. M... cedia o armazém.
Afirmou ainda que guardou palha para os seus animais, noutro armazém perto daquele onde se realizaram as festas, cerca de dois anos e que nunca viu efetuar qualquer obra. Confirmou que o armazém ficou muito degradado. Passava ali duas a três vezes por semana por que tem uma casa perto. Confirmou que foi ao casamento da sobrinha e de mais dois moços e ainda à festa do artista F.... Informou que na festa do casamento da sobrinha houve um vendaval e voaram uma série de chapas e depois deixou de se poder fazer alguma coisa porque ficou degradado.
A testemunha, F..., comerciante de carnes e amigo do impugnante, confirmou que fez o casamento da sua filha no pavilhão em 1992. Confirmou ao tribunal que esteve presente nos três casamentos que ali se realizaram, na festa do fim de ano e na festa do ….. Afirmou que o Sr. M... não cobrou nenhuma importância pelo armazém. Confirmou que ele e o irmão guardavam palha para o gado no armazém. Como não precisava das instalações o Sr. M... cedia-o aos amigos. No casamento da filha como chovia muito, tiveram de andar com as mesas de um lado para o outro. Confirmou que mora perto do lugar onde se situam os armazéns e que todos os fins-de- semana ia lá. Confirmou que nunca viu fazer obras nos armazéns e que nunca viu letreiros para venda.
A testemunha C..., auditor e Revisor Oficial de Contas, técnico oficial de contas de empresas do grupo ....... Afirmou que o Sr. M... nunca registou os imóveis no seu património nem nas suas obrigações declarativas em termos de contribuição Industrial. Nem no ano de aquisição nem até à presente data. Confirmou que o impugnante não afetou o imóvel misto, em causa nos autos, à sua actividade comercial mas sim ao seu património individual ao contrário de outros. Afirmou ao tribunal que inspeção tributária deixou caducar o direito de liquidação sisa que era o imposto devido pela mudança de intenção do impugnante em não entender ser o imóvel para revenda, tendo todos os elementos para o fazer. Confirmou que nas declarações de rendimentos não havia existências relativamente a 1988 e que o imóvel não foi registado na atividade do contribuinte.
As testemunhas revelaram nos seus depoimentos, sem grandes hesitações, conhecimento nas questões».
X
Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
O) Os serviços elaboraram a liquidação adicional de IRS de 2000, relativa aos impugnantes, no montante de €485.551,16, com o n.º … – fls. 99 do pat.
P) A demonstração da liquidação em causa consta de fls. 91/99, do pat.
Q) A liquidação referida no número anterior não foi notificada aos contribuintes.
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2.2. De Direito
2.2.1. Nos presentes autos, vem sindicada da sentença proferida a fls. 190/208, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra a “demonstração de compensação” e a “demonstração de liquidação de juros”, relativa a IRS de 2000.
2.2.2. A presente intenção rescisória centra-se sobre o alegado erro de julgamento em que terá incorrido a sentença recorrida, ao considerar que o imposto liquidado nos autos mostra-se caduco, porquanto não há prova de que o acto tributário tenha sido notificado aos contribuintes. Por seu turno, a recorrente sustenta que a liquidação em apreço constitui o desfecho de um procedimento inspectivo, que o acto tributário foi objecto de comunicação através da demonstração de compensação, referida na alínea J) do probatório e que os impugnantes podiam ter lançado mão do mecanismo previsto no preceito do artigo 37.º do CPPT, sendo tal omissão imputável aos interessados.
2.2.3. Para julgar procedente a impugnação, a sentença recorrida estruturou a argumentação seguinte:
«No decorrer normal do procedimento inspectivo e tributário, das correções efetuadas, resulta naturalmente uma liquidação adicional de IRS referente ao ano em análise que, no caso em análise era referente a 2009.
Porém, dos autos não consta o documento oficial da demonstração da liquidação adicional, referente ao IRS de 2009, onde é obrigatoriamente aposta a informação, dos valores que levaram ao apuramento do imposto, o prazo de pagamento voluntário, as garantias dos contribuintes e o prazo para o seu exercício.
Também não consta dos autos qualquer registo ou aviso de receção, assinado pelos impugnantes, referente à receção da notificação da liquidação.
Dos documentos constantes dos autos, a alegada liquidação adicional é identificada na “Demostração de Compensação” com o n.º e no print do sistema informático da DGCI/IRSLQMA1 de 06.05.2005, a fls. 99, processo administrativo e referido no ponto 80 da contestação com o n.º , datada de 28.10.2004.
Ou seja, o tribunal fica sem saber qual o verdadeiro número da liquidação que legalmente deveria ter sido notificada aos impugnantes.
Não consta igualmente dos autos que a notificação da liquidação adicional tenha sido efetuada pessoalmente, nos termos do citado preceito do n.º 5 do art.º 38 do CPPT.
Neste desiderato, tendo em conta que os impugnantes não conseguem fazer a prova negativa da não notificação da liquidação em causa, cabia à AT provar que o ato tributário se tornou eficaz antes de decorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação (facto impeditivo ou modificativo do direito do autor)».
2.2.4. Antes de mais, impõe-se rectificar as referências ao IRS de 2009, que constam da sentença recorrida (1) , as quais resultam de lapso material, porquanto está em causa liquidação adicional de IRS de 2000.
As questões que se suscitam nos autos consistem em saber se a liquidação em exame foi objecto de notificação aos contribuintes, validamente efectuada (i); se a eventual omissão de notificação do acto tributário podia ter sido suprida através do mecanismo do artigo 37.º do CPPT (ii); se decorreu o prazo de caducidade do direito à liquidação do imposto em causa nos autos, sem que o acto de liquidação tenha sido notificado (iii).
2.2.5. Estatui o preceito do artigo 36.º/1, do CPPT, que «[o]s actos em matéria tributária que afectem direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados.». O seu n.º 2 estabelece que as notificações devem conter «sempre a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o acto notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se fez no uso de delegação ou subdelegação de competências». Por seu turno, o artigo 77.º/6, da LGT, determina que a eficácia da decisão depende da notificação. No mesmo sentido depõe o disposto no artigo 114.º/2, do CPA.
A propósito do acto de notificação, cabe referir que «[o] direito à notificação faz recair sobre a Administração o dever de promover oficiosamente a comunicação do acto administrativo aos interessados, através da emissão de um acto formalmente dirigido à produção desse efeito» (2). «O acto de notificação, sendo uma formalidade exterior, instrumental e posterior (complementar) ao acto praticado, mas também requisito de eficácia deste (artigos 132.º, n.º 1, do CPA e 77.º, n.º 6, da LGT), tem como escopo, transmitir o conhecimento ao contribuinte de que foi praticado um acto em matéria tributária susceptível de afectar a sua esfera jurídico-patrimonial e os seus fundamentos, assim como facultar-lhe o exercício dos meios de defesa que a lei lhe propicia» (3). «A notificação, sendo exterior e posterior ao acto praticado, mas também requisito de eficácia deste, visa, por um lado, dar a conhecer ao contribuinte que foi praticado um acto em matéria tributária que afecta a sua esfera jurídica (anunciando-lhe a obrigatoriedade de realização do pagamento do imposto apurado, quando se trate de um acto de liquidação de imposto), por outro, propiciar-lhe o exercício dos meios de defesa que a lei lhe faculta. Por isso, a exigência de indicação na notificação do autor do acto e da qualidade em que decidiu, dos meios de defesa e do prazo para reagir, para além da decisão e seus fundamentos» (4). A notificação do acto tributário constitui um direito constitucional do contribuinte (artigo 268.º/3, da CRP), cuja verificação é condição do exercício do direito à tutela judicial efectiva através da reacção contenciosa ao acto tributário questionado.
No caso, conforme resulta do probatório e do ponto 80 da contestação, não houve lugar a acto de notificação do acto tributário em exame nos autos, tendo apenas ocorrido a comunicação ao contribuinte dos ofícios elevados às alíneas J) e K), do probatório, os quais não operam como notificação do acto de liquidação, por serem omissos quantos aos elementos essenciais, referidos no artigo 36.º/2, do CPPT. Ou seja, do probatório resulta que apenas foi notificada aos contribuintes a demonstração de compensação operada na sequência da liquidação em causa nos autos, pelo que a comunicação do teor e fundamentos do acto tributário em apreço nos mesmos não foi observada.
A alegação da recorrente não logra reverter a presente asserção. Não cabe ao contribuinte “reconstruir” o acto tributário em exame a partir dos dados colhidos através das comunicações efectuadas no âmbito do procedimento inspectivo, conjugados com os elementos resultantes do “documento de compensação”. A asserção segundo a qual, «[o] documento de compensação para além deste título, investe os SP, ora impugnantes, na obrigação de efectuar o pagamento da dívida tributária – art.º 31.º da LGT – estabelecendo uma data limite de pagamento – sobre a qual foi contado o prazo para apresentar a presente impugnação; de um saldo a pagar, o qual foi apurado tendo em conta os montantes já pagos resultantes de liquidações anteriores que haviam sido efectuadas para o mesmo exercício» (5), não se oferece procedente. É que, sendo a compensação forma de extinção da dívida, antes da prática do acto administrativo que a determina, cumpre observar o prazo de pagamento voluntário da dívida apurada, bem como o prazo para reagir contenciosamente à liquidação em causa (artigo 89.º do CPPT). Para além de que os elementos que integram a comunicação de demonstração de compensação não correspondem aos elementos que caracterizam o acto de liquidação em exame nos autos. Ou seja, falta no caso a concretização do acto de liquidação em apreço, os motivos que o suportam, a indicação do prazo de pagamento voluntário, a indicação do seu autor e a indicação dos meios de reacção (graciosa e contenciosa). Pelo que não houve lugar a efectiva notificação do acto de liquidação em causa nos autos. Como se conclui na sentença recorrida.
Ao julgar no sentido referido, a sentença não enferma de erro, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.6. A argumentação segundo a qual a omissão dos requisitos da notificação podia ter sido suprida através do mecanismo previsto no artigo 37.º do CPPT não se afigura que proceda.
Recorde-se o teor do preceito do artigo 37.º/1, do CPPT: «Se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a fundamentação legalmente exigida, a indicação dos meios de reacção contra o acto notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento».
Com a invocação do preceito em referência, a recorrente pretende convocar o regime da sanação da notificação irregular. A este propósito, recorde-se o preceito do artigo 39.º/12, do CPPT, cujo teor é o seguinte: «O acto de notificação será nulo no caso de falta de indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data». Fora dos casos identificados no preceito, a notificação irregular seria sanável.
Conjugando os preceitos dos artigos 37.º/1 e 2 e 39.º/12, do CPPT, em presença, dir-se-á que «o facto de não se exigir, para a regularização da situação gerada com a notificação irregular, a realização de uma nova notificação substituindo a anterior, mas “apenas a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha”, aponta no sentido de se ter pretendido que se mantenham os efeitos produzidos pela notificação dos elementos não omitidos, pois não se impõe que eles sejam comunicados novamente. À mesma conclusão conduz o facto de, se não for pedida, no prazo legal, a comunicação dos requisitos omitidos, a notificação produzir todos os seus efeitos, como se os contivesse, o que implica que se se considere sanada a irregularidade da notificação» (6).
Sucede, porém, que tal regime não é de aplicar aos casos em que, como sucede no litígio sub judice, não ocorreu efectiva comunicação do acto de liquidação, pelo que não existe acto de comunicação ou de notificação do acto tributário, com requisitos omitidos, susceptível de ser sanado, através dos mecanismos legais em apreço.
Donde se impõe concluir no sentido do carácter infundado da presente linha de argumentação.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.7. Resta aferir se a sentença decidiu, de forma correcta, no que respeita ao exaurimento do prazo de caducidade do direito à liquidação.
Considerando o disposto no artigo 45.º/1, da LGT, impõe-se concluir no sentido de que a falta de notificação do acto tributário em apreço (liquidação adicional de IRS de 2000) determina a caducidade do direito à liquidação do tributo subjacente aos autos, o que constitui vício que inquina o acto tributário no seu todo.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não enferma do erro que lhe é apontado, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.

DISPOSITIVO
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)


(Cristina Flora - 1º. Adjunto)



(Ana Pinhol - 2º. Adjunto)


(1)Seja na fundamentação de facto, seja na fundamentação jurídica.

(2) Paulo Marques e Carlos Costa, A liquidação de imposto e a sua fundamentação, Coimbra Editora, 2013, p. 164.

(3) Paulo Marques e Carlos Costa, A liquidação de imposto e a sua fundamentação, … cit. pp. 164/165.

(4) Isabel Marques da Silvam apud Paulo Marques e Carlos Costa, A liquidação de imposto e a sua fundamentação, … cit. p. 165.

(5) Ponto 109º da contestação.

(6) Jorge Lopes de Sousa, CPP; anotado, Vol. I. 6.ª Ed., p. 358.