Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:428/12.3BEALM
Secção:CA
Data do Acordão:01/21/2021
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:PROCESSO DISCIPLINAR;
VIOLAÇÃO DAS NORMAS ÉTICAS E DEONTOLÓGICAS DO ADVOGADO;
ARTIGO 91.º DO EOA.
Sumário:I. O quadro normativo aplicável aos Advogados, previsto no seu respetivo Estatuto, consagra no seu artigo 91.º o dever de comunicação, à luz da Lei n.º 15/2005, de 26/01.

II. Apurando-se que a ora Recorrente não dirigiu qualquer comunicação à advogada autora da ação, não a informando quer da apresentação da contestação, quer da dedução do pedido reconvencional, está verificada a prática da infração disciplinar por violação do artigo 91.º do EOA.

III. Essa comunicação não se pode ter por realizada em consequência da comunicação a um outro advogado, informando-o de que contra ele seria deduzido o incidente de intervenção provocada, ainda que esse advogado seja colega de escritório da advogada e de tais advogados serem casados entre si.

IV. A comunicação é pessoal e não feita por interposta pessoa, pelo que, qualquer comunicação feita a um certo advogado só produz efeitos em relação a ele e não em relação a qualquer outro, de modo que a comunicação dirigida ao advogado colega de escritório e marido da participante não a informa que vai ser apresentada contestação e, menos ainda, de nela ir ser deduzido pedido reconvencional.

V. Tanto mais, por a reconvenção consistir num contra-pedido ou numa contra-ação que o réu deduz contra o autor, de forma a que, a partir desse momento, a primitiva instância processual deu lugar a pedidos ou ações cruzadas entre os respetivos sujeitos processuais.

VI. O artigo 91.º do EOA tem aplicação ao advogado não apenas quando atue como advogado do autor, mas também quando atue como advogado do réu, visto o preceito legal abranger toda e qualquer diligência judicial promovida pelo advogado contra outro advogado ou magistrado.

VII. A norma do artigo 91.º do EOA adota uma formulação suficiente abrangente para incluir no dever de comunicação prévia entre advogados qualquer procedimento judicial ou de qualquer outra natureza e qualquer diligência judicial promovida contra outro advogado, sem introduzir quaisquer diferenciações.

VIII. Por princípio, no âmbito do processo disciplinar não pode, em regra, o juiz sindicar a medida da pena, salvo nos casos de erro grosseiro ou clara violação do princípio da proporcionalidade.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – RELATÓRIO

E......., devidamente identificada nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datada de 07/06/2018, que no âmbito da ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo, instaurada contra a Ordem dos Advogados, julgou a ação improcedente, mantendo o acórdão do Conselho Superior, de aplicação da pena disciplinar de censura.


*

Formula a aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem:

“A. A aqui Recorrente informou a Participante do Processo Disciplinar, que iria contestar ação de honorários, proposta pela referida Participante, contra o ex-marido da sua filha, o Senhor N........

B. A Advogada do Senhor N......., desde 2005, sempre foi a Dra. E......., aqui A./Recorrente (a este propósito rememore-se o ponto oito dos factos provados do Acórdão do Conselho Superior da R. e ainda a tabela inserta no articulado da A. de 2012/11/26, item n.º 11, que aqui se dá por integralmente reproduzido) e portanto, se a Participante, Dra. M......., intenta ação contra o Senhor N......., seguramente, seria a sua Advogada, Dra. E......., quem poderia deduzir Contestação.

C. Acresce a isto o facto de, em 2006/01/24, a A. ter dirigido fax para o escritório da Participante, Dra. M......., relativamente à ação de honorários, informando que iria contestar a ação de honorários e requerer a intervenção principal do Exmo. Sr. Dr. J.......

D. Destes dois factos, não controvertidos nestes autos, forçoso é concluir, até pelas regras de experiência comum, que a Dra. M....... sabia que a A. ia contestar a ação de honorários que aquela interpusera.

E. Destarte, a A./Recorrente cumpriu assim o dever previsto no art.º 91º. do E.O.A., estando completamente salvaguardados os deveres que a ratio do artigo prevê com o envio da comunicação remetida em 24.01.2006 para o escritório da participante: “deveres de solidariedade, cordialidade, urbanidade e honorabilidade”, assim como a possibilidade de trocar esclarecimentos e explicações…” (cfr. pág. 29 do acórdão do Conselho de Deontologia do Conselho Distrital de Évora da Ordem dos Advogados).

F. Sem conceder quanto ao supra exposto e mesmo que se entendesse que a Participante do processo disciplinar não foi notificada previamente, o que não se aceita, mas que à cautela se verte, necessário se torna salientar que, em sede de contestação, não há lugar ao cumprimento do disposto neste artigo.

G. A obrigação decorrente do art.º 91º. dos E.O.A. não abrange o caso da subscrição de um articulado de contestação, mas apenas o acto de iniciativa judicial. Ora, neste caso, a acção estava já proposta e proposta pela Participante.

H. Na verdade, a interpretação operada pela R. do art.º 91.º do EOA, no sentido adoptado, quando confrontada com o princípio da subsidiariedade (ou princípio da máxima restrição das penas) e princípio da proporcionalidade, bem como com o respeito, em geral, pelos direitos, liberdades e garantias, que a Constituição da República consagra, mostra-se inconstitucional, ultrapassando os limites imanentes consagrados no n.º 2 do art.º 18.º da CRP.

I. Deverá ser declarada, por esta razão, a Inconstitucionalidade Material do art.º 91.º do EOA, quando interpretado no sentido de abarcar o dever de comunicação, no caso específico da dedução de Contestação, por violação dos princípios supra elencados, questão que expressamente se coloca à consideração deste Tribunal, solicitando-se a sua pronúncia, até para efeitos do art.º 70.º da Lei do Tribunal Constitucional.

J. Paralelamente, refira-se que o art.º 110.º do EOA apenas considera como infração disciplinar a ação ou omissão dolosa ou culposa, salientando-se que estamos perante um caso em que se operou uma mudança legislativa, com a entrada em vigor do novo EOA, em 2005.

K. Dos autos, nada permite concluir, com segurança (ou até mesmo indiciariamente), que a A./Recorrente agiu de forma dolosa ou com culpa, o que sai reforçado pelo facto de em causa estar uma omissão, cujos requisitos para a verificação de responsabilidade disciplinar, são mais exigentes.

L. Desta forma, inexistindo quaisquer factos que evidenciem a existência do elemento volitivo pela aqui A. (lembre-se que a A. até avisou o colega de escritório (e marido) daquela, de que iria contestar e nessa contestação suscitar a intervenção deste último.

M. Salvo superior entendimento, a conclusão plasmada pela R., no acto administrativo aqui impugnado, acerca da alegada culpa da A., excede claramente os limites do art.º 351.º do Código Civil – regras de experiência comum – já que não será da exposição e debate argumentativo em sede de peças processuais que se aquilatará do íntimo da A., mormente do seu processo mental no cumprimento ou não do dever consagrado no art.º 91.º do EOA

N. A sustentar-se o contrário, no respeito pelo princípio da estrutura acusatória, também ele aplicável em sede de processo disciplinar, caberia à R. demonstrar tal intuito doloso, tal intenção “propositada” de violação do dever deontológico, o que não logrou fazer.

O. Não é verdade que a A. tenha, intencionalmente, querido omitir o cumprimento do dever do art.º 91.º do EOA.

P. Este facto, que constitui o fulcro da decisão, foi dado como provado ao arrepio das mais elementares regras de prova, maxime dos limites em que é admissível recorrer a presunções, conforme ao disposto nos artigos 349.º e 351.º do Código Civil.

Q. Como tal, o douto acórdão impugnado aplicou erradamente a lei, violando aqueles preceitos e o disposto nos artigos 110.º do EOA e 13.º a 15.º do Código Penal (ex vi art.º 121.º do EOA), já que, falhando na atuação da A. os momentos representativo e volitivo relativamente ao resultado que consubstanciará a ofensa, não poderá ela, caso se entenda que essas suas condutas são objetivamente violadoras de deveres impostos por normas do Estatuto da Ordem dos Advogados, ser atribuída, senão a título de negligência.

R. Dispõe o artigo 135.º do Código do Procedimento Administrativo que «são anuláveis os atos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção».

S. Ao concluir-se pela conduta dolosa da A., sem apoio fáctico que o legitimasse, violou aquelas normas, em conexão com os preceitos dos artigos 91.º, 110.º, 126.º, 127.º e 128.º do EOA, em que fundamentou a punição cominada ao autor

T. Subsidiariamente, caso feneça a tese ora sustentada, o que apenas se ressalva por imperioso dever de patrocínio e sob pena de preclusão de tal direito, deverá ser aplicada a figura de dispensa de pena, ao abrigo do disposto no art.º 121.º, alínea a) e art.º 74.º do Código Penal.

U. Ora, no caso sub judicio, a ilicitude e culpa, a existirem, são bastante diminutas, o dano não ocorreu (e portanto nem tampouco se deverá aquilatar deste requisito e, mesmo que se admitisse o contrário, o dano foi reparado, até porque a Advogada Participante soube, ab initio, mesmo antes da notificação judicial da Contestação, que iria ser a aqui A. a patrocinar o ali R. Senhor N.......) e, por fim, à dispensa da pena não se opõem razões de prevenção, porquanto este tipo de ilícito disciplinar não teve qualquer repercussão, nem tampouco se trata de infracção frequente

V. Caso este Tribunal entenda não aplicar a figura da dispensa da pena, sempre deverá ser reconsiderada a dosimetria da medida concreta da pena, porquanto, mesmo considerando cometida infracção ao art.º 91.º do EOA (hipótese que se coloca, reforce-se, por mero dever deontológico), a pena aplicada é desproporcional, considerando os critérios previstos no n.º 1 do art.º 126.º do EOA.

W. A A./Recorrente nunca foi alvo de uma sanção disciplinar, por mais leve que fosse.

X. A sua culpa, a admitir-se a tese da R. (o que se faz por mera cautela de patrocínio judiciário), é bastante diminuta, tampouco tendo representado a violação do art.º 91.º do EOA e as consequências da infração foram nulas, porquanto a Advogada Participante tomou conhecimento de que a aqui A. iria contestar a ação judicial interposta, já que disso deu nota ao marido da Participante, também ele advogado.

Y. Há ainda a considerar todas as circunstâncias atenuantes nesta matéria, como a conduta mantida desde sempre no processo disciplinar, fiel à verdade e não procurando obstaculizar a descoberta da verdade material, colaborando, inclusive, com a R. e nunca procurado de alguma forma demonstrar que afinal dirigiu, diretamente, à Advogada Participante a comunicação em causa.

Z. Por tudo isto, mostra-se manifestamente desproporcional a aplicação da pena de censura.

AA. Em bom rigor, estamos na presença de uma falta leve no exercício da profissão de Advogado, que não teve quaisquer consequências nefastas, que deve implicar apenas uma advertência para que não se repita, como aliás se cuida de referenciar no art.º 126.º, n.º 2 do EOA.

BB. Note-se que a escolha da pena de censura implica, nos termos do art.º 11.º, n.º 1 do EOA, a impossibilidade da aqui A. poder ser eleita ou designada para qualquer órgão da Ordem dos Advogados, o que redunda na cumulação com uma verdadeira pena acessória, coartando a A./Recorrente de poder ser eleita ou designada para o desempenho de funções de dirigente, junto da Ordem dos Advogados, o que denota a desproporcionalidade e excesso da pena de censura.

CC. Deverá este douto Tribunal declarar a prescrição do procedimento disciplinar movido pela R. contra a A., ora Recorrente, com as devidas e legais consequências.

DD. Verificou-se a prescrição do procedimento disciplinar na data de 06 de Junho de 2014.

EE. Outra forma de contagem do prazo prescricional seria simplesmente considerar se o prazo de um ano e meio de suspensão da prescrição e o prazo máximo de prescrição (no qual se incluem causa de interrupção) de sete anos e meio (art.º 117.º, n.º 5 do EOA).

FF. Datando o alegado facto ilícito de 24/01/2006 e somando nove anos, teremos que a prescrição ocorreu no dia 24 de Janeiro de 2015.

GG. Neste contexto, deverá este Tribunal declarar a prescrição do procedimento disciplinar movido pela R. contra a A., ora Recorrente, com as devidas e legais consequências.”.

Pede que o recurso seja julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida e julgando-se em substituição, ser anulado o acórdão do Conselho Superior da Ré, no sentido da absolvição da Autora da violação disciplinar de que foi condenada ou, subsidiariamente, revogar a pena de censura aplicada, substituindo-a pela pena de advertência e, deverá ser declarada a prescrição do procedimento disciplinar.


*

A ora Recorrida, notificada da admissão do recurso, apresentou contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

“A. A Recorrente não impugna a decisão da matéria de facto constante na sentença, pelo que, a apreciação do recurso, com a consequente aplicação do Direito, terá de ser feita de acordo com a matéria de facto dada como provada na sentença.

B. O dever específico de comunicação previsto no artigo 91.º do EOA 2005 não foi cumprido pela Recorrente em relação à Dr.ª M........

C. Tal dever, imposto pelo artigo 91.º do EOA 2005 (Decreto-Lei n.º 15/2005, de 26 de janeiro), é aplicável tanto no caso do advogado representar a parte activa, que vai instaurar um processo ou procedimento contra advogado, como no caso de representar a parte passiva, contestando ou respondendo a um procedimento instaurado por advogado, nem sequer existindo qualquer dúvida quando na contestação é deduzido pedido reconvencional, como ocorreu no caso em apreciação.

D. Em face da expressão «antes de intervir», as dúvidas que existiam quanto à interpretação do artigo 88.º do EOA 2001 (Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de março com a redacção da Lei n.º 80/2001, de 20 de julho) ficaram resolvidas, passando o seu sentido a abarcar situações de comunicação em qualquer um dos casos, sendo que esse já era o entendimento adoptado pela maioria da jurisprudência.

E. E este é o entendimento que adopta a interpretação que melhor se adequa à finalidade do dever em causa, pois o elemento relevante está na intervenção e não no tipo de intervenção ou de iniciativa.

F. Aliás, nem o entendimento da jurisprudência invocada pela Recorrente abona a favor da sua actuação, pois no acórdão do Conselho Superior de 09/09/2003, proferido no âmbito do processo R-123/2002, entende-se que a dedução de reconvenção está abrangida no conceito de “promover diligências judiciais” e na contestação apresentada pela Recorrente foi deduzida reconvenção, pois esta formulou pedido de condenação da Sra. Dra. M....... no pagamento de uma indemnização por litigância de má fé.

G. A interpretação adoptada pela sentença recorrida e pelo acórdão impugnado nos autos não viola, por isso, os princípios da subsidiariedade e proporcionalidade, nem os direitos, liberdades e garantias, constitucionalmente consagrados, pelo que não é inconstitucional.

H. A Recorrente sabia e não podia ignorar que o seu comportamento era proibido e punido por lei, tendo agido livre, voluntária e conscientemente.

I. O entendimento errado ou alegado desconhecimento da Lei não justifica, nem afasta ou exclui a ilicitude do comportamento, maxime de um advogado.

J. Não se verifica a nulidade ou anulabilidade do acórdão do Conselho Superior da Recorrida, alegadamente por não se ter pronunciado ou decidido em sentido oposto ao acórdão do Conselho de Deontologia de Évora, inexistindo nos autos qualquer tipo de situação subsumível a excesso ou falta de pronúncia, uma vez que a Recorrente foi condenada a título de negligência, com base nos factos provados e de forma sustentada, não existindo, por isso, e em suma, qualquer aplicação errada ou violação de lei.

K. O grau de culpa, in casu, negligência, patenteado na conduta adoptada pela Recorrente e respectivas circunstâncias, revela uma atitude particularmente censurável de descuido ou leviandade, evidenciando uma irresponsabilidade e insensatez reprováveis num advogado.

L. Do balanço das circunstâncias atenuantes com o grau de culpa da Recorrente, das exigências de prevenção geral e especial e dos valores deontológicos em causa, é adequada e suficiente a pena de censura, de acordo com os artigos 26.º, 127.º e 128.º, do EOA 2005.

M. O termo do prazo de prescrição do procedimento disciplinar ocorre com a prolação da decisão do recurso hierárquico da decisão disciplinar, pelo que nem a situação de tempestividade de impugnação contenciosa nem a pendência de acção administrativa especial de impugnação do acto administrativo constituem fundamento de prescrição do procedimento disciplinar.

N. A prescrição do procedimento disciplinar não corre durante a pendência da respectiva acção de impugnação judicial (cfr. acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 27-01-2010, processo 0551/09, relator Jorge de Sousa e de 22-05-2015, processo 0471/15, relator São Pedro, disponíveis em www.dgsi.pt).

O. Pelo exposto, não se verifica a prescrição do procedimento disciplinar cuja decisão definitiva, proferida atempadamente, é objecto dos presentes autos.

P. Compulsado o teor da sentença recorrida constata-se que a mesma deu como provados os factos relevantes para a decisão da causa, de acordo com a prova documental junta, aplicando correctamente as normas jurídicas aos factos provados, de forma sustentada e fundamentada, não padecendo, por isso, e em suma, de qualquer vício.”.

Pede que o recurso seja julgado totalmente improcedente e seja mantida na íntegra a sentença recorrida, por não merecer qualquer reparo e ter interpretado e aplicado corretamente a lei.


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Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, foi emitido parecer no sentido da improcedência do recurso e da confirmação da sentença recorrida.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas pela Recorrente, resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de:

1. Erro de julgamento, em relação à interpretação do artigo 91.º do EOA, por ter sido comunicado que iria contestar a ação e tal preceito não se aplicar ao articulado da contestação, mas apenas ao ato de iniciativa judicial, estando a ação já proposta, não sendo violado qualquer dever, sob pena de inconstitucionalidade material, por violação do artigo 18.º, n.º 2 da CRP, em violação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade;

2. Erro de julgamento, em relação à interpretação e aplicação do artigo 110.º do EOA, por não se demonstrar a atuação dolosa ou com culpa, tanto mais por estar em causa uma omissão, cujos requisitos são mais exigentes, não se verificando os momentos representativo e volitivo relativamente ao resultado que constitui a ofensa, excedendo-se os limites do artigo 351.º do CC, em violação dos artigos 91.º, 110.º, 126.º, 127.º e 128.º do EOA;

3. Subsidiariamente, deve ser aplicada a dispensa da pena, ao abrigo dos artigos 121.º, a) e 74.º, do Código Penal, por a ilicitude e a culpa serem muito diminutas e o dano não ter ocorrido;

4. Se não for aplicada a dispensa da pena, erro de julgamento por violação do princípio da proporcionalidade, considerando os critérios previstos no artigo 126.º, n.º 1 do EOA, devendo aplicar-se a mera advertência, por estar em causa uma falta leve;

5. Erro de julgamento, por prescrição do procedimento disciplinar.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

A) Em 24/01/2006, a Autora, na qualidade de advogada de N......., apresentou contestação no processo n.º 9458/05.0TBSTB, que correu termos no Tribunal da Comarca de Setúbal, tendo deduzido incidente de intervenção provocada do Dr. J...... e, ainda, deduziu “reconvenção” contra M......., por ser

«…patente a má fé da A. ao intentar a presente ação, o que, nos termos dos arts. 456.º e 457.º do CPC, a obriga a indemnizar o R. no montante correspondente ao reembolso das despesas com o pleito e ao pagamento dos honorários da mandataria deste, indemnização essa a fixar segundo o prudente arbítrio do Tribunal, mas nunca inferior a € 3.250,00» (cfr. fls. 8 a 16 do PA);

B) Em 24/01/2006, a Autora remeteu ao Dr. J......, advogado, um fax com o seguinte teor:

«Exmo. Colega,

Serve o presente para, nos termos dos Estatutos da Ordem dos Advogados, comunicar que o M. Constituinte no âmbito de ação declarativa (“de honorários”) em que é R. e A. a Exa. Sra. Dra. M....... vai requerer a intervenção principal provocada de V. Exa., em virtude de procuração emitida a V. favor. O processo corre seus termos no 2.º Juízo Cível, sob o n.º 9458/05 do Tribunal Judicial de Setúbal.

Sem outro assunto de momento, apresento os meus melhores cumprimentos, A Colega Attª e Obgada.» (cfr. fls. 74 do PA);

C) Em 25/05/2006, a Advogada Dra. M....... apresentou participação contra a Autora «por violação dolosa dos deveres e princípios gerais consignados nos artigos do Estatuto da Ordem dos Advogados, designadamente os contidos nos artigos 84º, 90º, 91º, 106º, 107º, n.º 1, als. a) e d), 105º, n.º 1 e 110º» (cfr. fls. 1 a 6 do PA);

D) Em 06/06/2006, foi instaurado processo disciplinar contra a Autora, ao qual foi atribuído o n.º 101/D/2006 (cfr. fls. 19 do PA);

E) Em 03/12/2007, foi deduzida acusação no processo disciplinar n.º 101/D/2006, de cujo teor se extrai, nomeadamente, o seguinte:

«7. Os factos acima descritos nesta acusação apontam para a infração disciplinar pela violação do dever estipulado no Art 91, aplicável ex vi do Artº 110, ambos do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pela Lei 15/2005 de 26 de Janeiro, nos termos do qual deve o Advogado, antes de intervir em procedimento disciplinar, judicial ou de qualquer outra natureza contra um colega ou um magistrado, comunicar-lhes por escrito a sua intenção, apresentando as explicações que entenda necessárias, salvo tratando-se de procedimentos que tenham natureza secreta ou urgente.

8. Às infrações acima referidas são aplicáveis, em abstrato e em alternativa, as penas de advertência, censura, multa e suspensão, nos termos dos arts. 125º e 126º do atual EOA» (cfr. fls. 145 a 154 do PA);

F) Em 04/12/2007, o Conselho de Deontologia de Évora dirigiu à Autora o ofício n.º 011166, com talão de registo datado de 06/12/2012, pelo qual se comunica o despacho de acusação e o prazo de 20 dias para se pronunciar por escrito (cfr. fls. 155 do PA);

G) Em 07/01/2008, a Autora interpôs recurso do despacho de acusação (cfr. fls. 157 a 172 do PA);

H) Em 09/01/2008, a Autora apresentou a sua defesa por escrito (cfr. fls. 174 a 197 do PA);

I) Em 13/11/2008, foi elaborado o relatório final no processo disciplinar n.º 101/D/2006 (cfr. 237 a 267 do PA);

J) Em 13/11/2008, o Conselho de Deontologia da Ordem dos Advogados deliberou aplicar à Autora a pena de censura, pela prática da infração do dever estipulado no artigo 91.º do EOA, o que fez, nomeadamente, com os seguintes fundamentos:

«(…)

Relatado que está todo o expediente importa agora, após análise da prova constante dos autos, enunciar os factos com relevo para esta decisão:

1. Correu termos no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal uma ação declarativa de processo sumaríssimo, aí registado com o n.º 9458/05.0TBSTB, em que figura como Autora e Advogada em causa própria, a Srª Drª M......., participante nestes autos e Réu, o Sr. N.......

2. Na referida ação, a Sra. Advogada participante reclama o pagamento de despesas e honorários referentes a dois processos judicias em que a mesma, alegadamente, terá representado o ali Réu N......, que aparece naqueles autos patrocinado pela Sra. Advogada arguida.

3. No âmbito desse patrocínio, a Srª Advogada subscreveu e fez dar entrada, no dia 24 de Janeiro de 2006, ao articulado de contestação, junto aos autos a fls. 8 a 16.

4. Sem que antes tivesse comunicado ou apresentado qualquer explicação à Srª Advogada Participante.

5. Sabia a Srª Advogada e não podia ignorar que o seu comportamento era proibido e punido por lei.

6. Em tudo agiu a Srª Advogada livre, voluntária e conscientemente.

Mais se apurou que,

7. Em 24 de Janeiro de 2006, a Srª Advogada participada remeteu ao Sr. Dr. J......, fax comunicando que iria requerer a sua intervenção provocada no âmbito do processo 9458/05 do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Setúbal.

8. A Srª Advogada participada patrocina o Sr. N......, desde o ano de 2005 em processos judiciais (de divórcio e de regulação do poder paternal litigiosos), nos quais é parte a filha da Srª Advogada participante, representada pelo Sr. Dr. J.......


*

Enunciada que está toda a matéria com relevo para esta decisão, importa agora fazer o enquadramento jurídico da situação por confronto com as disposições do EOA, com vista a aferir da conformidade da conduta da Sr.ª Advogada com os deveres aí consagrados, analisando cada uma das questões suscitadas pela Srª Advogada participada.

Antes de mais e no que toca à apontada invalidade da acusação, desde já diremos que a mesma não padece de nenhum vício, obedecendo a todos os requisitos legais.

Ao contrário do que refere a Sr.ª Advogada, o despacho de acusação (constante de fls. 152 a 153) dos autos, encontra-se redigido de forma articulada, sendo composto por nove artigos, contendo a identificação completa da Sr.ª Advogada participada (nome completo e nome profissional), o número de cédula profissional, bem como, a referência ao seu domicilio profissional. Contém a descrição dos factos e a indicação das normas legais infringidas e o prazo para apresentação da defesa, tudo em conformidade com o disposto nas alíneas a), b), c) e d) do Art. 148 do EOA, pelo que não tem qualquer fundamento a matéria alegada pela arguida nos artºs 24 e 25 da sua defesa.

Quanto ao requerimento apresentado pela Srª Advogada a fls 203, apenas se dirá que a pretensão já tinha sido objeto de despacho de indeferimento, por se considerar a diligência manifestamente desnecessária para o apuramento dos factos da responsabilidade da arguida.

De facto, em causa nestes autos está a apreciação da conduta deontológica da Srª Advogada arguida e não, a conduta da Srª Advogada participante, pelo que nenhum relevo tem a questão de saber se a Srª Advogada participante ao apresentar participação disciplinar contra a Srª Advogada arguida lhe comunicou previamente o seu propósito.

Na verdade, o dever de comunicação prévio, plasmado no artigo 91.º do nosso EOA, visa tutelar interesses pessoais, do advogado ou magistrado a quem não tenha sido feita aquela comunicação. Assim, não tendo sido apresentada participação disciplinar pela Srª Advogada arguida contra a Sr.ª Advogada Participante, carece este Conselho de Deontologia de legitimidade para apreciar tal factualidade, a qual extravasa manifestamente o objeto destes autos.

Isto posto, cumpre agora apreciar a conduta da Srª Advogada face ao Estatuto da Ordem dos Advogados.

DA APRECIAÇÃO DA PROVA E QUALIFICAÇÃO DA CONDUTA

Nos termos do Artº 110 do Estatuto da Ordem dos Advogados, comete infração disciplinar o Advogado ou Advogado Estagiário que, por ação ou omissão, violar dolosa ou culposamente algum dos deveres consagrados no presente Estatuto, nos respetivos regulamentos e demais disposições legais aplicáveis.

A atuação culposa abrange tanto o dolo como a mera culpa.

Os factos anteriormente enunciados consubstanciam a prática de infração disciplinar pela violação do dever estipulado no Art. 91.º, aplicável ex vi do Art. 110, ambos do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pela Lei 15/2005 de 26 de Janeiro, nos termos do qual deve o Advogado, antes de intervir em procedimento disciplinar, judicial ou de qualquer outra natureza contra um colega ou um magistrado, comunicar-lhes por escrito a sua intenção, apresentando as explicações que entenda necessárias, salvo tratando-se de procedimentos que tenham natureza secreta ou urgente.

Com efeito, e conforme admitiu nestes autos, a Srª Advogada contestou a ação de honorários apresentada pela Colega participante, sem lhe apresentar qualquer explicação ou dar conhecimento prévio, em clara violação do citado preceito.

Na defesa que oportunamente deduziu nestes autos, referiu a Srª Advogada que não violou o citado preceito, porquanto o mesmo apenas obriga à referida comunicação nos casos de propositura de ação, e não nos casos de contestação.

Admite-se que até à nova formulação daquele dever com a alteração agora introduzida pelo Artº 91º do EOA (Lei 15/2005, de 26 de Janeiro), disposição em vigor ao tempo da prática dos factos, não era pacífica a questão de saber qual era a interpretação que melhor se ajustava ao conteúdo normativo do Artº 88 do EOA, sendo certo que, o entendimento maioritariamente sufragado na jurisprudência, ia interpretando extensivamente aquele normativo, no sentido de que a contestação se integrava no conceito de “promover quaisquer diligências judiciais contra outros advogados ou magistrados”, conforme referia aquele preceito.

Todavia, a atual redação da norma que contempla este dever termina com as dúvidas anteriormente existentes, passando a referir que: “O Advogado, antes de intervir em procedimento disciplinar, judicial ou de qualquer outra natureza contra colega deve comunicar-lhe por escrito a sua intenção…”. O que significa que independentemente da qualidade em que intervém, ou seja, quer intervenha como advogado do autor, propondo a ação, ou como advogado do Réu, contestando essa ação, deve o advogado dar cumprimento àquele dever. Neste sentido, veja-se Ac. Conselho Deontologia do Porto nº D64/2005 de 10 de Março, em que foi relator Augusto Cardoso.

Ora, no caso em apreço, não restam dúvidas que a Srª Advogada não cumpriu o mencionado dever.

O alegado desconhecimento deste dever, por parte da Srª Advogada, não justifica, nem afasta a ilicitude da sua conduta, podendo apenas relevar em sede de escolha e medida da pena, já que lhe é exigível o conhecimento das regras do Estatuto da Ordem dos Advogados.

Por outro lado, afigura-se-nos que o facto de a Srª Advogada ser mandatária do Réu noutras demandas, não dispensava o cumprimento deste dever, já que em nenhuma dessas demandas a Srª Advogada Participante figura como parte, ou sequer, como mandatária.

Sendo que a única relação de proximidade que tem com essas demandas, lhe advém do facto de ser mãe de uma das partes em litígio e esposa do mandatário. Ora, tal facto na nossa perspetiva não a desobriga do cumprimento deste dever.

Por outro lado, refira-se que os anteriores litígios em que a Srª Advogada foi mandatária, nenhuma relação ou conexão têm com a ação 9458/05.0TBSTB do 2º Juízo do Tribunal de Setúbal.

As primeiras demandas em que a Srª Advogada representou o seu cliente, são processos divórcio e de regulação do poder paternal. Esta última (processo 9458/05.0TBSTB) visa a cobrança de honorários.

Tratam-se de litígios substancialmente distintos. Pelo que se impunha o cumprimento do dever consagrado no Artº 91 do EOA.

É que a ratio deste preceito vai muito além do que refere a Srª Advogada.

Com efeito, salvaguardando deveres de solidariedade, cordialidade, urbanidade e honorabilidade, tem esta norma, não só a preocupação de prevenir o colega ou magistrado para o facto de poder vir a ser demandado em Tribunal, mas também a finalidade de lhe conferir a possibilidade de, trocar esclarecimentos e explicações, tendo em vista a resolução extrajudicial dos assuntos, de modo a evitar a exposição pública, que um pleito judicial acarreta, com consequências negativas ao nível da imagem e honorabilidade do colega ou magistrado.

Assim sendo, dúvidas não restam que deveria a Srª Advogada ter dado cumprimento ao dever de comunicação prévia.

Ao não atuar deste modo violou a Srª Advogada o dever preceituado no Artº 91 do EOA. Assim sendo, reunido em sessão, deliberou o Conselho de Deontologia, nos termos do Artº 155 do Estatuto da Ordem dos Advogados dar integralmente por provados os factos acima descritos, os quais consubstanciam a violação do dever estipulado no Art. 91, aplicável ex vi do Artº 110, ambos do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pela Lei 15/2005, de 26 de Janeiro.

DA ESCOLHA E MEDIDA DA PENA

Atendendo ao quadro descrito à infração acima referida é aplicável em abstrato e em alternativa as penas de advertência, censura, multa e suspensão, nos termos dos Artºs 125 e 126 do EOA aprovado pela Lei 15/2005 de 26 de Janeiro.

Na escolha e medida da pena levar-se-ão em consideração, os antecedentes profissionais e disciplinares da arguida, o grau de culpa, as consequências da infração e todas as demais circunstâncias atenuantes e agravantes previstas respetivamente nos Artºs 127 e 128 do EOA aprovado pela Lei 15/2005 de 26 de Janeiro.

A Srª Drª E....... encontra-se inscrita na Ordem dos Advogados desde 21/02/1991. No seu registo disciplinar não se encontra registada a prática de infração disciplinar. Confessou que não comunicou previamente à colega que iria contestar a ação.

Agiu negligentemente, pois não podia ignorar a existência de tal dever de comunicação.

Como circunstâncias atenuantes, importa pois considerar aquelas que vêm previstas na alínea a) e b) do Artº 127 do EOA.

Não há circunstâncias agravantes a considerar.

Tal como em direito penal, também aqui a medida da pena corresponderá à medida da necessidade de proteção ou tutela dos bens jurídicos no caso concreto.

Pelo que também o critério da prevenção geral positiva ou de reintegração (aqui entendida a nível da interiorização dos valores primordiais da Advocacia) e de prevenção especial irão delinear a medida da pena. Sendo certo, porém, que nunca a medida da pena superará o grau de culpa no caso concreto.

Atendendo ao que ficou dito, às exigências de prevenção geral e especial sobreditas, considerar-se que é suficiente e adequada, a pena de censura.

Assim, deliberou o Conselho de Deontologia aplicar à arguida a pena de censura.» (cfr. fls. 268 a 300 do PA);

K) Em 23/12/2008, o Conselho de Deontologia de Évora dirigiu à Autora o ofício 016321, pelo qual se comunica o acórdão proferido no processo disciplinar n.º 101/D/2006 (cfr. fls. 302 do PA);

L) Em 15/01/2009, a Autora interpôs recurso para o Conselho Superior da Ordem dos Advogados do acórdão proferido no processo n.º 101/2006-D- E/D (cfr. fls. 305 a 315 do PA);

M) Em 29/01/2012, foi elaborado parecer no processo de recurso nº 128/2009- CS/R, de cujo teor se extrai o seguinte:

«(…)

Dispõe o artigo 91º do EOA, que o advogado, antes de intervir em procedimento disciplinar, judicial ou de qualquer outra natureza contra um colega, deve comunicar-lhe por escrito a sua intenção, com as explicações que entende necessárias.

Como resulta por demais evidente dos factos apurados, a recorrente não cumpriu o estatuído no citado preceito em relação à recorrida. Alega a recorrente que o fez, através de comunicação efetuada ao Dr. J......, marido e colega de escritório da recorrida. O argumento não, porém, não colhe, e constitui uma espécie de extensão do regime da comunhão matrimonial ao exercício da profissão.

Como decorre da expressão “comunicar-lhes”, a eles magistrados ou advogados, a comunicação deve ser pessoal e não por interposta pessoal, pelo que a comunicação feita ao abrigo do artigo 91º do EOA, dirigida a um advogado, não se estende aos seus colegas de escritório.

Argumenta ainda a recorrente que ao remeter a comunicação ao Dr. J......, esta tomou conhecimento de que a ação iria ser contestada por si, cumprindo deste modo o dever do artigo 91º do EOA. Este argumento também não colhe, ainda que se admitisse a possibilidade de estender a comunicação, cabia à recorrente fazer prova de que a recorrida teve dela conhecimento, o que não logrou fazer.

A recorrente censura, por outro lado a decisão recorrida, por não ser aplicável à contestação a obrigação estatuída no artigo 91º do EOA, constituindo esta a sua “firme convicção”, tanto mais que cumpriu em relação ao Dr. J......, antes de requerer a sua intervenção provocada no processo.

Assinalemos antes de mais a contradição entre o agora e o anteriormente invocado. Na motivação deste recurso, a recorrente começou por usar a comunicação feita ao Dr. J...... para convencer (pelo menos tentar) que com ela cumpriu o dever do artigo 91º do EOA em relação à recorrida, para de seguida e na mesma motivação vir dizer que, afinal, só fez em relação a ele, porque considerava que não o tinha que fazer em relação à advogada recorrida, por se tratar de contestação. Esta contradição é suficiente para demonstrar a falta de fundamento do argumento convicção da recorrente sobre esta matéria, o que permite concluir, caso se conclua pela existência de infração disciplinar, que está verificado o elemento subjetivo da conduta da recorrente, necessário à censura.

A Ordem dos Advogados, em particular os órgãos com competência disciplinar, tem debatido a questão da aplicabilidade ou não do dever de comunicação em caso de contestação.

Antes da revisão de 2005 do EOA, a questão, apesar de não pacífica, tendia maioritariamente, ainda que contrária à posição do signatário, para a interpretação de que o dever de comunicação existia, tanto no caso da propositura de uma ação, como no caso da contestação.

Estas dúvidas interpretativas suscitadas pela redação do artigo 88º do EOA, foram eliminadas com a nova redação do artigo 91º do EOA, que substitui a frase “antes de promover quaisquer diligências judicias” constante do citado artigo 88º pela frase “antes de intervir em procedimento”. Com a consagração desta redação, quer se entenda que a mesma teve caráter meramente interpretativo ou clarificador da anterior, quer se entenda que a mesma tem um carácter inovatório (como entende o signatário), o certo é que, desde a entrada em vigor da Lei 15/2005, de 26 de Janeiro, o dever de comunicação constitui dever do advogado, ainda que para contestar uma ação.

Refira-se, aliás, que a questão não se colocaria no caso em apreço nos autos, ainda que a redação em vigor fosse a do aludido artigo 88º do EOA. A recorrida, para além da contestação, deduziu reconvenção contra a recorrida, como resulta do teor da respetiva peça processual junta aos autos, circunstância que a recorrente omite na motivação de recurso, apesar de citar expressamente jurisprudência da Ordem dos Advogados nesse sentido.

Nas suas conclusões, a recorrente suscita ainda a questão que decorre do facto de patrocinar o réu noutras ações, pelo que, segundo ela, era por demais evidente que a ação seria não só contestada, como contestada pela recorrente, pretendendo com isto, que face à litigiosidade anterior, que não estaria, por isso, obrigada a dar cumprimento ao dever do artigo 91º do EOA.

Ainda que o alegado seja verdadeiro (…), não estaria excluído o cumprimento do dever. Essa circunstância exigiria, aliás, maiores cautelar por parte da recorrente, para evitar o contágio da conflitualidade existente entre o seu cliente e a recorrida e os seus familiares, pois só assim poderá garantir a independência necessária ao exercício do patrocínio e, consequentemente, a melhor defesa dos interesses do seu constituinte.

Finalmente, a recorrente conclui que a participante não comunicou à recorrente a intenção de apresentar a participação que deu origem a estes autos, pelo que foi ela quem violou o dever do artigo 91º do EOA.

Esta matéria é irrelevante ao objeto destes autos. A recorrente, como resulta do teor da decisão recorrida, não participou disciplinarmente contra a recorrida por tal omissão. Por outro lado, sempre se dirá, que os atos e omissões de terceiros, nunca poderão justificar a conduta omissiva da recorrente.

Nestes termos, nenhuma censura merece a decisão recorrida, pelo que deve improceder o recurso.» (cfr. fls. 374 a 378 do PA);

N) Em 03/02/2012, o Conselho Superior da Ordem dos Advogados deliberou aprovar o parecer referido na alínea anterior e julgar improcedente o recurso (cfr. fls. 379 do PA);

O) Em 13/02/2012, o Conselho Superior da Ordem dos Advogados dirigiu à Autora o ofício n.º 0383, pelo qual lhe comunica o parecer e o acórdão melhor identificados nas alíneas a antecedem (cfr. fls. 381 do PA);

P) Em 14/05/2012, deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, a petição inicial da ação administrativa especial (cfr. fls. 1 a 60 dos autos).


*

Não resultaram provados outros quaisquer factos com relevância para a decisão da causa.

*

A convicção do Tribunal relativamente à decisão da matéria de facto fundou-se na análise crítica da prova produzida nos presentes autos, designadamente nos documentos juntos pelas partes e no PA, conforme referido a propósito em cada alínea do probatório.”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

Antes da análise, em separado, de cada um dos fundamentos do recurso, importa destacar que a ora Recorrente, mais do que concretizar que aspetos concretos da decisão recorrida enfermam de erro de julgamento de direito, pretende que o presente Tribunal de recurso, se substitua ao Tribunal a quo e reaprecie o julgamento efetuado, por dele discordar.

Por isso, toda a alegação da Recorrente se traduz não em sindicar a concreta decisão judicial proferida, ora recorrida, nem em refutar as razões de direito invocadas, mas em reiterar a sua alegação constante da petição inicial.

Daí que as conclusões do recurso que sintetizam as razões em que o recurso se fundamenta, traduzem não a alegação de vícios da sentença recorrida, mas a formulação de pretensões ou de pedidos da ora Recorrente a este tribunal de recurso.

Não obstante, porque as questões ora suscitadas no presente recurso foram objeto de pronúncia e de decisão na sentença recorrida, não estando em causa conhecer de questões novas, conhecer-se-á do sustentado no presente recurso.

1. Erro de julgamento, em relação à interpretação do artigo 91.º do EOA, por ter sido comunicado que iria contestar a ação e tal preceito não se aplicar ao articulado da contestação, mas apenas ao ato de iniciativa judicial, estando a ação já proposta, não sendo violado qualquer dever e sob pena de inconstitucionalidade material, por violação do artigo 18.º, n.º 2 da CRP, em violação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade

Vem a Recorrente a juízo impugnar a sentença recorrida discordando da apreciação dos factos e da respetiva aplicação do direito, defendendo que, ao contrário do decidido, comunicou que iria contestar a ação, assim como informou que ia deduzir incidente de intervenção provocada.

Com base na prova de tais factos entender a Recorrente que errou a sentença recorrida ao manter o ato impugnado, ele próprio enfermado de erro quantos aos seus pressupostos de facto e de direito.

Como se extrai da alegação da Recorrente, sem que seja impugnado o julgamento de facto da sentença recorrida, por a Recorrente não vir invocar qualquer deficiência à matéria de facto dada como provada, vem discordar da apreciação e valoração dos factos que foram dados como provados, entendendo que dos mesmos deve ser extraído que deu integralmente cumprimento ao disposto no artigo 91.º do EOA, no que se refere ao dever de comunicação ou informação.

O que exige, antes de mais que se dilucide a matéria de facto dada como provada, procedendo à sua respetiva apreciação.

Conforme resulta da matéria de facto assente:

(i) em 24/01/2006 a Autora, na qualidade de advogada apresentou contestação no Processo n.º 9458/08.0TBSTB, que correu termos no Tribunal da Comarca de Setúbal, tendo deduzido incidente de intervenção provocada do Dr. J...... e ainda deduziu reconvenção contra a Autora, M....... [alínea A)];

(ii) na mesma data remeteu ao Dr. J...... (advogado e marido de M.......) um fax em que comunica, nos termos dos Estatutos da Ordem dos Advogados, que vai requerer a sua intervenção principal provocada [alínea B)];

(iii) em 25/05/2006 a advogada M....... apresentou participação contra a Autora [alínea C)];

(iv) em 13/11/2008 o Conselho de Deontologia da Ordem dos Advogados aplicou à Autora a pena disciplinar de censura, pela prática da infração do dever estipulado no artigo 91.º do EOA, por na ação que correu termos sob o Processo n.º 9458/08.0TBSTB ter subscrito e dado entrada de articulado de contestação sem que antes tivesse comunicado ou apresentado qualquer explicação à Autora, Advogada em causa própria, M....... [alínea J)];

(v) interposto recurso pela ora Recorrente para o Conselho Superior da Ordem dos Advogados, este aprovou, em 03/02/2012, o parecer emitido em 29/01/2012, mantendo a deliberação impugnada e julgando improcedente o recurso, por a recorrente não ter cumprido o artigo 91.º do EOA, por não poder em relação à pessoa da advogada M....... a comunicação feita a outro colega, ainda que seu marido, o advogado J......, por a comunicação dever ser pessoal e não por interposta pessoa, e a comunicação feita a uma advogado não se estender aos seus colegas [alíneas M) e N)].

Perante este enquadramento de facto, vejamos então as razões invocadas pela ora Recorrente.

Sustenta a Autora que comunicou ao advogado J...... que iria requerer a sua intervenção provocada, pelo que ao comunicar-lhe esse facto, era claro que iria contestar a ação; e que ao comunicar esse facto ao advogado, este certamente relataria à autora da ação, sua esposa, que iria contestar a ação, pelo que, entender ter respeitado o disposto no artigo 91.º do EOA.

Alega que foi remetido fax para o escritório da participante e que a mesma além de partilhar com ele o escritório, é também sua esposa, além de ter comunicado antes de dar entrada da contestação.

Estando em causa uma ação sumaríssima, que não prevê mais articulados que não a petição inicial e a contestação, ao comunicar que iria requerer a intervenção provocada do advogado, significaria que também ia contestar a ação.

Pelo que, entende a ora Recorrente que a participante tomou conhecimento de que iria contestar a ação, estando cumprido o artigo 91.º do EOA.

Mais invoca que tal preceito do EOA não abrange a situação descrita, de apresentação de um articulado de contestação, mas o caso de propor uma ação contra um advogado ou magistrado e que, sendo adotada essa interpretação do artigo 91.º do EOA, o mesmo é materialmente inconstitucional, por violação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade.

Sem razão, nos termos em que se mostram decididos quer no ato impugnado, quer na sentença sob recurso.

Nos termos que decorre do julgamento da matéria de facto fica patente que em nenhum momento a ora Recorrente comunicou à sua colega advogada, Autora em causa própria na ação que instaurou sob o Processo n.º 9458/05.0TBSTB, que não só iria contestar a ação, como nela ia deduzir contra a Autora pedido reconvencional.

Como se sabe, a reconvenção consiste num contra-pedido ou numa contra-ação que o réu deduz contra o autor, de forma a que, a partir desse momento, a primitiva instância processual deu lugar a pedidos ou ações cruzadas entre os respetivos sujeitos processuais.

De acordo com o disposto no artigo 259.º, n.º 1, do CPC, a instância inicia-se com a proposição da ação e a instância reconvencional nasce com a dedução da reconvenção, o que dá, de imediato, azo a uma atividade processual daí emergente, com a possibilidade de réplica (artigo 584.º, n.º 1, do CPC),

Embora se entenda que à face da lei processual não exista uma peça processual nominada de “reconvenção” e reconvenção ser, tão só, um pedido deduzido normalmente no articulado “contestação”, não se pode olvidar que a formulado esse pedido se constitui uma nova relação processual.

Como refere Miguel Mesquita, “a reconvenção, uma vez notificada ao autor, gera uma relação processual que se sobrepõe à relação originária”, Reconvenção e Excepção em Processo Civil, pág. 184.

Considerando os factos apurados, os quais não se mostram impugnados, fica patente que a ora Recorrente não dirigiu qualquer comunicação à advogada participante, autora da ação contestada pela ora Recorrente e nela deduzido o pedido reconvencional, não a informando quer da apresentação da contestação, quer da dedução do pedido reconvencional.

Nem essa comunicação se pode ter por realizada em consequência da comunicação a um outro advogado, informando-o de que seria deduzido o incidente de intervenção provocada no referido processo.

Nada altera quanto à materialidade dos factos de esse advogado ser colega de escritório da advogada participante, nem ainda de tais advogados serem casados entre si.

Naturalmente que qualquer comunicação ou notificação é pessoal e não feita por interposta pessoa, pelo que, qualquer comunicação feita a um certo advogado só produz efeitos em relação a ele e não em relação a qualquer outro.

A tal não obsta qualquer especial relação de amizade ou até decorrente do casamento, como a própria advogada, ora Recorrente, tem a obrigação de saber.

Além de que, mesmo a comunicação dirigida ao advogado colega de escritório e marido da participante não o informa que vai ser apresentada contestação e, menos ainda, de nela ir ser deduzido pedido reconvencional.

Por isso, tal como decidido na sentença sob recurso:

Nem se diga, como intenta a Autora, que foi remetido fax para o escritório da participante e, como tal, o dever de comunicação prévia foi devidamente cumprido.

O referido fax reporta-se tão-somente ao pedido de intervenção provocada do Advogado Dr. J...... e é apenas a este dirigido (alínea B) do probatório). Não há aqui lugar, nem pode haver, a qualquer presunção de conhecimento por banda da participante, Dra. M......., por ser casada com aquele ou partilhar com o mesmo escritório, posto que o que se visa acautelar é, como sobredito, os deveres de urbanidade e cordialidade para com esta, que é também profissional do foro, inexistindo, como bem se sublinha no parecer em que se louva o acórdão do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, qualquer “comunhão matrimonial ao exercício da profissão” (alíneas M) e N) do probatório). Não é, pois feita, qualquer comunicação no referido fax quanto à dedução de contestação e pedido de indemnização por litigância de má-fé na ação que foi intentada pela Dra. M....... (alínea A) do probatório).

Ora, os deveres de cordialidade e urbanidade são devidos quer quanto ao Dr. J......, quer quanto à Dra. M......., impondo-se, portanto, que seja cumprido o dever de comunicação prévia quanto a ambos, sendo irrelevante, para o cumprimento deste dever, que estes sejam casados e que, como ditam as regras da experiência comum, até possam conversar entre si. Cada um, por si, exerce a profissão e, repita-se, a cada um é devida a observância dos deveres plasmados no EOA em prol da salutar relação entre profissionais do foro e em homenagem à solidariedade profissional.”.

Neste sentido, falece totalmente razão à ora Recorrente quanto aos pressupostos de facto em que baseia o fundamento do recurso.

Nos mesmos termos, carece a Recorrente de razão quanto aos respetivos pressupostos de direito, já que não é possível extrair do disposto no artigo 91.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) a interpretação que defende.

Considerando a data da instauração do processo disciplinar, em 06/06/2006 e a data da prática do ato de aplicação da pena disciplinar de censura, em 13/11/2008, mantido pelo ato datado de 03/02/2012, tem aplicação o EOA aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26/01, sendo-lhes posteriores no tempo as alterações introduzidas, as quais apenas serão aplicáveis se de conteúdo mais favorável à advogada visada no procedimento disciplinar.

Segundo disposto no citado artigo 91.º do EOA, sob epígrafe “Patrocínio contra advogados e magistrados”: “O advogado, antes de intervir em procedimento disciplinar, judicial ou de qualquer outra natureza contra um colega ou um magistrado, deve comunicar-lhes por escrito a sua intenção, com as explicações que entenda necessárias, salvo tratando-se de procedimentos que tenham natureza secreta ou urgente.”.

Consagra-se nesse preceito um dever de comunicação prévia relativamente à intervenção em procedimento disciplinar, judicial ou de qualquer outra natureza contra um advogado, sendo que tal dever encontra o seu fundamento na relação de confiança e cooperação entre os advogados, assim como de solidariedade profissional, como consta do artigo 106.º do EOA.

Neste sentido, “o dever específico de comunicação escrita prevista nesta disposição resulta da constatação de que a vida judiciária, pela especial tensão que gera no plano do relacionamento profissional, exige particulares cuidados na preservação de regras de cordialidade e urbanidade e, além disso, que o princípio da solidariedade profissional deve estar presente quando um Advogado disponibiliza a sua prestação profissional contra interesses de outros Advogados ou Magistrados”, Fernando Sousa Magalhães, Estatuto da Ordem dos Advogados Anotado, pág. 115.

Também como se tem entendido este dever de comunicação prévia existe nos casos em que o advogado atua no quadro do patrocínio judiciário, como resulta da epígrafe do artigo 91.º do EOA, “Patrocínio contra advogados e magistrados” e já não quando atua em causa própria.

Além de que tal dever apenas se mostra afastado quando estejam em causa procedimentos de natureza secreta ou urgente, sendo que tal natureza tem de resultar da lei que regula o respetivo procedimento ou processo, o que não se configura no presente caso.

Nem tem sustento defender que o preceito do artigo 91.º do EOA apenas tem aplicação aos advogados quando atuem como advogado do autor e que já não tem aplicação quando atue como advogado do réu, visto o preceito legal abranger toda e qualquer diligência judicial promovida pelo advogado contra outro advogado ou magistrado.

A norma jurídica do artigo 91.º do EOA adota uma formulação suficiente abrangente para incluir no dever de comunicação prévia entre advogados qualquer procedimento judicial ou de qualquer outra natureza e qualquer diligência judicial promovida contra outro advogado, sem introduzir quaisquer diferenciações.

Assim, em face de todo o exposto, não assiste qualquer razão à ora Recorrente quanto ao fundamento do recurso, pois não só não procedeu a qualquer comunicação à advogada, autora da ação, que iria apresentar contestação e pedido reconvencional, como a disposição do artigo 91.º do EOA tem plena aplicação à situação configurada em juízo, tanto mais por a contestante ter deduzido contra a autora da ação um pedido reconvencional, que demanda a constituição de uma contra-ação, em que se verifica o pressuposto da iniciativa judicial do respetivo mandatário contra o autor da ação.

Por conseguinte, não só não tem aplicação o disposto no artigo 351.º do CC, quanto a poder extrair-se através das regras de experiência comum que a advogada teve conhecimento dos factos, por ter sido produzida prova de que não foi dirigida à advogada em causa qualquer comunicação, como da interpretação expendida em relação ao disposto no artigo 91.º do EOA não resultar qualquer restrição de direitos fundamentais, não tendo razão de ser a invocação pela ora Recorrente do disposto no artigo 18.º, n.º 2 da CRP.

De resto, limita-se a ora Recorrente a alegar que a interpretação do artigo 91.º do EOA de que resulte a sua aplicação ao caso configurado em juízo, em que a advogada apresentou contestação e pedido reconvencional, viola os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, em desrespeito pelos direitos, liberdades e garantias, ultrapassando os limiites imanentes consagrados no artigo 18.º, n.º 2, da CRP, sem concretizar um qualquer argumento de direito em que o sustente.

O teor das conclusões H. e I. do presente recurso não materializam a invocação de qualquer razão material em que se fundamente o invocado juízo de inconstitucionalidade material da interpretação adotada do artigo 91.º do EOA, do mesmo modo que se mostra insubstanciada a alegação constante nos artigos 22.º a 25.º da alegação recursiva, por se limitar a Recorrente à sua mera invocação, desprovida da indicação de qualquer razão de direito que a fundamente.

Daí que, tal como decidido na sentença sob recurso:

Nem se vislumbra em que medida a interpretação que ora se explanou, ou seja, de que o dever de comunicação prévia abrange a dedução de contestação, padece de inconstitucionalidade material, nem tal, na verdade, esclarece a Autora.

Com efeito, não é suficiente arguir a violação de princípios constitucionais, sem concretizar, através da alegação e demonstração de factos, em que medida os mesmos resultaram beliscados pela atuação da Entidade Demandada. E, em qualquer caso, nem se perspetiva que possa, in casu, existir qualquer inconstitucionalidade mercê da violação dos princípios da subsidiariedade ou proporcionalidade ou dos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados.”.

Daí que que careça a ora Recorrente de razão em relação a todo o sustentado, que no plano da apreciação e valoração dos factos, quer na interpretação e aplicação dos normativos de direito.

Termos em que, em face das razões de facto e de direito supra explanadas, será de negar provimento ao recurso, por não provado.

2. Erro de julgamento, em relação à interpretação e aplicação do artigo 110.º do EOA, por não se demonstrar a atuação dolosa ou com culpa, tanto mais por estar em causa uma omissão, cujos requisitos são mais exigentes, não se verificando os momentos representativo e volitivo relativamente ao resultado que constitui a ofensa, excedendo-se os limites do artigo 351.º do CC, em violação dos artigos 91.º, 110.º, 126.º, 127.º e 128.º do EOA

Sustenta ainda Recorrente o erro de julgamento de direito da sentença recorrida em relação à interpretação do artigo 110.º do EOA, com o fundamento de não ter resultado demonstrado no processo disciplinar que atuou de forma dolosa ou com culpa, não tendo sido apurados quaisquer factos que caracterizem o elemento subjetivo do tipo de infração.

Defende que o artigo 110.º do EOA apenas considera como infração disciplinar a ação ou omissão dolosa ou culposa, a qual não resulta, tanto mais por estar em causa uma omissão, cujos requisitos para a verificação da responsabilidade disciplinar são mais exigentes.

Defende que cabia à Entidade Demandada demonstrar tal intuito doloso ou intenção propositada de violação do dever deontológico, o que não logrou fazer.

Por isso, entende terem sido violadas as normas dos artigos 91.º e 110.º do EOA, assim como dos artigos 13.º a 15.º do Código Penal, ex vi, artigo 121.º do EOA e ainda dos artigos 126.º a 128.º do EOA, em que se fundamentou o ato punitivo.

Vejamos.

Como se extrai da factualidade que consta do julgamento da matéria de facto, nos termos supra analisados, ficou demonstrado que a advogada, ora Recorrente, não comunicou à sua colega, advogada, autora no processo n.º 9458/05.0TBSTB que ia contestar a ação e deduzir pedido reconvencional (no âmbito do qual alegou a má-fé processual da autora, sua colega).

O que resulta que foi inteiramente demonstrada a prática do facto ilícito.

Põe agora a Recorrente que se verifique o elemento volitivo, da culpa, sob a invocação de que não se provou a atuação culposa ou dolosa.

Sem razão.

Os factos em que se baseia o ato sancionatório disciplinar apresentam-se suficientemente esclarecedores quanto às circunstâncias constitutivas da infração disciplinar, quanto à prática do ato ilícito, quer quanto ao elemento da culpa, pelo que, ao contrário do sustentado no presente recurso foram apurados factos que caracterizam o elemento subjetivo da culpa.

Não se provou a atuação dolosa, nem a mesma se mostra invocada no processo disciplinar, no sentido de ter existido a premeditação ou o propósito de esconder a atuação adotada no processo judicial, mas tal não se mostra exigido em face do disposto no artigo 110.º do EOA, o qual não exige o dolo como elemento da infração, bastando a culpa leve ou negligência.

Por isso, se diz no artigo 110.º do EOA que Artigo 110.º que comete infração disciplinar “o advogado ou advogado estagiário que, por acção ou omissão, violar dolosa ou culposamente algum dos deveres consagrados no presente Estatuto, nos respectivos regulamentos e nas demais disposições legais aplicáveis”.

Ao parece que que parece fazer crer a Recorrente, o disposto no artigo 110.º do EOA não exige a prática da atuação comissiva ou omissiva dolosa, bastando a mera culpa, o que a factualidade apurada em juízo permite atestar.

Acolhendo a fundamentação aduzida na sentença recorrida:

Age com dolo quem representando o facto típico atua com a intenção de o realizar (dolo direto; representa a realização de um facto típico como consequência necessária, certa, segura da sua conduta e não lhe repugna a sua verificação (dolo indireto) e representa a realização de um facto típico como consequência meramente possível da sua conduta e, mesmo assim, atua indiferente à sua verificação (artigo 14.º do Código Penal). Atua com negligência quem, sendo obrigado e capaz de o fazer, não procede com o cuidado normalmente exigível, assumindo uma conduta censurável (artigo 15.º do Código Penal).

Como resulta da deliberação do Conselho de Deontologia de Évora, considerou-se que a Autora atuou negligentemente «pois não podia ignorar a existência de tal dever de comunicação» (alíneas J) e K) do probatório). E no acórdão do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, acolhendo a argumentação aduzida no parecer que o antecedeu, reitera que se encontra verificado o elemento subjetivo da conduta da Autora (alíneas M) e N) do probatório).

Neste particular, considera-se que não existem motivos para questionar a valoração efetuada pela Entidade Demandada processo disciplinar quanto ao grau da culpa, posto que resulta de modo evidente do probatório que a Autora atuou sem a diligência exigível, tanto mais que, atenta a profissão que exerce, recai sobre si um especial conhecimento da lei que regula a mesma, não podendo invocar o seu desconhecimento.

Ademais, não está aqui em causa saber se a Autora quis ou não, intencionalmente omitir o cumprimento do dever previsto no artigo 91.º do EOA, posto que, como sobredito, a infração não lhe foi imputada a título de dolo, mas apenas a título de negligência.

E porque assim é, o ato impugnado não viola os artigos 110.º do EOA e 13.ºa 15.º do CP.”.

Pelo que, nos termos que antecedem, não tem a ora Recorrente razão em sustentar ter ocorrido a violação das normas dos artigos 91.º e 110.º do EOA, assim como dos artigos 13.º a 15.º do Código Penal, ex vi, artigo 121.º do EOA.

Nem tão pouco, em relação à alegada violação dos artigos 126.º a 128.º do EOA, que a ora Recorrente se limita a invocar, sem indicar qualquer razão que substancie o erro de julgamento da sentença recorrida.

Pelo que, improcede, por não provado, o fundamento do recurso.

3. Subsidiariamente, deve ser aplicada a dispensa da pena, ao abrigo dos artigos 121.º, a) e 74.º, do Código Penal, por a ilicitude e a culpa serem muito diminutas e o dano não ter ocorrido

No que se refere à questão enunciada, denota-se, em evidência, que a ora Recorrente vem formular uma pretensão a este tribunal de recurso, no sentido de o tribunal se substituir à Entidade Demandada e aplicar o instituto da dispensa da pena.

Porém, esta questão não foi colocada em 1.ª instância, impedido que a sentença recorrida sobre a mesma se tenha pronunciado e decidido.

O que acarreta que o presente Tribunal ad quem, sobre a mesma não se possa pronunciar, por não constituir finalidade e objeto do presente recurso conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente decididas, salvo as de conhecimento oficioso, que não constitui o presente caso.

A finalidade do recurso constitui a de reapreciar a decisão judicial impugnada e apenas nos pontos concretamente objeto do recurso, não se destinando a conhecer e decidir pela primeira vez de quaisquer questões, nem de reapreciar em toda a linha o objeto da decisão recorrida, salvo nas partes impugnadas.

Pelo que, sem mais, por a questão suscitada não ter sido objeto de pronúncia e de decisão na sentença sob recurso, não pode ser agora apreciada e decidida em fase de recurso jurisdicional.

Termos em que, não conhece do suscitado pela Recorrente, por inadmissibilidade legal.

4. Se não for aplicada a dispensa da pena, erro de julgamento por violação do princípio da proporcionalidade, considerando os critérios previstos no artigo 126.º, n.º 1 do EOA, devendo aplicar-se a mera advertência, por estar em causa uma falta leve

Vem ainda a Recorrente invocar a violação do princípio da proporcionalidade no tocante à pena disciplinar de censura, entendendo que ao invés, deveria ter sido aplicada a sanção de mera advertência, por estar em causa uma falta leve.

Sem razão.

O artigo 125.º do EOA elenca as penas disciplinares aplicáveis, a saber: advertência, censura, multa, suspensão e expulsão.

Segundo o artigo 126.º do EOA, sob a epígrafe “Medida e Graduação da Pena”:

1 - Na determinação da medida das penas deve atender-se aos antecedentes profissionais e disciplinares do arguido, ao grau da culpa, às consequências da infração e a todas as demais circunstâncias agravantes e atenuantes.

2 - A pena de advertência é aplicável a faltas leves no exercício da advocacia, com vista a evitar a sua repetição.

3 - A pena de censura é aplicável a faltas leves no exercício da advocacia e consiste num juízo de reprovação pela infração disciplinar cometida.

4 - A pena de multa é aplicável aos casos de negligência, sendo fixada em quantia certa em função da gravidade da falta cometida.

5 - A pena de suspensão é aplicável aos casos de culpa grave e consiste no afastamento total do exercício da advocacia durante o período de aplicação da pena.

6 - As penas de expulsão e de suspensão por período superior a três anos só podem ser aplicadas por infração disciplinar que afete gravemente a dignidade e o prestígio profissional.”.

Nos artigos 127.º e 128.º do EOA, prevêem-se as circunstâncias atenuantes e agravantes.

A escolha da medida da pena encontra-se devidamente justificada no ato sancionatório, não se vislumbrando que exceda as finalidades sancionatórias, ou seja, que vá para além do necessário a assegurar a finalidade punitiva e, consequentemente, incorra na violação do princípio da proporcionalidade.

Além de que, por princípio, no âmbito do processo disciplinar não pode, em regra, o juiz sindicar a medida da pena, salvo nos casos de erro grosseiro ou clara violação do princípio da proporcionalidade.

Como se decidiu no Acórdão do Pleno do STA, datado de 29/03/2007, Proc. n.º 0412/05, “ao exercer os seus poderes disciplinares em sede de graduação da culpa e de determinação da medida concreta da pena, a Administração goza de certa margem de liberdade, numa área designada de “justiça administrativa”, movendo-se a coberto da sindicância judicial, salvo se os critérios de graduação que utilizou ou o resultado que atingiu forem grosseiros ou ostensivamente inadmissíveis”.

Não se encontra o juiz impedido de sindicar a legalidade da decisão punitiva desde que ofenda os critérios gerais de individualização e graduação estabelecidos na lei ou que ultrapasse os limites normativos correspondentes, aferindo se foram ou não ponderadas as circunstâncias concretas, que, pela sua gravidade, indiciariam a concreta pena aplicada.

No presente caso foi aplicada a pena de censura pela prática da infração disciplinar, pela violação do dever de comunicação previsto no artigo 91.º do EOA, a qual constitui uma das mais leves ou menos gravosas.

Além de que a pena aplicada se afigura adequada a sancionar a conduta da ora Recorrente, por a pena de censura ser abstratamente aplicável a faltas leves no exercício da advocacia, consistindo num juízo de reprovação pela infração disciplinar cometida, juízo que ora se verifica em relação à infração cometida.

No caso em apreço, o comportamento ilícito cometido não permite afirmar que exista qualquer erro na escolha e medida da pena e, muito menos, manifesto, ou sequer que a pena aplicada se afigure como desadequada e desproporcional, exigindo uma atuação corretiva por parte do poder judicial.

A pena aplicada não se afigura excessiva para sancionar a conduta ilícita apurada, por ter sido aplicada uma pena que visa sancionar faltas leves, pelo que não é desproporcionada, nem enferma de erro grosseiro para poder ser sindicada judicialmente.

Assim, apurando-se que a advogada foi sancionada numa pena disciplinar de censura, pelo cometimento da infração disciplinar que se encontra devidamente comprovada, não tem razão a invocação do princípio da culpa ou sequer da violação do princípio da proporcionalidade da pena.

Consequentemente, não ocorre a violação do princípio constitucional da proporcionalidade invocado pela Recorrente.

Nestes termos, improcedem as conclusões do presente recurso, sendo de as considerar não provadas.

5. Erro de julgamento, por prescrição do procedimento disciplinar

Por último, invoca a Recorrente a prescrição do procedimento disciplinar, nos termos dos artigos 117.º e 118.º do EOA.

De harmonia com o disposto no artigo 112.º, n.ºs 1 e 2 do EOA, o procedimento disciplinar extingue-se por prescrição quando tenham decorrido cinco anos sobre a prática da infração, correndo tal prazo desde o dia em que o facto se tiver consumado.

Segundo o n.º 3 do artigo 112.º do EOA, o prazo de prescrição só corre:

a) Nas infracções instantâneas, desde o momento da sua prática;

b) Nas infracções continuadas, desde o dia da prática do último acto;

c) Nas infracções permanentes, desde o dia em que cessar a consumação.”.

Além de a prescrição do procedimento disciplinar ter sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade (artigo 112.º, n.º 4 do EOA).

O artigo 113.º, n.º 1 do EOA prevê que o prazo de prescrição se suspende nos seguintes casos:

a) O processo disciplinar estiver suspenso, a aguardar despacho de acusação ou de pronúncia em processo criminal;

b) O processo disciplinar estiver pendente, a partir da notificação da acusação nele proferida;

c) A decisão final do processo disciplinar não puder ser notificada ao arguido, por motivo que lhe seja imputável.

Segundo o artigo 113.º, n.º 2 do EOA, a suspensão, quando resulte da situação prevista na alínea b) do número anterior, não pode ultrapassar o prazo de dois anos.

Mais prescreve o artigo 113.º, n.º 3 do EOA que o prazo prescricional volta a correr a partir do dia em que cessar a causa da suspensão.

Além disso, o prazo de prescrição interrompe-se, nos termos do artigo 114.º do EOA, com a notificação ao advogado arguido da instauração do processo disciplinar e da acusação.

Após cada período de interrupção começa a correr novo prazo de prescrição (artigo 114.º, n.º 2 do EOA).

Tendo presente este enquadramento de direto, importa revertê-lo para os factos apurados no julgamento de facto.

O procedimento disciplinar foi instaurado contra a Autora, ora Recorrente pela sua atuação ocorrida em 24/01/2006, com a dedução da contestação e de pedido reconvencional sem cumprimento do dever de comunicação prévia previsto no artigo 91.º do EOA.

Para o que aqui releva, com a instauração do processo disciplinar em 06/06/2006, interrompeu-se a contagem do prazo prescricional.

O prazo não recomeçou, porém, a contar-se, porquanto o artigo 113.º, n.º 1, alínea b) do EOA prevê a sua suspensão a partir da notificação da acusação, em 03/12/2007 e enquanto estiver pendente o procedimento disciplinar.

Ora, o n.º 2 do artigo 113.º do EOA, na redação aplicável ao caso dos autos, prevê, porém, que a suspensão naquele caso não pode ultrapassar o prazo de dois anos, pelo que se reiniciou a sua contagem em 06/12/2009, terminando o prazo de cinco anos em 06/12/2014.

A decisão final do procedimento disciplinar foi praticada em 23/12/2008 e confirmada por deliberação do Conselho Superior da Ordem dos Advogados em 03/12/2012 (alíneas J), K), M) e N) do probatório), portanto antes de prescrever o procedimento disciplinar.

Tal como decidido na sentença recorrida, não tem, por isso, razão a Recorrente ao defender que o referido prazo continuou a correr e que o procedimento disciplinar prescreveu na pendência dos presentes autos.

O procedimento disciplinar tem natureza administrativa e termina com uma decisão administrativa, não se podendo pretender que o mesmo abrange, também, a fase judicial (neste sentido, veja-se, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, no processo n.º 0797/04, de 15/12/2004 e, também, o acórdão do Supremo Tribunal de justiça, no processo n.º 126/11.5YFLSB, de 05/07/2012).

Acresce que, por força do disposto nos artigos 306.º, n.º 1 e 321º do CC, o prazo de prescrição não corre entre a data do ato que a decidiu e o trânsito em julgado da decisão que julgou a impugnação judicial desse mesmo ato (v. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, processo n.º 0551/09, de 27/01/2010 e processo n.º 0471/15, de 22/05/2015).

Termos em que não se verifica a prescrição do procedimento disciplinar, tendo a decisão final sido praticada antes do decurso do prazo de cinco anos previsto no artigo 112.º, n.º 2 do EOA.”.

Em face do exposto, será de julgar improcedente, por não provado, o fundamento do recurso, não se verificando a prescrição do procedimento disciplinar.


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Em consequência, será de negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos, mantendo-se a sentença recorrida, que manteve na ordem jurídica a deliberação impugnada, de aplicação da pena disciplinar à ora Recorrente.

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Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. O quadro normativo aplicável aos Advogados, previsto no seu respetivo Estatuto, consagra no seu artigo 91.º o dever de comunicação, à luz da Lei n.º 15/2005, de 26/01.

II. Apurando-se que a ora Recorrente não dirigiu qualquer comunicação à advogada autora da ação, não a informando quer da apresentação da contestação, quer da dedução do pedido reconvencional, está verificada a prática da infração disciplinar por violação do artigo 91.º do EOA.

III. Essa comunicação não se pode ter por realizada em consequência da comunicação a um outro advogado, informando-o de que contra ele seria deduzido o incidente de intervenção provocada, ainda que esse advogado seja colega de escritório da advogada e de tais advogados serem casados entre si.

IV. A comunicação é pessoal e não feita por interposta pessoa, pelo que, qualquer comunicação feita a um certo advogado só produz efeitos em relação a ele e não em relação a qualquer outro, de modo que a comunicação dirigida ao advogado colega de escritório e marido da participante não a informa que vai ser apresentada contestação e, menos ainda, de nela ir ser deduzido pedido reconvencional.

V. Tanto mais, por a reconvenção consistir num contra-pedido ou numa contra-ação que o réu deduz contra o autor, de forma a que, a partir desse momento, a primitiva instância processual deu lugar a pedidos ou ações cruzadas entre os respetivos sujeitos processuais.

VI. O artigo 91.º do EOA tem aplicação ao advogado não apenas quando atue como advogado do autor, mas também quando atue como advogado do réu, visto o preceito legal abranger toda e qualquer diligência judicial promovida pelo advogado contra outro advogado ou magistrado.

VII. A norma do artigo 91.º do EOA adota uma formulação suficiente abrangente para incluir no dever de comunicação prévia entre advogados qualquer procedimento judicial ou de qualquer outra natureza e qualquer diligência judicial promovida contra outro advogado, sem introduzir quaisquer diferenciações.

VIII. Por princípio, no âmbito do processo disciplinar não pode, em regra, o juiz sindicar a medida da pena, salvo nos casos de erro grosseiro ou clara violação do princípio da proporcionalidade.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, decide-se no presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos, mantendo-se a sentença recorrida, que mantém a deliberação impugnada na ordem jurídica.

Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.

A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 01/05, tem voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores, Pedro Marchão Marques e Alda Nunes.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)